sexta-feira, 22 de março de 2019


ECONOMIA LINEAR/ECONOMIA GLOBAL

Fleming de OLiveira

A classe politica, sempre ocupada em aparecer na televisão, participar em debates, mesas redondas, quadradas ou ovais, opina sobre isto e aquilo, não vê ou não quer saber o que dela se diz.
Não andando nos transportes coletivos, ignora mesmo o que se fala nos autocarros ou no metro. Se ouvisse, calava-se e procurava passar despercebida, antes que recolhesse algum “piropo”.
Para a classe politica, o povo serve, desde logo, para lhe fazer promessas. Metido o papelinho na urna, contados os votos, o “Zé” submete-se às estratégias partidárias, que pouco lhe interessam, ou nelas não se revê.
Conheço o argumento que as promessas eleitorais são consideradas mais intenções do que compromissos, pois não existem, na prática, exigências de que as promessas em campanha sejam cumpridas, nem sanções para os que não as cumprirem.
Se o político soubesse bem o que por aí se passa, perceberia que “Democracia” para os sem esperança, é palavra vã por não afastar a pobreza, a desigualdade, a degradação das condições de vida e o favorecimento de cliques. Se o desprezo matasse, esvaziava alguns “políticos da nossa praça” ou libertava-nos deles.
“No Tempo da Outra Senhora” , havia a ideia que às pessoas faltava capacidade para se pronunciar sobre o país e a cidade. Mas hoje em dia, talvez por força dessa “pesada herança”, a situação não é substancialmente diferente. Uma república, sem cidadãos intervenientes, rejeita que o “cidadão anónimo” (que terrível expressão!) seja capaz de elaborar uma visão estruturada sobre a realidade, falar de futuro e de coisas sustentáveis.

Por vezes o articulista acerta, desencadeando sentimentos e recordações que guardados no “disco rígido” a que chamamos coração, só esperam oportunidade para virem a superfície.
É o caso da evocação das dificuldades e comportamentos que a evolução da vida do País e do mundo nos convenceram que não voltavam mais. Mas voltaram. As privações de tempos que pensávamos extintos, suscitaram algumas mensagens quando neste espaço abordei o assunto. Fiquei reconfortado, pois é sinal que não foram “palavras fora da boca”. Recordo, concretamente, o que me escreveu um leitor: “Era mesmo assim. Tinha eu uns 2 anos quando começou a guerra na Europa e então era uma miséria. Em 1945, à luz da cadeia lá no alto da Serra, tudo se comia, tudo se aproveitava, as roupas eram remendadas e no meu casamento levei o fato comprado 2 anos antes quando a minha avó faleceu”.

Esta é a perspetiva de um anónimo, pelo que citando o nada anónimo Vitorino Magalhães Godinho não resisto a invocar que “incapazes de diagnosticarem a natureza estrutural da crise e presos nas teias dos grandes interesses resistindo as mudanças estruturais que se impunham, os Estados optaram pelo o que chamaram saneamento financeiro, sobrecarregar as populações pelos impostos e anulação de benefícios. Apertar o cinto, diz-se na gíria, tornar-se inevitável a degradação do nível de vida”.

 A ideia não é nova e antigamente era qualificada de mero bom senso. Os casacos passavam para os manos mais novos, os sapatos para os primos mais pequenos. A água depois de lavar couves ou alfaces, servia para regar as plantas do jardim e os frascos tinham uma nova oportunidade de vida, guardavam botões, agulhas ou parafusos e mesmo aquela divinal compota de amora que a avó fazia como ninguém. A minha neta Teresinha, licenciada em Economia, explicou-me que isto na sua Universidade pode ser designado como “Economia Linear”.
Com o tempo esquecemos estes gestos, e a prática de uso único passou a dominar a nossa vida, pelo que nos habituamos a deitar fora uma quantidade enorme de objetos que poderiam ser reutilizados. Acontece que, finalmente, estamos a perceber que poderá não haver em breve matéria prima suficiente para fazer novos produtos ao ritmo da procura e não mais espaço para nos desfazermos daquilo que descartamos.
Então voltou a necessidade de ter bom senso, agora sofisticadamente chamado “Ecologia”. Bem sei que, como em tudo, chegará a hora de um produto estar em fim de vida, que não é viável reparar. Por exemplo, uma caixa de cartão pode dar origem a novas caixas ou mesmo a papel higiénico.
Mas para que tudo isto funcione é importante o contributo individual e que não se quebre esta economia em cadeia, como me explicou a minha neta, também chamada “Economia Global”.