sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Alcobaça em finais da Monarquia

 

Alcobaça em finais da Monarquia

 


Em 3 de Julho de 1907, Câmara Municipal de Alcobaça protestou contra o estado (anormal) da administração pública decorrente da ditadura  de João Franco, para o que enviou a Lisboa uma delegação da sua Comissão Executiva de dois de vereadores, para pedir o regresso à normalidade democrático-constitucional, a qual foi acolhida com uma indiferença pelo secretário do ministro que a recebeu.

O Presidente da Câmara, em 30 de dezembro de 1907, perante o arrastar da situação, anunciou que abandonava, tal como os vereadores, a gestão da Câmara, em protesto contra a violação constitucional e das leis regulares do país.


O Deputado Afonso Costa virou-se para João Franco e disse implacavelmente : “O Senhor Presidente do Conselho é mandatário do País e os membros do Parlamento, como representantes da nação são seus mandantes. Sª. Exª, como administrador ou procurador nosso, tem o dever de trazer à Câmara as contas dos adiantamentos feitos a eles. A Nação ordena, e declarara indispensável, que essas pessoas reponham as quantias desviadas com todos os juros sem exceção de uma só verba; declara formalmente que não consentirá no aumento da lista civil, nem em qualquer regularização, nem em outro modo acomodatício de pagamento. E mais ordena do Povo, solenemente, que logo que tudo esteja pago, diga o Senhor Presidente do Conselho ao Rei: Retire-se senhor, saia do País, para não ter que entrar numa prisão em nome da lei”.

Das galerias, soaram fortes aplausos, que a Mesa não conseguiu dominar, pelo que Afonso Costa prosseguiu: “ Por muito menos crimes do que os cometidos por D. Carlos I, rolou no cadafalso, em França, a cabeça de Luís XVI ”.

Soou a campainha, e o Presidente da Câmara dos Deputados  Tomás Pizarro de Mello Sampaio declarou que “ou o senhor Afonso Costa retira a frase ou tenho de lhe aplicar o Regimento”.

Afonso Costa, repisou a injúria no mesmo tom, sobrepondo-se ao tumulto que criara e grassava: “Por muito menos rolou no cadafalso a cabeça de Luís XVI”.

O tumulto aumentou nas galerias, que os contínuos queriam esvaziar. Os deputados republicanos gritavam que era ilegal mandar sair o público, encontrando-se a sessão aberta e não se deviam suspender os trabalhos. Mais uma vez a voz de Afonso Costa fazia-se ouvir acima de qualquer outra:

A.C.:

-“Eu respondo pelos meus actos!

PRESIDENTE:

-V. Exª não pode falar… Convido-o a retirar-se do edifício das Cortes”.

A.C.: “Havemos de sair todos! Hão de prender-nos a todos! Esta a liberdade do governo e a liberdade da monarquia.

PRESIDENTE”:

”Em virtude da resistência do senhor Afonso Costa à intimação que lhe faço, em nome da Câmara, vou mandar entrar a força armada!”

Quando os soldados entraram na sala, num gesto largo e teatral, Afonso Costa ao ser arrastado para o exterior, virou-se para eles de braços abertos e gritou: “Soldados, não tendes o direito de tocar num representante do povo. E acrescentou: “Soldados! Com a minha voz e as vossas armas baionetas, vamos proclamar a República, vamos fazer uma Pátria nova”.

Dirigindo-se a João Franco, e enquanto partia entre os soldados, Afonso Costa gritava de punho erguido: “Esta é a sua liberdade!”.

 

O Deputado António José de Almeida, ainda tentou convencer os militares – que apelidava de filhos do Povo –, a proclamarem nesse momento a República. Este e outros incidentes, difundidos e ampliados pelos republicanos, levaram a agitação a muitos pontos do País. Em Alcobaça, tudo em que participava António José de Almeida era seguido com atenção. Nas Cortes, Afonso Costa e Alexandre Braga, foram julgados e condenados por ofensas ao Rei na suspensão dos direitos parlamentares por 30 dias.

A notícia deste memorável acontecimento, chegou a Alcobaça no dia seguinte, trazida de Lisboa por Américo d’Oliveira, tendo sido recebida com cautela dados os inusitados termos, e possíveis efeitos. Todavia, quando na sexta-feira retomaram os seus lugares nas Cortes (não esperaram 30 dias), os Deputados Afonso Costa e Alexandre Braga, foi expedido para Lisboa o telegrama de solidariedade:

“Drs. Afonso Costa e Alexandre Braga, câmara dos deputados – Lisboa.

Republicanos de Alcobaça saúdam os seus deputados e, confiando que eles continuarão a servir o país e a honrar o seu mandato como até aqui, esperam que se não repetirá a injusta violência de que foram vítimas, e nós com eles.

(a) Raposo de Magalhães  .