segunda-feira, 21 de novembro de 2011

VINHO


-UM BOM COPO (de vinho) EM
ALCOBAÇA?
-O FRANGO NA PÚCARA (fraco sucedâneo)
da Perdiz na Púcara
-HISTÓRIAS DO VINHO

FLEMING DE OLIVEIRA

Nos tempos que correm, não se faz mais bom vinho em Alcobaça (nem tinto nem branco, perdoem-me alguns esforçados produtores) e o prato apontado ao turista como típico da terra, o Frango na Púcara, é um triste sucedâneo de uma antiga Perdiz na Púcara.
Gosto de um bom copo, e de histórias relacionadas com o vinho que vou contar.
Uma lenda grega, como bonita é também esta lenda !!!, atribui a descoberta da videira a um pastor, de nome Estáfilo que ao procurar uma cabra tresmalhada a foi encontrar a comer parras. Colhendo os frutos da planta, até então desconhecida, levou-os ao patrão Oinos, que deles extraiu um sumo cujo sabor foi melhorando com o decurso do tempo. Assim, em grego, uma videira designa-se por Staphyle e o vinho por Oinos.
A mitologia romana, atribui a Saturno a introdução das primeiras videiras no Mundo.
Na Península Ibérica, é imputada a Hércules e terá sido inicialmente cultivada nos vales do Tejo e do Sado, cerca de 2000 anos a.C., funcionando como moeda de troca no comércio de metais. Mais tarde, ao fundar Lisboa, Ulisses terá usado o costume das suas viagens, oferecendo vinho, para assinalar as boas vindas.
Mas noutras regiões do Mediterrâneo, a origem do vinho encontra-se em muitas lendas e, desde tempos remotos, o vinho tem desempenhado papel de relevo em quase todas as civilizações. Fruto da videira e do trabalho (suor e sangue…) do Homem, não é ultrapassado por nenhum outro produto da terra. Repleto de simbologia, impregnado de religiosidade e misticismo, o vinho surge cedo na vida da Humanidade, tornando-se fonte de Lendas e Mitos. Expressões tão interessantes como
Dádiva dos Deuses, Sangue de Cristo, Essência da Vida, In Vino Veritas, Bonum Vinum Laetificat Cor Hominis. explicam a sua importância na Cultura Ocidental, no Direito, no Cristianismo e na Literatura, onde ocupou um lugar de destaque ao longo das eras. O interesse de expressões como aquelas, para a história da gastronomia, é, por demais. evidente. Mostram-nos a dicotomia existente no mundo romano entre o exagero, a extravagância e a imoderação de banquetes com orgias e os apelos à temperança e à racionalidade de pensadores como Séneca non facit ebrietas vitia sede protahit (isto é, a embriaguês não faz vícios apenas os evidencia), um estóico como Cícero optimum cibi condimentum fames (isto é, o melhor condimento é a fome) ou um Quintilhano.
O mesmo podemos dizer da Idade Média, aonde encontramos a alternância entre ascéticos conselhos médicos e os apelos à libertinagem.
Procura ser feliz ainda hoje, pois não sabes o que te espera no dia de amanhã. Toma uma taça cheia de vinho, senta-te ao clarão do luar e monologa: Talvez amanhã a lua me procure em vão.
O vinho pode ser encarado sob as mais diversas facetas, como um produto comercial, como uma mera bebida alcoólica que se bebe para esquecer, como símbolo de status e sofisticação ou como fonte inesgotável de prazer.
Não faço a apologia da bebida, muito menos dos excessos, nem me abalanço a falar deste tema numa perspectiva de enólogo ou de técnico, mas de um pequeno filósofo de horas vagas, leigo que chegou tarde, seguindo o conselho alguns bem mais competentes, como a minha Mulher. Um leigo que não tem pretensões de deixar de ser leigo, mas ainda obter algum estilo, embora correndo o risco de uma vez por outra, quando a Aninhas não está a ver, ficar emocionado. Gostaria de ser um virtuoso na arte de beber de vez em quando um Sirah, Esporão, ou um barca Velha!!!, percebendo os seus gostos, aromas e compartilhando alegrias com alguns amigos.
Pensamos, sonhamos e agimos de acordo com o que bebemos e comemos, escreveu Marinetti.
In Vino Veritas, é uma expressão antiga associada a mais uma lenda curiosa. É bastante conhecida, podendo entender-se que sob a acção do vinho prevalece a verdade e nesse caso o que se diz é mesmo sincero e espontâneo.
Um agreste povoado italiano vinha preocupando sobremodo as autoridades romanas que resolveram designar para assumir a paróquia, promissores padres da nova geração. Esperava-se assim conseguir mudar o sentimento dessa localidade, cujos habitantes se mostravam indiferentes aos assuntos religiosos. Indicado para fazer uma visita pastoral, o bispo da diocese verificou que o jovem padre era tímido nos sermões, actuando de forma acanhada e inibida. À guisa de resolver esse impasse, aconselhou o sacerdote que, antes de subir ao púlpito tomasse alguns cálices de vinho. O jovem padre seguiu de bom grado tão agradável sugestão, e bebendo uns copos, passou mesmo os limites da moderação. No término do seu inflamado sermão, recebeu efusivas felicitações, acompanhadas de admiração e pasmo por tão radical transformação de pregador. Tinha superado as expectativas e havia sido até demasiado veemente nas suas exortações, não havendo necessidade de clamar cinco vezes pelas profundas do inferno! É fora de qualquer dúvida que os eflúvios catalizadores do vinho tiveram o condão de romper as cadeias que prendiam os arroubos e impulsos do seu talento.

O Dr. Amílcar Magalhães, há bastantes anos, mas depois do 25 de Abril, quando certo tipo de vinho já se encontrava em declínio, resolveu engarrafonar para escoar mais fácil, rápida e a melhor preço, a sua produção de mais de cem pipas de vinho tinto dos Montes, tido por muito bom conforme as castas tradicionais. A esse vinho foi atribuído o nome de Vinho Montês e no bonito rótulo que se mandou desenhar, além de uns cachos de uvas vermelhinhas, aparecia o aforismo latino Bonum vinum laetificat cor hominis, o que traduzido para português significa que o bom vinho alegra o coração do homem. Nessa altura há mais de 25 anos,o vinho estava já numa fase de irreversível transição em termos de exigências dos consumidores, o vinho em garrafão ainda se vendia, embora cada vez menos, pelo que esta experiência não se revelou de grande sucesso, e que não durou muito tempo, em breve sendo abandonada.


FLEMING DE OLIVEIRA

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