O REGICÍDIO E ALCOBAÇA
A família real encontrava-se em Vila Viçosa, mas
acontecimentos políticos levaram o Rei a antecipar o regresso a Lisboa. A
comitiva régia chegou de comboio ao Barreiro para depois tomar o barco, desembarcando no Terreiro
do Paço, por volta das 17 horas de 1 de
fevereiro de 1908. Apesar do clima de enorme tensão, o Rei optou por se
deslocar em carruagem aberta com reduzida escolta, com o objetivo de demonstrar normalidade. Enquanto a família real
saudava os populares, a carruagem foi atingida por vários disparos. Um tiro
de carabina atravessou o pescoço do Rei, que morreu imediatamente.
Seguiram-se mais disparos, sendo que o Príncipe D. Luís Filipe ainda alvejou um
dos atacantes, antes de ser atingido mortalmente. D. Amélia, de pé, defendia-se
com um ramo de flores que lhe fora oferecido pouco antes, fustigando um dos atacantes
que subira o estribo da carruagem, gritando Infames! Infames!, numa imagem que ficou marcada para a
História. O Infante D. Manuel foi também atingido num braço. Dois dos
regicidas, Manuel Buíça e Alfredo
Costa, foram mortos no local.
A notícia do atentado
começou a circular em Alcobaça, apenas na manhã do dia seguinte/domingo 2 de
Fevereiro, trazida por pessoas que chegavam de fora. Acolhida a princípio com
as dúvidas, em breve pelas comunicações telegráficas e depois pelos jornais foi-se adquirindo a
certeza de terem sido assassinados a tiro o Rei e o Príncipe Herdeiro.
Era enorme a curiosidade
em saber pormenores do acontecimento, pelo que quando chegaram os jornais de
Lisboa a Valado de Frades, foram insuficientes para contentar as pessoas que os
aguardavam numa numerosa fila, lendo-os sofregamente e nalguns casos até os
revendendo.
Durante o dia, não se
falou noutra coisa na rua, aguardando com impaciência os republicanos que se
reuniam no Centro Republicano, os desenvolvimentos políticos, o que era
espicaçado por fantasiosos boatos. Houve quem assegurasse a presença de uma
esquadra inglesa de três navios, fundeada no Rio Tejo, para prevenir eventuais
motins populares. A este boato, que não correu apenas em Alcobaça, responderam
telegramas de Londres e Paris, publicados nos jornais de Lisboa no dia 4, e nos
quais isso foi expressamente desmentido.
Na segunda-feira,
estiveram encerradas a Recebedoria, Tribunal e outras repartições do Estado,
hasteada a meio pau a Bandeira Nacional na Porta de Armas do Quartel e no
edifício da Câmara Municipal. Várias pessoas vestiram de luto, os sinos da
Igreja da Conceição, Igreja Nova, Igreja de Santo António ou Igreja da
Misericórdia e do Mosteiro, dobraram a finados várias vezes por dia, e na
Câmara foi aberto um Livro de Condolências, assinado por populares. Disse-se
que houve mesmo dois republicanos que o assinaram.
Na sessão da Câmara
Municipal, foi deliberado enviar ao camarista de serviço de D. Manuel, o
telegrama: Muito rogo a V. Ex.ª se digne
fazer constar em nome da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de
Alcobaça, a profunda mágoa que lhe causou o inqualificável atentado de que
foram vítimas seu Augusto Pai e infeliz irmão e que em nome dos povos deste
Concelho se protesta contra tal procedimento, ao que aquele respondeu, dando parte que o novo Rei agradecia as
condolências enviadas.
A Alcobaça republicana,
embora não tenha aplaudido o regicídio com garrafas de champanhe ou palmas,
também não o repudiou expressamente. A sua postura, exprimindo o sentimento
republicano mais radical, aliás expressa no Semana
Alcobacense, decorria do sentimento que foi estranho e trágico o epílogo da
triste aventura, que à História de Portugal, passou com o nome de Franquismo.
Isto era apregoado franca
e pública pelos republicanos nas ruas, farmácias ou no Centro, num momento em
que a sensação agora de alívio como diziam, lhes dava a impressão de acordar de
um horroroso e agitado pesadelo, onde não era oprimir, censurar, mentir,
perseguir, vexar e ludibriar que se governa o povo Português. No seu discurso
de massas, embora se queixassem da falta de liberdade e da censura, os
republicanos usavam uma linguagem e uma imprensa virulenta onde parecia não
haver freios, como o Semana Alcobacense.
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