AGITAÇÃO EM FRANÇA
Cumprimentos aos nossos
leitores
FLeming
de OLiveira
A agitação social que recentemente se registou em numerosas
cidades francesas, parece-me ser o momento para abordar a sua dimensão real e
causas, antes de fazer o levantamento dos desafios que se colocam para levar a
cabo uma nova política de integração sociocultural, cujas lacunas insofismavelmente
se revelam.
Tendo em conta o efeito amplificador de imagens de
incêndios e de violência que nos chegaram, era expectável títulos tão
sensacionalistas como “A França a fogo e
a fogo”, “Paris já está a arder”.
Certos comentadores, aproveitaram a oportunidade para ajustar contas com o
modelo de integração “à francesa”,
sublinhando o carácter xenófobo e racista do país.
Falei um dia destes com um meu conhecido radicado em
Marselha desde inícios de 1970 (bem sucedido empresário da construção civil,
reformado e integrado com filhos, netos e 2 bisnetos, mas que nem por isso
deixa de se assumir como português nado e criado no Marco de Canavezes, aonde
vem todos os anos) cuja sorte como de muitos nossos compatriotas poderia ser eventualmente
inquietante, no quadro destes acontecimentos. Pessoalmente não se sentiu
inquieto. Os actos de violência, no seu entender, foram indiscutível e desproporcionadamente
graves, gravíssimos, incontáveis automóveis queimados, edifícios públicos
vandalizados, lojas saqueadas, polícias feridos e muitos de detidos. Os
acontecimentos não tiveram dimensão política, étnica ou religiosa, que por
vezes os “media” lhes quiseram
atribuir para consumo interno ou externo, não se apercebeu corresponderem a um plano
pré-concertado. A violência rebentou sem ligação entre grupos de adolescentes, imigrantes
de segunda geração, que conhecem mal (ou nem conhecem) o seu país de origem e
que atravessam uma crise de identidade. Alegam, conforme os casos, que não tem
as oportunidades dos outros jovens franceses para estudar, para trabalhar (o
que não é inverdade) ou dispor de habitação condigna (mas o problema não é
apenas francês). O seu comportamento, reflexo desta frustração e alegadamente
em direta retaliação à descriminação policial, não questiona, todavia, serem
franceses de pleno direito.
O meu interlocutor,
apesar da pequena escolaridade que obteve em Portugal, defende, talvez por isso,
a educação como prioridade, a luta contra o
insucesso escolar, o aumento das bolsas de mérito para os provenientes dos “bairros problemáticos”, a abertura do
ensino profissional aos jovens em rutura escolar, e na boa conceção portuguesa,
uma maior responsabilização dos pais.
Ele que vive numa casa confortável fruto de muita canseira,
lado a lado com imigrantes espanhóis e franceses da pequena classe média com
quem se encontra no café, gostaria de ver erradicados os blocos de cimento
construídos por si e muitos portugueses nos anos de 1960 e 1970 para
corresponder ao pico da emigração proveniente da Europa do sul.
Se hoje em dia não se sente discriminado socialmente
como gosta de salientar, já não pode dizer o mesmo dos magrebinos que abundam
em Marselha (mas que não frequentam o seu café), pelo que vê como necessária a
criação de uma autoridade contra a discriminação e para a igualdade de
oportunidades, munida de poderes sancionatórios.
Portugal sentiu-se tocado, mas não contaminado,
pelos acontecimentos em França.
Portugal foi um país de emigração, nomeadamente para a
França. Para milhares de compatriotas nossos que procuravam trabalho, fugiam à
ditadura e à guerra de África, o “salto”
foi difícil, mas o estabelecimento globalmente bem-sucedido, pelo que se
constata que, tal como os descendentes, ocupam frequentemente posições de
destaque.
A integração dos portugueses em França pode
ser considerada um êxito, sem descurar problemas iniciais como os que conheci
em 1966 no bairro de lata de Champigny (Paris) o que como burguês me chocou
pelo inusitado, ou os que ainda podem subsistir. A França enfrenta hoje o
desafio da adaptação da sua política de integração com o fim de satisfazer os
que reclamam na sua maioria de forma pacífica, o desejo de serem franceses de
pleno direito. Vamos a ver os que
pode acontecer nos próximos tempos.
Cumprimentos
aos leitores de O AlCOA em França.
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