sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

-TEÓFILO BRAGA E ALCOBAÇA (1915)-

-TEÓFILO BRAGA E ALCOBAÇA (1915)-

Fleming de Oliveira
Em 27 de Setembro de 1915, o Presidente da República Teófilo Braga, veio a Alcobaça presidir à inauguração de um importante certame. Já tinha prometido fazer a visita, mas por várias razões fora sempre adiada, o que causava incómodo nos dirigentes do Centro Republicano, que algo desmoralizados e com conflitos muito pessoais entre si, necessitavam de um estímulo vindo de fora.
Tendo partido de Lisboa, numa carruagem salão, atrelada ao comboio-correio, Teófilo Braga era aguardado por alguns republicanos na estação de caminho de ferro de Valado dos Frades.
Sendo esta a primeira vez que um Presidente da República se deslocava a Alcobaça, a expetativa era grande. Ao longo do percurso do Valado de Frades até aos Paços do Concelho havia pessoas nas janelas engalanadas e na rua, que batiam palmas e davam vivas à República (estas em menor número). Teófilo Braga não era o dirigente republicano mais apreciado em Alcobaça, pois não obstante a sua idoneidade cívica e cultural, era-lhe imputado não ter tomado parte ativa no 5 de Outubro. Por outro lado, também havia em Alcobaça quem não estivesse de acordo com o seu apoio, tido por exagerado e despropositado, à Lei da Amnistia já que dos cerca de 3.000 monárquicos por ela beneficiados, só uns 20 viriam a ser considerados como chefes, dirigentes ou instigadores e, portanto, a sofrer a pena de condenação, que consistia na expulsão do território da República pelo tempo que lhes restar cumprir, não excedendo contudo os dez anos.
Apesar do seu passado radical, não reuniu consenso para chefiar o Governo Provisório ou assumir a Presidência da República. O facto é que seria ele o Presidente do Governo Provisório da República e mais tarde Presidente da República. Mas era este o Chefe de Estado que iria ser recebido em Alcobaça.
Ele mesmo registou que surge o 5 de Outubro, proclama-se a República e, inesperadamente, achei-me saudado nas ruas de Lisboa por uma multidão ansiosa, quase delirante, que me tratava pelo “Senhor Presidente”. A ilusão depressa se converteu, confrangedoramente, em realidade. Não tardou que algumas centenas de excelentes pessoas me entrassem pela porta dentro pedindo-me entrevistas, autógrafos, empregos, subsídios e, até, dinheiro emprestado. Não havia dúvida: eu era, para todos os efeitos, o Presidente da República.
A passagem pelo poder não lhe foi agradável a este inteletual, atendendo à luta travada entre os chefes das formações partidárias que existiam ou iriam nascer a partir do PRP.
Após a receção na Câmara Municipal, o Presidente da República e comitiva, de que fazia parte o Ministro do Fomento, foram almoçar ao Clube Alcobacense, cujo salão fora ornamentado por senhoras da melhor sociedade, republicana. A Banda dos Marinheiros da Armada, tocou alguns números patrióticos e populares durante o banquete servido pelo Hotel Central. Pelas 16 horas, realizou-se a inauguração da Exposição de Pomologia, Flores e Plantas Ornamentais, no Claustro de D. Dinis, afinal a razão principal da visita presidencial.
Aguardavam o Presidente, além das autoridades civis e militares (a Igreja não se fez representar), 7 internados do Asilo dos Velhinhos Maria e Oliveira que se podiam deslocar, crianças do Asilo da Infância Desvalida e um grupo de raparigas do campo da zona da Cela, envergando trajes regionais e um rancho folclórico que executou um número da Estremadura.
Serviu de cicerone à comitiva presidencial, Manuel Vieira Natividade, um dos principais responsáveis pela organização da Exposição.Terminada a visita, Teófilo Braga, dirigiu-se ao Asilo dos Velhinhos Maria e Oliveira, para cumprimentar a fundadora e elogiar a obra que, como sublinhou não conhecia nenhuma igual e visitou ainda, em passo apressado, o Jardim-Escola João de Deus, o Hospital da Misericórdia e o Posto Agrário.
À noite, decorreu uma sessão solene no Claustro de D. Dinis, já que aí teve lugar a Festa dos Frutos. Além da Banda dos Marinheiros da Armada, atuou a Banda de Infantaria 7.
As honras da noite, couberam, de certo modo, a Manuel Vieira Natividade, que fez a conferência intitulada A Poesia dos Frutos. Farmacêutico de profissão, que não talvez por devoção, a sua farmácia, situada no Rossio, era ponto de encontro das pessoas gradas da terra, republicanas mas não só.
A sessão cultural prosseguiu com uma récita de versos de Bulhão Pato e António Correia de Oliveira e, terminou, com um discurso do Ministro do Fomento, Manuel Monteiro, que não perdeu a oportunidade de o entremear a apologia da República, com a homenagem a Alcobaça histórica e agrícola que engrandece o povo rural e promove o seu desenvolvimento.
O Presidente da República e comitiva, passaram a noite no chalet do Diretor da Companhia Fiação e Tecidos de Alcobaça, pois o Hotel Central não oferecia as necessárias condições de segurança, tendo a guarda sido feita de noite pelo corpo privativo de bombeiros daquela unidade fabril.
Mais tarde, aquando do falecimento de Natividade, Teófilo Braga que o tinha em elevada consideração, exprimiu-se do modo seguinte, que transmitiu à família:
Manuel Vieira Natividade consagrou o seu talento literário, artístico e crítico e também os seus estudos arqueológicos, históricos e económicos à glorificação monumental de Alcobaça. Compete-lhe a divisa que para si se impôs o quinhentista Ferreira:
Eu desta glória só fico contente,
Que a minha terra amei e a minha gente.




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