sexta-feira, 11 de janeiro de 2019


NO TEMPO DE PESSOAS “IMPORTANTES” COMO NÓS
50 Anos da História de Alcobaça Contada através de Pessoas


Almeida, Firmo Ferreira de, nasceu em Alcobaça em 1900, sendo o irmão mais velho de Ernesto Ferreira de Almeida.
Casou com Laura Ferreira de Almeida, com quem teve a filha Maria Fernanda. Firmo de Almeida e família moravam na Av. João de Deus, em Alcobaça, tendo sido Chefe da Secretaria Notarial de Alcobaça, aliás a única que havia na terra.
Pessoa de bem, educado, democrata e republicano, escrevia com elegância, dispunha de dotes oratórios e foi autor de peças de teatro, algumas representadas pelo Rancho do Alcoa (de que também foi diretor) destacando-se o êxito Por bem, por Alcobaça.
-A 28 de Setembro de 1974, em reunião na sede do MDP/CDE, nas instalações que ocupou no 1º. piso da Ala Norte do Mosteiro, foi proposto e decidido um ataque ao Jornal de Alcobaça, propriedade de Tarcísio Trindade, o que veio a ocorrer com a destruição dos exemplares, à saída da tipografia. O jornal interrompeu a publicação, anunciando que só a retomaria com a normalização da vida política local e quando houver garantia que o civismo de quem milita em campos ideológicos diferentes, é capaz de respeitar as ideias dos outros.
Mais tarde, em pleno PREC, alguém bem intencionado defendeu num plenário popular, um ataque a O Alcoa. Firmo de Almeida, opôs-se de imediato, dizendo que o Pe. Siopa (administrador do jornal) já tinha demonstrado bem não se meter em política, nem o jornal. Porém, a insistências no sentido de se tomarem medidas de afrontamento ao jornal, Firmo de Almeida apelou ao bom senso, pois não desejava ver menos apreciado o filho do Sr. Francisco Siopa, seu amigo de outros tempos. Mais tarde, um pouco desencantado com o decurso do processo revolucionário, Firmo de Almeida confidenciou ao Pe. Siopa que não era isto que queríamos. E quero dizer-lhe que passei para o seu lado. Os senhores é que tinham razão, isto não serve a ninguém. Vamos ficar pior que antes.
-Sobre Firmo de Almeida, J.C., escreveu em Silhuetas de Alcobaça que,
Este amigo que nestas rimas foco,//No volume é de fracas proporções,//Porém, pelo saber e outras razões,//Por muito bom notário eu não o troco.
Entre os mais competentes o coloco,//Pois, a formados mesmo, dá lições//Se nisto ofendo peço mil perdões//À digna classe notarial que invoco.
Além do mano que é procurador//E goza aqui de muita simpatia,//Também o meu focado é diretor,
Dum grupo que nos enche de alegria//- Um folclórico rancho de valor –//Que a nossa terra lustra e prestigia.
-A propósito de Firmo e Ernesto de Almeida, Maria Fernanda, filha de Firmo de Almeida, lembra que estes dois irmãos eram filhos de Maria José Ferreira, irmã de João Ferreira da Silva, que teve uma loja muito conhecida e afreguesada em Alcobaça.
Do meu avô só quase sei que tinha vindo de Mendalvo, bastante novo e teve uma loja de tecidos e mercearia que servia de paragem às camionetas dos Capristanos, que vinham ou seguiam para Lisboa. Aí foi mais tarde e durante algum tempo o escritório de solicitador do meu tio Ernesto. Meu avô tinha a sua casa na Rua Frei António Brandão, mesmo em frente às antigas casas dos Magistrados e do Quartel dos Bombeiros e lá sempre viveu o meu tio Ernesto e depois o filho José Manuel, conhecido em Alcobaça por ser jogador de xadrez. Do meu pai sei que só casou aos 33 anos quando já era ajudante de notário e trabalhava para o Dr. Palha Pinto. Sempre se deu bem com os notários e por eles foi elogiado, assim como pelos advogados e inspetores, como por exemplo o Dr. Múrias. Aliás, quando em determinada altura o Dr. Laborinho, da Marinha Grande, quis seguir o notariado veio pedir-lhe explicações.
Firmo de Almeida dedicou-se à política, mais que o irmão. Eram democratas o que na altura não era nada bem visto pelo regime corporativo. Aspiravam a uma democracia de tipo ocidental, do género da Inglaterra, França ou Estados Unidos. Comunistas não eram, nem nunca as nossas casas foram revistadas. De comunistas nada tinham, embora se pense que ser de esquerda era ser marxista. Os seus amigos mais próximos, eram democratas como Carlos Campeão, Belo Marques da Silveira, Moreira (de Évora), Seiça, David Pinto e José Furtado. Além destes também eram seus amigos, embora não politicamente falando, o Tenente-Coronel Brusco, João Leitão, Puga, Acácio Santos, Tomás Correia, Henrique Trindade Ferreira, Domingos Arinto, Manuel Almeida e, obviamente muitos mais. Meu pai andou nas campanhas eleitorais de Norton de Matos e de Humberto Delgado.
Sem exageros acho que meu pai e tio eram pessoas generosas, tendo aquele participado em instituições como o Jardim de Infância Desvalida Álvaro Possolo, meu tio como irmão do Hospital que todos os dias visitava. Mais tarde, aquando do 25 de abril meu pai que era Vice-Provedor da Misericórdia, foi destituído do cargo, onde nada ganhava.
Antigamente as festas dos Santos Populares eram muito importantes e animadas e a receita revertia para o Hospital que muito precisava de apoios materiais. Os Santos Populares, festejaram-se durante anos na GAFA, depois junto ao Jardim Escola quando era no Rossio. Montavam-se barracas de comes e bebes, de serviço de chá e bolos, com géneros oferecidos e servidos por senhoras da vila. A barraca com mais popularidade era talvez a da Quermesse, cuja organização dava muito trabalho e onde o meu pai e tio ajudaram durante muitos anos, frequentemente até altas horas da noite na organização e noites de funcionamento.
Firmo e Ernesto de Almeida foram diretores do Rancho do Alcoa e dos Serraninhos, talvez para corresponderem ao desejo de um grupo de rapazes alcobacenses que gostavam que a sua terra tivesse um rancho. Destaco entre eles Gilberto Magalhães Coutinho, os irmãos Joaquim e Orlando Pedrosa Carvalho e José Coelho. A direção artística esteve a cargo de Mercedes e seu marido Carlos Campeão. Tenho ideia que na formação do Rancho estiveram também os senhores Moreira de Évora, o Sr. Seiça e que os desenhos dos fatos foram feitos pela Srª. Dª. Irene Sá Natividade. Quando o Rancho saía apenas aceitava o pagamento da despesa da viagem. O meu tio Ernesto teve uma grande quantidade de afilhados de casamento, cerca de 20 ao que se dizia pois nem ele sabia ao certo, era pessoa alegre, extrovertida e faladora mais que o meu pai, mais calmo e calado, que gostava de ler bons livros e tinha uma grande coleção de policiais. Enfim foi um autodidata que lia todos os dias O Século e o República. Escrevia versos com facilidade e quando era preciso discursar fazia-o muito bem.
Maria Fernanda acrescenta que o meu pai e irmão foram dois bons alcobacenses e posso dizer que souberam viver o lema que o meu pai escreveu para o Rancho Alcoa: Por Bem Por Alcobaça.

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