quinta-feira, 4 de outubro de 2012



TRABALHO MAS COM DIREITOS

Fleming de Oliveira

É indiscutível que o trabalho desempenha um papel de essencial relevância no homem social.
O trabalhador é visto como pessoa responsável, honesta, íntegra e comprometida com a sociedade e quem não trabalha (isto não é uma generalização, muito especialmente nestes dificeis dias que vivemos), acaba por ser reputado pelo amigo louro e de olhos azuis como o oposto. No entanto, e algo paradoxalmente, algumas pessoas que subiram  na vida a pulso, como se costuma dizer, são vistas com certa reserva pelos demais cidadãos que questionam impetuosamente como, quando, onde e a quem a pessoa ganhou, roubou, subornou ou sonegou para aí chegar tão alto ou tão depressa.
A sociedade portugues aceita o sucesso com limites, que ultrapassados neste momento de desconforto generalizado, leva a questionar a integridade, honestidade e o comprometimento do cidadão, com ela mesmo. 
Porém, ainda que o trabalho ajude uma pessoa a tornar-se  responsável e independente, a imagem de homem trabalhador ainda tem e terá grande impacto aos olhos da sociedade deste Portugal que somos.
A coberto do acordo com a Troika, o Governo (muito especialmente o anterior deu início a essa política) parece admitir, não rejeitar pelo menos, a desvalorização do trabalho (em Direito penal isto seria rotulado como dolo eventual), seja através da diminuição real dos salários, seja através do aumento do horário de trabalho, seja através da redução das indemnizações, em suma, um empobrecimento que irá ganhar uma dimensão mais significativa com os cortes nos Subsídios de Natal e de Férias.
Empobrecimento para quem trabalhou toda a vida, estabelecendo confiadamente um contrato com o Estado, e que vê agora esse contrato não ser cumprido, com argumentos que não compreende. Triste sorte!!!
Não, não me reputo ser um incansável e empedernido esquerdista, mas não repudio entender esta a ideia que tem justificado e possibilitado, através de um conjunto de medidas de austeridade, uma brutal desvalorização do trabalho em prol dos interesses do capital financeiro e do aumento de facto da exploração.
E, entretanto, vamos continuar a ouvir doutoralmente que é preciso trabalhar mais como a formiga que não a cigarra (o camarada Vasco não faria um discuirso melhor, obviamente ainda que de âmbito oposto), que vivemos acima das possibilidades e que é necessário ajustar (diminuir!!!) salários.
Mas o plano de desvalorização do trabalho não está a ser executado apenas de forma direta no salário, como resulta por exemplo do ataque à Segurança Social, o deteriorar de diversos apoios sociais, como o apoio aos desempregados (subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego) e os abonos de família. A degradação duma parte do salário e de direitos elementares pressionam o conjunto dos salários para baixo, por via da chantagem social, a expressão é dura mas rigorosa, e da pressão do desemprego.
Com as desculpas da crise, o discurso da inevitabilidade assume especial relevância, e esta desvalorização do trabalho representa uma perigosa regressão social.
Pelo caminho, o Poder envia algumas docinhos envenenados aos precários, como o subsídio de desemprego para os prestadores a recibos verdes.
Em vez de resolver o problema de centenas de milhares de portugueses a falsos recibos verdes, dá-se uma prendinha para as manter caladas sem se acabar com essas contratações. É certo que este dinheiro lhes faz falta, mas a nossa contestação não se resume ao subsídio de desemprego, outrossim a um trabalho sem direitos.

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