terça-feira, 24 de outubro de 2023

ANGOLA E MADAGÁSCAR PARA OS JUDEUS?

 

ANGOLA E MADAGÁSCAR PARA OS JUDEUS?

 

Em finais do século XIX, quando se falava da Herança Sagrada, tinha-se uma ideia difusa das colónias portuguesas. Invocando um Direito Histórico, decorrente da primazia da ocupação, Portugal reivindicava vastas áreas, embora em alguns casos, apenas dominasse feitorias em estreitas faixas costeiras e respectivos arredores.

Em Moçambique, o território que Portugal ocupava era substancialmente inferior ao de Angola. Na Guiné, a presença portuguesa resumia-se, quase, ao litoral. A partir de 1870, com o Congresso de Berlim, vingou a tese que o Direito Histórico não era suficiente e que a presença portuguesa impunha o alargamento rumo ao interior das possessões ultramarinas.

No século XIX, se era possível defender que tudo aquilo era português, também

que se podia vender, ceder Angola e ninguém era preso por isso. Com a I República, ressurgiu a oportunidade de se pensar na possibilidade construir um lar judaico em território português de além-mar. Angola era uma forte possibilidade.

Os massacres contra o povo judaico, nomeadamente nos países do leste europeu, e as dificuldades encontradas por Theodoor Herzl, para a edificação do Estado Judaico na Palestina, levaram a que alguns líderes judaicos começassem a estudar hipóteses para o estabelecimento da comunidade judaica para além da Palestina. Era urgente encontrar uma solução para que o sofrimento e a diáspora terminassem. Por outro lado, era preciso não esquecer que Portugal se debatia com a necessidade de ocupar efetivamente as colónias – a fim de contrariar as pretensões alemãs e inglesas – e tinha uma dívida ancestral com os judeus. Tendo em conta as dificuldades do povoamento de Angola com elementos naturais da Metrópole, a fraca capacidade financeira do Estado Português e razões como sentimentos de culpa, a colonização judaica aparecia como uma alternativa viável. Havia razões para a diminuta presença portuguesa em África, a que não era estranho a importância do Brasil, a resistência das populações locais e a inclemência do clima onde, afinal, os ganhos e empregos pareciam ser pouco aliciantes. África era terra para degredados, aventureiros ou militares. Para contrariar a diminuta ocupação, iniciaram-se expedições após expedições a partir de zonas costeiras de Angola ou Moçambique, destinadas a promover a exploração e abertura à civilização europeia do interior africano, algo influenciadas pelas grandes e romanceadas viagens de Livingstone e Stanley. Enfim, era necessário fazer face à concorrência, perante o risco de usurpação.

O projeto não se concretizou apesar de em 1913, aguardar apenas a votação das duas Câmaras, o que não tendo acontecido, acabaria por o inviabilizar. Aproximava-se 1914 e as sombras da guerra surgiam no horizonte. A Declaração Balfour, ainda antes do termo da I Guerra, abriria caminho para o único território possível e esfumaram-se os planos para uma Palestina Portuguesa, no planalto de Benguela.

Em 1885, Paul de Lagarde havia sugerido a deportação de judeus da Europa de Leste. Em 1926 e 1927, a Polónia e Japão estudaram a possibilidade de utilização de Madagáscar para resolver os seus problemas de excesso de população. A Polónia enviou em 1937 uma comissão a Madagáscar para apurar a viabilidade de forçar os judeus a emigrar para lá. Em 1938 e 1939, a Alemanha nazi tentou usar o Plano Madagáscar para arranjos de política financeira e expansionista, tendo Goering anunciado em 12 de Novembro de 1938 que Hitler ia sugerir o envio de judeus para Madagáscar. Heinrich Himmler defendeu o envio de judeus para Madagáscar, como solução mais suave e melhor que o bolchevique extermínio físico. A Alemanha ainda incluiu em Dezembro de 1939, o envio de judeus para Madagáscar como parte de uma proposta de paz enviada ao Papa. Sendo Madagáscar colónia francesa, a Alemanha não tinha maneira de aprovar a sua ideia, sem o acordo da França. O

início da II Guerra suspendeu este plano, sendo que, depois da derrota da França em 1940, a Alemanha não mais necessitaria de coordenar com o Ocidente o seu plano. Mas, como a Batalha da Grã-Bretanha não decorreu como planeado e com a decisão de Hitler no outono de 1940 de invadir a União Soviética, o Plano Madagáscar tornou-se inviável e foi posto de parte, pois a guerra contra a União Soviética traria mais territórios.

Sem comentários: