terça-feira, 4 de abril de 2017

-FESTEJANDO O S. MARTINHO EM ALCOBAÇA E JOSÉ MALHOA-

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A cultura da vinha, em Alcobaça, teve sempre importância pelo que o consumo de vinho incorporou-se nos rituais e tradições locais, exercendo uma poderosa influência em setores, como o folguedo ou a agricultura.
Foi uma cultura, que ao longo dos séculos integrou socialmente a produção, transformação e comercialização vitivinícola. Todavia, apesar do importante papel do vinho no desenvolvimento da cultura e tradições nacionais, nas últimas décadas sofreu profundas transformações com repercussão nos momentos, locais e formas de consumir.
Em Portugal, o consumo do álcool foi tradicionalmente quotidiano, praticamente exclusivo dos homens em termos públicos (as mulheres que bebiam faziam-no às escondidas dos familiares ou vizinhos sob pena de censura), com uma enorme componente social e essencialmente protagonizado pelo vinho. O facto de o País ser um dos maiores produtores de vinho, associado a mitos e preconceitos, como o vinho aquece, o vinho dá força, e em certas regiões ter servido de pagamento complementar da jorna e utilizado como alimentação pobre, sopas de cavalo cansado, justifica em certa medida, que o português seja também um dos maiores consumidores europeus de álcool, por pessoa.
José Malhoa em 1907, pintou um notável quadro de costumes, bêbados a festejarem o São Martinho, a comerem sardinhas e a beberem vinho.
A importância de Malhoa, na cultura portuguesa decorre do entendimento que transmite pelo seu ofício numa obra que, no seu conjunto, aborda trechos urbanos e burgueses, mas principalmente percorre os aspetos da ruralidade do país, desde a paisagem aos costumes e vivências do quotidiano. Recolhe o conteúdo de um panorama humano diversificado, a que não é estranho a compreensão da relação com o meio e natureza envolventes, um imaginário comum servido por uma arte de bons recursos técnicos.
José Malhoa legou um trabalho carregado de intenções, que intitulou Festejando o São Martinho, mas que correntemente se chama Os Bêbados, no qual representa um bando de aldeões, sentados à volta de uma mesa de uma taberna algo sórdida, no termo de uma festança. Ti José de Sousa nunca ouviu falar de Malhoa e, possivelmente jamais se reconheceria naquela tela, onde se figura um ferreiro (veja-se o avental de couro) a resvalar para as franjas do coma alcoólico e o que lhe fica em frente (esgotados uns quantos canecos de tinto sobre sardinhas ressequidas e castanhas que juncam o tampo), não tardará a seguir-lhe o exemplo. Quanto aos restantes convivas, terão permanecido no patamar em que o vinho, se não trouxe alegria excessiva, não os precipitou ainda no torpor completo. Mas em breve veríamos…
A alguns puritanos, ao ver o Festejando o São Martinho, ocorrerá provavelmente estigmatizar o que Fialho de Almeida caraterizou sibilinamente, como uma raça de miséria, avergoada de superstições e de ignorância, comendo mal, vivendo imundo, e guardando ao dinheiro dos ricos uma servilidade de escravos e cães esfomeados
Em terra de vinhedos, o vinho não podia faltar à mesa e se um copo estimulava o apetite e tornava mais agradável o repasto, não deixava de ser verda­de que o vinho dava de comer a um milhão de portugueses.
Durante a refeição a garrafa do vinho rodava (muitas vezes sem copo) e todos bebiam, incluindo as crianças, pois o vinho ajudava a empurrar a comida e dava força. Chegava-se ao extremo de calar os bebés quando choravam, com uma chucha de açúcar molhado em vinho..., como recorda D. Adélia, embora reconhecendo, que talvez não fosse um bom procedimento.
 A embriaguez era o estado normal de muita gente, especialmente ao Domingo à tarde e a origem de incontáveis males físicos, morais e sociais, que se projetavam de geração em geração.
Ti Zé recorda casos de sua família, como um tio, um irmão e um cunhado com maleitas graves, alegadamente devidas ao vinho.
Beber um copito na adega, convidar um amigo para vir provar o tinto, chamar o compadre para beber um branquinho, pagar uma rodada na taberna, estava de acordo com o certo e habitual, tal como brigar ao fechar da taberna, chegar a casa e dar uma tareia à mulher e filhos, partir a loiça, andar pelas ruas a cambalear, enfim gerar filhos com problemas.
Mas nem toda a gente bebia vinho.
Para esses, além da água da nascente (que era muita e boa no poço de Ti Zé), havia o pirolito, até que mais tarde apareceu com muito sucesso a laranjada Buçaco (mas sé em dias especiais).






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