terça-feira, 1 de junho de 2010

Uma Tarde em Verona

Há uns quarenta ou cinquenta anos, William Somerset Maugham, escritor inglês, um dos maiores romancistas deste século, entre outros grandes títulos autor de “Servidão Humana”, teve merecido sucesso em Portugal. Nos seus romances e contos, situados entre as duas guerras e em alguns lugares exóticos, ele que correu mundo e conheceu gentes, apresentou-nos magistrais descrições onde palpitavam o amor e o crime, o luxo ou a miséria, não em duros contrastes de programas revolucionários mas, naturalmente no cego embate da onda eterna, na infinita, densa e mesmo cínica maré da vida. Recordo dessa altura um belo livro, passado nas então chamadas Índias Orientais “ O Canto Estreito”, onde se descreve um tal Frith, que estudara em Cambridge e vamos encontrar por lá meio perdido, a fazer para si mesmo a tradução métrica para inglês de “Os Lusíadas”. Retomando algumas leituras que trouxe da casa dos meus Pais, como necessito de fazer de vez em quando, fui reencontrar neste regresso de férias, um saboroso livro de contos daquele autor intitulado “Histórias dos Mares dos Sul”. Para enquadrar a acção, a determinado passo Maugham defendeu benevolamente a ideia que o viajante sensato só o faz com a imaginação. Foi por isso que um antigo francês escreveu, certa vez, um livro chamado “Viagem à roda do meu quarto”, ao que se crê sem êxito, pois o seu nome não passou à história, salvo no título que estimulava a fantasia. Assim se poderia dar, facilmente e sem risco, a volta ao mundo. Parafraseando S. Maugham, eu diria que há certas tardes de inverno com nuvens baixas e pesadas, que fazem uma luz tão lúgubre que nos enche o coração de angústia. Mas, se olharmos para fora da janela, vemos logo imensos coqueiros a comprimirem-se numa ilha de coral. Estas as viagens ao pé da lareira não destroem nenhuma ilusão.







Recordo-me agora que tive um tio, tripeiro obviamente, que bebia mais brandy que porto e punha sal no café. Impossível mistura argumentávamos nós, revoltadamente, e com a ilusória segurança que nos dava ser rapazes já com buço. Mas ele não ligava e acrescentava que na sua mocidade lhe ensinaram que se deve segurar uma mulher pela cintura e uma garrafa pelo gargalo. Quanto ao sal, dava à bebida um sabor singular. Do mesmo modo, por esse mundo fora há lugares que existem cercados por uma auréola romântica, mas que acarretam a inevitável desilusão que se sente ao vê-los. Esperávamos uma coisa simplesmente bela mas recebemos uma impressão infinitamente mais complexa do que a que nos pode dar a beleza.



Neste mundo que se quer cada vez mais organizado, a fantasia é um bem com o seu espaço e relativamente apreciado. Em tempo de férias, muito especialmente, estou de acordo que ela não deve estar ausente. Todavia, partir de férias ao sabor dos desígnios da pura fantasia, como faz habitualmente um casal meu amigo e com sucesso segundo diz, parece-me ultrapassar os meus limites do razoável. A verdade é que, mesmo com projectos muito elaborados, nunca faltam os imprevistos, que salpicam com a fantasia, os itinerários mais precisos. A mudança de tempo, um museu fechado, um avião que se perde, as amizades de uma estada, um pôr-do-sol que jamais algum prospecto turístico podia imaginar ou anunciar. O lado da fantasia, nas férias lá de minha casa, nunca poderia ser levado ao extremo de não prevêr nada, no desejo infantil de obter o mais possível da surpresa, para assim melhor as rentabilisar. É que há surpresas que podem ultrapassar aquilo que um bom pai de família está disposto a aturar. Não foi o caso deste verão passado, antes pelo contrário.



Como ia dizendo, a preparação das férias em minha casa já é um tempo óptimo, de alguma fantasia diga-se, pois antes pergunta-se, informa-se e consultam-se agências de viagens. Enfim, nesta Alcobaça onde nada acontece e tudo é por demais previsível, já nos divertimos e, divertirmo-nos assim, é o entusiasmo de antemão, ao acreditar no sucesso do que ainda não se viu mas se pressente com querer. É fazer pela primeira vez a viagem sem o cansaço, sem medo das alterações do clima, sem gastar um tostão. Bem sei que em viagem nunca se vê aquilo que se desejaria, do que há para admirar. Uma escolha, quantas vezes arbitrária, obriga-nos a eliminar detalhes pitorescos ou encantadores, a fim de dedicar o tempo a outros supostamente essenciais ou que nos querem mostrar. Se a vida tivesse mil anos haveria sempre mais coisas para ver. Por isso, no tempo a empregar, gostamos lá em casa de ter uma reserva para a descoberta do que não pode ser previsto, para aquilo que surge imprevistamente. Doutro modo é um sufoco.



Foi o que aconteceu esse verão. Ah!, caros leitores, o assistir ao ensaio geral de uma ópera de Verdi, ao ar livre, na “Arena” de Verona! Como foi bom assistir a essa hora extraordinária, mas que ao invés das outras parece que não teve sessenta minutos, e entrar momentaneamente num mundo de fantasia, que não imagináramos antes! Uma pequena avaria no autocarro tinha-nos feito renunciar ao percurso previsto para essa tarde. Mas de acordo com uma informação obtida casualmente num quiosque onde se vendiam postais e outro material do género, pela boca do proprietário barrigudo e careca, soubemos do ensaio para o espectáculo da noite. Pé ante pé, “entrando à portuguesa” (*), mas sem fazer nada por isso, através de uma porta de serviço entreaberta, demo-nos a assistir a esse trabalho fantástico que pôr em cena uma ópera italiana, na cidade de Verona, a cidade do Romeu e Julieta.



Ora vejam lá...Para que nos havemos de atribular quando a vida é tão curta? “Facciamo una piccola combinazione”. Aproveitemos os seus sorrisos e fechemos os olhos quando eles se desfazem.





Nota: (*) Em Itália, os “portoghesi”, em calão, são os golpistas, os penetras, segundo vim a apurar.

-UMA CONFIDÊNCIA INÉDITA-2005

-UMA CONFIDÊNCIA INÉDITA
-SOU CIUMENTO
(2005)


Vou confessar um pequeno segredo, um mal secreto, talvez um trauma, cuja origem nunca soube identificar, que me atormenta, corrói a alma e provoca insónias.
É parecido com a inveja e a cobiça, não mete e nada tem a ver com o mulherio ou dinheiro!

É mesquinho e talvez, por isso, muito democrático, sem categoria, nem classe, como diria com snobismo um amigo meu, do Porto.
Mas sou assim.
Trata-se do ciúme, esse pecado capital, como se dizia nas aulas de catequese do antigamente e que me crie uma azia, que nem se safa com kompensan reforçado. É verdade, reconheço, que sou um irremediável ciumento que disfarço, escondo, pois não ando por aí a anunciar.
Mas quem nunca sofreu deste mal como a minha Aninhas, que me diga cara a cara ou atire um remoque.
O ciúme, creio ser um pecado muito português, o que não me conforta de sobremaneira.
Este é o meu momento de o registar pela primeira vez.
-Cobiça, é querer o que não se tem.
-Inveja, é não querer que o outro tenha.
-Ciúme, é reconhecer ser um outro superior, e saber que não se chega lá.

Embora tenha dentro de mim, este vírus desde pequenino, há muita gente incapaz de descortinar os meus sintomas.
Não espumo bolhas de ciúme, nem o faço brilhar no escuro, mas ao fim de tantos anos já não engano a Aninhas.
Tenho ciúme de quem ou de quê?
Tenho ciúme de certas cabeças bem pensantes, que reconheço serem muito sofisticadas intelectualmente e especiais, e sinto ciúme de não me poder comparar a elas.
Gostaria de ser capaz de falar como um Marcelo ou escrever como um Eça.
Dirão que não me fico por pouco.
O óptimo é inimigo do bom?
Mas como poderia ter ciúmes de não falar apenas como uma Maria ou não escrever como uma Margarida Rebelo Pinto que, mesmo assim, obtém grandes tiragens e proventos?

Já li umas coisas dela.
A única gravidade do tipo de literatura light é, apenas se mal escrita, mas quando bem escrita, pode ser uma boa indução à leitura.
De António Lobo Antunes retiro esta nota, o que me preocupa são os autores que dizem que puseram os portugueses a ler. Isso é mentira. Puseram sim os portugueses a lerem-nos a eles e isso não é ler. Mas como disse, sou assim, e abaixo disto, não me conformo.
Por isso, as minhas relações nem sempre são fáceis com pessoas que têm algumas das mesmas minhas fidelidades, as mesmas convicções políticas, religiosas ou assim.

Nunca estou totalmente de acordo com essas pessoas, que o diga a Aninhas que é a pessoa mais próxima que tenho e me conhece, mesmo que tenha para isso de inventar no momento, divergências microscópicas, defeitos, formular dúvidas, objecções ou minudências.
Qualquer confrade é um colosso.
Qualquer opositor, não passa de uma besta quadrada.
Prefiro? um comunista intelectualmente brilhante, a um democrata atrasado mental, como prefiro um preto compincha, a um branco rude e emproado. A Aninhas, tal como o Nuno FO uma vez, diz que sou um chato, com quem não se pode falar, que a enfado no meu individualismo crítico. Na verdade, abomino o colectivo, em todas as suas encarnações, especialmente a acabada soviética.

Quando era Deputado, se pudesse, antes de votar uma Lei, gostaria sempre de lhe acrescentar, pelo menos, um ponto e uma vírgula. Não sei se foi por isso que me mandaram embora, no fim da legislatura do Pinto Balsemão.
Mas também me irrita a estupidez, embora a não deva ignorar.
Não será esta uma das Sete Maravilhas do Mundo, mas faz parte deste nosso mundo.
Fazer coisas estúpidas faz parte da natureza humana, e não vale a pena fingir que a vida é só feita de inteligência e pessoas inteligentes, sensiblidade e bom senso como eu.

Decepcionado, descrente e descontente vou-me fechando em casa e no escritório, não me contentando no íntimo com o razoável, embora não consiga impugnar, de todo, a tese que o senso comum, afinal tem bem senso.
Provavelmente, tento transmitir ou acreditar em tanta racionalidade, porque sou naturalmente emotivo.
Admito, embora não goste de o reconhecer, que o coração é o meu órgão mais poderoso e influente, digam-me então, porque tive um AVC?, embora eu diga que não, que é a cabeça.
O facto de a certa altura ter percebido que o ciúme é uma doença, o facto de o ter de forma tão compulsiva e incontrolada, revela uma aberração, a que não me consigo furtar.
Falei do meu ciúme, mas parece-me que também se pode falar da minhainveja, pequena, a que como bom português não estou de todo imune, que é como aquele, um pecado capital, e que encarada em termos colectivos, tem uma carga negativa.
Não sei mesmo se, é por isso, que não arrancamos em direcção ao futuro.
O trabalhador, tem inveja do patrão, e cada vez tem menos dinheiro e mais precariedade no emprego, o patrão tem inveja do trabalhador que quando despega do trabalho, desliga das preocupações da empresa até ao dia seguinte, o aluno tem inveja do professor, e cada vez sai mais gente da escola a saber menos, o professor tem inveja do aluno que classifica, como indisciplinado ou mal criado, e cada vez há mais professores com baixas psiquiátricas.

ULTRAMAR PORTUGUÊS, GUERRA E O FIM DO MARCELISMO

Na Guiné, um Comandante Militar e Governador de monóculo e bengalim.


Marcelino da Mata, guineense, e Asdúbal Fortes, alcobacense de Montes-Alcobaça.


Gadamael, Guileje, Guidage (os 3 g’s) e Cacine


A Primavera Marcelista não deu nem flores, nem frutos.


Fala-se da Ala Liberal.


25 de Abril de 1974.



Era uma referência militar, quando o Brigadeiro do Exército, da Arma de Cavalaria, António de Spínola, desembarcou em Bissau, no dia 2 de Maio de 1968.



De monócolo e bengalim, a figura era majestosa, aparentemente arrogante. Trazia consigo um rasto de heróico comandante militar, construído em Angola.




Tinha pouco em comum com os demais chefes militares portugueses, pois participava nas operações, largado de helicóptero, fardado com camuflado, boina e pistola à cintura, dormia no chão e comia ração de combate. Ao chegar à Guiné, deparou-se com o teatro de guerra mais difícil da África Portuguesa. Lisboa esperava que resolvesse, de vez, uma situação militar, que não parava de se degradar.



Já em 1963, o Gen. Gomes de Araújo, Ministro da Defesa, admitia que a guerrilha controlava cerca de 15% do território. Logo a seguir, numa conversa mantida no Ministério do Ultramar, em Lisboa, o Gen. Louro de Sousa, Comandante-Chefe na Guiné, considerava que a guerra estava perdida.




O Brig. António de Spínola chegou à Guiné para substituir o Gen. Arnaldo Schultz, que sempre acreditou numa Guiné eternamente portuguesa. Spínola, pouco depois de assumir, cumulativamente, os cargos de Governador-Geral e Comandante-Chefe apontou, num documento remetido ao Governo, a triste realidade económica, social e militar que ali encontrou.



Rompendo com a estratégia convencional, Spínola passou a jogar ao mesmo tempo nos campos militar e político.




O objectivo estratégico era retirar à guerrilha, o tapete sobre o qual desenvolvia a actividade psico-militar. Para tal, deu início a um largo plano de obras públicas estradas, pontes e equipamentos sociais, de medidas sanitárias e de educação. Quadros da Administração Pública e do Exército, foram substituídos e o Governador fez-se rodear de jovens Oficiais do Quadro Permanente, unidos pela ideia que a guerra teria de ser ganha politicamente alguns dos quais mais tarde o traíriam….



A criação dos Congressos do Povo foi uma novidade, na procura de ganhar força como interlocutor, junto das populações. Em 1969, surgira um dado novo, quando o Presidente do Senegal, Leopold Senghor, propôs a Portugal e ao PAIGC, um plano de independência para a Guiné, no quadro de uma Comunidade Luso-Africana. A ideia não teve desenvolvimento e a situação continuou a agravar-se, tendo as tropas portuguesas sido obrigadas a retirar de Madina do Boé, onde José Bernado Nino Vieira comandava as tropas e vem a ser, em 1973, proclamada a independência unilateral da Guiné.



Confrontado com alguns desaires, Spínola pareceu disposto a jogar tudo na Operação Mar Verde, destinada a liquidar, física e politicamente, Sekou Touré, Presidente da Guiné-Conacri, capturar Amílcar Cabral, destruir os MIG da Força Aérea da República da Guiné-Conacri e a libertar os prisioneiros portugueses.




Apesar do elevado risco, Caetano deu autorização, mas a operação acabou por traduzir-se num desaire, pois nem Sekou Touré, nem Amílcar Cabral, se encontravam em Conacri nesse dia, 22 de Novembro de 1969. O único objectivo conseguido, foi a libertação dos prisioneiros portugueses. Apesar dos desmentidos na O.N.U., relativamente à participação portuguesa na operação, agravou-se o isolamento português na cena internacional e o governo de Conacri, que alinhava com a União Soviética, encontrou o pretexto para solicitar aos seus navios, a patrulha das águas territoriais.



As manobras para aliciar os guerrilheiros do P.A.I.G.C. não resultaram e, em 1971, começaram a chegar à Guiné, os mísseis terra-ar soviéticos. No ano seguinte, Spínola não hesitou em transmitir a Caetano a opinião que não ganharemos esta guerra pela força das armas.




Sendo Leopold Senghor a última esperança diplomática de Spínola, tiveram eles um encontro, em território do Senegal, perto da fronteira com a Guiné. Caetano, pressionado pelos ultras recuou, e pôs termo a novos encontros, pois entendia que é preferível perder a guerra, a negociar com terroristas. Salazar não seria mais peremptório.




Em 1971, segundo historiadores, Amílcar Cabral ainda admitia a independência num quadro de igualdade. Foi nesse ano, em que o autor destas notas foi mobilizado para a Guiné, que Amilcar Cabral se deslocou a Londres no desenvolvimento duma digressão de charme por países europeus, tendo sido recebido no Vaticano, por Paulo VI, conjuntamente com outros dirigentes independentistas da África Portuguesa. Esta recepção a Amílcar Cabral e aos outros líderes africanos, foi muitíssimo mal recebida pelo Governo Português, que nunca a compreendeu, nem aceitou. Todavia o conflito com o Vaticano não assumiu as dimensões do que se seguiu à deslocação do Papa a Bombaim.



Em Londres, o Secretário-Geral do P.A.I.G.C., concedeu uma entrevista a duas publicações de exilados portugueses, o Polémica, dirigida por José Medeiros Ferreira e o Anticolonialismo, por Pedro George. Sobre o futuro das relações, entre Portugal e a Guiné, Amílcar Cabral, disse que (…) se porventura em Portugal houvesse um regime que estivesse disposto a construir, não só o futuro e o bem-estar do povo de Portugal, mas também o nosso, nós não veríamos nenhuma necessidade de estar a fazer a luta pela independência. Mas em pé de absoluta igualdade. (…)




Isto passava-se cerca de dois anos antes da declaração da independência da Guiné, perante a incapacidade, intransigência, em negociar e iniciar um processo de autonomia progressiva. O P.A.I.G.C. proclamou a independência, depois de uma reunião da Assembleia Nacional Popular.



Entende-se hoje, que as palavras de Amílcar Cabral, homem de cultura portuguesa, não eram apenas uma manifestação de propaganda ou de finalidade táctica, para consumo internacional. Foram subscritas, mais tarde, por Luís Cabral, primeiro Presidente da Guiné-Bissau. Era, com algumas nuances, o segundo cenário acima referido por Baltasar Rebelo de Sousa e registado por seu filho.

No ano de 1971, quando o autor deste texto chegou à Guiné, podia-se dizer que havia um empate técnico, entre a força político-militar portuguesa e o P.A.I.G.C.. Cabral, tinha capacidade de manobra e idoneidade, para propôr o diálogo, como daquelas declarações parece resultar, sem esquecer a postura de Leopold Senghor.




Em Janeiro de 1973, Cabral, foi assassinado por um grupo dissidente do P.A.I.G.C., onde a PIDE não terá tido qualquer tipo de participação, como errada e oportunisticamente ainda terá sido dito. Em 24 de Setembro de 1973, a Guiné proclamou unilateralmente a independência, que foi reconhecida por dezenas de países, não apenas da esfera soviética, e isolou Portugal, que passou a encontrar-se na máxima de Salazar, orgulhosamente só. Dúvidas existem, sim, sobre o sentido das negociações promovidas em Londres, Março de 1974, com o P.A.I.G.C., e com a mediação do Foreign Office, com vista ao eventual reconhecimento da independência da Guiné, se houvesse um cessar-fogo, por parte daquele movimento. Interroga-se hoje, se estas negociações, eram mesmo a sério, ou uma manobra para ganhar tempo, até que as novas baterias de mísseis ao serviço das F.A. estivessem operacionais, ou será que os acontecimentos internos em Portugal, fizeram acelerar a tese a que Spínola não era estranho, de que no contexto existente, a Guiné já não tinha defesa? Em suma, será que, o Governo Português e Caetano, estavam bem informados?



Marcelino da Mata, guineense de etnia papel, figura lendária da guerra da Guiné, e o militar mais condecorado das F.A.portuguesas, é possuidor de várias Cruzes de Guerra. Em 1966, pela Operação Tridente na Ilha de Como-2ª classe, 1967, Operação em Farim K 3, 1969, 1971, Operação Mar Verde-Guiné Conacri-1ª classe, 1973, Operação Ametista Real-3ª classe e 1973 colectiva, 1ª classe com o BCmdsAfric, disse a José Freire Antunes, in A Guerra de África, que as Companhias Africanas, ao todo mais de 20, seriam suficientes para assegurar um referendo, a propósito do futuro da Guiné. Na verdade, nós não precisávamos do exército branco, para montar a segurança, para se fazer o referendo. Mas a única preocupação, que o Estado Português, teve na Guiné, foi desarmar o exército africano, e entregá-lo ao P.A.I.G.C., como veio a acontecer com muitos comandos africanos, depois presos, torturados ou fuzilados. Marcelino da Mata, que após o 25 de Abril conseguiu vir para Portugal, chegou a ser preso e seviciado em Maio de 1975, no quartel do Ralis, graças ao MRPP, a um tal capitão Quinhones, que lhe disse que lhe iam fazer o mesmo que aos turras na Guiné, quando não queriam falar. O comandante do Ralis, Ten.Cor. Leal de Almeida, que o conhecia dos idos da Guiné, disse-lhe também que os pretos só falavam quando eram torturados e levavam pancda, pelo que não tinha outra solução senão ordenar que lhe fizessem isso. Depois de muito insistir, Marcelino da Mata, conseguiu ser levado para a enfermaria da Prisão de Caxias, onde lhe fizeram os primeiros tratamentos. Ali esteve preso 150 dias, dos quais 90 em estado de total incomunicabilidade. Só quando foi libertado, se pode tratar adequadamente e soube que tivera fractura da coluna.



Asdrúbal Fortes Jorge, que reside em Montes-Alcobaça, e trabalha para os Serviços Municipalizados da CMA, foi mobilizado para a Guiné em Junho de 1964, com a especialidade de Fuzileiro Especial (ou Naval) e o Posto de Primeiro Grumete. Esta comissão de serviço, prolongou-se até Junho de 1966, tendo participado em operações em todo o território, algumas com os Comandos Africanos, onde pontificava o Furriel Marcelino da Mata.
Com Marcelino da Mata falou muitas vezes, pois falava bem português, e trocou opiniões operacionais.




A ideia que formou sobre Marcelino da Mata, é que ele se considerava um português como nós, além de ser extremamente conhecedor da arte da guerra. Nessa comissão, Asdrúbal Fortes sofreu ferimentos num ombro, não muito graves é verdade, visto a operação em que participava com outros destacamentos de fuzileiros, na região de Cacine, junto à fronteira sul com a Guiné-Conacri, ter sido atacada por engano por um avião português, com rockets e metralhadora. Desse ataque, resultaram 4 mortos e cerca de 40 feridos, todos fuzileiros portugueses.



Regressado a Portugal em Junho de 1966, no termo da sua comissão normal de serviço obrigatrório, fez contrato com o Estado para passar ao Quadro Permanente dos Fuzileiros. Foi promovido a Marinheiro e tendo voltado à Guiné, em Abril de 1967, fez inúmeras operações, por vezes lançado de helicóptero, rumo ao objectivo. Nessa segunda comissão, encontrou-se com Marcelino da Mata, na zona de Cacheu e Binta, em operações de golpes de mão. Em 23 de Dezembro de 1968, aliás dia do seu aniversário, no decurso de uma operação no norte da Guiné, pela qual também recebeu um louvor, foi ferido com gravidade por estilhaços de bazuca, depois da metralhadora se ter encravado, o que determinou a sua imediata evacuação para o Hospital de Bissau, aonde foi operado por três vezes aos intestinos, e depois para Portugal, para o Hospital da Marinha, no qual esteve internado durante cerca de dois anos. Dado como incapaz para o serviço militar, pela Junta de Saúde Naval, passou à reforma da qual recebe uma pequena pensão. Não obstante, não repudia, a divisa da Armada A Pátria honrai que a Pátria vos contempla.



Asdrúbal Fortes foi militar condecorado e louvado por várias vezes. Sabe o que é combater com metralhadoras MG, lança granadas de foguete Instalaza, de fabrico espanhol e, naturalmente, com G3, viver e morrer no mato e nos rios (como aconteceu com amigos e companheiros). Por vezes, ainda sonha e sofre com momentos difíceis e de insegurança porque passou. Confrontou-se com guerrilheiros a fazer fogo com obus de 105mm, morteiros de 82mm, foguetes de RPG7, a disparar com uma costureirinha/calibre7.62, ou outro armamento, que nada tinha de comum com o que foi utilizado pelos guerrilheiros no início da luta armada (armas caçadeiras, gentílicas, pistolas metralhadoras, granadas de mão ou engenhos explosivos rudimentares). A partir de 1966, os fuzileiros, como os militares do exército, tinham pela frente um P.A.I.G.C. com canhões sem recuo, morteiros e foguetes de 120mm. Sabia quanto os portugueses estavam dependentes das vias fluviais, num território pejado por muitos rios navegáveis e sujeitos a marés de grande amplitude, e da incidência na vida de muitos homens, o abastecimento em géneros e material de guerra. As lanchas e os fuzileiros eram o grande suporte logístico.Asdrúbal Fortes, recebeu a Medalha de Cobre, pelo salvamento de um camarada que caira à àgua e estava a ser arrastado pela corrente. Foi condecorado com a Medalha de Mérito Militar de 4ª Classe e, antes de ser ferido e evacuado para a Metrópole. Possui uma Medalha de Cruz de Guerra de 2ª Classe.



No referente, a louvores recebeu alguns colectivos, com o seu Destacamento de Fuzileiros Especiais nº 10, e individuais. Entre os louvores que recebeu, gosta de destacar o de 3 de Junho de 1968, atribuído pelo Comandante de Defesa Marítima da Guiné, Comodoro Aníbal Almeida Graça e publicado na O.A.-11ª Série, nº 48/7-8-968: Louvo o Marinheiro FZE nº 10106-Asdrúbal Fortes Jorge, do Destacamento nº 10 de Fuzileiros Especiais, por ao longo do tempo que em prestou serviço nesta unidade, ter revelado possuir, em acção de combate, excepcionais qualidades de coragem, dezembaraço, sangue-frio e desprezo pelo perigo. Tendo feito grande número de operações da Unidade, seguindo no primeiro lugar da coluna, demonstrou sempre ter elevado senso táctico, valentia e decisão debaixo de fogo. Nomeadamente numa operação realizada no IADOR, ao aperceber-se à distância dum grupo inimigo que preparava uma emboscada ao seu grupo de assalto, arrastou consigo a sua esquadra e a Esquadra da Metralhadora. Fixando o inimigo, causando-lhe um ferido e obrigando-o a debandar, só não conseguindo uma completa aniquilação, pelo facto de se terem esgotado as munições, ao mesmo tempo que as da metralhadora que o acompanhava. Digno de ocupar postos de maiores riscos, abnegado, leal, cumpridor e com espírito de sacrifício, considero o Marinheiro FZE 10106 um militar de muito mérito.



Regressemos a Marcelino da Mata, que ao chegar refugiado a Portugal, depois do 25 de Abril, trazia o corpo cheio de condecorações (que aliás Asdrúbal Fortes viu quando uma vez se encontrou com ele na Associação de Deficientes da Forças Armadas), com estilhaços e em risco de ficar apátrida.




Não foi seguramente um caso único.




Muitos militares, naturais dos antigos territórios ultramarinos, que vieram para Portugal após a Revolução, tiveram que requerer a nacionalidade portuguesa. A alguns foi negada, por muito difícil de entender que assim fosse para quem tantos combates travou em nome da Bandeira das Quinas e medalhas recebera.



Fernando Gomes da Silva, de Santarém, que foi Sargento-comando na Guiné, e com ele privou de perto, recordou numa conversa em sua casa, que quando se deu o 25 de Abril, Marcelino da Mata encontrava-se a preparar junto da fronteira com a Guiné-Conacri, um golpe de mão. Informado por um oficial português que, a guerra não iria muito provavelmente continuar, só se convenceu quando ouviu o noticiário, pela emissora oficial do território, a única que existia e era permitido ouvir. Era o fim de uma guerra, que Marcelino da Mata assumiu integralmente, como muitos portugueses da Metrópole, que considerava justa e em nome de um país que acreditava como seu. Marcelino da Mata foi um caso especial, pela astúcia e energia invulgares que revelava. Comandava grupos especiais, os Comandos Africanos, a quem dava instrução meticulosa, para poder operar em todo o território. Falando sete dialectos e bem o português, isso permitia-lhe fazer-se passar, por amigo da guerrilha, entrar nos seus acampamentos, estudar o terreno e desaparecer. Asdrúbal Fortes, pode confirmar estes predicados, pois participou ao lado de Marcelino da Mata em operações, nomeadamente as que incluíam Acção Psicológica. Nestas, quando os Portugueses entravam nas tabancas, reunia-se a população e Marcelino da Mata era capaz de identificar o pessoal afecto ao P.A.I.G.C.. o que Asdrúbal Fortes, nunca percebeu como era possível. Também, não era reconhecido como sendo o célebre Marcelino, ao serviço dos portugueses.
Após o 25 de Abril, teve problemas em Portugal, mas como contou a Fernando Gomes da Silva, aquilo que o feriu, mais que as sevícias, foi ter perdido duas pátrias, aquela para quem trabalhava e a que poderia ter sido sua.



O Comandante Guilherme Alpoim Calvão foi uma das personalidades mais reputadas dos Fuzileiros Navais, nas águas da Guiné, onde veio a ser o Comandante do Centro de Operações Especiais. Ousado, segundo Asdrúbal Fortes que serviu sob o seu comando, terá sido quem propôs a Spínola a Operação Mar Verde. De acordo com o Comandante Alpoim Calvão, a manobra de Conacri correu mal, por falhas de informação que competiam a PIDE. Asdrúbal Fortes não tem opinião formada sobre o assunto, pois não participou na operação, evacuado que se encontrava, como se referiu. Anos mais tarde, convidado para o integrar o M.F.A., Alpoim Galvão, recusou pois, segundo terá argumentado, outra guerra o esperava, o período quente do PREC.



Depois do 25 de Novembro, uma Junta Hospitalar de Inspecção, considerou Marcelino da Mata diminuído físico e qualificou-o como deficiente das F.A., ao abrigo do DL 43/76, e na situação de reforma extraordinária. Em 10 de Dezembro de 1980, por despacho do C.E.M.E. e decisão do Conselho da Revolução, foi confirmado o seu processo pendente desde 1973, da sua promoção a Alferes do S.G.E., com antiguidade reportada a 1 de Agosto de 1973. Por decisão do Conselho da Revolução veio a ser promovido a Tenente do S.G.E., com antiguidade reportada a 2 de Agosto de 1974, e a Capitão do S.G.E., com antiguidade reportada a 2 de Agosto de 1977. Em 1995, Marcelino da Mata foi graduado em Tenente-Coronel, na situação de reforma extraordinária. Actualmente reside entre Portugal e Bissau.



Pode o autor destas notas dizer, que não foi infeliz na sua passagem pela Guiné, embora tenha estado, antes de ter sido colocado no C.T.I.G.-Bissau, em locais operacionalmente críticos. Não esteve no C.O.M., em Mafra, como engajado voluntário, nem se assumiu como opositor à guerra embora, por variadíssimas vezes, se tivesse interrogado sobre o sentido e objectivos da presença militar, em África, muito especialmente quando saía de noite a comandar um ou dois pelotões de africanos, cuja língua não entendia, no meio de chuva, a tropeçar ou cair na lama, com o risco de perder a G3, apenas com os relâmpagos da trovoada a iluminar o trilho, ou mosquitos, a tentarem come-lo vivo.




Para o bem e para o mal, embora estudante universitário, e tendo vivido a crise académica de 1969, sem ter alinhado com o boicote aos exames, não tinha grande motivação, nem militância políticas, pelo que contrariado achava natural, como os demais rapazes da sua geração, embora pai de duas filhas, ser chamado a cumprir serviço militar no Ultramar, mesmo depois de ter exercido funções de Magistrado do M.P. A militância política que desenvolveu com o PPD/PSD, veio só a partir do verão de 1974. Em casa de seus Pais, no Porto, pouco se falava de política. Em Alcobaça não era propriamente matéria que abordasse com o Dr. Amílcar Magalhães, salvo quando era necessário que movesse alguma influência paraminorar, à Filha, o incómodo da Guiné. A experiência na Guiné, foi importante para decidir a filiação no PPD/PSD, ainda em 1974.



Encontrava-se o autor destas notas na Guiné, quando em 1973 foi declarada a independência, em Madina do Boé. Foi na Guiné que lhe chegavam, as notícias sobre as votações contra Portugal na ONU, os termos da reeleição de Américo Tomás e as últimas eleições marcelistas para a A.N.. Também se sobressaltou, com as notícias sobre o golpe falhado das Caldas da Rainha, em Março de 1974, seguiu com expectativa as nomeações de Costa Gomes Chefe e Spínola Vice-Chefe, para o E.M.G.F.A.. Foi ainda na Guiné que, em serviço no Q.G. do CTIG, conheceu oficiais do quadro permanente, como Almeida Bruno, Otelo Saraiva de Carvalho, que no dizer de Marcelino da Mata nunca participou num combate a sério, Duran Clemente, Salgueiro Maia e despachou propostas de condecorações, louvores e processos disciplinares com Firmino Miguel.



Além de outros locais, o autor destas notas esteve em Gadamael (porto), durante de três meses, Guileje algumas vezes, e Guidaje. Em Maio de 1973, o aquartelamento de Guileje estava isolado, sem comunicações, água, mantimentos ou artilharia, que lhe chegavam via terrestre a partir de Gadamael, pelo que quando o P.A.I.G.C. atacou com força, segundo referiu o (então) alferes miliciano médico Dr. Santos Silva, actualmente a exercer clínica na Covilhã. O aquartelamento que era um praça forte de cimento armado, foi abandonado por iniciativa do major. Em consequência, este oficial veio a ser preso, e o pessoal recolheu a Gadamael (porto). Esta posição militar, não obstante o Coronel Durão(cujo mandato era recuperar Guileje), ter sido nomeado para o comando da Região Sul, também veio em breve a ser abandonada, pois a guarnição tinha a moral em baixo, por falta de alimentos, dormida e armamento. Dali houve 4 fugas para Cacine, o que foi caso raríssimo, entre as quais a de um alferes miliciano. Essas fugas, eram passíveis de fuzilamento de acordo com a lei militar, o que nunca acontecera desde a frente da Flandres, na I Guerra, caso não houvesse regresso dos militares. Essa ameaça foi proferida por um exaltado Tenente Coronel, com as tropas de Gadamael em parada, enquanto Spínola se havia dirigido a Cacine e intimava o pessoal a regressar. Este dramático e pouco conhecido acontecimento foi-nos contado, de forma algo emocionada, pelo antigo cabo miliciano Ferreira Guedes, actualmente a residir e trabalhar como empresário em Palmela e natural dos Pousos-Leiria.



Como escreveu, o guineense Leopoldo Amado, os G’s-Guiledje, Gadamael e Guidadje, na Guiné- se não foram determinantes para a agonia do sistema colonial, pelo menos, catalizaram a interiorização da ideia de que afinal, o Império (Português), tinha pés de barro.



A vida internacional na década de 60, teve papel determinante no regime e na vida do País, pois verifiou-se a progressiva descolonização e independência dos povos africanos (colónias inglesas e francesas), a guerrilha generalizou-se a Angola, Guiné, 1963, e Moçambique, 1964, dá-se o isolamento externo do governo, expande-se o movimento internacional contra a guerra do Vietname, estala a guerrilha guevarista na América Latina, ocorre a revolução maoista, o Maio Francês, o esmagamento da Primavera de Praga, a revolução dos costumes e práticas sociais, aonde se insere o começo do consumo fácil de drogas. E muitas outras coisas.




O salazarismo, após ter aniquilado os anarquistas até fins dos anos trinta, estimulou o PC na luta clandestina A oposição democrata, republicana e reviralhista ensaiara medidas quase exclusivamente no campo legal, não tendo feeling para adoptar meios como os comunistas que tiveram necessidade de criar um aparelho clandestino tanto capaz da responder às investidas policiais, como os frutos de uma cisão interna, chamada o Grupelho Provocatório. Foi essa carapaça que permitiu ao PC aguentar-se até ao 25 de Abril e sair imediatamente para a rua.



Cremos não ser errado dizer que a Ala Liberal se pode incluir no grupo dos que dignamente se opuzeram ao regime. Vejamos o caso de Joaquim Magalhães Mota, sócio fundador da SEDES-Associação Para o Desenvolvimento Económico e Social, presidente do respectivo Conselho Coordenador, período durante o qual foi publicado o trabalho O País Que Somos, O País Que Queremos Ser (sobre a eleição presidencial). Como deputado à A.N. (1969-1973), fez numerosas intervenções parlamentares, destacando-se a discussão da Lei de Meios, para 1972-1973, a Lei do Cinema ou a Lei do Fomento Industrial. Foi um dos signatários do Projecto de Revisão Constitucional nº6/X. Na sua última intervenção na Assembleia Nacional, em que anunciou não se recandidatar, denunciou a utilização de fundos reservados, pelo Ministério do Interior e a acção de obstrução da maioria na Assembleia Nacional. Em Maio de 1974, fundou o PPD com Sá Carneiro e Pinto Balsemão e tomou posse do cargo de Ministro da Administração Interna, no I Governo, presidido pelo Prof. Palma Carlos. Exerceu as funções de Ministro Sem Pasta, nos governos provisórios de Vasco Gonçalves (II, III e IV), entre 17 de Julho de 1974 e Agosto de 1975. Em 19 de Setembro de 1975, assumiu as funções de Ministro do Comércio Interno (VI governo provisório). No VI Congresso do PSD, em Leiria, assumiu as de Secretário-Geral, que exerceu até ao Congreeso do Porto, em Janeiro de 1978. Durante 1978, foi Presidente do Grupo Parlamentar do PSD. Em 1979, desvincula-se do PSD, para integrar a ASDI.




Dos três fundadores do PPD, Magalhães Mota terá sido o mais discreto, Sá Carneiro foi Primeiro Ministro, Balsemão também Primeiro Ministro, fundador do semanário Expresso mas, como referiu Miguel Veiga, histórico militante do PSD, ser menos evidente não quer dizer que tivesse sido menos útil. Depois do 25 de Abril, os elementos da Ala Liberal exibiram as credenciais democráticas. O seu fracasso com Caetano, veio a converter-se em sucesso em Democracia.



Voltemos atrás, como que rebobinando uma película.




Com a Guerra Fria, o republicanismo português assumiu-se como movimento atlantista, pró-NATO, pró-americano, anticomunista e adepto de uma transição pacífica para a democracia, através de diálogo com sectores mais evoluídos do regime ou de um golpe palaciano, acertado com militares, de modo a prevenir que o poder caísse na rua.




É com algumas reservas, que o republicanismo do MUD concorre nas eleições de 1949 para a Presidência da República com o Gen. Norton de Matos, em divergência táctica com a oposição polarizada pelo PC, presente no MUNAF. É a primeira vez que oposição concorreu a eleições presidenciais no quadro da Constituição de 1933. Esta campanha apesar do relativo entusiasmo que chegou a gerar, revelou dissensões na candidatura, na opção de se apresentar nas urnas, como defendiam o candidato e os republicanos.




A reacção repressiva do regime e o reflexo da desistência da ida a votos por não existirem condições de democraticidade, conjugados com o clima de crispação internacional, criaram condições para a primeira ruptura na unidade antifascista, demarcando-se a oposição republicana na sua postura democrática, atlantista e anticomunista, do PC e seus aliados. A partir daqui, Norton de Matos aproximou-se do seu sector mais moderado e conservador e interveio na campanha para a eleição da Assembleia Nacional, de 1953, ao lado da oposição de Aveiro.




Com o eclodir com a Guerra de África, muitos republicanos conservadores, mantiveram-se na linha ideológica da República, nos princípios demo-liberais, na recusa de aceitação da autodeterminação ou direito à independência dos povos colonizados, chegando mesmo a prestar algum apoio ao regime na política ultramarina, no seu esforço de guerra. Daqui em diante, releva o ocaso físico e ideológico-político da oposição republicana tradicional.




Em 1961, foi apresentado publicamente o Programa Para a Democratização da República, com a participação importante de Mário Soares, que fez uma primeira tentativa de sistematização de um programa republicano.



Em Portugal, o Estado Novo, não foi apenas um drama político-social, como por vezes se pretende fazer crer, nem a oposição, corporizada no PC, a correcta expressão de abnegação e seriedade na defesa de ideiais ou objectivos progressistas e/ou democráticos, como algumas memórias gostariam, encomiasticamente, de transmitir. Vejam-se as memórias de Pavel, Chico da CUF, Cândida Ventura, Raimundo Narciso e claro Álvaro Cunhal. Sugerimos ainda J. Silva Marques e mais recentemente, Zita Seabra. Estamos de acordo, quando esta escreveu que ninguém diga que ignorava, os comunistas portugueses sempre souberam de tudo. Ou seja, feitas as contas e assente alguma poeira, a U.R.S.S., não era um Grande Sol, e o heroísmo dos comunistas portugueses, era por vezes o possivel e à portuguesa!!!

ÚLTIMOS DIAS DO ESTADO PORTUGUÊS DA ÍNDIA E SUAS SEQUELAS - A IINVASÃO E OCUPAÇÃO DE GOA PELA UNIÃO INDIANA (1961)

A INVASÃO E OCUPAÇÃO DE GOA PELA UNIÃO INDIANA (1961).


ALGUMAS SEQUELAS (Gen. Vassalo e Silva).


MÁRIO SOARES, COSTA GOMES E OS HOMENS QUE NÃO MORRERAM CALÇADOS


ENGRÁCIA ANTUNES E CARLOS AZEREDO


JOAQUIM GUILHERME RAMOS (depoimento)





O Dec.Lei. n.° 727/74, de 19 de Dezembro, veio em parte resolver situações pendentes:


Os acontecimentos ocorridos em 1961 no Estado Português da Índia só agora puderam ser apreciados com realismo e a prudêcia, com vista à reparação das injustiças cometidas pelo Governo, relativamente ao pessoal militar que ali servia. As vicissitudes que rodearam a aplicação das penas disciplinares aos elementos das Forças Armadas tão injustamente responsabilizadas pelo descalabro da situação política e militar daquele Estado, em especial a falta de audiência prévia dos arguidos e a disparidade de decisões ulteriores que vieram a ser tomadas obrigam moralmente a Administração a tomar uma atitude que enfim ponha termo a este delicado problema. Na impossibilidade, em termos de oportunidade prática, de, à distância de tantos anos, se fazer uma investigação segura e detalhada de todas as circunstâncias que rodearam os mesmos acontecimentos, optou-se pela anulação das sanções disciplinares impostas , bem como dos seus efeitos legais em relação a todos os militares. Por último, foram realçadas as qualidades de aprumo e de honorabilidade do general Manuel António Vassalo e Silva, o último Governador-Geral do Estado Português da Índia.




Usando da faculdade conferida pelo n.° l do artigo 1.° da Lei n.° 4/74, de 1 de Julho, o Conselho dos Chefes dos Estados-Maiores das Forças Armadas decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:




ARTIGO 1.º)-São anuladas as penas impostas (…)




ARTIGO 2.º)-A anulação referida no artigo anterior é oficiosa e produzirá os seguintes efeitos:




1.°)-(…)




2.°)-Reintegração dos militares no activo, na reserva ou na reforma(…)




3.°)-Os militares reocuparão os seus lugares nas escalas de antiguidades, sem prejuízo da possibilidade de se exigir a realização dos cursos de promoção aos que forem reintegrados na situação do activo.




ARTIGO 3.º)-(…)




ARTIGO 4.º)-(…)




ARTIGO 5.º)-As medidas previstas nos artigos anteriores são extensíveis aos militares já falecidos (…)



Em 1961, na iminência da ocupação dos territórios pela União Indiana, o gerente do Banco Nacional Ultramarino, em Goa, trouxe para Lisboa, as jóiasdo território. Abriu-se a partir daí o contencioso dos chamados Gold Ornament, que só veio a ser resolvido em 4 de Junho de 1992, por decreto sobre a Restituição de Objectos e Valores, assinado por Mário Soares, após a sua visita à Índia, na qualidade de Presidente da República. De então para cá, as relações entre Portugal e a Índia têm-se desenvolvido cordialmente, particularmente nos domínios do comércio, turismo, cultura, ciência, tecnologia e investimentos.



A ocupação dos territórios da Índia Portuguesa em 1961, que não demorou os oito dias que só por milagre Vassalo e Silva previa perante Salazar, ser a duração da resistência, foi altamente marcante na vida político-social, e a sua avaliação nunca deixou de ser controversa. O Dr. Joaquim Guilherme Ramos, de Alcanena, é parente, por via da Esposa, do Gen. Vassalo e Silva e dispôs-se, passados tantos anos sobre estes acontecimentos, a prestar um depoimento pessoal, que passamos a transcrever:




O Gen. Vassalo e Silva, último Governador do Estado da Índia, granjeou a admiração, a estima e a gratidão da população daqueles territórios, pelo impulso que tinha dado ao desenvolvimento económico, pela atenção prestada aos problemas das populações e pelo esforço posto na melhoria das suas condições de vida. Sobretudo a partir de 1954, os prenúncios da invasão por parte da União Indiana tornavam-se cada vez mais ameaçadores e, apesar da relutância do Governo Português em acreditar que a agressão militar se efectivasse, dado o apregoado pacifismo de Nehru, Vassalo e Silva aceitou em Dezembro de 1958 a nomeação para aquele cargo, demonstrando grande coragem e sentido de dever. Tempos antes da invasão Costa Gomes, então Subsecretário de Estado do Exército, determinara a retirada dos territórios portugueses da Índia de todo o material militar no pressuposto de que, a acontecer a agressão por parte da União Indiana, de nada valeria a resistência militar portuguesa frente ao poderio inimigo. Assim sendo era preferível a retirada para outros territórios de rodo o equipamento e foi assim que se fez, restando em Goa uma reduzida guarnição de 3.000 homens, sem armamento. Costa Gomes condenava Vassalo e Silva a não poder cumprir a promessa que havia feito na tomada de posse: Luteramos com todas as forças de que dispomos. Tudo podemos perder, menos a honra. Em 18 de Dezembro de 1961, as forças armadas indianas iniciavam o ataque por todas as frentes, ar, terra e mar. A única bateria anti-aérea que ficara não tinha munições e era bem o símbolo dramático da total incapacidade de defesa da nossa presença.

.Lisboa, fora informada, não directamente pelo Gen. Vassalo e Silva da absoluta falta de meios, em equipamentos, armamentos, viaturas, transmissões, munições. Estes meios terão sido negados, com o argumento que em Goa não haveria guerra. Assim, Vassalo e Silva apenas pode ordenar a destruição (felizmente não de uma cidadeplena de igrejas e memórias relevantes da presença portuguesa, algumas consideradas pela UNESCO como Património da Humanidade) de vias de comunicação, pontes e tudo o que pudesse retardar o avanço inimigo em Bicholim, Mapuçá, Ordofondo, Sinquervale (aqui o Major de Cavalaria Manuel Engrácia Antunes, combateu activamente tropas indianas e recebeu uma Cruz de Guerra). A rendição ao fim de três dias, pois os indianos não avançaram a pé-coxinho, como comentou Carlos Azeredo, de resistência às forças inimigas, cumpria o dever de salvar, em situação dramática, as vida das populações e dos homens às suas ordens. E ao contrário do que vocifravam muitos heróicos combatentes acantonados em gabinetes e cafés de Lisboa, a Honra estava cumprida !




Segundo o Dr. Joaquim Guilherme Ramos, que para estas notas conversou com descendentes directos do Gen. Vassalo e Silva, e consultou documentação, na imprensa internacional apareceram fotos e descrições das manifestações de gratidão na despedida afectuosa da população de Goa a Vassalo e Silva. A censura não permitiu a sua divulgação em Portugal. Os enganos políticos de Lisboa, (perante um Nehru que se afirmava pacifista, o único meio de dissuasão que parecia restar ao governo português era afirmar a intenção de uma defesa radical, até ao último homem, que permitisse pela duração e número de baixas, abalar o prestígio do governo da União Indiana) cometidos no território do Estado da Índia, incómodos para o orgulho português, julgaram encontrar lenitivo no completo abandono à sua sorte de militares de portugueses aprisionados em campos de concentração na Índia e depois na demissão de Vassalo e Silva, do Exército. A outros comandos militares, noutros territórios portugueses, começou a minar o receio deletério que o futuro lhe reservasse a mesma sorte que a Vassalo e Silva.
O Dr. Joaquim Ramos que não quer ser apontado de parcialidade, acrescentou que poucos dias depois do 25 de Abril encontrei-o à entrada da Cova da Moura (Vassalo e Silva, nasceu em Torres Novas a 8 de Janeiro de 1899 e faleceu a 11 de Agosto de 1985 no Hospital Militar da Estrela) e perguntei-lhe se vinha ali na expectativa de ser reintegrado nas Forças Armadas. Sorriu e confidenciou-me não pensar que Costa Gomes estivesse esquecido das responsabilidades que lhe cabiam na questão da perda dos territórios da Índia. A reintegração deu-se, mas como que às escondidas e envergonhada!. Vassalo e Silva sofreu como ninguém o desgosto da perda de Goa, Damão e Diu. A amargura que lhe deixara a vivência desses trágicos acontecimentos dominou-a pela consciência de ter compreendido correctamente as situações e assumido as soluções possíveis. Cumprira o seu dever e isso bastava-lhe (…). Dez anos passados, em momento difícil da vida de alguns familiares em que me incluía, contou-me que tempos antes de partir para Goa tivera um sonho. Estava no meio de um estrada larga, paralisado. Nada conseguia mexer, cabeça, perna ou braço. E viu que vinha na sua direcção um cilindro. Quis desviar-se, mas em vão e foi cilindrado! Mas logo a seguir mexeu-se, levantou-se e viu que estava vivo. O que me estava a contar era a lição da sua vida (…).



O Gen. Carlos Azeredo, foi uma testemunha priveligiada dos momentos finais da presença portuguesa em Goa, pois era o Oficial de Ligação junto do Governador e Comandante Militar, tendo prestado também o seu depoimento no jornal O Público, de 20 de Março de 2002, em resposta ao diplomata Mário Matos e Lemos.

TERMO DA II GUERRA NO PACÍFICO-BOMBA A

TERMO DA II GUERRA NO PACÍFICO
A BOMBA A SOBRE O JAPÃO
O MUNDO CONTINUA PLENO DE INCERTEZAS (O TERRORISMO INTERNACIONAL)
(2005)


Decorreram sessenta anos sobre o termo da última Guerra, na Europa e no Pacífico.
Creio que nenhum momento da nossa era, marcou tanto o mundo.
Daí, o seu permanente fascínio, a perene fonte inesgotável de ensinamentos e invocações, com interesse e actualidade.

Neste Agosto de 2005, decorreram sessenta anos sobre o lançamento das bombas sobre Hiroxima e Nagasaki, depois da rendição da Alemanha nazi, enquanto que os japoneses continuavam a lutar no Pacífico.
Muito se escreveu e disse sobre este acontecimento, que continua envolto em secretismo e controvérsia.
Segundo reza a história, o Presidente Roosevelt, no início da guerra tinha-se inicialmente oposto ao bombardeamento de centros populacionais civis alemães, pois o bombardeamento implacável de civis através do ar, tem chocado a consciência da humanidade.



Todavia, o esforço da guerra deu lugar, em breve, a uma dura e inelutável realidade, o bombardeamento de populações civis por um lado ou outro dos beligerantes, tornou-se prática comum.
Destaquem-se os casos de Tóquio ou Dresden.
Os ataques, que em determinada altura mereceram a oposição de Roosevelt, passaram a ser considerados como uma opção estratégica para por fim rapidamente ao conflito.
A história é feita de decisões para harmonizar o presente, mas com consequências imprevisíveis para o futuro.
Em Setembro de 1944, Roosevelt e Churchill tinham chegado a acordo quanto à necessidade de bombardear o Japão, eventualmente com a Bomba A. Falecido Roosevelt, o seu sucessor H. Truman, parece não ter partilhado das suas dúvidas, e declarou após saber do êxito do lançamento das duas bombas que este é o acontecimento mais notável da História. Gastamos dois mil milhões de dólares na maior aposta científica da História e ganhamos!

Numa perspectiva bem diferente, o físico J. Robert Oppenheimer depois de saber os efeitos de um ensaio nuclear no Novo México, Los Álamos, em 16.06.1945, havia prevenindo aquilo que ele e outros já sabiam, reconhecendo o perigo, mas encontrando uma grande esperança, sabíamos que o mundo não voltaria a ser o mesmo.
Numa guerra em que os japoneses estavam de corpo e alma fanaticamente envolvidos, pareceu durante algum tempo que esta era a única forma de obter a sua rendição, doutro modo era tida por impossível, acabar com a guerra à custa de menor perda de vidas dos boys.
Mas passados estes anos todos, as coisas revelam-se um pouco diversas do que pareciam ser de início.
A grande esperança do uso das armas nucleares é algo difícil de conceber, ainda hoje.
As bombas foram mesmo necessárias contra o Japão?



Revelações posteriores demonstraram que nos dois meses anteriores ao lançamento das bombas, o Japão já negociava ou queria negociar um tratado de paz com os americanos.

A Guerra Fria ainda não começara, mas já se vislumbrava, e a URSS já ensombrava as perspectivas de paz do pós-guerra. A URSS acabava de entrar em guerra com o Japão e preparava-se para exigir um controlo parcial deste, como fizera com a Alemanha, o que repugnava aos ingleses e americanos.
A Bomba além de actuar directamente sobre o Japão, era uma mensagem clara à URSS sobre o poderio americano.
A 14 de Agosto de 1945, o Imperador tinha aceite as condições dos Aliados e, entre lágrimas, declarou que é meu desejo que vocês, meus ministros, cedam à minha vontade e aceitam a resposta aliada.

O Japão estava derrotado, rendera-se.
Mas a política de guerra japonesa ainda teve um estertor, quando um grupo de oficiais radicais tentou um golpe de estado fracassado, por não ter qualquer apoio popular, para assumir o poder e continuar a guerra.
Por isso à distância de sessenta anos, pode-se afirmar com alguma segurança que o bombardeamento atómico sobre Hiroxima e Nagasaki não foi determinante para pôr termo à Guerra.
A entrada da URSS na Guerra e a certeza que esta estava irremediavelmente perdida, parece ter sido decisivo para o Imperador do Japão. Chefes militares de enorme peso e prestígio como Eisenhower ou MacArthur, eram de opinião que não havia justificação para o bombardeamento atómico e a consequente carnificina. Se as explicações sobre a utilização em Hiroxima são refutáveis, por maioria de razão parece acontecer quanto a Nagasaki.



Se a demonstração do poder da bomba acabava de ser feita, porque repetir logo a seguir tamanha crueldade?

Com alguma perverso cinismo, há quem argumente que os americanos não teriam utilizado a bomba contra os alemães, mas contra os japoneses por os considerarem uma raça inferior…
Também aqui se aplica a máxima romana ai dos vencidos.

O vencedor é aquele que define as regras.
Os Tribunais de Nuremberga e Tóquio foram, naturalmente, tribunais de vencedores, e nunca Aliado definiu como crimes de guerra, o bombardeamento atómico das cidades japonesas.
Na guerra, as razões morais são importantes, sem dúvida, mas são de peso relativo perante outras, não são os americanos uma excepção.
Sessenta anos passados, pode-se dizer, a muitos títulos, que de certo modo o mundo é mais seguro hoje em dia, que no tempo da Guerra-Fria. Na sequência de acordos sobre o controlo de armamento, há boas esperanças, de as potências nucleares reduziram substancialmente os seus arsenais.



Mas em contrapartida, existem incertezas em países como a Coreia do Norte e Irão.
Sendo o terrorismo um ameaça latente e incontornável, há sempre o risco de poder ser utilizada uma bomba suja, ou seja, um explosivo convencional acoplado a material radioactivo, proveniente de fontes médicas ou industriais. Segundo li recentemente, os especialistas definem estas armas como armas de perturbação emmassa, devido ao pânico e perturbação que podem causar. Mas mais grave que isto, seria o ataque surpresa, uma bomba terrorista armada com urânio altamente enriquecido ou plutónio roubados, transportado num meio de difícil detecção, como um camion ou barco.
Creio que hoje em dia, salvaguardadas as devidas proporções, podemos imaginar melhor o resultado de um deflagar em Manhattan de um engenho nuclear rudimentar transportado dentro de um camion, que mataria num instante mais de meio milhão de pessoas.

Depois de nos anos oitenta, antes da queda da URSS, ter sido excomungadaa energia nuclear, veja-se com razão o caso de Chernobil, parece voltar a ser considerada uma realidade promissora, por ser segura,limpa, investindo certos países biliões em programas tecnológicos de ponta.

Na nossa vizinha Espanha, onde não acontece tudo de errado em certas opções, que nada têm a ver com progressismos ético-sociais, o segredo do investimento não radica na energia eólica ou solar, porque apesar da sua incontestável limpeza ecológica, os seus custos são superiores às das centrais de fuel ou de gás.

Segundo tenho lido, o segredoreside no baixopreço da energia nuclear, o que confere à Espanha margem para subsidiar as suas energias renováveis e mantê-lo baixo a energia custa à indústria cerca de 30% menos que em Portugal. Sendo o nosso País tão dependente do petróleo, e por ser um dos poucos países que tem urânio, entendo sem entrar com foice em seara alheia, que a questão das fontes de energia em Portugal, deveria ser analisada rapidamente e com rigor, partindo do pressuposto que o nuclear não está mais excomungado.

E o que acontecia nesse longínquo 1945, em Portugal? O fim da Segunda Guerra foi logo marcado por celebrações espontâneas a 8 e 9 de Maio de 1945, em várias locais do País. Salazar, receando uma nova ordem internacional desfavorável às ditaduras da Península, ainda afastadas da ONU, anunciou uma revisão constitucional, após a rendição incondicional da Alemanha.
Promete eleições tão livres como na livre Inglaterra. A censura alargou a malha, prepararam-se golpes que falharam como outros antes. A oposição organiza-se incipientemente, é fundado por Mário Soares e outros, o MUD - Movimento de Unidade Democrática, que veio a ser ilegalizado em Abril de 1947. Às eleições de 17 de Novembro, livres como na livre Inglaterra, só concorrem as listas da União Nacional.

O clima de agitação e de expectativa de mudança ainda se prolongam até ao início de 1949, com a campanha presidencial de Norton de Matos, mas o início da Guerra-Fria permite ao regime controlar a situação, impor asua lei, que veio ainda a durar quase mais 30 anos.

SISSI E OS HABSBURG EM PORTUGAL (Madeira), VISTOS A PARTIR DE ALCOBAÇA

A Imperatriz Elizabete/Isabel, Sissi, do Império Austro-Húngaro, veio a Portugal, à Madeira, por duas vezes.



Vamos fazer um breve apanhado dessas presenças.



Em Novembro de 1860, começou a preparar-se a recepção à Imperatriz da Áustria, que vem passar o inverno à Ilha da Madeira, alegadamente em consequência do seu estado de saúde. A Câmara Municipal do Funchal, votou um orçamento suplementar para as honras da recepção.



A Imperatriz Elizabete/Isabel, chegou à Madeira a bordo do navio inglês Victoria e Albert, emprestado pelos Reis de Inglaterra, sendo saudada pela guarnição da Fortaleza do Ilhéu, com uma salva de 21 tiros e recebeu ainda a bordo as principais autoridades da região, ou seja o Bispo, o Governador Civil e o Comandante Militar. Quando desembarcou para um bote, foi saudada com nova salva de tiros. No momento do desembarque, no Cais da Pontinha, foi dada outra salva, agora no Castelo de S. João Baptista. A Imperatriz, ter-se-á sentido incomodada com o grupo de curiosos que a aguardavam no porto. Mas ao mesmo tempo essa presença alegrou-a, pois tratavam-se de pessoas desconhecidas que aos seus olhos só podiam ser simpáticas. Depois seguiu de carro para a residência escolhida, a quinta de Mr. Davies, sobre a baía do Funchal, onde hoje se situa o Hotel Carlton e o Casino. Era acompanhada pelas autoridades eclesiásticas, civis e militares, pelos corpos militares de infantaria e artilharia que no cais lhe haviam feito as honras do estilo. Sissi, dispensou a guarda de honra que lhe tinha sido postada à porta da residência, bem como outras honrarias devidas à sua hierarquia.



Em Dezembro, Elizabete/Isabel, Sissi fez passeios discretos a pé e de carro pelo Funchal e arredores. Passeava a pé ou a cavalo, numa carruagem puxada por póneis brancos. Conta-se no jornal A Voz do Povo, do Funchal que no dia 4 de Dezembro do ano de 1860, à saída da Sé, onde fora rezar, a Imperatriz Sissi deu uma avultada quantia a uma pobre mulher, mãe de muitos filhos, que vendia violetas, a quem comprou cinco ramos. Este facto depois de ter sido divulgado na imprensa local, comoveu os madeirenses, que admirando já a juventude e a sua beleza, passaram agora a enaltecer também as suas virtudes morais, os modos simples e generosos, qual anjo de bondade, conforto e consolação dos aflitos ou derradeiro amparo dos órfãos e viúvas. Para esse Natal, o Imperador Francisco José mandou à esposa uma árvore de Natal e um nobre que a visitou relatou em Viena que Sissi estava melhor, mas que se sentia horrivelmente deprimida, quase melancólica. Fechava-se amiúde quase o dia inteiro no quarto, chorando. Comia pouco e à excepção de um passeio a cavalo, andando durante uma hora a passo, nunca saía, apenas ficando sentada à janela aberta.



A 25 de Abril de 1861, aproximando-se a data da partida, escreveu-se na imprensa madeirense sobre a gratidão que a mesma Augusta Senhora há feito a bem dum povo, entre o qual pela primeira vez viveu, louvando os actos caritativos praticados.



Em 28 de Abril Elizabete/Isabel, Sissi acompanhada pelo Infante D. Luís, que viera de Lisboa em representação do pai, partiu escoltada pela corveta portuguesa Bartolomeu Dias até Gibraltar e mais dois vapores de guerra ingleses.



Acontece que trinta anos depois, numa muito breve passagem por Lisboa, só por delicadeza acedeu Isabel em encontrar-se com Maria Pia, recém viúva de D. Luís.



A Imperatriz Isabel passou na Madeira os dias em que cumpriu os seus 23 e 56 anos de idade. De facto, voltou bastantes anos depois à Madeira, embora por menos tempo, onde chegou no dia 23 de Novembro de 1893 no Iate Real Greif, sendo saudade com a salva do estilo. Desta vez, a viagem da Imperatriz não foi oficial, viajava incógnita, pelo que dispensou todas as honras, limitando-se a receber um amigo particular, o cônsul austríaco. Não houve bandeiras, arcos-de-flores ou bandas de música. A sua estadia foi no Reid’s New Hotel. Quando passeava na cidade era acompanhada por uma senhora e a curta distância por um marinheiro do Iate. Fez numerosas excursões a pé pela Ilha, acompanhada por um homem mais novo, corcunda e gestos rebuscados. Alta, com 1,72, muito magra, nunca pesou mais de 50 kg e nos seus 50cm de cintura, Sissi estava sempre vestida de luto, pois nunca mais o tirou desde o suicídio do filho em 1889. Um leque escuro oculta-lhe a cara devastada por rugas. A partida, no Greif, ocorreu a 4 de Fevereiro de 1894.



Voltando de novo, à Imperatriz Isabel e a sua relação com Portugal, que lhe serviu de porto de abrigo, sabemos conforme um biógrafo, que era intimamente republicana por influência de um pai liberal e sobretudo do seu professor particular de história.



Bela e também profundamente infeliz, a Imperatriz Elizabete, Isabel, Sissi, passou a vida a viajar, numa busca incessante pelo que acontecia simultaneamente no espaço físico do mundo e no seu interior, a sua alma. A sua inquietação não a deixava permanecer em lado nenhum. Sentia-se impelida a partir sempre, a cruzar os mares, a ir mais além, à procura de liberdade, de paz interior, de solidão, em busca de si mesma e de um sentido para a vida. A liberdade era, para Sissi, um valor essencial. Sentia-se qual gaivota, para partir sobre o mar imenso, tendo um dia escrito que:



Uma gaivota sou, de terra nenhuma,

Não chamo pátria a nenhuma praia,

Não me prendem terras ou lugares,

Eu vou de onda em onda .



Num outro poema, pedia que a deitassem numa praia quando morresse, para contemplar o mar, de modo a que esta fosse a sua última visão. E depois que a atirassem à água, onde fosse mais fundo, pois mesmo que há superfície haja tempestade, no fundo encontrarei a calma.



Elizabete/Isabel, Sissi terá confessado que tenho a sensação de que sou permanentemente impelida. Cada barco que deixa o porto, desperta-me o desejo de embarcar. Ir para onde ele for, para o Brasil, para a África, não importa para onde, apenas não permanecer num lugar.



Esta necessidade está também presente numa outra poesia pois:



Para onde ainda, minha alma?,

Estamos no alto mar,

Ele leva-nos de onda em onda,

Agora para baixo logo para cima. (...)

Para onde? Eis a pergunta,

O grande hieróglifo,

O meu amargo tormento da alma,

O enigma sem fundo .



O seu professor de grego, escreveu oportunamente no seu diário que ela é a rainha das águas correntes. É mais do que isso, é a rainha dos mares.



Oficialmente, quando Elizabete/Isabel veio a Portugal (Madeira) pela primeira vez, em Novembro de 1860, foi por motivos de saúde. A Madeira era conhecida como estância terapêutica, com um clima favorável ao tratamento de tuberculose. Terá sido essa mesmo, a razão da viagem? Duvidou-se muito desse diagnóstico médico, a doença seria antes uma desculpa para a sua fuga da corte, cheia de etiquetas e obrigações, que tanto detestava. Outrossim, ela gostava de passeios, montar a cavalo, cavalgadas que chegavam a durar 10horas, e caçar. Admirava a beleza, ela que chegou a ser considerada a monarca mais bela do seu tempo adorava a poesia, em especial o alemão Heinrich Heine e não lhe interessava, nem a política nem o poder. A rigidez da corte austro-húngara não se compadecia com esta maneira de ser e cedo se sentiu prisioneira desse mundo. Tal como acontecia com o seu filho Rudolfo, que era tido por liberal- antiaristocrático e pró húngaro. Assim começou a distanciar-se e a virar-se para si mesma. Um dos seus biógrafos escreveu que o pretexto da doença abafará tudo isso. Na realidade, pode-se dizer que ela está doente, porque o seu estado de espírito influencia o corpo e o que não passaria de uma pequena anemia, de uma tosse insignificante, com esses comportamentos pode tornar-se uma verdadeira doença.



A sua sogra, com quem nunca se deu bem, terá dito que ela encenou a doença para fugir ao inverno da Áustria e, longe dali, poder viver de acordo com os seus próprios hábitos. Todavia, segundo a sua própria mãe, o problema de Isabel era mais psíquico que físico. Porquê então, a Madeira?



O Arquiduque Maximiliano, irmão do Imperador, conhecia bem a Madeira. Ali estivera pela primeira vez de 4 a 7 de julho de 1852, no regresso a uma viagem ao Brasil, voltou de 6 a 15 de Dezembro de 1859 e ainda de 5 a 12 de Março de 1860. Na Madeira, terá tido um romance com a princesa D. Amélia de Bragança, filha de D. Pedro IV, de Portugal, falecida pouco tempo depois, vítima de tuberculose. O Arquiduque, entretanto casado com Carlota de Saxe, filha de Leopoldo I da Bélgica, ia a caminho de se sentar no trono do México, cuja mulher Carlota veio a mergulhar na loucura, ainda passou outra vez pela Madeira, de 28 a 29 de Abril de 1864. Não admira que tenha ficado ligado à Madeira pelo que é possível que tendo falado desta ilha, tenha assim influenciado Elizabete/Isabel, na escolha. Durante a sua primeira deslocação à Madeira, a certa altura desencadeou-se no mar uma violenta tempestade. Enquanto os outros passageiros se mostraram amedrontados e se sentiam mal, ela admirava o espectáculo, sentia a tempestade, queria participar dela. Em vez de se recolher ao camarote, perante o perigo de ser arrastada pelas ondas, pediu para ser arrastada a um mastro, de modo a admirar o furor da natureza.



De Viena, Elizabete/Isabel, Sissi apenas terá tido saudades dos filhos e dos seus cavalos. Após uma separação de meses, o casal imperial voltou a ver-se em Maio de 1861. Ao fim de 4 dias os acessos de febre, ataques de tosse e de choro voltaram, tomando proporções preocupantes. O médico particular diagnosticou uma tuberculose e propôs uma estadia em Corfu, que se veio a realizar mais tarde.



Porque terá voltado Isabel, à Madeira? Saúde? Procura de distância da corte? Fuga ao inverno de Viena? Tentativa de recuperar os anos passados?



Quatro anos antes desse regresso, uma tragédia abalou seriamente a vida da Imperatriz, a morte do seu filho Rudolfo, e herdeiro do trono, que se suicidou em Meyerling, a 30 de Janeiro de 1889, depois de matar a amante, por não ter conseguido por razões de Estado o divórcio da mulher a Princesa Stephanie, da Bélgica, para casar com uma bela jovem de 17 anos, a baronesa Maria Vetsera. Este casal tinha feito um pacto de suicídio. A corte abafou a verdade. O corpo da baronesa foi retirado em segredo do local e pôs-se a correr aversão que Rudolfo morrera de um ataque cardíaco.



A tragédia parece ter feito parte da vida desta mulher, que teve o seu cunhado preferido, o irmão mais novo do marido, Maximiliano, fuzilado no México a 19 de Junho de 1867, o afogamento do marido da irmã, Ludwig II, e ainda a morte da irmã Sofie, queimada num incêndio de um bar.



Elizabete, Isabel, Sissi ficou para a história como uma mulher enigmática, que não viveu nenhum conto de fadas, mas uma vida trágica, coroada por uma morte também trágica, ao ser assassinada na via pública em Geneve (Suíça), nas margens do lago Leman, a 10 de Setembro de 1898, por um anarquista italiano, que procurava um grande feito em nome da causa, a apunhalou com um estilete, de certo modo por engano, dado que inicialmente a vítima pretendida era o Príncipe de Orleães, pretendente ao trono de França, tido pelos anarquistas como o grande representante da aristocracia. Aqui a toilette da Imperatriz pode ter sido fatal. Depois de agredida a Imperatriz caiu no chão tendo sido ajudada a levantar-se por populares a quem agradeceu. Mas devido ao apertado espartilho, o sangue passou a sair tão lentamente que ninguém se apercebeu que estava gravemente ferida. Antes de morrer e depois de ter percorrido a pé uma centena e metros perguntou:O que é que aconteceu comigo?



A vida de Isabel, Sissi acabou por se tornar um mito, que até hoje continua a fascinar as pessoas e que corporizou o glamour, mas também a dificuldade da vida na corte da Áustria-Hungria, no século XIX.



A cidade do Funchal, decidiu prestar-lhe homenagem e nessa sequência os jardins da Hotel Carlton, junto ao Casino, ganharam nova vida com a colocação de uma estátua da Imperatriz, em bronze e em tamanho natural.



A saga dos Habsburg em Portugal continuou depois de Elizabete/Isabel, Sissi,. Com o termo da I Guerra e a derrota do Império Austro-Húngaro muita coisa mudou no panorama europeu e mundial. Não vamos fazer a história político-militar desses tempos conturbados, mas uma simples evocação dos Habsburg entre nós. O final é triste como convém a estas histórias. Desde a Princesa Maria Leopoldina, futura imperatriz do Brasil, até Carlos, último soberano do Império Austro-Húngaro, todos começaram bem, pelo menos assim-assim, e acabaram mal. Carlos está sepultado na Igreja do Monte-Funchal, perto da casa onde passou os últimos meses de vida. A Madeira, foi o seu porto de abrigo ou de exílio e também a escala para o passamento, aos 34 anos de idade.



Em 1817 desembarcou na Madeira uma jovem princesa estrangeira, Maria Leopoldina filha de Francisco I, da Áustria, que ia a caminho do Brasil, onde a esperava o príncipe D. Pedro, com quem casara por procuração, depois de se conhecerem por retrato. Todavia este casamento foi um autêntico desastre. D. Pedro desprezou-a mal a viu, porque era feia e odiou-a mal a ouviu, porque era culta. No dia em que assumiu o trono do Brasil, D. Pedro promoveu a marquesa de Santos a concubina oficial. Leopoldina deu-lhe os filhos que lhe eram exigidos, desmazelou-se, engordou e entregou-se à melancolia e à bebida. Antes dos 30 anos morreu de um aborto por efeitos de um pontapé que o marido lhe deu, estava ela grávida.



Decorridos 35 anos sobre a passagem de Leopoldina, corria o ano de 1852 chegou à Madeira Fernando Maximiliano de Habsburg, irmão do Imperador Francisco José, que ao que se diz se tomou de amores pela princesa D. Maria Amélia de Bragança, que ali estava em tratamentos e à procura de melhoras. Parece que eles já se conheciam de Viena. D. Maria Amélia, órfã do segundo casamento de D. Pedro IV era uma jovem bela, viajada, culta e brilhante, que frequentara a corte de Viena onde terá impressionado Maximiliano. Morreu ao fim de 5 meses na Madeira, já Maximiliano tinha seguido viagem.



Quando Maximiliano voltou ao Funchal em 1859, nada faria prever que se iria tornar uma figura patética da história moderna. É aqui de certo modo a continuação da sua lua-de-mel, com a bela Carlota, que entretanto desposara, mas que fica no Funchal durante o inverno, enquanto ele segue para o Brasil. No regresso da América passou uns curtos dias na ilha, deixando a marca de pessoa boa e generosa nos donativos.



Voltando a escalar a ilha em 28 de Abril de 1864, Maximiliano vinha já investido do título de Imperador do México. Nunca mais conhecerá horas tão leves como as que ali passou. Em Junho de 1867, a Madeira e o mundo souberam que o Imperador Maximiliano, do México, acusado de traição e usurpação do poder público, morreu num pelotão de fuzilamento. Carlota que viera à Europa mendigar apoio para o marido, entra em estado de loucura.



Quando Isabel, Sissi, chegou ao Funchal, a cidade estava habituada a receber personalidades de relevo. Mas nenhuma outra terá deixado marca tão importante. Segundo Agustina Bessa-Luís, as meninas do Funchal começaram a imitar a Imperatriz no porte, nas indumentárias, nos gostos e até nos caprichos...



A Europa e o Mundo mudaram muito. A Guerra pôs termo a uma ordem há muito moribunda, instaurando outra ainda muito instável, que é uma incógnita. O Império Austro-Húngaro já não existia mais. Carlos I abdicou em Novembro de 1918 e no ano seguinte Karl Renner foi o primeiro chanceler da República da Áustria. A 25 de Março de 1921, Carlos de Habsburg chegou a Viena, via Suiça e França, com um passaporte espanhol falsificado para prosseguir viagem à Hungria, em companhia dos legitimistas mais próximos. No dia 22 de Outubro desse ano quando a avioneta do casal real aterrou na Hungria para arrancar o poder pela força, o governo em sessão desse dia tomou a decisão unânime de o rei Carlos (...) não poderá tomar o exercício dos seus direitos de soberano e terá de abandonar o território da Hungria, outra vez. Depois de falhada a tentativa de restauração, foram feitas pressões para abdicar voluntariamente do trono e prepara-se a lei da destronização. Carlos I desembarcou na Madeira, a 19 de Novembro de 1921, como derrotado e proscrito, acompanhado de Zita, a esposa. A Inglaterra, e os aliados, impuzeram-lhe esse destino depois da recambolesca tentativa de recuperar o trono. Ele assinou a renúncia, sem abdicar dos direitos ao trono. Os sete filhos em breve chegarão da Suíça. Grande número de pessoas acorreu ao cais, praia e Estrada da Pontinha para assistir ao desembarque dos ex-imperadores. Os viajantes sorriem agradavelmente, agradecendo com muita cortesia os cumprimentos que lhes eram dirigidos, embora tentassem esquivar-se a fotografias e filmagens.



O ex-Imperador devia pensar que o esperava um exílio longo. Teve missa todos os dias na sua residência, a Villa Victoria. Uma vida familiar, longe de intrigas, fá-lo-à esquecer dois anos de reinado para que não fora feito.



Como chegou lá? A herança caiu-lhe nas mãos devido ao suicídio de Rudolfo e ao assassinato de Francisco Fernando, respectivamente filho e sobrinho de Francisco José. Pouco tempo antes da sua morte Francisco José comentou que o seu sucessor é realmente um excelente príncipe. O meu povo pode depositar nele toda a confiança.



Se a ilha estava habituada a receber personalidades de destaque foi a primeira vez que recebe um monarca exilado. Mas estranhou quando cinquenta e tal anos depois, recebeu de passagem para o Brasil, Américo Tomás e Caetano.



Qual era o estatuto de Carlos da Áustria? Hóspede ou prisioneiro? Os ilhéus não se queriam ver no papel de carcereiros. Nem este era um Napoleão que também por ali passou a caminho de Santa Helena. Em breve a situação dos ex-imperadores tornou-se constrangedora. O casal real vinha pobre, sem dinheiro ou rendimentos. Além do mais tem sete filhos, o que obrigou a vender joias. Ao mesmo tempo a Checoeslováquia confiscou todos os bens dos Habsburg. Escasseia-lhes dinheiro para tudo, para pagar as dívidas, nomeadamente para se deslocarem à Sé-Catedral onde gostavam muito de comungar. Em Lisboa publicou-se a notícia da divergência sobre o pagamento das despesas com o exílio, pelo que são auxiliados por vários particulares madeirenses durante a estadia. Portugal pretendia ficar à margem de qualquer tipo de responsabilidade, favorecendo uma custódia cujas despesas correriam por conta dos Aliados. Carlos passava muitas tardes embrulhado num capote, por causa do frio e humidade, a jogar cartas com um elemento qualquer da comitiva.



De compleição débil, adoeceu em meados de Março. Nas igrejas da Madeira, a população rezou pela sua salvação, mas veio a falecer em 1 de Abril de 1922. As missas celebradas nas igrejas do Funchal em sufrágio de Carlos de Habsburg foram muito concorridas. No dia 4 de Abril, o Arquiduque Otto, de 12 anos, filho mais velho de Carlos e Zita, foi proclamado rei pelos monárquicos austro-húngaros. Os próprios irmãos passaram a tratá-lo por magestade. No dia 7 de Abril chegaram ao Funchal várias personalidades régias, entre as quais, a Infanta D. Maria Antónia, Duquesa de Parma, filha de D. Miguel de Bragança, que manifestou a sua satisfação por ela poder acolher-se na Madeira, entre Portugueses. Na sala principal da sua casa havia dois retratos a óleo, um de D. João VI e outro de D. Carlota Joaquina, que eram antepassados comuns de Carlos e Zita. Ele era bisneto de D. Pedro IV e ela neta de D. Miguel. Ficou sepultado no cemitério da freguesia enquanto na Igreja não se abriu uma capela para o receber. Mas o coração foi mandado para Viena, a fim de se reunir aos dos outros Habsburg. A ex-Imperatriz Zita e os seus filhos deixaram a Madeira no dia 19 de Maio com destino a Espanha. O seu oitavo filho, aliás uma menina, nasceu em Espanha, dois meses depois da morte do pai, facto que por gentileza foi comunicado à população do Funchal a pedido da ex-Imperatriz Zita. Esta, durante um longo exílio pela Europa, veio por várias vezes ao Funchal, rezar junto ao túmulo do marido. Faleceu em 1989.



Em 1 de Abril de 1972, 50 anos após a sua morte e assinalando esse meio século, quis a Santa Sé proceder à abertura do túmulo do soberano. A exumação dos restos mortais de Carlos I foi feita na presença dos técnicos necessários à operação, uma comissão nomeada pelo Vaticano a pedido da Causa de Beatificação de Carlos de Áustria.

RAINHA ISABEL II - VI AS CORES DAS LOIÇAS DO TOUCADOR E O PROTOCOLO BRITÂNICO. UM ROLLS ROYCE EM SEGUNDA MÃO. OS PRIMÓRDIOS DA RTP

NO TEMPO DE SALAZAR, CAETANO E OUTROS
VI
A RAINHA ISABEL II EM PORTUGAL E ALCOBAÇA (1957)
AS CORES DAS LOIÇAS DAS INSTALAÇÕES DA TOILETTE DA RAINHA E O PROTOCOLO BRITÂNICO
UM ROLLS ROYCE EM SEGUNDA MÃO
OS PRIMÓRDIOS DA RTP
O REI D. CARLOS E ESPOSA D. AMÉLIA, GRACE KELLY (MÓNACO) E HAILÉ SALASSIÉ (ETIÓPIA) EM ALCOBAÇA






Em 25 de Junho de 1891, visitaram Alcobaça, o Rei D. Carlos e Esposa, D. Amélia, tendo sido festivamente recebidos pela população e pelas forças vivas. Segundo Bernardo Villa-Nova, no Livro de Honra do Hospital de Alcobaça, então recentemente inaugurado, D. Carlos escreveu com o seu punho:
APROVEITO A OCASIÃO DESTA VISITA PARA FELICITAR A MESA DA MISERICÓRDIA PELA PERFEIÇÃO DE ARRANJO E DE ASSEIO EM QUE TEM O HOSPITAL.
EL-REI D. CARLOS
D. AMÉLIA-RAINHA
Em 29 de Abril de 1907, de novo o Rei D. Carlos visitou Alcobaça, acompanhado do príncipe alemão Guilherme de Hohenlern.
A Rainha D. Amélia havia feito uma visita particular ao Mosteiro em Agosto de 1892.
De origem francesa, era pessoa culta e artista e que, não obstante os tempos conturbados do fim da monarquia e do exílio que cumpriu, assumiu sempre postura digna e respeitável.
D. Amélia era delicada pintora e desenhadora, sendo a sua obra mais conhecida, a colecção de desenhos do Paço de Sintra, destinados a ilustrar o estudo do Conde de Sabugosa, sobre esse palácio. Já no exílio, em França, manifestou para com os desprotegidos de Portugal, o espírito beneficente. Note-se, que o produto da venda da edição em dois volumes fac-similados de Mes Dessins, reverteu a favor da Associação Nacional aos Tuberculosos. D. Amélia dedicou parte da sua vida a fundar e apoiar instituições de beneficência, ligadas à saúde, à ciência e à cultura.
Entre estas, destacam-se dispensários e sanatórios, lactários, cozinhas económicas, bem como as creches que davam assistência às crianças pobres.
Em 1899, fundou a Assistência Nacional aos Tuberculosos e criou em Portugal, o primeiro Instituto Pasteur, com o nome de Instituto Câmara Pestana.
Também o interesse pelos bens e cultura portugueses, levou-a a fundar o Museu Nacional dos Coches. Voltando à referida visita, diremos que nesse mês de Agosto de 1892, D. Amélia veio a Alcobaça acompanhada dos seus amigos Conde de Sabugosa e Esposa, para desenhar alguns temas do Mosteiro, na altura em fase de degradação, por incúria dos governantes e também de pessoas da terra.
Segundo rezam as crónicas locais (imprensa), eivadas de algumas pinceladas poéticas, naquela mansão de luto que arte tornou tão bela, a presença da Rainha, sentada num tosco escadote, desenhando o túmulo de outra rainha que a precedeu no mesmo trono e cuja existência custou tantas lágrimas a uma pobre repudiada, tomou a nossos olhos um vulto especial, uma especial feição. Não víamos nela somente a mulher coroada, víamos uma artista modestamente vestida, extasiada ante um modelo que foi um primor na arte. (...) Vimos a arqueóloga seguindo a evolução da arte, não se importando com os dramas e os idílios que cada um daqueles monumentos representa.






Não constitui exagero, afirmarmos que o Mosteiro de Alcobaça, sintetiza alguns dos aspectos que nos identificam como Povo e Nação.
Talvez, por isso, uma mulher de origem francesa, tentou em Alcobaça compreender o verdadeiro e profundo ser e sentir de um povo, que já não nutria simpatia especial pela Monarquia, mas que nunca deixou de considerar a Rainha. Segundo o jornal que se publicava na vila, denominado De Alcobaça, após ter almoçado no Claustro de D. Dinis, sentada nuns degraus arruinados, demorou-se seis horas em trabalho delicado e paciente e, ao despedir-se, disse que voltaria muitas vezes, porque tinha muito que desenhar ali.
D. Amélia não chegou a voltar a Alcobaça, nem mesmo quando terminada a Guerra, foi em Junho de 1945 autorizada, tal como a demais família real, a visitar Portugal.
No início da Guerra, Salazar ofereceu-lhe asilo, que foi recusado. Faleceu em França, a 25 de Outubro de 1951 e encontra-se sepultada no Panteão Nacional.





Depois de Isabel, os jovens Príncipes de Mónaco, Rainier e a charmosa Grace, acompanhados dos filhos, visitaram Alcobaça em 1964, no seguimento de uma ida a Fátima, tendo almoçado na Estalagem do Cruzeiro, em Aljubarrota. Há quem conte, como Luísa Pescadinha, ter assistido na Nazaré, a Princesa Grace, a contar e confirmar pessoalmente, as suas típicas sete saias de peixeira.
Em 1959, o Rei dos Reis, O Senhor dos Senhores, O Conquistador Leão da Tribo de Judah, O Supremo Defensor da Fé e Poder da Santíssima Trindade, o Imperador Etíope, Hailé Selassié, que havia sido coroado em 2 de Novembro de 1930 (o salmo 87:4-6 foi também interpretado como a previsão da coroação de Hail Selassié), efectuou uma visita a Portugal e, a Alcobaça, atirando aquando do acesso ao Mosteiro, moedas de ouro aos populares que se debatiam histericamente atrás delas. Hailé Selassié era, de acordo com a tradição, o ducentésimo vigésimo quinto da linhagem de imperadores etíopes, descendentes do bíblico Rei Salomão e a Rainha de Sheba. Nos discursos da praxe, o Chefe de Estado africano e os responsáveis portugueses, fizeram referências aos laços históricos que uniam os dois países, desde o século XVI.
Na evocação da amizade luso-etíope, um episódio parece ter sido deliberadamente omitido, a posição assumida por Portugal na Sociedade das Nações, aquando da agressão da Itália fascista à Abissínia. Porque é que até determinada altura a defesa da independência da Abissínia mereceu o apoio do governo de Lisboa?
E quais os motivos do volte-face operado por Portugal, em 1936, quando chegou internacionalmente a altura de endurecer o regime de sanções imposto à Itália?
FIM

RAINHA ISABEL II - V AS CORES DAS LOIÇAS DO TOUCADOR E O PROTOCOLO BRITÂNICO. UM ROLLS ROYCE EM SEGUNDA MÃO. OS PRIMÓRDIOS DA RTP

NO TEMPO DE SALAZAR, CAETANO E OUTROS
V
A RAINHA ISABEL II EM PORTUGAL E ALCOBAÇA (1957)
AS CORES DAS LOIÇAS DAS INSTALAÇÕES DA TOILETTE DA RAINHA E O PROTOCOLO BRITÂNICO
UM ROLLS ROYCE EM SEGUNDA MÃO
OS PRIMÓRDIOS DA RTP
O REI D. CARLOS E ESPOSA D. AMÉLIA, GRACE KELLY (MÓNACO) E HAILÉ SALASSIÉ (ETIÓPIA) EM ALCOBAÇA





Por onde andou, Belém, Alcobaça, Nazaré, aonde assistiu à exibição de dois ranchos folclóricos, e Batalha, a soberana britânica foi aclamada por milhares de pessoas, embora muitas das situações tivessem sido encenadas, como se veio a saber com os pescadores da Nazaré.
Percebe-se pela correspondência trocada entre diplomatas dos dois países, que o embaixador britânico em Lisboa, Sir Charles Stirling, quis conhecer, com mais de um mês de antecedência, o conteúdo do discurso do Presidente da República. Fez-se saber, de Londres, que a Rainha não desejava uma visita do Presidente do Conselho, alegando que tal podia implicar uma conversa sobre grandes problemas políticos.
Faltava mais de uma semana para a concretização da visita oficial da Rainha Isabel, e já a correspondência engrossava o dossier no Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre todos os pormenores, incluindo financeiros.

Enquanto as ofertas inglesas parece não ascenderem a mais de 20 ou 25 mil escudos, as nossas somaram 222.590$90, alertava uma nota do M.N.E. em Janeiro de 1957, dando conta dos valores: uma banda para a Rainha-95.000$00; um serviço de jantar para a Rainha e de chá para o Duque- 90.000$00); um lugre Gazela para o príncipe Carlos-25.000$00; uma boneca, vestidos e toucador de prata para a princesa Ana-11.000$00.

E até houve um presente extra para Isabel II, o Bussaco, um belo garanhão castanho, com oito anos, de pura raça lusitana e detentor certificado de árvore genealógica de três gerações, com arreios encomendados pelo próprio Presidente da República. Sabe-se que o animal deixou descendência nas cavalariças inglesas. Para lá do protocolo, a Rainha conversou com Craveiro Lopes, que sendo oficial de cavalaria, era um entendido em assuntos de raças e performances, como a Rainha.



Todos os passos da visita real foram previstos ao detalhe. As dormidas, a hora do chá, a criadagem, os seguranças, que não deviam dormir em Queluz no mesmo piso da Rainha, a presença da PIDE, os cortejos, os banquetes inclusive de Alcobaça, as visitas, os petiscos. E algumas dicas: A Rainha aprecia muito sardinhas portuguesas de lata, lia-se nas indicações do Embaixador Inglês, em Lisboa.
António Pinto de Mesquita, embaixador reformado, contou ao Diário de Notícias, a propósito dos cinquenta anos da visita, que ainda conserva o uniforme que o Ministério dos Negócios Estrangeiros ofereceu aos funcionários para a visita, mas ofereci-o ao meu filho, porque já vamos na quarta geração de diplomatas.
Na altura, Pinto de Mesquita tinha 29 anos, e estava no Serviço de Protocolo do M.N.E., pelo que assisti à cena em que o duque renunciou, no Porto, ao Rolls-Royce e entrou num carro de bombeiros aberto..
Lembra que Salazar pôs um cuidado especial na visita, não pensava noutra coisa. A visita foi a coroação de todo o esforço diplomático de Armindo Monteiro, que permitiu a Salazar uma grande reaproximação à Inglaterra, que se tem mantido.

A visita de 4 dias de Isabel de Inglaterra, constituiu uma prova de fogo para a RTP, que começava a dar os primeiros passos.
Foi acontecimento que teve significado especial para o País e o Regime.
Um tema como este, rodeado de um enorme interesse popular, levou a RTP a ter a oportunidade, bem como a necessidade, de oferecer a um relativamente significativo número de espectadores em expansão, a cobertura integral da visita, fazendo uma reportagem, até à altura, sem paralelo na história da informação no país.
Os passos da soberana e marido, foram minuciosa e rigorosamente documentados pelas equipas de repórteres de câmara e chegaram, escassas horas depois, a uma audiência que, estimativas ao tempo, calcularam ser cerca de um milhão de portugueses, atendendo à invulgar frequência registada nos locais públicos, como cafés e estabelecimentos, onde normalmente ainda só se encontravam os receptores.
A visita, mereceu na RTP as honras de um jornal diário, e que, incluindo as reportagens do dia, não deixava de documentar o programa do dia seguinte, mostrando os locais a visitar, a descrição dos acontecimentos próximos, os preparativos que estavam a decorrer. Alcobaça sentiu essa presença e afã, que mobilizou, pelo inusitado, o interesse das pessoas, ao reconhecer algumas caras do pequeno ecrã e proporcionou motivos de conversa nas famílias e tertúlias.

A par do serviço que houve que assegurar para a RTP, teve esta de responder ao interesse do estrangeiro, pelo fornecimento de imagens. Largas dezenas de metros de filme, na altura utilizava-se uma película que tinha de ser impressionada ao jeito do cinema, foram fornecidos ao Brasil e à United Press Television.
Por outro lado, tanto a BBC, como a ITV, fizeram deslocar a Portugal equipas de reportagem. A BBC, chegou a Portugal com alguma antecedência para documentar todos os locais a visitar por Isabel II.

A cerimónia do desembarque de Isabel II no Terreiro do Paço, foi objecto de um interesse especial. Uma bobina com muitos metros de filme, compreendendo planos colhidos de posição estratégica, era necessária ao conjunto da reportagem e foi rodada por um operador da RTP, o único que teve permisdsão para aceder ao local. Um jacto da RAF, aguardou na Portela o tempo necessário para que um estafeta-moto fizesse entrega do filme, e de outros realizados por operadores britânicos. Cerca de 3 horas depois, o Reino Unido via as imagens da Rainha a desembarcar em Lisboa.



Na memória colectiva de Alcobaça, está indissoluvelmente ligado a esta visita real, a pessoa do Presidente da Câmara, Joaquim Augusto de Carvalho. É de justiça fazer-lhe aqui uma pequena homenagem, para o que nos socorremos da notícia publicada em O Alcoa, de 17 de Julho de 2008, da autoria de Luís Peres Pereira:
Natural de Ílhavo, veio para Alcobaça na década de 30. Foi co-fundador da Crisal e Presidente do Clube Desportivo Comércio e Indústria de Alcobaça. No mandato de Júlio Biel, foi vereador e Presidente da Comissão Municipal de Turismo. Tomou posse como Presidente da Câmara a 9 de Outubro de 1953. O seu mandato, fortemente, ligado à aplicação do II Plano de Fomento, permite-lhe investir em várias frentes, nomeadamente, na electrificação, que neste período foi alvo de colossal avanço. Assim, em várias sedes de freguesia e respectivos lugares, é inaugurada a rede eléctrica: Alpedriz, Bárrio, Benedita, e cinco dos seus lugares, Cós e dois lugares, Évora de Alcobaça, Turquel, Montes, Vestearia, Vimeiro, Maiorga e quatro lugares, Pataias e um lugar, Pataias- Gare, e Alfeizerão e dois lugares. A componente educativa também foi contemplada, destacando-se o apoio prestado para o arranque da Escola Técnica de Alcobaça, a criação do Posto Escolar de Monte de Bois, no Bárrio; edificação das cantinas escolares, em Pataias, Aljubarrota e Ataíja; construção de escolas nas freguesias de Cela (Junqueira) Turquel (Casal de Vale de Ventos, Louções, Carvalhal e Fonte Santa) e Pataias e início das obras da futura escola de Cós. As ligações viárias também conheceram avanço. Na freguesia de Alfeizerão inaugurou a estrada do Casal Pardo e o acesso ao Valado de Santa Quitéria; ligação entre Turquel e Carvalhal; e a abertura da estrada de ligação da Castanheira ao Juncal. Outros investimentos, como a requalificação da Avenida Marginal em S. Martinho do Porto, a construção do Estádio Municipal de Alcobaça, uma fonte no Casal dos Lopes, freguesia da Maiorga, ou um lavadouro público no Casal de Aguiar, freguesia de Alfeizerão, espelham bem a diversidade da sua actividade autárquica.
Várias Igrejas são abertas ao culto neste período: Benedita, Bárrio, Vimeiro e Carris, freguesia de Évora. Assiste-se à reabertura de Igrejas Paroquiais de Turquel e da Vestearia, e da Igreja da Misericórdia de Alcobaça. As visitas internacionais também marcaram o seu mandato: a visita de Hailé Selasié, Imperador da Etiópia; da Princesa Margarida, de Inglaterra, e a visita da Rainha Isabel II, de Inglaterra, acompanhada do Presidente da República General Craveiro Lopes. Esta última visita impulsionou uma impressionante transformação urbana da Praça Oliveira Salazar, de onde foi retirado o Edifício do Jardim-Escola João de Deus Ramos, libertando mais ainda visualmente a Praça, ao mesmo tempo que promoveu obras de reintegração do Castelo de Alcobaça. Ao longo do mandato homenageou Frei Estêvão Martins, o Bispo D. António de Campos, Manuel Vieira Natividade e a Ala dos Namorados, o grupo dos bravos jovens cavaleiros mortos na Batalha de Aljubarrota, que se encontram sepultados no Claustro do Silêncio do Mosteiro de Alcobaça, contando nestes dois momentos com a presença do Sub-Secretário da Educação Nacional, Baltasar Rebelo de Sousa. Na ocasião da sua retirada da Autarquia, em 1963, foi alvo de apoteótica homenagem (…). Completaria 96 anos de idade a 4 de Setembro.
CONTINUA

RAINHA ISABEL II - IV AS CORES DAS LOIÇAS DO TOUCADOR E O PROTOCOLO BRITÂNICO. UM ROLLS ROYCE EM SEGUNDA MÃO. OS PRIMÓRDIOS DA RTP

NO TEMPO DE SALAZAR, CAETANO E OUTROS
IV
A RAINHA ISABEL II EM PORTUGAL E ALCOBAÇA (1957)
AS CORES DAS LOIÇAS DO TOUCADOR DA RAINHA E O PROTOCOLO BRITÂNICO
UM ROLLS ROYCE EM SEGUNDA MÃO
OS PRIMÓRDIOS DA RTP
O REI D. CARLOS E ESPOSA D. AMÉLIA, GRACE KELLY (MÓNACO) E HAILÉ SALASSIÉ (ETIÓPIA) EM ALCOBAÇA




As pessoas em Alcobaça também se prepararam, para a visita, mesmo sabendo que não iriam nem poderiam ser convidadas para as recepções.
Como era a moda e o que se usava nos fins da década de cinquenta?
As senhoras da sociedade usavam luvas, sempre que possível a condizer com o vestido, composto de uma jaqueta e saia, com abertura nas mangas e golas em bico. O chapéu era cónico, o sapato negro de tacão, por vezes alto, e com biqueira. Tal como sempre, houve senhoras que queriam ver e ser vistas, revelando estarem up date, adquirindo conjuntos de toiletes, que compreendiam sapatos, chapéus e vestidos, em modistas e estabelecimentos de Lisboa (pois que em Alcobaça não se sentiam confortadas, para o grande momento…), apesar de haver modistas. Mas estas eram mais tipo costureiras como a Maria Amélia do Couto, a Segismunda, a Maria Pequena ou a Sineiro, que faziam vestidos simples, inclusive de noiva, e principalmente muitos arranjos.
Há cerca de 50 anos a principal modista de Alcobaça era talvez Elvira Veríssimo, que tinha um atelier na rua do Dr. Brilhante, situado ao lado da actual Ourivesaria Rilhó, considerada por muitos como a mestra das outras que trabalharam em Alcobaça. Não se esqueça a Lúcia costureira, a América, mulher do Fernando Albano, a Joaquina Coelho, com atelier perto da antiga Olaria de Alcobaça, a Maria do Carmo, a Alice, a Virgínia Mineiro, com atelier na Pissarra e mulher de Pica Sapateiro. Estas modistas/costureiras tinham clientes, tanto da vila, como de vários pontos do Concelho. A mulher de Altino fez os vestidos por medida para muita noiva, embora houvesse já as que os compravam feitos.

Domingas Lucas, que não ganhou com a visita da Rainha, diz na sua forma peculiar de se exprimir, que nunca ninguém lhe ensinou costura, que esta arte é um dom. Não sei explicar, mas acho que cada qual nasce com uma habilidade e um gosto para uma coisa.
Além de ser bastante conhecida e por vezes ainda solicitada na zona onde reside, Alfeizerão, os seus fatos já tiveram méritos reconhecidos. Algumas senhoras nem chegavam a tirar medidas, explicou, adiantando que, a maior parte das vezes, saía-lhe bem à primeira, o que dispensava as provas.

Para a visita da Rainha, os sapateiros de Alcobaça, como o Cândido Sarmento, o João Elias, o Juveo, o Pica, da Pissarra, também não tiveram clientes, não fizeram negócio, não competiam com os de Lisboa, seja com os cavalheiros ou com as senhoras. Eram, ainda e só, sapateiros à maneira tradicional. O calçado, faziam-no à mão. Utilizavam peles de vitelo e vaca, que, quando secas e grosseiras, tinham o nome de atanadas.
As peles eram ensebadas, ao lume para se impermeabilizar, com sebo de borrego que se comprava no talho. Usava-se pneu para as solas. O cerol servia para untar as linhas, de modo a ficarem mais resistentes. O sapateiro tradicional usava martelos, torqueses e sovelas, instrumento constituído por uma espécie de agulha direita ou curva e encavada com que os sapateiros e os correeiros usavam para furar o cabedal para coser, pois do calçado faziam parte a presilha, o tacão, a gáspea, daí o dizer-se que mandei gaspear os sapatos, a palmilha, a vira, o rebordo, as almas, as solas, daí o dizer-se mandei deitar meias solas. Nas solas dos sapatos e botas usavam-se com frequência os chamados pregadores ou protectores, peças pequenas em ferro, colocadas nas biqueiras ou calcanhares, para que as solas durassem mais tempo. Era dura, não desafogada, a vida do sapateiro, até porque muita gente, há sessenta anos ainda andava descalça... ou não pagava.




Ouvimos recentemente contar a história que segue, embora não tenhamos conseguido apurar com quem se passou. Há cerca de 60 anos um sapateiro de Alcobaça, começou a exigir o pré-pagamento do trabalho. As razões eram evidentes. Alguns clientes não pagavam, outros não levantavam os trabalhos, e no fim do mês as más consequências desses comportamentos eram manifestas. Um dia, um cliente pediu que lhe fossem substituídos os tacões dos seus sapatos de marca, alegadamente para ir à recepção à Rainha. O sapateiro explicou ao cliente que tinha de os deixar, podendo levantá-los mais tarde. Ao mesmo tempo, propôs-lhe o prévio pagamento do serviço. Mas como o cliente dizia ter todo o tempo do mundo, não se importava de esperar. E, assim foi. Tirou os sapatos, sentou-se numa cadeira, cruzou as pernas, mostrando meias de boa qualidade, e fumou um cigarrinho, enquanto aguardava. Ao fim de algum tempo, o trabalho estava pronto.
Calçou-se, perguntou quanto era e disse que tinha que ir ao carro buscar a carteira, pois não tinha ido antes, porque não podia ir descalço.
-Concerteza, comentou, com a maior naturalidade o sapateiro.
O cliente, sapatos arranjados, saiu da loja e nunca mais apareceu.

E os cabeleireiros da terra?
Tinham ou tiveram muito que fazer com a visita real?Com a vista real cremos também que não. O cabeleireiro de Alcobaça com mais freguesia, com clientes mesmo de Caldas da Rainha, era o Manuel Catita, com salão ao lado do actual do Café Portugal e entrada tanto pela Rua Alexandre Herculano, como pela Praça da República. Este salão teve o serviço da Lili manicure, bem como de aprendizes, cuja função era apenas lavar cabeças. Não penteavam, muito menos pegavam na tesoura.




Do alto dos seus quase sessenta anos no ramo, Joaquim Cabeleireiro, de Caldas da Rainha, fez umas considerações sobre a profissão. Há anos, dizia-se que um cabeleireiro com uma escova e um pente não passaria fome. Hoje, esse conceito deve ser modificado pois, dificilmente sobreviverá o que dispuser apenas de talento e habilidade. Recorda que, antigamente, a noiva lhe levava uma foto ou revista e, assim, fazia o modelo que ela queria, mas hoje respeitamos sim, mas, com toda delicadeza e educação sugerimos modelos que lhe ficarão melhor.
Atendeu noivas que queriam casar com o cabelo solto, porque tinham orelhas de abano, nariz saliente, rostos muito redondos ou pequenos demais…. Nos últimos vinte ou trinta anos, profissionais como Joaquim Cabeleireiro sentiram a grande mudança no dia-a-dia do salão, concretamente com relação ao movimento de clientes, cuja assiduidade e rotina foi aumentando. Vários factores concorreram para a alteração, como hábitos e técnicas que substituíram algumas, anteriormente utilizadas.
O perfil da cliente mudou. Antes, Joaquim Cabeleireiro, como muitos colegas de Alcobaça, trabalhava exaustivamente, de segunda-feira a sábado, aos sábados, por causa dos casamentos ou festividades, o trabalho começava às 7h30, e os serviços mais procurados eram o corte, o pentear, o banho de creme, a coloração, a permanente e a touca de gesso, isto é, uma mistura de líquido de permanente e farinha de trigo, utilizada para diminuir o volume.
Hoje, comenta Joaquim Cabeleireiro só continua inalterado o perfil da cliente que procura o serviço de corte mensal, bimestral ou semestral. A diferença está na procura de outros trabalhos. Há cinquenta anos, algumas das minhas clientes, mesmo as que tinham cabelos curtos, iam ao Salão até duas vezes por semana, ainda que tão só para pentear. Com a evolução das técnicas de corte e a moda, a escova deixou de ser exclusividade e prioridade no meu salão. Em compensação, outros serviços ganharam força, substituindo práticas anteriores. É o caso da coloração, que antigamente só era procurada para cobrir fios brancos, e agora passou a ser um factor de fidelidade, como reconhece Joaquim Cabeleireiro.
Houve homens, os cavalheiros como se reputavam e usava dizer, que fizeram fatos de em Leiria ou Lisboa, mesmo não indo à recepção. Recordamo-nos do que era fazer um fato antes da era do pronto-a-vestir, como o caso de nosso Pai (no Porto) ou do Dr. Magalhães (em geral em Lisboa, mas por vezes em Leiria).

Faça-se aqui uma pequena e incidental digressão sobre o tema, abordando uma profissão que se extinguirá, definitiva e eventualmente, dentro de algum tempo.
Com efeito, a arte de alfaiate, muito popular há meio século, está praticamente extinta.
Haveria na altura da visita, na vila de Alcobaça, cerca de uma vintena de profissionais a exercer a arte, já com a categoria de mestre, como o reviralhista Serafim Amaral, o Gaivoto, à Pissarra, o Bento Ricardo, perto do Posto de Turismo e que era padrinho da mulher de Altino Ribeiro, o Bajouco, ao lado do antigo Quartel dos Bombeiros, o Amaral, ao lado do Capador, o Abílio Alfaiate Lourenço Marques, junto aos antigos sanitários públicos, ao lado da actual sede da Junta de Freguesia de Alcobaça, o Xico Belo, ao lado do Palácio Costa Veiga, o Isidro Caneco, perto da Fonte dos Talassas ou o Manel Alfaiate. Aprendizes, semi-oficiais e oficiais, talvez houvesse para aí o dobro dos que se tinham alcandorado ao topo da arte. Só era mestre quem já sabia tomar medidas e talhar.

Hoje, Manuel Alfaiate, que em novo foi profissional de sucesso, está com mais de oitenta anos.
Não se aventurando a fazer obra de responsabilidade, ainda constitui um pronto-socorro para um vizinho que precise de apertar, alargar um casaco ou umas calças, subir, descer bainhas ou mangas, e se for bem conversado, antes de almoçar, ainda confecciona umas calças para ambos os sexos.
Até aos anos cinquenta, rara era a peça de vestuário que não fosse feita por medida, como diz Manuel Alfaiate. Quando um fato era adquirido numa loja de pronto a vestir, o que acontecia apenas nas cidades, o alfaiate da província comentava, desdenhosamente, que se tratava de obra de fancaria. O freguês entregava o tecido na alfaiataria, ou comprava-o lá, submetendo-se a tomada de medidas de rigor geométrico pelo mestre, cuja fita métrica estava ordinariamente suspensa sobre o pescoço. A fazenda era molhada para depois não encolher.

A obra iniciava-se com o esboço do fato, feito com giz branco apropriado, seguindo-se o corte e depois todas as operações de confecção que incluía uma ou duas provas. Na segunda prova de Manuel Alfaiate, entrava o pormenor da dimensão das mangas, tomada com o braço estendido e dobrado, e o cair da gola, os rebuços. Era importante assegurar ao cavalheiro que o casaco caía bem, tanto de frente como de costas, sendo para tal necessário que permanecesse quieto, direito, sem levantar os ombros. A altura das calças dependia do tacão do sapato.
Depois de tudo, poderia sair um trabalho digno de aparecer, se não na recepção à Rainha, pelo menos numa festa ou tão só na rua. O traçado de giz de Manuel Alfaiate, denunciava o futuro formato do casaco ou das calças. Com o corte certeiro da tesoura, o mestre transformava o tecido numa peça única. Um casaco, colete e calças, exigia trabalho aprimorado e era feito geralmente de tecido de qualidade, que só os clientes mais abastados tinham possibilidades de adquirir. Para os outros havia o cotim, a ganga e a saragoça, que não exigiam confecção muito apurada, dispensavam forros e, por isso, eram mais ruraos e menos onerosos.

Recordamo-nos da azáfama que, nos nossos tempos de estudante, reinava nas alfaiatarias do Porto, nas semanas que precediam as épocas festivas, como o Natal ou a Páscoa.
O Domingo de Páscoa e o Natal eram os dias em que muitos desejavam estrear roupa nova e então, o trabalho nas oficinas de alfaiate, desenrolava-se com um frenesim, fora do comum. Não havia horários, e os serões prolongavam-se até às tantas. Também não havia folgas e era apertado o tempo dispensado às refeições e ao descanso.Talhar, alinhavar, coser à máquina e à mão, provar, casear, pregar botões e passar a ferro, eram operações que se sucediam com celeridade, mas quase sempre sem prejuízo do apuramento da obra, pois estava em jogo o prestígio do mestre, sem excluir a rivalidade dentro da classe. Os janotas queriam exibir-se, e os alfaiates, na mira de proventos que os compensassem de épocas mais brandas, davam o máximo.

Os alfaiates estão, pois, em vias de extinção como se sabe. As lojas de pronto a vestir e concorrência dos ciganos, foram acabando com eles. Nas grandes cidades ainda vão subsistindo os que são procurados por executivos ou gente da alta que, embora pagando caro, ainda preferem um fato que se molde bem ao corpo ou então que, pela corpulência ou defeito físico, não encontrem naqueles estabelecimentos, coisa que lhes assente bem. Mas a verdade é que a confecção de obra personalizada, está a passar à história. Alcobaça não é excepção.

Conhecemos um alfaiate, à moda antiga, que trabalhou no Porto para o autor destas notas e, especialmente, para o seu Pai, que ainda tem oficina na Rua Sá da Bandeira, ao Bolhão. Os mais de 70 anos do Sr. Miguel, não são visíveis no rosto e postura erecta, homem que desde os 11 anos é alfaiate. Segundo diz, não se imagina reformado e ainda faz as suas peças de roupa, com excepção das camisas. Aprendeu a arte muito novo, quase criança, acabara de sair da escola baptista, sem poder prosseguir os estudos. Foi ao longo dos anos que aprendeu os segredos da actividade. A dedicação, o empenho, a habilidade e até a afabilidade, valeram-lhe uma seleccionada e fiel clientela, hoje quase só da sua idade!, que ainda vem encomendar fatos ou, simplesmente, umas calças ou um casaco especiais. Enquanto conversámos, numa visita para matar saudades, admitiu que o volume de trabalho tem vindo a diminuir, mas que mesmo assim consegue viver. Gosta de conversar e, apesar de não ter muitos estudos.
-Um homem mandou fazer um fato no alfaiate. Este disse-lhe para vir fazer a prova daqui a oito dias. O homem foi lá e o alfaiate disse-lhe que ainda não estava bom pois que venha daqui a mais oito dias. O homem voltou na data marcada e o alfaiate disse-lhe, mais uma vez, que ainda não estava bem, devendo voltar daqui a oito dias. Então, o homem retorquiu, impaciente: O senhor demora mais a fazer um fato do que Deus o mundo! O alfaiate respondeu muito senhor de si: Mas depois se comparar um com o outro... verá que o fato ficou perfeito!.
CONTINUA