sexta-feira, 30 de junho de 2023

EÇA DE QUEIROZ, O TEMIDO Dr. GODINHO, O PADRE AMARO E LEIRIA.

 

EÇA DE QUEIROZ, O TEMIDO Dr. GODINHO, O PADRE AMARO E LEIRIA.

 

No dia 17 de Junho de 2023, foi apresentado no Juncal o livro EÇA DE QUEIROZ, O TEMIDO Dr. GODINHO, O PADRE AMARO E LEIRIA.

 

Bacharéis, Magistrados, Advogados, Tabeliães, Escrivães, Meirinhos, Homens de Leis, aparecem amiúde, na obra queirosiana.

Como viu ele essa gente?

Com o aristocratismo indolente e dandy de um Carlos da Maia, com o apuro intelectual de um Fradique Mendes ou com o espírito das rimas mordazes de Sá de Miranda ou de Gil Vicente? Que ideia fazia dessas pessoas que lidam com o papel selado? Pretendeu elogiá-las? Denegri-las? Ou tão só representá-las?

 

A entrada d’O Crime do Padre Amaro no universo escolar foi muitas vezes retardada e até censurada, em particular durante o Estado Novo, sob o pretexto de uma moralidade a que sobrava hipocrisia e a que faltava lucidez.

 

Em Leiria, Amaro rezava missas como se impunha mas o seu pensamento, devaneio e ocupação eram a Amélia.

 

É n´O Crime (…) que aparece o temido leiriense Dr. Godinho, respeitável chefe de família, cuja eloquência arrancou inúmeros desventurados ao cutelo da lei. Homem pronto a levantar falsos testemunhos, e cujo desamor pela Igreja e seus ministros se sintetiza na ordem dada aos redatores d´A Voz do Distrito: Em tudo o que cheire a padre, para baixo! Havendo escândalo conta-se! Não havendo, inventa-se!

 

Eça de Queiroz faleceu em 16 de Agosto de 1900 em Paris e foi sepultado em Lisboa. Em setembro de 1989, os seus restos mortais foram transladados do Cemitério do Alto de São João/Lisboa para um jazigo de família no cemitério de Santa Cruz do Douro (Tormes), Baião.

A Assembleia da República em janeiro de 2021 aprovou por unanimidade um projeto de resolução para conceder honras de Panteão Nacional aos restos mortais de Eça de Queiroz em reconhecimento e homenagem pela obra literária ímpar e determinante na história da literatura portuguesa.

 

A obra pode ser adquirida via flemingdeoliveira@gmail.com ou 962925444







QUANDO O GOVERNO PORTUGUÊS ENGANOU O PAPA PAULO VI

 


FLeming de OLiveira

 

 

 

Paulo VI veio Fátima em 1967 (tal como Francisco em 2017 no centenário das aparições, mas não falou delas), tendo publicamente apresentado Lúcia, numa imagem que se tornou icónica.

“Paulo VI recebeu as homenagens da Irmã Lúcia que, autorizada, a título excecional, pelo Arcebispo-Bispo de Coimbra, interrompeu por três dias, a sua clausura no Carmelo de Santa Teresa, para vir assistir ao momento mais solene da história da Fátima, desde as aparições de há cinquenta anos, de que foi testemunha principal. (…) O Papa conversou afetuosamente durante três minutos, com a freira carmelita, servindo de intérprete o Bispo de Leiria. Depois dirigiu à vidente algumas palavras e ofereceu-lhe um estojo com uma medalha. Lácia pediu, então, ao Papa, autorização para lhe apresentar alguns dos seus familiares, que Sua Santidade igualmente abençoou. (…) O Padre Santo convidou Lúcia a aproximar-se dele e apresentou-a aos peregrinos sob uma revoada de aplausos”.

 

Em Outubro de 1942, Gonçalves Cerejeira havia afirmado: “Não foi a Igreja que impôs Fátima, foi Fátima que se impôs à Igreja”.

A frase sintetiza, a meu ver, o complexo e por vezes tenso, processo de construção do “milagre” junto da hierarquia católica. Esta haveria de reconhecer que os acontecimentos da Cova d’Iria eram, talvez, o facto mais saliente da história religiosa de Portugal.

A Igreja estudou os acontecimentos, organizou um processo canónico que estendeu ao longo de oito anos, permitindo recolher testemunhos, e sobretudo, “verificar a prova decisiva do tempo”.

 

O ambiente era de tensão, entre o Governo Português e o Vaticano, nesses tempos finais do salazarismo, embora a maioria dos portugueses não se apercebesse disso, por força do controlo da informação.

“Oficialmente nada sei, mas, pessoalmente, creio que o Papa virá a Portugal, caso não haja implicações internacionais que o não permitam”, declarou cautelosamente o leiriense Cónego José Galamba de Oliveira, vice-presidente da comissão central das comemorações do cinquentenário das “aparições”. Galamba de Oliveira acrescentou saber que a TAP (“no caso de se concretizar a visita a Portugal”) convidará o Santo Padre a fazer a viagem num dos seus aviões.

Os rumores de uma visita do Papa a Portugal começaram a circular durante a cerimónia da entrega por Paulo VI ao Santuário da “Rosa de Oiro” e, embora sem qualquer confirmação oficial, passaram a ter acolhimento muito favorável da parte das autoridades eclesiásticas portuguesas.

A viagem foi publicitada pessoalmente na Audiência Geral de 2 de maio de 1967 e apresentada como uma “peregrinação para honrar Maria Santíssima e invocar a sua intercessão em favor da paz da Igreja e do Mundo. A peregrinação rapidíssima, terá caráter totalmente privado. Sua Santidade partirá para Fátima no dia 13, e o avião pousará no aeródromo de Monte Real. Depois de celebrar missa e falar aos fiéis, regressará a Roma na tarde do mesmo dia”.

Do ponto de vista da comunicação social, a visita papal foi, provavelmente, o acontecimento mais mediático a que, até então, se assistira e que veio atenuar a política isolacionista do Estado Novo e também fonte de inspiração e estímulo para os que se lhe opunham.

 

Salazar terá “jurado” a Franco Nogueira que enquanto fosse vivo, Paulo VI não viria a Portugal, que lhe recusaria o visto de entrada.

À partida, era expectável que a visita do Papa se prestasse fortemente capitalizada pelo regime. Mas também acabou por se revelar mobilizadora e benéfica para as oposições, que reconheciam os seus anseios e preocupações no discurso de Paulo VI que liderava um movimento de renovação da Igreja que assumira a causa dos mais fracos e denunciava as injustiças decorrentes de um capitalismo feroz e alheado do progresso dos povos, que fomentava a revolta e a guerra.

Conforme o embaixador de Portugal em Roma, António de Faria, o Pontífice tardou todavia a dar o “sim” à deslocação. D. João Pereira Venâncio desenvolveu inúmeras diligências para que o Papa aceitasse o convite, cuja anuência lhe foi confirmada apenas nos primeiros dias de Maio de 1967.

Paulo VI foi o primeiro Papa a fazer com regularidade viagens para fora do Vaticano. Antes de Fátima, foi à Terra Santa, à Assembleia Geral de ONU, em 1963 ao Congresso Eucarístico em Bombaim, que Franco Nogueira, qualificou como “um agravo gratuito, no duplo sentido de que é inútil e injusto para com um país católico”, em 1964 à Colômbia.

A deslocação a Fátima, à partida, não foi apreciada pelo governo português. Permanecia o agravo entre a Índia e Portugal, pois aquela tinha invadido e ocupado Goa, Damão e Diu em dezembro de 1961, e, apesar da tentativa do Papa em procurar mostrar que a ida a Bombaim não era um gesto hostil a Portugal e ao catolicismo português, provocou uma forte reação por parte de Salazar e do Governo.

A visita papal a Portugal deveria ser um momento de glória, nunca de embaraço. Não foi uma visita de Estado, o Pontífice decidiu não ir a Lisboa, não pernoitar em Portugal e aceitar ser convidado do Bispo de Leiria. Enfim, para mostrar o distanciamento face ao regime político português.

Assim que correu a notícia da visita papal, o país entrou em efervescência a preparar a receção que, além da solenidade protocolar propriamente dita, se queria envolta em exuberantes manifestações populares de carinho e apoio à sua pessoa (e ao regime…), bem como ao propósito da peregrinação, a paz no mundo e o entendimento dos homens.

 

No Museu do Caramulo, existe um Rolls-Royce Phantom III de 1937, ligado a histórias interessantes ocorridas em Portugal. Entre 1936 a 1939, foram produzidas cerca de 710 unidades deste modelo, aliás o último Rolls-Royce de luxo a ser fabricado antes da II Guerra.

Este carro esteve ao serviço da Presidência da República e nessas funções, transportou algumas figuras de Estado que visitaram o nosso país.

O General Craveiro Lopes era o Presidente da República quando se foi decidido adquirir um Rolls-Royce descapotável, tendo em vista a receção à Rainha Isabel II na visita a Portugal em fevereiro de 1957.

Harry Rugeroni foi enviado a Inglaterra com esse propósito, mas não conseguiu comprar o modelo desejado, em estado novo. Decidiu-se, assim, por um usado, aproveitar o Rolls-Royce, do Príncipe de Berar, que veio para Londres em 1950, e expurgado das suas fantasias de nobre indiano. O carro recebeu a matrícula DD-30-92, ficou ao serviço da Presidência da República.

O Papa Paulo VI tinha comunicado ao governo português que não desejava usar um Rolls-Royce, pelo facto de ser um carro muito ostensivo.

Apesar da consciência que o Rolls-Royce não se enquadrava nas pretensões do Papa, os portugueses recorreram ao proverbial engenho e criatividade. O Estado Português não queria desiludir Sua Santidade. Por isso, foi decidido descaracterizar o automóvel, procedendo-se à substituição do seu símbolo (Rolls Royce) pela bandeira do Vaticano. A grelha foi pintada de negro, nomeadamente o logótipo.

O Papa viajou no Rolls-Royce todo o tempo, sem que tivesse percebido que se encontrava num carro de luxo. 

 

 

 

 

 

 

A PROPÓSITO DE UMA BONECA

 

FLeming de OLiveira

 

A minha neta mais nova é muito menineira, o que a família regista e aprecia, sem condescender com modernismos, no respeitante a género.

Quando este ano fez sete anos, disse à Avó que gostava muito de ter uma boneca, do género daquela com que gosta de brincar quando vem a Alcobaça. Trata-se de uma idosa boneca de porcelana, que existe em minha casa estimada com desvelo, e já vem dos tempos da minha Sogra.

Mas onde adquirir uma boneca destas, hoje em dia?

-Temos de fazer o gosto à nossa menina.

-Mas como?

-Ir ao estrangeiro, encomendar pela internet?

Foi então que nos lembramos da Feira da Ladra. Boa ideia da minha Mulher, a Ana Maria, que tem um fraquinho pelos netos.

Há muitos anos, provavelmente desde o tempo em que fiz a tropa e a Messe de Oficiais era em Santa Clara, nunca mais tinha passado por lá. Está muito diferente, não faltam chinesices e outras coisas sem gracinha alguma. Mas o certo é que sem dificuldade especial encontramos uma boneca mais ou menos conforme o pretendido, com um fantástico vestido cor-de-rosa e tranças. A boneca não seria propriamente de porcelana, mas de resina. Seja como for, a minha Neta quando a viu, não mais a largou, dando gritinhos de satisfação, perante o gáudio de alguns turistas, entre os quais um casal de espanhóis que acabou por fazer também uma compra. O preço foi além do que tínhamos pensado (já não existem pechinchas…), mas gostos são gostos e a uma neta menineira há coisas irrecusáveis, que nãio de discutem, pelo que saímos reconfortados, pese embora mais aliviados da carteira.

Cumpre dizer que a Sofia (a Neta em questão) gostou tanto de lá ir, que nos obrigou a voltar mal entre em férias, para comprar umas sandálias para a boneca, que fique bem entendida esta ressalva, pois não é pirosa.

Os meus leitores sabem onde é, e o que é a Feira da Ladra e apesar de descaracterizada, não desaconselho de todo uma vista para adquirir velharias, colecionismo, antiguidades e artesanato, algo original, kitsch ou vintage ou só mesmo passear.

Embora não exista consenso sobre a origem do nome, a tese mais reconhecida/usual é que  Ladra decorre de aí se venderem objetos roubados. Alguns autores defendem que a feira em tempos remotos, terá tido lugar na Ribeira Velha junto ao Tejo, e que por isso Ladra poderia ter origem no português antigo, lada, que significa margem do rio.

Nos tempos que correm tem a particularidade de, a par dos feirantes habituais ou profissionais, ser local procurado por alguns jovens para venderem o que já não usam ou velharias da família e, assim, conseguirem alguns cobres.

Foi consultar um amigo que trabalha na Câmara de Lisboa e me forneceu alguns dados históricos, que compartilho.

Feira da Ladra teve início no Chão da Feira, ao Castelo, provavelmente nos finais do século XIII, tendo depois passado para o Rossio. Em meados do século XVI, surgiu a primeira notícia da sua realização no Rossio, e em 1610  a designação Feira da Ladra numa postura municipal. Depois do Terremoto  instalou-se na Cotovia de Baixo (atual Praça da Alegria), estendendo-se pela Rua Ocidental do Passeio Público. Em 1823 transferida para o Campo de Santana onde esteve cinco meses, voltou para a Praça da Alegria e em 1835  para o Campo de Santana, onde se conservou até 1882, antes de passar para o Campo de Santa Clara.

Feira da Ladra, cantada por Sérgio Godinho, acontece às terças feiras e aos Sábados das 9h às 18h no Campo de Santa Clara, atrás do Mosteiro de São Vicente de Fora.