DUAS BOMBAS ATÓMICAS SOBRE O JAPÃO *sessenta anos depois*
Fleming de Oliveira
Decorreram sessenta anos sobre o termo da última Guerra, na Europa e no Pacífico. Creio que nenhum momento da nossa era, marcou tanto o mundo. Daí, o seu permanente fascínio, a perene fonte inesgotável de ensinamentos e invocações, com interesse e actualidade.
Neste Agosto de 2005, decorreram sessenta anos sobre o lançamento das bombas sobre Hiroxima e Nagasaki, depois da rendição da Alemanha nazi, enquanto que os japoneses continuavam a lutar no Pacífico. Muito se escreveu e disse sobre este acontecimento, que continua envolto em secretismo e controvérsia.
Segundo reza a história, o Presidente Roosevelt, no início da guerra tinha-se inicialmente oposto ao bombardeamento de centros populacionais civis alemães, pois o bombardeamento implacável de civis através do ar, tem chocado a consciência da humanidade.
Todavia, o esforço da guerra deu lugar, em breve, a uma dura e inelutável realidade, o bombardeamento de populações civis por um lado ou outro dos beligerantes, tornou-se prática comum. Destaquem-se os casos de Tóquio ou Dresden. Os ataques, que em determinada altura mereceram a oposição de Roosevelt, passaram a ser considerados como uma opção estratégica para por fim rapidamente ao conflito. A história é feita de decisões para harmonizar o presente, mas com consequências imprevisíveis para o futuro. Em Setembro de 1944, Roosevelt e Churchill tinham chegado a acordo quanto à necessidade de bombardear o Japão, eventualmente com a Bomba A. Falecido Roosevelt, o seu sucessor H. Truman, parece não ter partilhado das suas dúvidas, e declarou após saber do êxito do lançamento das duas bombas que este é o acontecimento mais notável da História. Gastamos dois mil milhões de dólares na maior aposta científica da História e ganhamos!
Numa perspectiva bem diferente, o físico J. Robert Oppenheimer depois de saber os efeitos de um ensaio nuclear no Novo México, Los Álamos, em 16.06.1945, havia prevenindo aquilo que ele e outros já sabiam, reconhecendo o perigo, mas encontrando uma grande esperança, sabíamos que o mundo não voltaria a ser o mesmo.
Numa guerra em que os japoneses estavam de corpo e alma fanaticamente envolvidos, pareceu durante algum tempo que esta era a única forma de obter a sua rendição, doutro modo era tida por impossível, acabar com a guerra à custa de menor perda de vidas dos boys.
Mas passados estes anos todos, as coisas revelam-se um pouco diversas do que pareciam ser de início. A grande esperança do uso das armas nucleares é algo difícil de conceber, ainda hoje. As bombas foram mesmo necessárias contra o Japão?
Revelações posteriores demonstraram que nos dois meses anteriores ao lançamento das bombas, o Japão já negociava ou queria negociar um tratado de paz com os americanos.
A Guerra Fria ainda não começara, mas já se vislumbrava, e a URSS já ensombrava as perspectivas de paz do pós-guerra. A URSS acabava de entrar em guerra com o Japão e preparava-se para exigir um controlo parcial deste, como fizera com a Alemanha, o que repugnava aos ingleses e americanos. A Bomba além de actuar directamente sobre o Japão, era uma mensagem clara à URSS sobre o poderio americano. A 14 de Agosto de 1945, o Imperador tinha aceite as condições dos Aliados e, entre lágrimas, declarou que é meu desejo que vocês, meus ministros, cedam à minha vontade e aceitam a resposta aliada.
O Japão estava derrotado, rendera-se. Mas a política de guerra japonesa ainda teve um estertor, quando um grupo de oficiais radicais tentou um golpe de estado fracassado, por não ter qualquer apoio popular, para assumir o poder e continuar a guerra. Por isso à distância de sessenta anos, pode-se afirmar com alguma segurança que o bombardeamento atómico sobre Hiroxima e Nagasaki não foi determinante para pôr termo à Guerra. A entrada da URSS na Guerra e a certeza que esta estava irremediavelmente perdida, parece ter sido decisivo para o Imperador do Japão. Chefes militares de enorme peso e prestígio como Eisenhower ou MacArthur, eram de opinião que não havia justificação para o bombardeamento atómico e a consequente carnificina. Se as explicações sobre a utilização em Hiroxima são refutáveis, por maioria de razão parece acontecer quanto a Nagasaki. Se a demonstração do poder da bomba acabava de ser feita, porque repetir logo a seguir tamanha crueldade?
Com alguma perverso cinismo, há quem argumente que os americanos não teriam utilizado a bomba contra os alemães, mas contra os japoneses por os considerarem uma raça inferior…
Também aqui se aplica a máxima romana ai dos vencidos.
O vencedor é aquele que define as regras. Os Tribunais de Nuremberga e Tóquio foram, naturalmente, tribunais de vencedores, e nunca Aliado definiu como crimes de guerra, o bombardeamento atómico das cidades japonesas. Na guerra, as razões morais são importantes, sem dúvida, mas são de peso relativo perante outras, não são os americanos uma excepção.
Sessenta anos passados, pode-se dizer, a muitos títulos, que de certo modo o mundo é mais seguro hoje em dia, que no tempo da Guerra-Fria. Na sequência de acordos sobre o controlo de armamento, há boas esperanças, de as potências nucleares reduziram substancialmente os seus arsenais.
Mas em contrapartida, existem incertezas em países como a Coreia do Norte e Irão.
Sendo o terrorismo um ameaça latente e incontornável, há sempre o risco de poder ser utilizada uma bomba suja, ou seja, um explosivo convencional acoplado a material radioactivo, proveniente de fontes médicas ou industriais. Segundo li recentemente, os especialistas definem estas armas como armas de perturbação em massa, devido ao pânico e perturbação que podem causar. Mas mais grave que isto, seria o ataque surpresa, uma bomba terrorista armada com urânio altamente enriquecido ou plutónio roubados, transportado num meio de difícil detecção, como um camion ou barco. Creio que hoje em dia, salvaguardadas as devidas proporções, podemos imaginar melhor o resultado de um deflagar em Manhattan de um engenho nuclear rudimentar transportado dentro de um camion, que mataria num instante mais de meio milhão de pessoas.
Depois de nos anos oitenta, antes da queda da URSS, ter sido excomungada a energia nuclear, veja-se com razão o caso de Chernobil, parece voltar a ser considerada uma realidade promissora, por ser segura, limpa, investindo certos países biliões em programas tecnológicos de ponta.
Na nossa vizinha Espanha, onde não acontece tudo de errado em certas opções, que nada têm a ver com progressismos ético-sociais, o segredo do investimento não radica na energia eólica ou solar, porque apesar da sua incontestável limpeza ecológica, os seus custos são superiores às das centrais de fuel ou de gás.
Segundo tenho lido, o segredo reside no baixo preço da energia nuclear, o que confere à Espanha margem para subsidiar as suas energias renováveis e mantê-lo baixo a energia custa à indústria cerca de 30% menos que em Portugal. Sendo o nosso País tão dependente do petróleo, e por ser um dos poucos países que tem urânio, entendo sem entrar com foice em seara alheia, que a questão das fontes de energia em Portugal, deveria ser analisada rapidamente e com rigor, partindo do pressuposto que o nuclear não está mais excomungado.
E o que acontecia nesse longínquo 1945, em Portugal? O fim da Segunda Guerra foi logo marcado por celebrações espontâneas a 8 e 9 de Maio de 1945, em várias locais do País. Salazar, receando uma nova ordem internacional desfavorável às ditaduras da Península, ainda afastadas da ONU, anunciou uma revisão constitucional, após a rendição incondicional da Alemanha. Promete eleições tão livres como na livre Inglaterra. A censura alargou a malha, prepararam-se golpes que falharam como outros antes. A oposição organiza-se incipientemente, é fundado por Mário Soares e outros, o MUD - Movimento de Unidade Democrática, que veio a ser ilegalizado em Abril de 1947. Às eleições de 17 de Novembro, livres como na livre Inglaterra, só concorrem as listas da União Nacional. O clima de agitação e de expectativa de mudança ainda se prolongam até ao início de 1949, com a campanha presidencial de Norton de Matos, mas o início da Guerra-Fria permite ao regime controlar a situação, impor a sua lei, que veio ainda a durar quase mais 30 anos.
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