“ASSÉDIO
SEXUAL”
FLeming de OLiveira
É grande a discrepância
entre os casos “identificados” em
estudos recentes e as queixas entradas na Comissão para a Igualdade no Trabalho
e no Emprego, em matéria de Assédio Sexual e/ou Moral no local de trabalho.
O
assédio no trabalho, tanto pode ser moral ou sexual. Assédio moral ocorre
quando os factos afetam a integridade física e moral da vítima. Verifica-se uma
situação de assédio sexual quando há um comportamento indesejado de natureza
sexual, expresso em forma verbal, não-verbal ou física.
Se
um em cada seis trabalhadores portugueses já foi vítima de assédio sexual e/ou
moral durante a sua vida profissional, como é que as queixas variam entre uma e
nove por ano?
Creio
que muito pode ser explicado pelas relações de poder e, no caso do assédio
sexual, com a “lei do silêncio”.
Todavia, pode-se ajuizar que o enquadramento legal não conferia aos lesados a
segurança, de modo a avançar com uma denúncia formal. Este apontamento não
pretende apresentar-se com um enquadramento jornalístico, onde se emitam
opiniões sobre a sua factualidade, mas como uma informação/divulgação de
conteúdo técnico-jurídico.
Até
1 de outubro de 2017, isto é, com a Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto de 2017,
não se previa mecanismo de proteção para quem fazia denúncias ou aceitava ser
testemunha. Era, por exemplo, possível uma empresa instaurar um processo
disciplinar sobre a matéria de queixa de assédio, ou a quem tinha testemunhado.
A nova Lei impede que o trabalhador que denuncia ou as testemunhas possam ser
alvo de sanções disciplinares pelas declarações que prestem num processo desta
natureza
A
Lei em apreço, trouxe outras mudanças significativas. Refira-se, para começar,
que se proíbem todos os tipos de assédio no trabalho, mesmo que não se
verificam no local de trabalho. Explique-se melhor, passou a ser tido em conta
o trabalhador vítima de assédio laboral, por email ou telefone.
Também
ficou inscrito no diploma que, se as falhas no desempenho de funções laborais
forem decorrentes do assédio, o despedimento é tido por infundado.
O
desgaste faz com que a pessoa/trabalhador deixe de ser capaz de desempenhar
adequadamente as suas funções pelo que leva, não raramente a baixas médicas.
Nesse sentido, a nova Lei imputa às empresas os custos relacionados com as
doenças profissionais decorrentes do assédio. Posto isto será necessário
acrescentar a depressão à lista de doenças profissionais, pelo que que ficou o
compromisso de o Governo avançar com a regulamentação dessa parte da Lei. Qualquer
doença profissional que resulte do assédio no trabalho, passa a estar abrangida
pelo regime das doenças profissionais e dará direito ao pagamento de
compensações pelos danos sofridos. Uma vez que o assédio passa a estar
expressamente proibido por lei, isso confere à vítima o direito a indemnização
por danos patrimoniais e morais. Através da nova Lei, o assédio passa também a
ser motivo de rescisão do contrato com justa causa pelo trabalhador. A Lei n.º
73/2017, de 16 de agosto de 2017, veio ainda implementar a elaboração de “códigos de boa conduta” às empresas com
mais de seis trabalhadores, com vista a prevenir e combater o assédio. Além
disso, veio obrigar a entidade patronal a instaurar procedimentos disciplinares
caso tenha conhecimento de uma situação de assédio no local de trabalho.
Os
custos serão importantes para as empresas, uma vez que as que forem condenadas
por assédio passarão, como sanção acessória, a constar de uma “lista negra”, expressão não meramente
figurativa, pois as condenações serão tornadas públicas no “site! da Autoridade para as Condições de
Trabalho.
O
resultado do trabalho desenvolvido pelo Centro Interdisciplinar de Estudos de
Género do ISCSP, para a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego,
verificou que 16,5% da população ativa portuguesa já foi alguma vez vítima de
assédio moral durante a sua vida profissional, e 12,6% sofreu uma qualquer
forma de assédio sexual no local de trabalho.
O silêncio dos
portugueses sobre o assédio sexual, e que está a ser exposto com ressonância no
estrangeiro, por vezes com aproveitamento inconfessável, com fundamentos e
motivações que desconheço e admito nem sempre serem claros, tem várias
justificações.
O
País é pequeno, o mercado de trabalho é ainda mais pequeno e as pessoas têm
medo de perder o emprego (cujas consequências são graves e de longo efeito) ao
exporem o que é frequentemente muito difícil de provar.
Por
outro lado, nem a sociedade em geral, nem a justiça, tendem ainda a valorar bem
a denúncia, antes pelo contrário, são as vítimas desincentivadas a
exporem o caso, alvo de críticas quando se expõem, correm o risco de serem “massacradas” na praça pública. A maior
parte dos empregadores, são pequenas e microempresas, o que dificulta a ação
por parte de lesados, pessoas sem acesso fácil aos “media”.
Em
Portugal, tem assim havido evolução na cultura social e na legislação, no
tratamento público da violência doméstica (caso diverso) e, mais recentemente,
na avaliação das decisões judiciais envolvendo essa mesma violência.
Mas
o silêncio sobre o assédio sexual, é revelador da força de uma cultura que
ainda “acata” este tipo de
tratamento, sobretudo das mulheres.
Enfim,
ao tentar prevenir situações de assédio, a nova legislação visa que os
lesados/trabalhadores se sintam mais protegidos para fazerem valer os
respetivos direitos.
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