segunda-feira, 30 de abril de 2012

QUESTÕES DE IDADE, FAMÍLIA e OUTRAS, ENFIM, (TECNOCRÁTICA) SOLIDARIEDADE SOCIAL

Fleming de Oliveira Longe vão os tempos em que os cuidados de saúde e higiene com os idosos eram prestados no calor da familia. Foi, ainda assim, com os nossos Avós que faziam parte integrante da família tradicional, a quem eram dispensados, naturalmente, o aconchego e o zelo possíveis. A família estava estruturada e preparada para isso, sendo a situação aceite no campo ou na cidade, num contexto de maior ou menor escassez de recursos. Antes de disparar o surto de urbanismo, a família tradicional era principalmente rural e agrupava, não raramente, três gerações. Na cidade, encontrava-se no seio de uma classe média, mais ou menos alta ou confortável. Com a cidade de habitações exíguas, a família viu-se reduzida ao núcleo mais elementar, desde logo, com a diminuição do número de filhos. O conceito de família, na sociedade portuguesa, deixou há muito de caber apenas no rótulo de tradicional, para se espalhar por outras formas de organização, desde homossexuais que têm a seu cargo filhos de anteriores relações, a mãe e pais solteiros, casais que conjugam filhos de anteriores relações com outros nascidos da nova relação. A sociedade portuguesa olha para as mais recentes formas de organização familiar, com um mixto de abertura e desconfiança, principalmente no que toca às mães solteiras e aos casais de homossexuais, cujo debate não encerrou, apesar de referendos. Com o passar dos tempos a estrutura foi-se alterando, com exigências e compromissos sócio-laborais a exigirem maior ocupação e dispersão dos braços, o que implicou que o idoso fosse sendo remetido para o isolamento do lar. O aumento do tempo médio de esperança de vida, acarretou para esta faixa etária a necessidade duma estrutura social mais sólida, com suporte administrativo e financeiro integrado no Estado-Social. Contudo este, pelo menos em Portugal, está longe de ter capacidade de resposta para todo o espaço nacional, além de que nem os Hospitais ou as Instituições de Solidariedade Social têm condições ou vocação para lidar com a situação. Perante este estado de coisas e com a população a envelhecer, os Lares de Idosos começaram a proliferar de Norte a Sul numa lógica de exploração ou de negócio como outro qualquer, sabe-se lá com que qualidade ou conhecimentos. O programa do governo socialista do Senhor Engenheiro, fez o reconhecimento da diversidade das situações familiares, o que implica o estudo e acompanhamento das mudanças em curso na família e a definição de tipologias de intervenção adequadas. Além disso, defendeu a consagração de políticas públicas determinadas por critérios de justiça social nomeadamente no que se refere à progressiva eliminação dos fatores que afetam todas as famílias em situações de grande vulnerabilidade social - as pessoas/mulheres sós, sobretudo idosos, as famílias numerosas pobres, as famílias em situação de monoparentalidade, as famílias com pessoas desempregadas, as crianças em situação de risco, as famílias imigrantes e famílias com pessoas portadoras de deficiência. Fez o reconhecimento, fraturou, insistiu e nada adiantou… Mais preocupante do que os Lares de Idosos (sem alvará), é a propagação de Casas (de idosos) Clandestinas, que acolhem pessoas sem reunir condições para tal. Trata-se de empresários, normalmente sem qualquer tipo de qualificações, que aceitam acolher em casa um, dois, três ou mais idosos a troco de uma mensalidade e que, muitas vezes os colocam a viver em caves, outros locais do género ou a repartir camas. As Autoridades Policiais, as Juntas de Freguesia, a Segurança Social (e muitos de nós), têm conhecimento desta triste realidade, o que nem por isso facilita uma atuação, dado só ser possível num Estado de Direito entrar numa casa com autorização do proprietário ou com mandado judicial. Nunca ninguém apurou quantas são estas casas que por aí existem, concretamente em Alcobaça, em que condições vivem os idosos. Não releva reportar às famílias a pesada quota-parte de responsabilidade no fenómeno, embora se reconheça que, assim ao proceder, ao deixarem os parentes nestes locais, livram-se duma incómoda preocupação no imediato. Se estivessemos no antigamente (e não me refiro ao tempo da outra senhora…), poderiamos afirmar que um idoso abandonado traduz o que há de mais sórdido, o desprezo para com o pioneiro fundador da família. Os nossos idosos, muitas vezes, são considerados como figuras gastas, um pesado e fastidioso encargo. Todavia, tendo o direito de exigir um lugar no seio da família, vêm-se obrigados, não raras vezes, a mendigar a migalha que sobra. Nalgumas sociedades ou famílias não apenas tribais, os idosos são considerados, como o Livro da Sabedoria, portanto, especialmente venerados. O idoso ao ser rejeitado, acelera o processo do seu envelhecimento. Por outro lado, muitas das alterações do comportamento, devem ser interpretadas como reação à vivência da desvalia da auto-imagem diretamente dependente da diminuição das capacidades funcionais e intelectuais. O idoso, tornando-se pouco a pouco mais frágil, tanto sob ponto de vista físico, como psíquico, fica cada vez mais dependente, num meio cada vez menos tolerante. A reforma é mal vista, na medida que é associada a morte social. Os colegas começam a desaparecer, os amigos e a família a afastar-se, e a surgir no medo e meio da solidão, a doença e a dificuldade de locomoção. O ser humano não é só biologia ou composto psicossomático, mas um projeto de vida que inclui corpo e espírito, tempo e, confio mesmo, Eternidade. A História é composta de alegrias e sofrimento, pelo que se impõe sensibilizar os mais jovens a estarem conscientes da conceção de velho, que amanhã tem de usar fralda, cadeira de rodas, algália e uma cama como cruz. Os Idosos e os Avós são personagens recorrentes em (com)textos que ocupam espaços importantes na televisão, particularmente nas novelas e nos programas humorísticos, pois é fácil explorar a sua dramaticidade, ao acentuar a teimosia, desorientação e impertinência. A familia tradicional está pois em crise, embora talvez pior que a crise, são os modelos alternativos que nos querem eleger como substitutos da verdadeira família, famílias monoparentais, mulheres com filhos gerados in vitro, pares de homossexuais a adoptarem crianças, famílias em que cada um dos membros é o que fica de outras famílias. Os que assim se encontram, tem os seus lobbies, querem reconhecimento social, jurídico ou económico, como se tratasse de famílias tradicionais, não aceitando que a situação é a corrução daquelas. O drama da velhice, é frequentemente retratado em reportagens de idosos abandonados/depositados em Lares. Todavia, numa hipócrita boa consciência, é vulgar que depois das imagens de abandono aonde há gente feliz sem lágrimas, sejam apresentados velhos, muitos velhos, que continuam a desenvolver atividades criativas, cantando e rindo... O Poder público-político tem de inverter a sua política familiar e deixar de gastar tanto do nosso rico dinheirinho em, pouco mais que, propagandear os malefícios da diminuição da natalidade e o rapidíssimo envelhecimento da sociedade portuguesa (com os correspondentes encargos na SS), elevado a um nível dos maiores da Europa. Respeitando a paternidade / maternidade responsável, devem estimular a natalidade, dentro do matrimónio, sim dentro do matrimónio, para que a sociedade se vá retornando, mais equilibrada. Os Lares de Idosos (ilegais) em Portugal movimentam muito dinheiro, embora pratiquem preços, ao que se diz, cerca de 15% ou mais, inferiores aos lares (legais), o que leva a que tenham uma forte procura de famílias menos abonadas, especialmente nestes tempos que correm. Têm sido recorrentes as notícias de Lares de Idosos (ilegais) encerrados coercivamente. Daqui do nosso jornal, lanço um alerta para os combater, pois que para além de não pagarem impostos (e por aí não são solidários perante a crise), frequentemente carecem de condições de higiene e segurança para uma qualidade de vida decente, embora não conheça nenhum caso (especialmente relevante) em Alcobaça. Estimado leitor e alcobacense, sempre que precisar de um Lar para um Idoso, procure um qure seja acreditado, consultando a Segurança Social, a sua Junta de Freguesia, que têm conhecimento de situações (irregulares), bem como disponíveis listas de lares (legais).
Mas o abandono não se traduz apenas nos casos de Lares de Idosos, ainda que legais. O número de idosos abandonados nos Hospitais não pára de aumentar, como os deixados na Urgência, familiares que desaparecem e não atendem os telefonemas das assistentes sociais ou vidas marcadas pela miséria, que acabam, enfim, numa cama de camarata de hospital. Mas também se registam casos de famílias que não levam os doentes para casa, quando o médico efetua a avaliação e diz que um idoso pode fazer lá a reabilitação, porventura, com necessidade de apoio domiciliário. Não os levam e vão protelando, tanto quanto possível, a permanência no hospital. Para quem fica, o sentimento de abandono será insuperável, impossível de imaginar por nós felizmente normais, pois nunca pensaram que os filhos ou outros familiares os pudessem deixar numa situação destas. E se a tudo isto acrescentarmos que isto acontece ou pode acontecer a uma pessoa que trabalhou uma vida inteira, fez os descontos para a S.S. e contribuiu, a seu modo, para a vida coletiva, ficamos sem saber qual é o conteúdo real que devemos atribuir à expressão solidariedade social, neste Portugal tecnocrático (mais preocupado com os números que com as pessoas) de 2012. A linguagem do político está cheia de palavras bonitas, utilizadas sem conteúdo substancial (fala-se muito das massas e menos do Zé…) e com a maior despudorada ligeireza. Certamente que estamos muito longe da sociedade justa e solidária que almejámos! E não venham com o argumento do Défice ou Imposições da Troica…

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Fleming de Oliveira - Nota Biográfica

Nasceu no Porto, a 22 de Fevereiro de 1945. Licenciou-se pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em 15 de Novembro de 1969. Foi Sub-Delegado do Procurador da República, no Tribunal Cível do Porto, Delegado do Procurador da República nas comarcas de Vila Franca do Campo (interino), Cinfães e Arraiolos. Casou-se em 21 de Fevereiro de 1970, no Mosteiro de Alcobaça, com Ana Maria Salgueiro Pereira de Magalhães, professora do ensino secundário, licenciada em Direito, de quem tem três filhos e quatro netos. Prestou serviço militar na Guiné, como Alf. Mil. Inf. e no Qartel General do C.T.I.G., em Bissau (Serviço de Justiça). Em Bissau, começou a exercer a Advocacia, tendo sido Advogado da respetva Câmara Municipal. No ano de 1973, pediu a exoneração do Ministério Público, e inscreveu-se na Ordem dos Advogados. Desde 20 de Abril de 1974, reside em Alcobaça, para onde veio trabalhar, como Advogado, no escritório de seu sogro Dr. Amílcar Pereira de Magalhães. Foi eleito, em listas do P.S.D., Substituto Legal Vice-Presidente da C.M.A., entre 1976 e 1979, Presidente da Assembleia Municipal, no triénio seguinte, Deputado à Assembleia da República, em 5 de Outubro de 1980, Deputado Municipal em 1985, e líder da respectiva bancada. Colabora, regularmente em vários jornais da região de Leiria e Alcobaça e em revistas nacionais. Exerce (não remuneradmente) a docência na USALCOA e realiza palestras e conferências, sobre temas históricos. Foi fundador e autor dos Estatutos de algumas entidades do Concelho de Alcobaça e ainda fundador do P.S.D. (Leiria e Alcobaça). Exerce a Advocacia há mais de 35 anos, num escritório que pertence hoje em dia conjuntamente ao Dr. Luís Pessoa Gaspar, que também tem escritório na Figueira da Foz, tendo trabalhado para algumas das principais Empresas privadas e Instituições Públicas do Concelho de Alcobaça. É autor de três livros: -No tempo de D. Pedro, D. Inês e outros. Histórias e Lendas que o tempo não apagou. -No tempo de Salazar, Caetano e outros. Portugal e Alcobaça. -No tempo de Soares, Cunhal e outros. O PREC também passou por Alcobaça

quinta-feira, 26 de abril de 2012

ENTRE POLÍTICOS E TECNOCRATAS, O CERTO E O ERRADO…

Fleming de OLiveira Não que a História se repita, mas os interesses dos que declararam o Fim das Ideologias, permanecem os mesmos. Em 1959, o norte americano de Harvard, Daniel Bell escreveu The end of ideology, onde aponta o esgotamento das ideologias, face ao sucesso do capitalismo liberal e o fracasso do comunismo, muito especialmente perante a recuperação da Europa (capitalista) após a II Guerra. No entanto, o otimismo desses intelectuais e seus seguidores, foram abalados na década seguinte, com o sucesso da adesão de Cuba ao tipo soviético, as revoluções em África e Ásia (decorrentes do processo de descolonização) e os movimentos sociais, em particular dos estudantes, destacando-se obviamente o Maio de 68. Direta ou indiretamente esses movimentos questionavam o modelo capitalista e muitos deles ocorreram nas grandes praças do capital. Na década de 70, os Estados Unidos deixaram o Vietaneme sem a glória de uma vitória e a expansão do modelo soviético, forçaram um discurso não redutor, reconhecendo a existência de mais uma força, além das duas tradicionais. Mais tarde, voltamos a confrontarmo-nos com aq defesa da mesma tese, o Fim das Ideologias, na visão precipitada pela queda do Muro de Berlim, a desagregação da URSS e o seu bloco. Ao mesmo tempo, aquela associou-se à expressão o Fim da História, que aparece num artigo do norte-americano Francis Fukuyama, que posteriormente veio a desenvolver em O Fim da História e o Último Homem. Segundo Fukuyama, o capitalismo e a democracia (burguesa/formal), constituem o coroamento da História da Humanidade, que teria atingido o topo evolutivo, salientando que o liberalismo superou, com sucesso, as dificuldades e obstáculos, nomeadamente o fascismo e o socialismo. Entre parentesis, refiro que entendo ser um equívoco, colocar fascismo e socialismo em campos opostos, pois o fascismo foi uma forma de governo que se desenvolveu no interior de estruturas capitalistas, serviu os interesses de grandes corporações e por isso, as suas expressões e métodos, anti liberais. Por outro lado, o socialismo (científico) não é apenas uma forma de governo, mas um sistema acabado, com concepções políticas, económicas e sociais. Mais do que defender a democracia e o liberalismo, faz-se com o Fim das Ideologias, a defesa do capitalismo. No entanto, como defender a excelência do liberalismo, do ponto de vista político e económico, se dele estão excluídos mais de dois terços da população mundial, enquanto se não desenvolver um pensamento que não se contente com a aparência dos fenómenos históricos e se preocupe mais em questionar a essência contraditória da realidade social, aberta à possibilidade da emancipação e transformação do mundo? Foi nos anos trinta do século XX que surgiu, nos Estados Unidos, a ideia de tecnocracia, como forma acabada e perfeita de organização da sociedade, ao admitir-se que a economia poderia passar a ser dirigida por técnicos e organizadores, independentes dos proprietários ou políticos, mas que não teve seguidores no Portugal corporativo. O fenómeno, a que não foi imune o próprio estalinismo, transformou-se, pelo menos no Ocidente (aqule que conhecemos por experiência), numa ideologia que se radica no reservar um lugar central ao fenómeno económico, à sua construção e articulação em função da vida económica, com justificação na eficácia, na descoberta de soluções ótimas no campo do bem-estar social, mediante o emprego dos métodos das ciências físicas. Ao mesmo tempo, assegura confiança na técnica da planificação, para regulamentar e desenvolver a economia. Marcelo Caetano, com o seu Estado Social, terá ensaiado alguns pequenos passos. Segundo alguns pensadores, a relação entre o saber, a ciência e o político pode ser encarada de forma decisionista, tecnocrática ou pragmática. No modelo decisionista, os políticos conservam fora dos âmbitos da praxis coactivamente racionalizados uma reserva em que as questões práticas devem continuar a decidir-se por meio de actos de vontade. O modelo pragmático considera que há uma comunicação recíproca, onde os peritos aconselham os políticos que, por sua vez, os encarregam, segundo as necessidades. No modelo tecnocrático, os peritos são os verdadeiros soberanos e os políticos apenas tomam decisões formais. As máquinas apresentam-se com belas roupagens, aparecem como instrumentos de libertação do suor do trabalho, facilitando múltiplos afazeres. É como se houvesse, finalmente, lugar à redenção da conhecida e inequívoca maldiçao divina: Com o suor do teu rosto comerás teu pão. Com este o avanço, não é mais preciso suor, nem esforço por parte dos homens, a máquina faz tudo. Soma-se a isto, outra benção da tecno–ciência, com as suas descobertas que prolongam a vida. A morte é sucessivamente postergada, já que, mesmo nos países subdesenvolvidos, aumenta substancialmente a expectativa de vida. É claro que não temos nenhuma intenção de negar o valor e a dignidade de todas as descobertas técnicas e científicas que, desde a gênese da modernidade, tem auxiliado o desenvolvimento da sociedade ocidental. Por mais que queiramos fechar os olhos perante os grandes fatos da história contemporânea, é impossível não enxergar tantos fatos que mostram o paradoxo existente da cultura tecno-ocidental como as múltiplas bênçãos advindas do avanço tecno-científico que não levaram, necessariamente, e o ocidental a realizar-se como pessoa. Pelo contrário, a corrida pelo progresso devastou culturas, tradições, chacinou uma multiplicidade de ecossistemas e reduziu o homem a uma peça na engrenagem das indústrias, fábricas, órgãos do governo, etc. Tudo isso em nome do projeto sócio-cultural tecno-científico. Alguns paises europeus estão a seguir este caminho, uma vez que lhes venderam a ideia que a Democracia pode ser prejudicial (sobretudo para as intenções de outros países!), pelo que o melhor é jogar pelo seguro e deixar os técnicos tratarem do assunto, visto que afinal eles é que sabem dessas coisas da Economia e de governar, sem dinheiro. Efeitos da crise? Contudo, tenho a confessar que não percebo o alarido à volta dos tecnocratas, quando nós já aderimos a esta estratégia há algum tempo, pelo menos em pastas tão pouco importantes como a Economia e Finanças. O facto de termos Académicos, Professores-Doutores e aspirantes a passar pelo governo, a proferir conferências e dar palpites sobre o controlo do défice, cortes no Orçamento, talvez facilite a vida aos estudantes e jornalistas, que podem tirar apontamentos à vontade, mas dificulta imenso a vida aos meros Contribuintes, que são os destinatários deste interminável caso prático. Mas uma coisa é certa, quando já não houver políticos dispostos a avançar, estes senhores iluminaos chegam-se à frente, com tudo a perder, incluindo o vencimento... No mundo (moderno ou antigo, Portugal ou Estrangeiro), sempre se discutiu a questão do certo e do errado, tendo em vista que os termos tem vários sentidos. Políticos, filósofos e religiosos têm se debruçado ao longo dos tempos e textos, meditando sobre o que os/nos cerca, para tentar conseguir algum vislumbre sobre o que verdadeiramente significa certo e/ou errado. Todos definimos, a partir da educação formal, da aprendizagem em família e em grupo, o que é certo e o que é errado. Assim, chegamos a alguns conceitos básicos, como roubar (é errado) ou mentir (é errado). E isso é tanto aplicável às pequenas, quanto às coisas grandes. Sou radical? Talvez. Mas, se temos uma ética, o que é certo o é para todas as ações e, do mesmo jeito, é o errado. Seja como for, pode dizer-se que os políticos que temos (ou tivemos) dão cabo deste nosso Portugal com as opções que tomam (alegadamente certas), mas os tecnocratas, certamente, não vivem nele.

terça-feira, 24 de abril de 2012

VIVER A VIDA, SEGUNDO A SEGUNDO

Fleming de Oliveira
 Por vezes, nem reparamos que a vida consiste em aproveitar cada segundo, pois vivemos sempre a pensar no próximo e este que vivemos passa logo para o passado, sem vida, sem vivência e, como tal, para o esquecimento. Tenho reparado que a vida é todos os dias um desafio diferente do que um dia pensamos, planeamos e vivemos. Não adianta muito traçar metas, porque no caminho da sua execução, inúmeras situações podem ocorrer e esse objetivo não passar de uma ilusão. Reparo que o passado é somente um conjunto de momentos que se evaporaram no tempo, mas que se mantêm na memória, não apenas por já terem passado, mas porque foram bem vividos. Abracei tanta gente, brinquei com tanta gente, partilhei momentos com tanta gente, nomeadamente na escrita, gente essa que hoje ou não está presente ou o tempo já levou. O presente é bem diferente daquele que um dia quando saí da Universidade ou vim para Alcobaça, menino e moço, imaginei e desenhe. Não, não quero mais idealizar algo que provavelmente pelo caminho se perderá no tempo. Prefiro viver cada momento e, tendo o que consegui, deixar os objetivos e futuros cenários aparecerem com o tempo, viver o segundo presente, não o torturando com a chegada do segundo seguinte, viver, somente viver!!!

ALCOBAÇA: UMA SOLUÇÃO FALHADA E/OU ADIADA?

Fleming de OLiveira
Os alcobacenses, constituem o fator mais importante na estratégia de desenvolvimento local, uma vez que são eles a essência da Comunidade, os detentores dos conhecimentos e ideias que interessam. É por isso, essencial, promover soluções que possam dar resposta a direitos básicos de cidadania (não propriamente dos turistas japoneses, nem dos profissionais, ainda que supostamente muito laureados), de caráter social ou económico, soluções que vão gerar coesão social e propiciar, naturalmente, uma maior igualdade de oportunidades, aos que cá estão. A nossa Alcobaça é, diariamente, o nosso cenário. O esvaziamento populacional e o pouco, melhor dizendo nulo, dinamismo evidenciado pelas recentes soluções urbanísticas (todavia, nunca se fez tanto no Concelho de Alcobaça como nos mandatos de Gonçalves Sapinho e tão mal na Cidade, como nestes), veio progressivamente deteriorar, até tornar praticamente obsoleta, a vivência no Cento Histórico, do mais nobre que existe em Portugal. Neste sentido, o envelhecimento do tecido urbano alcobacense, colocou questões relacionadas com o desinvestimento sofrido na zona e ilustrou a preferência dos investidores por estratégias de descentralização. A riqueza do património edificado no Centro da nossa Alcobaça, deveria fazer com que a tarefa de o reabilitar estivesse permanentemente em curso, constituindo a conservação e reabilitação, uma ação de continuidade que é necessário continuar a impulsionar e para a qual se exige um pleno envolvimento, estudo e esforço de investimento, desde logo com o exemplo do setor público. É seguramente fundamental atuar na reabilitação de elementos patrimoniais, como igrejas, monumentos, praças, jardins, etc., contribuindo para o reforço da imagem e identidade da cidade e para o turismo, sem esquecer que o Património é a identidade de um lugar, de uma cidade, de um Portugal. A herança dos antepassados deve ser assumida pelos presentes que promovam a recuperação e modernização, contribuindo para a identidade e memória coletiva. Cidades com o estatuto de Património Mundial ou monumentos possuidores desses valores, possuem um especial valor emblemático, tendo por isso de ser especialmente avaliadas. Muitos de nós conhecem cidades cujo interesse patrimonial, também assinalável, foram objeto de especial cuidado na sua recuperação e requalificação. O Jardim do Paço, em Castelo Branco, a Cava de Viriato, em Viseu, os Castelos de Bragança e de Portalegre, ou Guimarães, sem esquecer o Castelo, assumem tal importância que os seus encantos não estão longe de quem lhes está perto. A reabilitação devolveu o brilho às pérolas dessas cidades. Caros leitores, se poderem, confirmem o que digo, como fiz por alturas da última Páscoa para poder escrever este desencantado apontamento! A cidade evolui ao sabor do tempo e o tempo traz consigo novos desafios. À necessidade de dar novos usos a espaços que se perderam com funcionalidades ultrapassadas (em Alcobaça não existe um Mosteiro, mas um ex-Mosteiro), a reabilitação sustentada deveria responder com novos e ponderados horizontes. A reabilitação do Centro de Alcobaça deveria evidenciar as características que permitam promover a actividade habitacional e económica.Deveria-o fazer suportada em fatores de competitividade, ligando os estudos da autarquia aos destinatários, sem esquecer o design, o marketing, a comunicação, a investigação e desenvolvimento de produtos e serviços, a logística, o conhecimento e a inovação, contribuindo assim para a recomposição do tecido habitacional e empresarial da cidade. Outrossim assistimos a um resultado (falhado) no reabilitar o nosso Centro Histórico, olvidando as características que permitam promover a sua atividade. Um cenário que perdeu qualidade, fruto de novos elementos introduzidos, acinzentou-se, ganhou cheiros estranhos e os alcobacenses deixaram de ser o ator principal, mesmo sem haver alternativa. Fleming de OLiveira

A PROPÓSITO DA QUALIDADE DE VIDA (na nossa Alcobaça e não só…)

Fleming de OLiveira A questão da medição do Bem-estar ou da Qualidade de Vida dos alcobacenses, pela enormidade de indicadores necessários a considerar, não é uma tarefa fácil (mesmo à nossa pequena escala local). Mas creio que, para além do propósito ou ambições manifestadas em momentos político-eleitoralistas, nunca foi tentada a sério e se tal aconteceu, desconheço quando e seus resultados. São às dezenas, para não dizer centenas, as variáveis que influenciam apreciação da qualidade de vida dos alcobacenses, mais ou menos fáceis de quantificar, seja pela natureza qualitativa (e por isso difíceis de avaliar), outras pela natureza quantitativa (e por isso mais fáceis de contabilizar). Contudo, aquilo que daqui da minha secretária reputo mais complicado fazer, é misturar essas variáveis de molde a obter um indicador comparável com idêntico de outros Municípios, nomeadamente os nossos vizinhos, e que permitria estabelecer um interessante ranking entre todos. Hoje em dia, ao vivermos um momento de exuberância tecnológica, constatamos que a Ciência e a Economia, apesar dos progressos, não correspondem, às expectativas ditadas pelas necessidades do Homem. E, em Portugal, não podemos assacar esta conclusão e os resultados que sentimos no lombo apenas ou mesmo principalmente ao Engenheiro que, fique sossegadinho e a estudar em Paris. Muitos termos, são utilizados como sinónimos de Qualidade de Vida, tais como bem-estar, boas condições de vida e satisfação na vida. Olhando a história, num primeiro momento, a expressão Qualidade de Vida aparece à volta de temas como o meio ambiente e a deterioração das condições da vida urbana. Já nos meados do Século XIX, caracterizado pelas reformas liberais, diversas medidas foram definidas e implementadas na Europa (e depois timidamente em Portugal) com o objetivo de melhorar o padrão de vida da nossa população, ainda especialmente a urbana. Durante os anos 50 e início dos anos 60 (sec. XX), o crescente interesse pelo bem-estar e a preocupação pelas consequências da industrialização da sociedade, fizeram surgir (não obstante o Estado Novo) a necessidade de medir esta realidade por critérios e dados objetivos. Surgiram, então, as Ciências Sociais a iniciar o desenvolvimento de indicadores de tipo estatístico, que permitissem medir dados relacionados com o bem-estar da população. Mas os meios e os interesses em confronto não permitiram grandes progressos. O desenvolvimento e aperfeiçoamento dos indicadores sociais, nos finais dos anos 70 e inícios dos anos 80 do século passado, levou a um processo de diferenciação entre estes indicadores e o conceito Qualidade de Vida. A expressão começou a definir-se como um conceito integrador de todas as áreas da vida, e faz referência tanto a condições objetivas, como a componentes subjetivas. A definição de Qualidade de Vida não é consensual, embora seja unanimemente reconhecido que ela pode ser descrita em domínios, cada um dos quais associado a um diferente aspecto da vida. De um modo geral, a Qualidade de Vida relaciona-se com a satisfação das necessidades da população a nível económico, social, psicológico, espiritual e ambiental, proporcionando tranquilidade, segurança e esperança de um futuro melhor, não muito longínquo. O estudo da Qualidade de Vida deve ser cada vez mais um instrumento que permita idealizar políticas e delinear ações que promovam o aumento dessa mesma qualidade de vida nas populações. Para tal, é necessário que esses estudos acompanhem a evolução quer das necessidades das pessoas, quer do conjunto de componentes (materiais mas não só), que envolvem o dia-a-dia de uma população. É certo que a noção de Qualidade de Vida que temos, não é a mesma dos nossos antepassados, tal como não será igual à das gerações futuras, daí a imperiosa necessidade da investigação em torno deste tema existir e nunca estática, mas sim ter um carácter dinâmico e inovador (mesmo sabendo ou, por isso, mesmo esperando que a crise há-de passar, mesmo em Alcobaça).

LIDAR COM O (DES)EMPREGO

Fleming de OLiveira Por que é tão difícil lidar com o desemprego? Quando conhecemos uma pessoa, uma das primeiras perguntas que fazemos é: Onde é que vc. trabalha? O que é que vc. faz? Parece que muito do valor de cada um, encontra-se diretamente relacionado com o seu trabalho. O trabalho é a sua identidade. O que se fazemos torna-se no que se valoriza! Quem perde um emprego ou enfrenta uma mudança de carreira, muitas vezes sente-se como se tivesse perdido o valor. Lidar com o desemprego pode gerar uma profunda e insanável crise de identidade. M…. perdeu o emprego que tinha há vinte e cinco anos, depois que a fábrica foi lá para as bandas do Oriente. Enquanto trabalhava, tinha orgulho e satisfação (ia ver o Benfica e depois bebia um copito), valorizava a experiência, a longevidade da carreira e as capacidades. Agora, nada disso existia mais. De repente, aquelas coisas que tinham sido tão importantes, não valiam nada. Quando perdeu a carreira, M… sentiu-se como se tivesse perdido muito mais do que apenas um trabalho, ficou perturbado e com tão profunda depressão, que nenhum Valium o ajudou. M… deixou de estar certo sobre quem psassara a ser ou se tinha a capacidade de fazer alguma coisa. A auto-estima foi destruída. Qual é o valor da sua vida agora? A vida parecia sem sentido. A jornada para aprender a lidar com a perda de emprego foi, todavia, cheia de perda de algumas ilusões. M… perguntava-se se o Poder se preocupava com a sua situação. Mais de dois ou três anos depois de o País ter entrado no pior período de estagnação que conheceu, aconteceu uma coisa estranha e perturbadora no discurso político português. O Governo parece ter perdido o interesse pelos desempregados. De vez em quando a maioria, tal como a oposição, fala de emprego. Ou desemprego. Apesar disso, não se vislumbram medidas com o objetivo de criar emprego, planos com esse fim, pois a política (à portuguesa), de maneira geral, parece concentrada em reduzir a despesa. Os portugueses que não conseguem arranjar emprego ou se vêem obrigados a contentar-se com trabalhos menores ou a tempo parcial, quando o que queriam era empregos a sério e a tempo inteiro, acabaram por desistir. As coisas não seriam tão dramáticas se os que estão nesta situação, tivessem esperança de arranjar trabalho a curto prazo. A verdade é que o desemprego se transformou numa armadilha de que é difícil (impossível) escapar. Porque é que o Poder parece não querer saber disto? Parte da resposta pode ser que, enquanto os que estão desempregados tendem a continuar desempregados, os que ainda têm emprego sentem-se mais seguros que há um ano. Neste momento, o nosso tecido empresarial sofre com um baixo nível de contratações, e não propriamente com o alto nível de despedimentos (o que é diferente da cessação das relações de trabalho), por isso as coisas não parecem assim tão más, desde que não nos preocupemos demasiado com os desempregados. Acontece que as sondagens, mostram que os portuguess continuam mais preocupados com o emprego que com o défice, o que torna ainda mais surpreendente que, nos Corredores do Poder, se pense o contrário e que os argumentos usados para justificar a obsessão com o défice, não têm sido confirmados pela experiência. Por um lado, somos avisados que os mercados não vão voltar a apoiar Portugal, a não ser que cortemos na despesa de forma drástica e imediata. Por outro, foi-nos assegurado que a redução dos custos faria maravilhas pela confiança dos investidores (estranjeiros). No entanto, nada disso aconteceu nos países que adotaram políticas de austeridade. Mesmo assim, a obsessão com a redução da despesa continua em alta, sem que o Governo a ponha em causa. Estimado leitor e alcobacense, a próxima vez que ouvir um político (da maioria ou da oposição) dizer que está preocupado com o défice que põe em causa o futuro dos nossos filhos, lembre-se que o problema dos nossos jovens não é o défice, mas a falta de emprego. O que me leva a perguntar quando é que voltarão os nossos políticos a preocupar-se com essas centenas de milhares de nossos esquecidos.

EM TORNO DA FAMÍLIA BIPARENTAL, MAS NÃO SÓ.

Fleming de OLiveira Em Portugal, em termos político-eleitorais, é vulgar ouvir reclamar por políticas integradas para a infância. Embora à escala local, a ação de apoio à criança seja alegadamente integrada, importa que globalmente se faça bastante mais, pelo cumprimento dos seus direitos. Numa coisa estamos todos de acordo, cada vez mais se proclamam os direitos da criança mas, paradoxalmente, crescem os atentados contra as crianças de todo o mundo. Não há Comissão de Proteção de Crianças e Jovens em Risco que o resolva, mau grado o esforçado trabalho que vai desenvolvendo, e me apraz registar (concretamente no nosso caso de Alcobaça). Muito embora a globalização tenha aspetos positivos para o desenvolvimento das sociedades, o certo é que também veio acentuar as desigualdades sociais. No caso de Portugal (Alcobaça, tanto quanto sei, não será uma exceção), tem-se registado uma diminuição percentual da pobreza global, mas é na infância e nos idosos, que os índices de qualidade são mais diferenciados, é nos meios mais pobres (carenciados materialmente) que as crianças correm maiores riscos, a começar na situação dramática do desemprego parental. Menos filhos, menos casamentos e uma população envelhecida, são dados amplamente conhecidos no respeitante ao Portugal deste século XXI. A Coordenadora Nacional para os Assuntos da Família, salientou, recentemente e com toda a sua autoridade, que é urgente cuidar da família. Subscrevo inteiramente. Portugal viu aumentar o número de famílias residentes nos últimos anos, mas as famílias portuguesas são mais pequenas, com menos filhos, menos casamentos e… mais divórcios, dados que fazem parte da caracterização estatística da família portuguesa, como é fácil de reconhecer. Posso ser considerado démodé. Mas apesar dos indicadores serem muitos negativos em relação à família, é justamente por isso, que defendo que ela é cada vez mais o núcleo que melhor pode responder às inquietações que a sociedade coloca hoje. O conhecimento da vida, permite-nos reconhecer as alterações nos padrões de nupcialidade, divorcialidade e da fecundidade, bem como o aumento da esperança de vida, com o consequente envelhecimento da população portuguesa. A taxa de nupcialidade diminuiu enquanto, concomitantemente, se assistiu ao aumento da taxa de divorcialidade. Para além da redução do número de casamentos, assistiu-se, no mesmo período, ao retardar da idade ao primeiro casamento (legal…). A sociedade civil também não ajuda (talvez para parecer moderna, up to date). No núcleo estável de pai, mãe e filhos, que gostosamente apelidamos Família Tradicional, expressão embora utilizada nalguns casos com um teor pejorativo, a família biparental continua a ser a que dá melhores garantias para a criação e educação dos filhos. Outro dado significativo tem a ver com o aumento da proporção de casais sem filhos, sendo necessário acrescentar que as mulheres têm menos filhos e mais tarde. A redução da dimensão média da família em Portugal é, assim, explicada pelo decréscimo das famílias mais numerosas, a par com o crescimento particularmente acentuado do número de famílias unipessoais. Será esta uma inevitabilidade? Estimados leitores e conterrâneos alcobacenses, também assumo como uma inevitabilidade, mais do que nunca, cuidar da família, o núcleo, a unidade onde a vida nasce, cresce, e se desenvolve. Bem desejaria que hoje, amanhã, em qualquer ponto do País, as famílias se reúnam e se divirtam, gostem de estar juntas. Compartilho, neste momento convosco, o breve apontamento de Vergílio Ferreira: Toda a gente admira um grande artista e ergue-lhe mesmo, às vezes, um monumento a confirmar, mas nunca ergueu um monumento a um homem e uma mulher por terem gerado um filho, que é obra infinitamente maior.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

ANDANDO PELO MINHO, SEM ESQUECER A SÉ DE BRAGA E O (renovado) MOSTEIRO DE TIBÃES

Fleming de OLiveira

(I)

Quando pensa numas férias em Portugal só lhe surgem imagens de sol e mar?
Se é assim, estimado leitor, está com a mira profundamente desajustada.
Já alguma vez pensou ou fez um cruzeiro no Rio Douro, passando as comportas das barragens de Crestuma, Carrapatelo ou Régua, com escala em quintas do Douro Vinhateiro, para ver a paisagem a partir de Galafura e degustar um divinal nectar chamado Vinho do Porto? Ou um passeio de barco, entre os canais da Ria de Aveiro? Já foi à Mata do Buçaco? Ou passar uma noite num Turismo de Habitação? Já subiu a Monsaraz? Ou uma viagem aos Açores, para observar as furnas, comer um cosido, descer às lagoas (em S. Miguel) ou as baleias azuis no Atlântico (a partir do Faial ou Pico)?
Portugal, continua a oferecer muitas surpresas e está pleno de recantos, por descobrir.
Porque não partir, assim, à aventura, nos menos explorados do País? Esperam por si momentos emocionantes, inesquecíveis! Bem sei que apesar de boas estradas que temos, a gasolina está cara, muito cara, tal como as portagens…
Uma visita ao Norte de Portugal (é um tripeiro assumido que escreve estas notas, mas emigrado em terra de mouros onde vai deixar os ossos) é uma viagem no tempo, que o transportará aos primórdios da Nação.
A região está repleta de antigas citânias (pré-romanas), castelos (medievais), imponentes monumentos e solares barrocos (ao menos o ouro do Brasil serviu para alguma coisa, embora não tenha criado riqueza), preserva um rico manancial de histórias, tradições e lendas.
Nas verdejantes encostas da região, produz-se um famoso vinho do País, o Vinho Verde (que tanto pode ser branco, como tinto), e não há vila que não possua a sua especialidade gastronómica (será que o leitor não gosta de lampreia do Minho ou dos rojões de Ponte de Lima?).
























































(II)

Para mim (e assumo que não sou assético, nem imparcial), Braga ou Guimarães apresentam-se como a fisionomia de certas Avós que, por serem virtuosas, vão acumulando em si as características das várias idades, da infância, conservam a inocência, da juventude, o ardor, da maturidade, a sabedoria e, da velhice, a bondade.
Nesta Páscoa de 2012, minha Mulher e eu chegamos a Braga num instante a partir do Porto e ao lado de largas e floridas avenidas, encontramos logo um dédalo de ruas estreitas, repletas de marcas de um passado ilustre, com monumentos e antigas construções, e, claro, uma vetusta igreja, mesmo com uma inequívoca aparência idosa...
Trata-se como já se percebeu da idosa Igreja de Santa Maria, como era antes conhecida a Sé de Braga (velha como a Sé de Braga), precedida por uma despretensiosa praça de pedras graníticas, filas de casas encostadas lado a lado, como que se amparando mutuamente por serem, elas mesmas, muito antigas e trôpegas. Mas nem por isto (ou talvez por isso), deixam de ser vivas e de ter ar distinto, nas suas cores vivas, brancas cortinas bordadas a espreitar por detrás das janelas, balcões com flores, grades de ferro artisticamente trabalhadas, como agora já não se faz mais.

Entramos, cautelosamente na Sé, a minha Mulher e eu.
Instintivamente, no interior, ambos assumimos, naturalmente, um respeitoso silêncio, imposto pelo imponderável sentimento de sagrado e pela atmosfera de oração existentes. Nota-se (será mera sugestão?), a preocupação de evitar o ruído de passos, da conversa, o flash das máquinas, para não retirar do recolhimento os que aí procuram (embora em plena Semana Santa, não eram muitos os crentes) na oração, o refúgio para suas misérias o amparo e e as energias para a caminhada da vida.
O altar central parece presidido por uma Mãe, escultura medieval, representando a Virgem com o Menino nos braços. Uma artística capela dedicada ao Santíssimo Sacramento é banhada (naquele dia ainda se mantinha a seca deste inverno anormal e havia muito sol) pelos raios solares que atravessam os vitrais da ábside e transmitem cores refulgentes, ao sacrário de prata.
A riqueza da alma portuguesa (e os donativos), foram enriquecendo a Igreja, com imagens de invocações expressivas, sinceras e emocionantes, como por exemplo, numa parede exterior uma Nª. Srª. do Leite. Em altares laterais, encontramos o Senhor da Paciência, a Senhora dos Fastios, o Senhor Cristo das Ânsias, Nª. Srª. da Boa Memória, o Senhor do Perdão e alguns mais... Há também um pitoresco altar dedicado a Nª. Srª. do Rosário e aos Santos Negros de nomes estranhos (que até aí desconhecia a existência, mas que fui estudar para aqui os apresentar), um S. Benedito (a África gerou santos como S. Benedito, nascido em 1526, descendente de etíopes cativos em Filadelfo, região da Sicília. É conhecido na Europa como Santo Mouro, por causa da cor de pele semelhante aos árabes, que ocuparam a região. De analfabeto, chegou a chegou a Superior do Mosteiro Franciscano de Monte Pellegrino. Teve uma vida inspirada em S. Francisco de Assis, e antes de morrer em 1589, pediu para ser enterrado como simples frade), uma Stª Ifigênia Carmela, (filha de um rei da Etiópia, que com o pai foi convertida ao cristianismo por S. Mateus. Não tendo casado com o nobre que desejava, entristecida doou os bens materiais e construiu um Santuário, em homenagem aquele Santo, permanecendo virgem até à morte) um St. António Denoto (António de Noto, viveu na Sicília em Ávola e Noto onde faleceu. Nasceu no norte da África, em Barca, na Cirenaica, por volta de 1490. De cor escura, tinha o apelido de O Etíope. Daí, António Etíope, ou António Negro. Sem nome cristão, era simplesmente o negro oriundo dos montes de Barca, vendido em Ávola a um fazendeiro. Era um servo doméstico para trabalhar no campo. Educado segundo o Corão, o António mostrava ser uma pessoa simples, de boa índole, sem malícia. Foi-lhe confiado o pastoreio das ovelhas e cabras e o fazendeiro, temente do Deus dos cristãos, empenhou-se pela conversão do seu servo ao cristianismo, o qual recebeu no batismo o nome de António. António, veio a ser um homem livre, mas mesmo assim ainda continuou por algum tempo a trabalhar para o patrão, até que se dedicou inteiramente à caridade ao próximo. Recebeu o hábito de franciscano, vindo a tornar-se um eremita no Vale dos Pizões) e ainda um St. Elesbão (representado como um Rei negro da Etiópia, a veneração de Elesbão teve muita difusão no Brasil colonial entre os escravos africanos e seus descendentes).
Atraiu-me, mais uma vez a atenção, a antiga capela lateral bem iluminada, arranjada com bom gosto, senso artístico e sobretudo alegado espírito de piedade. Nela estão expostas à veneração dos fiéis as relíquias de inúmeros santos e mártires (noutro apontamento voltarei ao tema das relíquias).


Caros leitores, há um dado interessante a atestar a antiguidade da Diocese de Braga, ou seja, os 141 bispos, sete dos quais foram canonizados.
A Sé de Braga, é sede do Bispado fundado segundo a tradição por Santiago Maior (também chamado Santiago, o Grande, Santiago Filho do Trovão, Santiago de Compostela e São Tiago Apóstolo, o Maior, martirizado em 44 da nossa era, foi um dos doze apóstolos de Jesus Cristo. Foi feito santo e chamado Santiago Maior para o diferenciar de outro discípulo de Jesus de mesmo nome, conhecido como Santiago Menor e também de Tiago, o Justo ou Tiago, irmão do Senhor), que aqui deixou como primeiro bispo o seu discípulo S. Pedro de Rates (S. Pedro de Rates foi assim o primeiro Bispo de Braga entre os anos 45 e 60, ordenado pelo Apóstolo Santiago que teria vindo da Terra Santa, martirizado quando convertia povos aderentes à religião romana no norte do Portugal).
Por causa desta origem apostólica, é considerada Sacrossanta Basílica Pimacial da Península Ibérica, e o seu Arcebispo, Primaz das Espanhas. Possui uma liturgia própria, a liturgia bracarense.
A Sé encontra-se assente sobre as fundações de um antigo mercado outemplo romano, conforme testemunham uma pedra votiva (que um cicerone se dispôs a indicar), e os muros de uma basílica paleocristã. A sua história remonta, pelo menos, ao empenho do primeiro bispo, D. Pedro de Braga, e corresponde à restauração da Sé episcopal em 1070, de que se conservam poucos vestígios.
Em 1128, foi iniciada a construção um edifício, respeitando os cânones beneditinos clunicenses, com cinco capelas na cabeceira, parcialmente destruído pelo violento terramoto de 1135.
Em 1268, embora as obras ainda não estivessem concluídas, o edifício continuou a ser modificado, sendo particularmente significativa a galilé (isto é a entrada do templo), mandada construir, na fachada, por D. Jorge da Costa (o célebre Cardeal Alpedrinha, 36º Arcebispo de Braga, entre 1501 e 1505, antes de ir para Roma, onde fez carreira) e que viria a ser concluída por D. Diogo de Sousa. Este último, mandou fazer as grades que agora a fecham, tendo ainda alterado o pórtico principal (destruindo duas das suas arquivoltas) e mandado executar a abside e a capela-mor, obra de João de Castilho datada do início do século XVI.
Em 1688, destacou-se a campanha de obras promovida pelo arcebispo D. Rodrigo de Moura Teles, que modificou a frontaria ao gosto barroco, mandando executar também o zimbório que ilumina o cruzeiro.
No século XX, foi colocado junto aos claustros o túmulo da taumaturga, religiosa e estigmatizada, Irmã Maria Estrela Divina, que passou a ser centro de grande devoção popular. Maria Estrela Divina (nasc. a 4 de Agosto de 1904 e fal. a 5 de Outubro de 1961), foi professora primária e religiosa terciária. Na catedral, na Capela dos Reis, encontram-se os túmulos de Henrique de Borgonha e sua mulher, Teresa de Leão, os condes do Condado Portucalense, pais de D. Afonso Henriques.
O primeiro carrilhão da Sé de Braga foi inaugurado no século XVII. Ao longo dos séculos, os Arcebispos de Braga acrescentaram novos sinos, tornando o carrilhão da Sé de Braga num dos maiores de Portugal. Em 1996 substituiriam-se 23 sinos. Os sinos retirados ao longo do tempo da Sé de Braga e das Igrejas de Braga estão reunidos no Tesouro Museu da Sé Catedral, que contabiliza mais de 200 sinos. Nas dependências da antiga casa do Cabido, encontra-se atualmente o Tesouro Museu da Sé Catedral, especialmente digno de uma visita, pelas alfaias e paramentos e demais aparatos litúrgicos.
































(III)

Quem está de visita a Braga não pode deixar de ir visitar o Mosteiro de Tibães.
O Mosteiro de S. Martinho de Tibães, antiga Casa Mãe da Congregação Beneditina portuguesa, situa-se a seis kms. de Braga, na freguesia de Mire de Tibães.
Chega-se lá num instante e muito bem.
Fundado em finais do século XI, quando o Condado Portucalense começava a afirmar-se e os monges de Cluny introduziam a regra de S. Bento, tornou-se, com o apoio real e concessões de Cartas de Couto, num dos mais ricos e poderosos mosteiros do norte de Portugal.
A crise demográfica e económica que, a partir de meados do século XIV, se instalou no País, veio refletir-se duramente no quotidiano monástico de Tibães, que viveu a partir daí um longo período de decadência (material e espiritual).
Com o século XVI, e no desenvolvimento das resoluções do Concílio de Trento, o Mosteiro de Tibães recebeu a nova reforma monástica, participou na fundação da Congregação dos Monges Negros de S. Bento dos Reinos de Portugal e tornou-se Casa Mãe dos mosteiros beneditinos.
Espaço monumental belíssimo, assumiu-se, durante os séculos XVII e XVIII, como centro produtor e difusor de cultura e estética, transformando-se num dos maiores e mais importantes conjuntos monásticos beneditinos e num lugar de exceção do pensamento e arte portugueses.
Com a extinção das Ordens Religiosas em Portugal, em 1834, o Mosteiro foi encerrado e os seus bens, móveis e imóveis, vendidos em hasta pública ou integrados em coleções de museus e bibliotecas nacionais, com a exceção da Igreja, sacristia e claustro do cemitério. Este processo só terminaria em 1864 com a compra, por privados, de grande parte do edifício conventual.
Desafetado da função inicial, com exceção da de igreja e de residência, o Mosteiro de Tibães irá a assistir durante anos, à delapidação, degradação e ruína do seu património, até ser resgatado em 1986 pela compra por parte do Estado da maior parte da propriedade, em uso privado.
Após anos de restauro, e um investimento de 15 milhões de euros, desde novembro de 2009 uma comunidade da família missionária internacional Donum Dei, do grupo das Trabalhadoras da Imaculada, pertencente à Ordem Carmelita, está instalada numa ala do mosteiro.
Em 11 de fevereiro de 2010, também aqui abriu ao público uma hospedaria com 9 quartos, e o restaurante Eau Vive de Tibães, com capacidade de 50 pessoas, gerido por aquela comunidade de religiosas.
Ao longo de história, e dada a sua importância, o mosteiro reuniu o maior e mais valioso espólio da região norte. Nele se destacavam obras de pintura, escultura e arte sacra, bem como uma vasta coleção de livros sobre variados temas.
Após a alienação do imóvel, em 1834, a maior parte do espólio foi perdido. O atual museu conserva apenas um fragmento desse espólio, ao qual se somam novas peças relacionadas com a história do mosteiro e a congregação Beneditina. É ainda possível e interessante fazer o Percurso Museológico, onde se aprecia a área envolvente ao Mosteiro, a arquitetura, as ruínas de edifícios anteriores, a mata, os jardins, e extensos campos agrícolas como hortos, pomares e milheirais.