terça-feira, 6 de janeiro de 2009

CAÇA AOS GAMBUZINOS

CAÇA AOS GAMBUZINOS

Fleming de OLiveira




Francisco Mariano, doente e com dificuldades de locomoção, gosta muito de contar a velha partida da caça aos gambuzinos que, há perto de setenta anos, pregou ao primo e seu bom amigo Tó Mariano (hoje bancário reformado), ambos com uns oito ou nove anos que, recém chegado de Lisboa, se encontrava a passar as férias de Verão, em casa dos avós paternos, nos Carris de Évora. Não sabendo bem o que eram Tó, na sua ingenuidade imaginava talvez serem uma espécie de mistura entre um pirilampo e um ouriço cacheiro.

Francisco começou por dizer ao primo que o devia alertar que a caça aos gambuzinos é rigorosamente proibida, pelo que o não podiam contar a alguém.
Assim, logo depois do jantar, algo excitados, foram para o campo, onde procuraram árvores com tocas (buracos no tronco), buracos no solo ou buracos nas rochas.
O pobre do rapaz, acabou por ficar umas duas ou três horas de apito na boca, lanterna e saca aberta nas mãos, à espera que o primo, batedor experimentado como se reclamava, fizesse o cerco e assim correr na sua direcção, os famigerados e assustados bichos.
A aventura começou quando o Francisco lhe deu um apito e uma saca de serapilheira, que foi buscar ao celeiro do avô, e por sua vez se muniu de latas e paus para fazer barulho.
Tó Mariano, foi abandonado naqueles preparos e prosseguiu sozinho a caçada, apurando o ouvido ao mínimo ruído.
A experiência apenas acabou quando o frio, o medo ou o cair em si, o trouxeram, enfim, à realidade.

Este instante, constituiu para o Tó, um dos momentos de perda da inocência (que diz que bem lhe serviu na banca), e a partir daí o mundo não seria mais o que parecia, como depois reconheceu sem acrimónia.
Desabou um dos pilares que sustentava a sua infantil e lisboeta visão do mundo e da realidade.
Tó Mariano nunca mais esqueceu o incidente e acabou por crescer com a expressão na boca, vai caçar gambuzinos.

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