segunda-feira, 17 de outubro de 2011

-A HERANÇA MOURISCA NA ANDALUZIA -OS MOUROS EXPULSOS DE GRANADA, AINDA TÊM AS CHAVES DA CASA QUE LÁ DEIXARAM HÁ 500 ANOS! -ATÉ AO ANO EM GRANADA!


FLEMING DEOLIVEIRA
Todos sabemos dos enormes, importantes e belos vestígios da presença mourisca em Espanha, nada comparáveis com os existentes em território português. Os califados da Andaluzia, foram muito mais importantes dos que houve entre nós, acrescendo ainda a circunstância de os mouros apenas terem sido expulsos pelos Reis Católicos, por alturas da chegada de Colombo à América (1492 d. c.).
Andar pela Andaluzia é deparar, a todo o tempo, com a esplêndida herança mourisca.
Nos últimos tempos, tem vindo à baila em Espanha um tema que reputo de interessante e que desconhecia totalmente, os filhos de al andaluz. Diz respeito a cerca de cinco milhões de marroquinos, descendentes dos mouros expulsos pelos Reis Católicos (Isabel, de Castela e Fernando, de Aragão) que pretendem que lhes seja reconhecido o direito à nacionalidade espanhola. Têm apelidos espanhóis, falam castelhano e, nalguns casos, ainda conservam a chave da casa que, há cerca de 500 anos, os seus antepassados, compulsivamente e com lágrimas, deixaram em Granada. Sobreviveram a guerras, emigrações, histórias de amores impossíveis e ódios insanáveis, sem perder o orgulho da memória, que é afinal o cordão que os liga à origem espanhola. Sendo para Zapatero, este o ano da Memória Histórica, chamam a atenção que se sentem mais uns tantos exilados de outra Guerra Civil.
Em 1490, prevendo a inevitável queda de Granada e antes de Boabdil sair para o exílio, choras como uma mulher o que não soubeste defender como homem, alguns destes mouros venderam as propriedades, cruzaram o Estreito de Gibraltar e foram começar uma nova vida, nas severas montanhas do Rif. Alguns anos depois, outros mouros, outrora tão abastados, mas menos previdentes, chegaram pobres e a pedir refúgio, após expulsos de suas casas, pelo Decreto de Isabel, a Católica, de 24 de Fevereiro de 1502, que lhes impunha a opção entre a conversão ou a expulsão. A ideia destes marroquinos, não é propriamente voltar a Granada, como rezavam as profecias andaluzes, mas uma reparação moral, numa altura em que instituições como a Santa Sé, assumem erros do passado e, pedem perdão por crimes e injustiças. Há uns 4 anos, o presidente da Junta Islâmica Espanhola, apresentou uma petição à Junta da Andaluzia, para ser reconhecido o direito preferencial à nacionalidade espanhola aos descendentes destes mouros expulsos. Note-se que a Lei de Estrangeiros, de 1985, conferiu um tratamento preferencial aos judeus sefarditas, equiparando-os aos ibero-americanos, portugueses, filipinos, andorrenhos, guineenses equatorianos e gibraltenhos, isto é, aqueles que tiveram uma relação, histórica ou de sangue, com Espanha. Todavia, esqueceram-se destes andaluzes, que eram mais espanhóis que quaisquer outros, pois viveram oito séculos na Península. Por isso, dizem que chegou o momento de reparar essa situação de grave e injusto olvídio. Segundo o movimento, não se preocupem os espanhóis que não correm o risco de ser invadidos, mesmo no caso de nos ser concedida a nacionalidade.
Felizmente, os descendentes destes andaluzies, vivem bem em geral e não precisam de emigrar. Pretendem, apenas, uma reparação, pela injusta expulsão, tal como aconteceu com os republicanos, no termo da Guerra Civil. Esta petição, no quadro da reparação histórica, não é uma ideia original, pois um historiador marroquino de origem andaluzie escreveu uma carta aberta, há cerca de 4 anos, ao Rei João Carlos I, coincidindo com os 500 anos do Decreto de Expulsão, solicitando a revogação dos Éditos de Expulsão e o reconhecimento público do não cumprimento das promessas de Castela, pois quando da capitulação de Granada, se repetiu por dez vezes a fórmula em que se garantiam os direitos destes andaluzies em permanecer para sempre na sua terra, se entregassem a cidade. A verdade é que uma década depois, foram expulsos e perseguidos pela sanha da Inquisição. Ainda hoje essa promessa, não cumprida, acarreta consequências nefastas nas relações hispano-marroquinas, que durante cerca de cinco séculos tem permanecido sob tensão, desconfiança e receio. Com a agravante de os sucessores de Isabel, a Católica, se preocuparem em fazer a guerra ao mouro, nos seus próprios lares.
João Carlos I nunca chegou a dar resposta à carta, que não terá apreciado, pois suspendeu a visita que estava programada a Tetuão, aonde vivem muitos descendentes andaluzies. A cidade foi refundada por um grupo de mouros andaluzies provenientes de Granada, após ter permanecido desabitada durante cerca de um século, em resultado da destruição causada pelas tropas de Henrique III, em 1399. Daí, ser também conhecida como a Filha de Granada, e reputada pelos regressados como o lugar ideal para respirar os ares de Espanha, cantada por poetas e trovadores como o paraíso perdido, onde se pode ter a alegria de nesse rincão de África, manter as tradições.
Atualmente, calcula-se que cerca de 13% dos seus habitantes, têm origem andaluzie e de acordo com um senso com cerca de 100 anos, foram encontrados centenas de apelidos espanhóis. Muitos destes habitantes, têm uma ligação afectiva importante a Granada, que visitam quando podem. Um deles contou na TV, numa reportagem que segui com muito interesse e de certo modo deu origem a estas notas, que ainda se lembra de os seus avós falarem de Granada, da esperança de um dia lá poderem voltar, reconheceu que se sente marroquino, mas parece-lhe ter duas mães, uma que o gerou (biológica) e outra que o adotou (afetiva).
Os contributos da cultura andaluzie à sociedade marroquina do litoral são incontáveis, pois o reino nazari (Granada) era dos mais avançados do mundo. Tudo isto foi perdido com a expulsão e quem ganhou, de certo modo, foi Marrocos. Os regressados de Granada chegaram com dinheiro para experimentarem novas culturas de cereais, promover avanços da medicina, implantar técnicas de construção civil, desenvolver a culinária, dar nomes a plantas e flores, e introduzir as armas de fogo nos exércitos. Também fundaram bibliotecas e trouxeram consigo a música. É bom não esquecer os muitos que durante oito séculos nasceram, viveram e morreram na península. Em 1492, capitularam perante os castelhanos e obrigados a regressar ao Norte de África, levaram riqueza, cultura e conhecimentos agrícolas que lhes permitiram prosperar.
A segunda leva de andaluzies chegou a Marrocos em princípios do século XVII, após novo Decreto de Expulsão assinado por Filipe III, Filipe II de Portugal.
Estima-se que entre as duas expulsões, foram cerca de 300.000 os que deixaram a Andaluzia e se espalharam pelo Norte de Africa, Marrocos, Argélia e até zonas da Africa subsariana.

FLEMING DE OLIVEIRA

2 comentários:

Gustavo Peres disse...

Fascinante a história, a era de esplendor dessa região. O que seria da península ibérica sem os mouros? Meu avó é de Andaluzia, nascido em Bérchules, Granada, um genuíno Pérez que se refugiou com os irmãos no início do século XX no Brasil. Tenho certeza que ele trouxe genes de mouros, eu, meu pai, meus tios, só falta colocar o "taqiyah" rsrsr

Eu, sem clone disse...

Eu e meu marido estivemos recentemente na Andaluzia. Apaixonei-me por aquela região e senti de perto como a ambição dos reis catolicos e de seus descendentes destruiu a vida de tantas pessoas de diversos credos que viviam em harmonia. E todos tinham o que comer, porque eram unidos enquanto nos outros paises, o povo passava fome e vivia sem higiene por causa da indole belicosa de seus soberanos. Estava procurando alguma informação a mais para inserir no meu blog e encontrei o seu aqui, com algumas respostas à perguntas que tenho me feito desde então: sobre os descendentes. Vou indicar o seu blog no meu post. obgda.