sexta-feira, 21 de outubro de 2011

À VOLTA (do prazer)DA GULA


Fleming de OLiveira
Creio que nem mesmo a nossa Igreja Católica, classificando-a como um dos sete pecados capitais, se preocupa com as razões que levam os fiéis a comer por vezes sem prazer, sem conseguir saciar aquilo que o pobre pecador apelida de fome.
Na verdade, o guloso nem tem consciência de que aquilo que para ele nem sempre é um problema, está selado desde suas primeiras horas de vida. Qualquer criança começa a conhecer o mundo através da boca.
Uma criança nasce, cresce e chora. Está com fome, com frio, um dorzinha, não consegue entender o que está a acontecer à sua voltaa. Fica assustada e confusa. Em qualquer uma dessas situações, a mãe pega-lhe, leva-a ao seio e ela acalma, sente-se bem de novo.
Quando o bébé chora, a mãe associa o choro à fome e mesmo que esteja saciado oferece-lhe mais uma vez o peito que é aceite de imediato como forma de carinho e aconchego caloroso.
E nós adultos, o que fazemos?
Sentimos fome, vamos `dispensa. Sentimos calor, vamos ao frigorífico. Estamos sozinhos, entediados, vamos buscar uma faca e um garfo. Não gostamos do noticiário da TV, vamos à geladeira.
Na realidade, para cada situação de insatisfação, solidão, depressão, buscamos a comida...
E quanto mais se come, mais se perde o controle, desencadeando um sentimento de frustração, ansiedade e culpa, gerando assim uma grande insatisfação pessoal e também com o mundo.
A gula pode ser encarada como um comportamento, excessivo, que se manifesta em planos como o emocional, sexual, social, ou financeiro.
A gula é, pois, um impercetível, mas muito importante monitorizador do viver de cada um, sugerindo o que precisa ser transformado, mudado ou substituído.
Sintetizando, caro leitor, a gula é um comportamento que co-existe com uma insatisfação total e irrestrita consigo próprio e a tentativa de encontrar um remédio para essa angústia, que desencadeia sentimentos de frustração e ansiedade que só se aplacam com o avassalador ataque ao seu objeto do prazer.
A característica da gula é engolir e não digerir.
Quantas vezes não digerimos o que nos acontece e, simplesmente, engolimos?
Vulgarmente está associada à comida e à bebida, mas também pode ser entendida como gula intelectual. O sentimento que está por de trás da gula é o de laborar abaixo das possibilidades, buscando uma compensação pelo que se acredita não ter. A sensação é a de não estar a fazer tudo o que o potencial permite, vivendo sem atender expectativas.
A atitude mental básica deste guloso consiste supor ter necessidade de aprender tudo.
Essa característica pode levar à ânsia de monopolizar, desejando um poder cada vez mais autocrático.
Qual será mais danosa?

Fleming de Oliveira

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