quinta-feira, 14 de dezembro de 2023

ESPECULAÇÃO E RACIONAMENTO EM ALCOBAÇA (1942)

 

 

 

ESPECULAÇÃO E RACIONAMENTO

EM

ALCOBAÇA (1942)

 

Fleming de OLiveira

 

 

A Câmara Municipal, em 16 de março de 1942, mandou distribuir um Edital, transcrevendo uma determinação da Secção contra o Açambarcamento e Especulação:

Os preços do feijão e grão, de largo consumo, estão a subir sem justificação por virtude especialmente da perniciosa influência de intermediários e compradores que espontaneamente oferecem preços incomportáveis à produção.

Torna-se necessário que as autoridades locais vigiem tais indivíduos e os processem nos termos do Decreto nº 29.964 por alterarem os preços normais do artigo. Alguns deles não estão coletados, nem compram por delegação de qualquer firma inscrita como grossista no Grémio dos Armazenistas de Mercearia, o que agrava o delito. O crime de especulação é punido com a multa de 500$00 a 100.000$00.

O racionamento era feito através de cupões individuais que conferiam direito a comprar pequenas quantidades de bens alimentares de primeira necessidade, bem como o petróleo para o fogareiro da cozinha. O racionamento do pão era especialmente gravoso pois correspondia a um quarto de pão por pessoa e por dia. Pedacinho de pão que ao chão caísse, era apanhado, beijado e sempre comido, recordava Inácio Catarino. Quando em sua a casa faltava a broa, pedia-se uma emprestada ao vizinho, devolvendo-lha após a cozedura seguinte, aliás como acontecia em quase todas as casas dos Montes. Antes do sistema de racionamento ser instituído, a situação era pior, pois formavam-se grandes filas de espera, junto aos estabelecimentos. Havia pessoas que, quando viam uma fila, alinhavam logo nela, sem indagar sequer o que estavam ali a dar, porque o quer que fosse era batalha ganha. O merceeiro tinha uma caderneta para cada chefe de família, onde estavam registadas as pessoas do agregado. Era mediante estes dados que a família tinha direito a um certo número de senhas e alimentos. Ocorreram casos em Alcobaça, em que o merceeiro, embora sujeitando-se a multa ou mesmo prisão, vendia na candonga produtos aos amigos ou a quem melhor os pudesse pagar. Até o papel higiénico faltava, pelo que como recordava Altino do Couto Ribeiro, até o jornal servia, o que uma vez lhe mereceu uma forte reprimenda familiar por ter utilizado uma folha com a imagem de Roosevelt.

Na vila de Alcobaça, as senhas eram levantadas na Câmara Municipal, onde funcionava a Delegação da Intendência Geral de Abastecimentos, sendo o Moita o encarregado, paciente e respeitado. Para o efeito formavam-se filas, nem sempre muito calmas ou pacíficas. Havia uma relação onde constava o nome e número de pessoas de cada agregado familiar. Cada pessoa tinha direito, por exemplo, a 1dl de azeite ou 1 kg de açúcar, por mês. O café, quando não faltava, era adoçado com rebuçado. Nos meios rurais de Alcobaça utilizava-se o arrobo, mosto de uva branca, de preferência Fernão Pires, como se fazia em casa de Maria Moreira, nos Montes, tia de Ana Maria Magalhães (Fleming de Oliveira). O mosto, era colocado numa panela grande a ferver, e ia-se mexendo bem, até engrossar. Depois, guardava- se para ser utilizado para barrar pão, num estilo de marmelada ou adoçar o café.

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