quarta-feira, 12 de julho de 2023

AGITAÇÃO EM FRANÇA

 

AGITAÇÃO EM FRANÇA

Cumprimentos aos nossos leitores

 

FLeming de OLiveira

 

A agitação social que recentemente se registou em numerosas cidades francesas, parece-me ser o momento para abordar a sua dimensão real e causas, antes de fazer o levantamento dos desafios que se colocam para levar a cabo uma nova política de integração sociocultural, cujas lacunas insofismavelmente se revelam.

Tendo em conta o efeito amplificador de imagens de incêndios e de violência que nos chegaram, era expectável títulos tão sensacionalistas como “A França a fogo e a fogo”, “Paris já está a arder”. Certos comentadores, aproveitaram a oportunidade para ajustar contas com o modelo de integração “à francesa”, sublinhando o carácter xenófobo e racista do país.

Falei um dia destes com um meu conhecido radicado em Marselha desde inícios de 1970 (bem sucedido empresário da construção civil, reformado e integrado com filhos, netos e 2 bisnetos, mas que nem por isso deixa de se assumir como português nado e criado no Marco de Canavezes, aonde vem todos os anos) cuja sorte como de muitos nossos compatriotas poderia ser eventualmente inquietante, no quadro destes acontecimentos. Pessoalmente não se sentiu inquieto. Os actos de violência, no seu entender, foram indiscutível e desproporcionadamente graves, gravíssimos, incontáveis automóveis queimados, edifícios públicos vandalizados, lojas saqueadas, polícias feridos e muitos de detidos. Os acontecimentos não tiveram dimensão política, étnica ou religiosa, que por vezes os “media” lhes quiseram atribuir para consumo interno ou externo, não se apercebeu corresponderem a um plano pré-concertado. A violência rebentou sem ligação entre grupos de adolescentes, imigrantes de segunda geração, que conhecem mal (ou nem conhecem) o seu país de origem e que atravessam uma crise de identidade. Alegam, conforme os casos, que não tem as oportunidades dos outros jovens franceses para estudar, para trabalhar (o que não é inverdade) ou dispor de habitação condigna (mas o problema não é apenas francês). O seu comportamento, reflexo desta frustração e alegadamente em direta retaliação à descriminação policial, não questiona, todavia, serem franceses de pleno direito.

O meu interlocutor, apesar da pequena escolaridade que obteve em Portugal, defende, talvez por isso, a educação como prioridade, a luta contra o insucesso escolar, o aumento das bolsas de mérito para os provenientes dos “bairros problemáticos”, a abertura do ensino profissional aos jovens em rutura escolar, e na boa conceção portuguesa, uma maior responsabilização dos pais.

Ele que vive numa casa confortável fruto de muita canseira, lado a lado com imigrantes espanhóis e franceses da pequena classe média com quem se encontra no café, gostaria de ver erradicados os blocos de cimento construídos por si e muitos portugueses nos anos de 1960 e 1970 para corresponder ao pico da emigração proveniente da Europa do sul.


Se hoje em dia não se sente discriminado socialmente como gosta de salientar, já não pode dizer o mesmo dos magrebinos que abundam em Marselha (mas que não frequentam o seu café), pelo que vê como necessária a criação de uma autoridade contra a discriminação e para a igualdade de oportunidades, munida de poderes sancionatórios.


Portugal sentiu-se tocado, mas não contaminado, pelos acontecimentos em França.

Portugal foi um país de emigração, nomeadamente para a França. Para milhares de compatriotas nossos que procuravam trabalho, fugiam à ditadura e à guerra de África, o “salto” foi difícil, mas o estabelecimento globalmente bem-sucedido, pelo que se constata que, tal como os descendentes, ocupam frequentemente posições de destaque.


A integração dos portugueses em França pode ser considerada um êxito, sem descurar problemas iniciais como os que conheci em 1966 no bairro de lata de Champigny (Paris) o que como burguês me chocou pelo inusitado, ou os que ainda podem subsistir. A França enfrenta hoje o desafio da adaptação da sua política de integração com o fim de satisfazer os que reclamam na sua maioria de forma pacífica, o desejo de serem franceses de pleno direito.  Vamos a ver os que pode acontecer nos próximos tempos.

Cumprimentos aos leitores de O AlCOA em França.

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