José Almada Negreiros, filho de um tenente de cavalaria, Administrador de Concelho em São Tomé, terra natal de sua mãe, aí nasceu e passou parte da infância.
Depois da morte da mãe, em 1986 veio com o pai viver para Portugal, o qual em 1900 foi nomeado encarregado do Pavilhão das Colónias, na Exposição Universal de Paris. Os filhos ficaram no Colégio dos Jesuítas, em Campolide.
Em 1911, com a República, o Colégio foi extinto, pelo que José entrou para a Escola Internacional de Lisboa onde irá desenvolver o seu trabalho, publicando nesse ano, o primeiro desenho, n’ “A Sátira”, bem como o jornal manuscrito “A Paródia”, do qual foi o único redator e ilustrador.
Por alturas de 1913 conheceu Fernando Pessoa, com quem veio a editar a “Orpheu”, juntamente com Mário de Sá-Carneiro e outros.
Júlio Dantas, médico, poeta, jornalista e dramaturgo, tido em certos meios como a maior figura da intelectualidade portuguesa da época, afirmou que a Orfeu era feita por “gente sem juízo”. Irónico, mordaz e provocador, Almada respondeu-lhe com o “Manifesto Anti-Dantas”, onde escreveu que “uma geração que consente deixar-se representar por um Dantas é uma geração que nunca o foi. É um coio d’indigentes, d’indignos e de cegos, e só pode parir abaixo de zero! Abaixo a geração! Morra o Dantas, morra! Pim!”
Em Portugal, já Salazar ocupava o poder, Almada, começou a ser solicitado para colaborar com as grandes obras do Estado. O Secretariada da Propaganda Nacional/S.P.N., encomendou-lhe o cartaz a apelar ao voto na Constituição de 1933. O mesmo, irá organizou mais tarde a exposição “Almada-Trinta Anos de Desenho”, e convidou-o a apresentar-se na “Exposição Artistas Portugueses”, realizada no Rio de Janeiro em 1942. O S.P.N., viria a atribuir-lhe o “Prémio Columbano” pela tela “Mulher”.
A partir daqui, Almada dedicou-se, principalmente, ao desenho e à pintura. Pintou, os vitrais da Igreja de Nossa Senhora de Fátima/Lisboa, que o público mais tradicionalista não apreciou, o renomado retrato de Fernando Pessoa, os painéis das Gares Marítimas de Alcântara e da Rocha Conde de Óbidos, os frescos na Escola Patrício Prazeres, as fachadas dos edifícios da Cidade Universitária, os cartões para as tapeçarias do Tribunal de Contas e do Palácio da Justiça, de Aveiro.
Tendo colaborado muitas vezes com o Estado Novo, Almada, não deixou todavia de registar que “as construções do Estado multiplicam-se, porém, as paredes estão nuas como os seus muros, como um livro aberto sem nenhuma história para o povo ver e fixar”.
Os seus últimos trabalhos, então com 75 anos, são o painel “Começar”, na Fundação Calouste Gulbenkian e os frescos da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra.
O único registo televisivo que dele existe, é a entrevista aquando da sua ida ao ZIP-ZIP, gravado ao vivo, sem a intervenção da censura prévia, no Teatro Vilaret. Almada, nunca tinha ido à televisão e não voltou a ir. No Zip-Zip, foi ele a revelação para inúmeros portugueses, que nem de nome o conheciam, e um bom teste foi ver que os seus livros ou sobre ele, se esgotaram na Feira do Livro. Fialho Gouveia lembrava que não foi fácil convencê-lo a ir ao programa, mas que, “depois de lá estar se sentiu bem e foi muito comunicativo”. Cerca de um mês mais tarde, Natália Correia mostrava-se “surpreendida com o suculento prato de espírito, finalmente servido pela TV”. Segundo alguns, nunca antes um programa de televisão havia conseguido impacto semelhante.
Corria o mês de abril de 1969. Coimbra começava a estar em polvorosa com a crise académica. Salazar tinha caído da cadeira, e o governo era chefiado por Marcelo Caetano. A censura não abrandava o cerco à liberdade de expressão. Ramiro Valadão era o homem a conduzir os destinos da RTP, de braço dado com o poder. Perante a estagnação que se vivia em Portugal, Raúl Solnado, Carlos Cruz e Fialho Gouveia propunham a realização de um programa diário, de estúdio e porta abertos. Ramiro Valadão foi perentório, “era complicado..., mas… porque não o fazer semanalmente?”
Daí a pouco nascia o Zip-Zip e lá estava Almada Negreiros. Pela primeira vez, o artista estava na televisão, para uma conversa que deixaria os portugueses suspensos. Um homem culto, especial e inteligente em poucas palavras dava respostas que faziam eclodir palmas do público. Na rua, onde muitos dos seus quadros estavam expost
os, Fialho Gouveia fazia uma reportagem percorrendo falando com os transeuntes. No estúdio, Almada assistia atento e curioso.
As orientações de busca e criação de Almada Negreiros foram a beleza e a sabedoria, “pois a beleza não podia ser ignorante e idiota, tal como a sabedoria não podia ser feia e triste”. Mestre Almada, foi um pintor-pensador, executante de uma arte elaborada que pressupõe uma aprendizagem que não se esgota nas escolas tradicionais. Outrossim, uma aprendizagem que implica um percurso introspectivo e universal. Vulto cimeiro da vida cultural portuguesa durante quase meio século, contribuiu para a criação, prestígio e triunfo do modernismo artístico em Portugal. Na sua evolução como pintor, passou do figurativismo e da representação convencional, para a abstração geométrica, matemática e numérica que caracteriza as últimas obras.
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