(I)
Processos urgentes de intimação no processo administrativo
I-Processo de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões
Fleming de Oliveira
(A)-INTRODUÇÃO
-Começaremos estas notas, pelos Processos de Intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões.
-Embora se saiba que este processo deixou de ter uma natureza instrumental, essa dimensão é ainda uma característica do processo.
-Ou seja,
apesar de se tratar de um processo principal,
de ter sido abandonada a referência ao uso dos meios administrativos e contenciosos que outrora constava expressamente da LPTA,
a verdade é que este processo não constitui jamais um fim em si mesmo.
(B)-ABORDAGEM FUNCIONAL
-Usualmente o interessado, socorre-se deste processo, quando pretende:
-(a)-Atacar ou defender-se da Administração, e para isso precisa de saber e conhecer o procedimento administrativo (os pareceres, as informações técnicas, as vistorias que foram levadas a cabo, os despachos, etc…); ou
-(b)-Conhecer os registos e arquivos administrativos, para outros fins legítimos.
(C)-ENQUADRAMENTO SUBSTANTIVO
-(a)-Revela-se interessante, salvo melhor opinião, proceder a um prévio enquadramento substantivo desta questão, ou seja, dizer qual é o direito ou os direitos subjacentes a este expediente processual.
-Por princípio, o direito à informação cabe aos directamente interessados no procedimento administrativo a que se reportam os pretendidos elementos (cfr. arts. 61.° e 62.° do CPA) e, por extensão, tal direito cabe ainda a quaisquer pessoas que provem ter interesse legítimo no conhecimento dos elementos que pretendam (cfr art. 64.°/ 1 do CPA).
-No nosso entender, aliás não pacífico, como Advogado ou munícipe/administrado, o direito à informação, não se deve restringir à mera consulta do processo, de documentos não classificados ou emissão de certidões, mas ir mais longe, como o saber o andamento do procedimento, haja sido tomada ou não decisão definitiva.
-Para além destes casos, concretamente nas situações de informação extra-procedimental, pode-se aceder aos registos e arquivos administrativos nas condições referidas no art. 65.° do CPA (Princípio da Administração Aberta), devendo atender-se às regras e limitações constantes, entre o mais, do DL. n.º 46/2007, de 24 de Agosto (LADA).
-Os pedidos, a que nos referimos, têm de ser satisfeitos pela Administração no prazo de 10 dias (cfr. art. 61.º/ 3 do CPA) contados nos termos do seu art. 72.º (não contínuos, cfr. artº 144ºdo CPC) sendo que, no que toca à informação extra-procedimental, nos casos previstos pelo art. 14.º, n.º 4 da sobredita LADA se refere que, em situações excepcionais,
se o volume ou a complexidade da informação o justificarem, o prazo pode ser prorrogado, até ao máximo de dois meses, devendo o requerente ser informado desse facto com indicação dos respectivos fundamentos no prazo máximo de 10 dias.
(D)-ENQUADRAMENTO PROCESSUAL
-Importa a este respeito referir, o seguinte:
-(1)-É necessário existir um requerimento a suportar a pretensão, a pedir a consulta do processo, o documento ou a informação.
-(2)-A recusa da Administração perante um dever legal de decidir, a qual pode consubstanciar-se num acto de recusa expressa total ou parcial, ou numa conduta omissiva (tácita) relativamente ao pedido, tudo no prazo regra de 10 dias,
sendo que a intimação também pode ter por objecto uma notificação ou publicação insuficientes.
-(3)-No referente ao que se poderia designar por critério de oportunidade, cumpre salientar que a intimação para a consulta de documentos ou passagem de certidões deve ser apresentada no prazo de 20 dias, após o decurso do prazo (regra) de 10 dias, sem que o requerimento do interessado (para exercer o seu direito) tenha sido satisfeito. Tem sido entendido que o prazo 20 dias é um prazo de caducidade, com natureza substantiva, que se conta nos termos da alínea c) dos artigos 279.º e 296.º do C. C.
-(4)-No que toca ao patrocínio judiciário e representação em juízo, é obrigatória a constituição de advogado, sendo bastante a intervenção na parte passiva um licenciado em Direito, com funções de apoio jurídico, devidamente credenciado.
-(5)-A competência territorial do tribunal afere-se pela sede da autoridade requerida cfr. art. 20.º/4 do CPTA.
-(6)-Quanto à legitimidade processual do lado activo pertence às pessoas individuais e colectivas que intervieram administrativamente (apesar de na apreciação do mérito se poder entender que inexiste legitimidade por razões substantivas) e ao M.P. (cfr. art. 104.º/ 2 do CPTA), bem como aos que pretendam fazer uso de interesses difusos, sendo que quanto à legitimidade passiva importa sublinhar que aqui, em desvio à regra geral da legitimidade referida no art. 10.º do CPTA, o processo na nossa opinião
deverá ser dirigido contra o órgão requerido e não contra a pessoa colectiva.
-(7)-No que toca aos articulados, a lei prevê naturalmente o requerimento inicial (o qual deve ser concomitantemente acompanhado pelo requerimento feito à Administração, devendo aqui ser alegado o indeferimento ou a omissão de decisão no prazo legal) bem como um articulado de resposta.
-(8)-No que se refere às diligências complementares, consistem numa fase probatória, a qual só em casos extraordinários implicará a produção de prova oral.
-(9)-Quanto à decisão da processo, ela consubstancia-se numa pronúncia de natureza condenatória da Administração a determinar a consulta, a prestação da informação ou a passagem de certidão requerida, devendo determinar-se na mesma, o cumprimento no prazo máximo de 10 dias.
-De relevar, é a circunstância de o juiz poder impor à Administração sanções pecuniárias compulsórias, que só operarão quando haja incumprimento da decisão jurisdicional, sem justificação aceitável, o que implica uma averiguação da culpa no incumprimento (cfr. arts. 108.º/ 2 e 169.º do CPTA).
-A última nota a referir, a este propósito, é que poderá ainda ocorrer responsabilidade civil, disciplinar e criminal pelo incumprimento da decisão jurisdicional, nos termos do estatuído no art. 159.º do CPTA.
-(10)-No que diz respeito à impugnação jurisdicional, a mesma não apresenta qualquer especialidade de relevo relativamente ao recurso que é interposto dos processos urgentes. O efeito é suspensivo, (efeito-regra geral), seguindo-se os termos dos processos urgentes, tendo assim de se alegar imediatamente no prazo de 15 dias, nos termos do art. 147.º do CPTA).
-(11)-No que toca às consequências do incumprimento da decisão jurisdicional importa nesta sede ainda relevar, para além do que já se disse supra (9), que
no nosso entender (aliás não pacífico)
a decisão pode ser objecto de execução, devendo ser-lhe aplicáveis as regras relativas à execução por prestações de facto fungíveis, admitindo-se intervenções subrogatórias.
-Cumpre aqui recordar que, apesar de ser o nosso entendimento o que sentido que vimos de dar nota a V.Exª, alguma jurisprudência parece insistir na impossibilidade de execução jurisdicional destas decisões como se referiu supra.
-(12)-O efeito mais importante deste tipo de processo é, nos termos do prescrito pelo art. 106.º da CPTA, o de ter implicações sobre os meios processuais principais.
-Isto quer dizer que existe um efeito interruptivo do prazo de impugnação do acto de que se trate. Com efeito, se o requerimento for efectuado nos termos do art. 60.º do CPTA (casos aí referidos que abrangem os fundamentos do acto e sempre no prazo de 30 dias),
o prazo de impugnação só começa a correr após o cumprimento da decisão de intimação, após o trânsito em julgado do indeferimento do pedido ou, finalmente, com o trânsito em julgado da decisão que extinga a instância por satisfação do requerido. Tudo isto com a compreensível excepção de situações em que se deva entender que o uso desta faculdade é levado a efeito com fins meramente dilatórios (quiçá, situações de má-fé).
(E)-NOTAS FINAIS
-(1)-No nosso entender, face a uma recusa expressa, o interessado não está imediatamente confrontado com um acto administrativo que deve impugnar, mas antes seguir a via
da intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões
-(2)-No nosso entender não é este o meio adequado se se quiserem actos ou informações, documentos, certidões ou consulta de processos administrativos, para efeitos cíveis ou criminais.
-Para isso existem os respectivos meios na lei processual civil e na lei processual penal.
-(3)-No nosso entender mesmo ainda que se deixe escapar o prazo de 20 dias que para apresentar o requerimento inicial em juízo nem tudo está precludido.
-Basta, apresentar outro, aguardar os 10 dias, podendo-se então recorrer novamente a juizo.
-(4)-Pode com
vantagem política
ser usado este meio para fins de afirmação de uma pretensão no plano gracioso.
-(5)-O processo corre em férias judiciais.
-(6)-Nos processos de intimação para a prestação de informações, consulta de processo ou passagem de certidão, a lei estabelece uma isenção de custas, cfr. art. 73º-C/ 2/ b do CCJ, estando, portanto, isentos de custas quer o requerente, quer o requerido do pedido de intimação (trata-se de uma isenção objectiva);
-(7)-Dado a pretensão não envolver a prática de actos administrativos, este processo tem similitude com as acções administrativas comuns que visam a adopção de simples actuações.
-Pode, pois, dizer-se que esta forma de intimação
corresponde a uma espécie de acção administrativa comum urgente, mediante a qual se faz valer por forma mais célere o direito a prestações que, se não houvesse urgência nem fosse possível a adopção de um processo simplificado, seriam accionadas segundo a forma da acção administrativa comum.
-(8)-Para finalizar e mais como Advogado e menos como administrado, pensamos dever referir que esta forma processual, na maior parte dos casos, tem efeitos que ultrapassam o seu mero objectivo legal, por outras palavras, tem efeitos que extravasam o seu objecto.
-Na verdade, quando o mesmo se intenta, está-se a avisar a Administração (referimo-nos sobretudo aos casos de informação procedimental) que esta irá previsivelmente ver a sua actuação discutida em tribunal, com risco de ganhar ou perder.
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