quarta-feira, 23 de maio de 2018

A EUTANÁSIA EM DEBATE (PRÓS E CONTRAS)

A EUTANÁSIA EM DEBATE
(PRÓS E CONTRAS)

FLeming de OLiveira

-A AR tendo agendado para o dia 29 de maio de 2018, o debate e a votação na generalidade das iniciativas legislativas do PS, do BE e do PAN, sobre a legalização da eutanásia, entendo que ninguém deve ficar alheio ao tema. Assim, preparei este texto para os leitores de o Região de Cister, que apreciaria que fosse base para promover um debate neste jornal, durante o qual se tentaria colher uma ideia do que entendem os leitores e os alcobacenses em geral.
-Independentemente da forma como é praticada, legalizada ou não, a eutanásia constitui matéria controversa, “fraturante” como se costuma dizer, existindo sempre irremediável e insanavelmente prós e contras, ainda que mutáveis com o tempo e a evolução da sociedade.
É recorrente denominar de fraturantes temas que suscitam grande polémica, questionam atitudes e comportamentos ou põem em causa valores tidos como indiscutíveis para amplos sectores da opinião pública e da sociedade. Também é recorrente serem controversos entre partidos políticos, organizações sociais, países e mesmo religiões. E porque atravessam partidos e grupos, da esquerda à direita, novos e menos novos, suscitam muitas vezes a necessidade de referendo, no pressuposto de que os programas eleitorais partidários, são comedidos pelo melindre dos temas, não suficientemente explícitos e os eleitores, quando votam, não os têm em conta. Alegando que temas, como por exemplo o aborto ou a eutanásia, são questões de pura consciência, tentam retirá-los da alçada dos políticos e entendem que é o povo que deve pronunciar-se sobre a opção legislativa.
Conheço um deputado (aliás do PSD), que entende, ao ser chamado a votar uma lei desta delicadeza e complexidade, jurídica, ética e moral, não se sentir para tal mandatado. E acrescenta que o PSD (CDS pediu e os restantes partidos aceitaram que a votação sobre a legalização da eutanásia seja feita um a um. Todos os deputados contam), não sufragou o tema nas últimas eleições legislativas, tal como os restantes partidos, e que a eutanásia não é matéria de consciência individual. Sendo assim, um tema fraturante quanto este deveria ser decidido num referendo nacional.
Errado!, entendo eu, embora sem uma convicção muito forte.
-Com referendo ou não, ao abordar a questão da eutanásia não posso esquecer a consciência de cada um, alicerçada no conhecimento disponível à luz da liberdade de decisão pessoal, com o apoio da orientação de quem honestamente esteja capacitado para uma orientação.
Sabendo-se que a nossa sociedade está fraturada/dividida, cabe ao poder político o dever de legislar sobre a temática, tendo em conta o conhecimento científico disponível e a disponibilizar as diversas dimensões ético-políticas. Compete ao Estado, através dos seus órgãos de poder e de administração, organizar o acompanhamento pedagógico para que os portugueses (ainda que através dos seus deputados), decidam com toda a liberdade a lucidez possível.
Certo!, entendo eu, embora sem uma convicção muito forte, podendo assim ser-me imputada mais uma das minhas contradições.
-A eutanásia consiste afinal em quê? No ato de facultar a morte sem sofrimento a um indivíduo cujo estado de doença é incurável, normalmente associado a um imenso sofrimento físico e psíquico."Eutanásia ativa" como um conjunto de ações que têm por objetivo pôr termo à vida, acertadas entre o doente e o profissional que vai realizar o ato.
"Eutanásia passiva" não provocando deliberadamente a morte, conjuntamente com a interrupção dos cuidados médicos, farmacológicos ou outros, leva o doente a falecer.
"Suicídio assistido", ocorre quando o doente provoca a sua morte, ainda que para isso disponha da ajuda de terceiros.
Em Portugal, a “eutanásia ativa” é considerada crime, previsto no Código Penal, embora configurável ou como homicídio privilegiado, ou como homicídio a pedido da vítima.
No primeiro caso, que tem por fundamento a diminuição sensível da culpa do agente, a pena da prisão é reduzida, quando comparada com a que se aplica ao homicídio simples, se ocorrer um dos motivos determinantes do autor nele previstos, alguns dos quais consistem em aquele ter sido dominado, ao cometer a conduta, por “compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral”.
No segundo caso, que constitui um tipo específico de homicídio com uma atenuação ainda maior da pena abstrata aplicável, o agente é “determinado por pedido sério, instante e expresso” da vítima. Considera-se que neste caso a culpa é diminuta, justificando a benevolência do legislador.
Entendo a nossa lei (por enquanto…) como equilibrada, porque se o suicídio é algo que não é punido em si, embora seja um mal pelo que quem ajuda a cometê-lo pratica um crime. Admito, todavia, como altamente improvável que, à luz deste quadro legislativo, alguém que levasse um amigo ou familiar a uma clínica na Suíça, onde se pratica legalmente suicídio assistido, pudesse ser acusado e punido quando regressasse a Portugal, porque levar alguém em viagem não é uma causa de morte.
Não tendo Portugal descriminalizado a prática da eutanásia e do suicídio assistido, admite todavia o “testamento vital”, que consiste na formulação em vida de um “documento unilateral e livremente revogável a qualquer momento pelo próprio, no qual uma pessoa maior de idade e capaz, que não se encontre interdita ou inabilitada por anomalia psíquica, manifesta antecipadamente a sua vontade consciente, livre e esclarecida, no que concerne aos cuidados de saúde que deseja receber, ou não deseja receber, no caso de, por qualquer razão, se encontrar incapaz de expressar a sua vontade pessoal e autonomamente”.
-O tema não é novo, nem os argumentos jamais serão decisivos.
Quem argumenta a “favor da eutanásia”, parte do princípio da autonomia (absoluta) da pessoa, na alegação do direito à autodeterminação, direito à escolha pela sua vida e pelo momento da morte. Uma defesa que assume o interesse individual acima do da sociedade que, nas suas leis e códigos, visa proteger a vida.
A eutanásia não defende a morte, outrossim uma escolha refletida (obviamente sem possibilidade de arrependimento) por parte de quem a concebe como melhor ou a única opção.
A dor, sofrimento e o esgotamento do projeto de vida, são situações que podem levar as pessoas a desistirem de viver e conduzem-nas a pedir o alívio da dor, a dignidade e piedade no morrer, porque não reconhecem qualidade na sua vida.
Muitos são também os argumentos (embora também não decisivos) “contra a eutanásia”, desde os religiosos, éticos, os políticos e sociais. Do ponto de vista religioso, a eutanásia é uma usurpação do direito à vida humana, um exclusivo reservado a Deus o único que concede e pode tirar a vida.  
Na perspectiva da ética médica, tendo em conta o “Juramento de Hipócrates”, segundo o qual se considera a vida como um dom sagrado, sobre a qual o médico não pode ser juiz, a eutanásia é considerada homicídio. Cabe pois ao médico, cumprindo o “Juramento”, assistir o paciente, fornecendo-lhe os meios necessários à sua subsistência.
-A eutanásia, um assunto que desde sempre tem sido discutido, afinal foi utilizada por povos primitivos, segundo alguns autores. No século XX na Europa (na Alemanha Nazi com grande impacto), usou-se este procedimento para eugenia, eliminando os que para a sociedade não seriam “prósperos ou úteis”.
Nem sempre um ser humano com uma determinada patologia grave quer morrer. Muitas vezes acontece o contrário, tenta lutar contra a Morte, aceita ficar diminuído desde que sobreviva, e aceita sobreviver mesmo que saiba ou sinta que a doença o levará um dia, não muito distante.
Contrariando a tendência de luta a todo o custo, em alguns casos surgem doentes que realmente estão cansados de viver, que não aguentam mais sentirem-se "um fardo", ou sozinhos, apenas acompanhados por um enorme sofrimento de ordem física, psíquica ou social.
Admito mesmo que um ser humano, ainda que a sofrer profundamente, se bem tratado, não peça a Eutanásia. Hoje em dia podem ser administrados analgésicos e outros fármacos que minimizam o sofrimento e efeitos da doença bem como intervenções técnicas, a uma pessoa em estado terminal.
-Talvez seja esta a esta altura para pensar que um dia podemos ser nós, um familiar ou um amigo próximo, a estar numa situação em que "não há mais nada a fazer".
Pessoas que se encontram nesta fase, sentem-se um peso pela doença e a necessidade de cuidados e pela preocupação e o cansaço estampados nos rostos daqueles que amam e estavam habituados a ver sorridentes.
Num país como Portugal, em que a morte tem perdido visibilidade, é excluída de práticas ancestrais, os familiares são afastados, as crianças não sabem o que é, os processos de luto são cada vez menos vividos e morre-se mais nos hospitais, no lar ou em casa dependente nos cuidados.
Porquê? Uns por opção e altruísmo, pelo manter do seu papel e estatuto social, como opção lúcida e reconhecida, outros por medo, por a família não aceitar ou não querer vivenciar essa última fase em que culmina a vida.
Num país em que esperança média de vida aumenta, em que a todo o momento se vende o light e o saudável, contrasta a realidade dos acidentes vasculares cerebrais como primeira causa de morte e as doenças de foro oncológico como segunda. Salvar, fazer uso dos meios, do conhecimento, dos dadores, de todos os recursos para salvar é lógico.
No entanto, os cuidados paliativos que visam a melhor qualidade de vida possível para o doente e para a família, pode ou não equivaler a definição de qualidade desses intervenientes, o que pode levantar dúvidas, despoletar as habituais polémicas associadas ao debate do tema. Quando se fala neste, as opiniões divergem, o debate acende-se e os extremos refutam com prós e contras.
Perante o tabu da morte e o afastamento da família como um elemento cuidador, existem inúmeros contextos e particularidades. A eutanásia continuará a suscitar grande controvérsia na sociedade, alinhando-se argumentos entre os que defendem a legalização e os que a condenam. Posto isto, entendo que há necessidade de fazer corresponder a moral à prática concreta da pessoa enquanto membro de uma sociedade e nos tempos que correm, com condicionalismos diversos e específicos, e refletir sobre essas práticas.
Afinal, e estamos todos de acordo, a vida humana é direito em qualquer sociedade.
Marcelo Rebelo de Sousa, reiterou que só se pronunciará sobre a eutanásia no fim dos trabalhos parlamentares.
-Ao ser confrontado com as declarações recentes do vice-presidente da Conferência Episcopal, Marcelo Rebelo de Sousa adiantou que “agora, neste momento, é o tempo de o parlamento se pronunciar, o parlamento irá pronunciar-se no dia 29 na generalidade e, depois, haverá, naturalmente, o processo próprio e eu esperarei. Quando me chegar às mãos qualquer diploma para eventual promulgação, veremos se chega ou não, eu aí pronunciar-me-ei”.
À pergunta se considera que a sociedade portuguesa já fez o debate pedido pela Igreja Católica, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu: “Porque estamos ainda num momento em que ocorre a discussão parlamentar, e vai ocorrer, como sabem no parlamento é uma discussão que envolve primeiro a generalidade, depois a especialidade e, se for caso disso, uma votação final global, vamos esperar serenamente”.
Aprecio de há muito o Professor MRS a sua postura e argumentos, mas não creio como entende a Conferência Episcopal que depois de muitas horas de debate parlamentar, com os conhecidos/estafados argumentos a favor e contra, os que não conseguirem fazer vingar a sua opinião, ficam minimamente satisfeitos ou convencidos.
Eu não ficaria.


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