-TEÓFILO BRAGA E ALCOBAÇA (1915)-
Fleming de Oliveira
Em 27 de Setembro de 1915, o Presidente da República Teófilo Braga,
veio a Alcobaça presidir à inauguração de um importante certame. Já tinha
prometido fazer a visita, mas por várias razões fora sempre adiada, o que
causava incómodo nos dirigentes do Centro Republicano, que algo desmoralizados
e com conflitos muito pessoais entre si, necessitavam de um estímulo vindo de
fora.
Tendo partido
de Lisboa, numa carruagem salão, atrelada ao comboio-correio, Teófilo Braga era
aguardado por alguns republicanos na estação de caminho de ferro de Valado dos
Frades.
Sendo esta a
primeira vez que um Presidente da República se deslocava a Alcobaça, a
expetativa era grande. Ao longo do percurso do Valado de Frades até aos Paços
do Concelho havia pessoas nas janelas engalanadas e na rua, que batiam palmas e
davam vivas à República (estas em menor número).
Teófilo Braga não era o dirigente republicano mais apreciado em Alcobaça, pois
não obstante a sua idoneidade cívica e cultural, era-lhe imputado não ter
tomado parte ativa no 5 de Outubro. Por outro lado, também havia em Alcobaça
quem não estivesse de acordo com o seu apoio, tido por exagerado e
despropositado, à Lei da Amnistia já que dos cerca de 3.000 monárquicos por ela
beneficiados, só uns 20 viriam a ser considerados como chefes, dirigentes ou
instigadores e, portanto, a sofrer a pena de condenação, que consistia na
expulsão do território da República pelo tempo que lhes restar cumprir, não
excedendo contudo os dez anos.
Apesar do seu passado radical, não reuniu consenso para
chefiar o Governo Provisório ou assumir a Presidência da República. O facto é
que seria ele o Presidente do Governo Provisório da República e mais tarde
Presidente da República. Mas era este o Chefe de Estado que iria ser recebido
em Alcobaça.
Ele mesmo registou que surge o 5 de Outubro, proclama-se a República e, inesperadamente,
achei-me saudado nas ruas de Lisboa por uma multidão ansiosa, quase delirante,
que me tratava pelo “Senhor Presidente”. A ilusão depressa se converteu,
confrangedoramente, em realidade. Não tardou que algumas centenas de excelentes
pessoas me entrassem pela porta dentro pedindo-me entrevistas, autógrafos,
empregos, subsídios e, até, dinheiro emprestado. Não havia dúvida: eu era, para
todos os efeitos, o Presidente da República.
A passagem pelo poder não lhe foi agradável a este
inteletual, atendendo à luta travada entre os chefes das formações partidárias
que existiam ou iriam nascer a partir do PRP.
Após a receção
na Câmara Municipal, o Presidente da República e comitiva, de que fazia parte o
Ministro do Fomento, foram almoçar ao Clube Alcobacense, cujo salão fora
ornamentado por senhoras da melhor sociedade, republicana. A Banda dos
Marinheiros da Armada, tocou alguns números patrióticos e populares durante o
banquete servido pelo Hotel Central. Pelas 16 horas, realizou-se a inauguração
da Exposição de Pomologia, Flores e Plantas Ornamentais, no Claustro de D.
Dinis, afinal a razão principal da visita presidencial.
Aguardavam o
Presidente, além das autoridades civis e militares (a Igreja não se fez
representar), 7 internados do Asilo dos Velhinhos Maria e Oliveira que se
podiam deslocar, crianças do Asilo da Infância Desvalida e um grupo de
raparigas do campo da zona da Cela, envergando trajes regionais e um rancho
folclórico que executou um número da Estremadura.
Serviu de
cicerone à comitiva presidencial, Manuel Vieira Natividade, um dos principais
responsáveis pela organização da Exposição.Terminada a visita, Teófilo Braga,
dirigiu-se ao Asilo dos Velhinhos Maria e Oliveira, para cumprimentar a
fundadora e elogiar a obra que, como sublinhou não conhecia nenhuma igual e
visitou ainda, em passo apressado, o Jardim-Escola João de Deus, o Hospital da
Misericórdia e o Posto Agrário.
À noite,
decorreu uma sessão solene no Claustro de D. Dinis, já que aí teve lugar a
Festa dos Frutos. Além da Banda dos Marinheiros da Armada, atuou a Banda de
Infantaria 7.
As honras da
noite, couberam, de certo modo, a Manuel Vieira Natividade, que fez a
conferência intitulada A Poesia dos Frutos. Farmacêutico de profissão, que não
talvez por devoção, a sua farmácia, situada no Rossio, era ponto de encontro
das pessoas gradas da terra, republicanas mas não só.
A sessão
cultural prosseguiu com uma récita de versos de Bulhão Pato e António Correia
de Oliveira e, terminou, com um discurso do Ministro do Fomento, Manuel
Monteiro, que não perdeu a oportunidade de o entremear a apologia da República,
com a homenagem a Alcobaça histórica e
agrícola que engrandece o povo rural e promove o seu desenvolvimento.
O Presidente
da República e comitiva, passaram a noite no chalet do Diretor da Companhia Fiação e Tecidos de Alcobaça, pois o
Hotel Central não oferecia as necessárias condições de segurança, tendo a
guarda sido feita de noite pelo corpo privativo de bombeiros daquela unidade
fabril.
Mais tarde,
aquando do falecimento de Natividade, Teófilo Braga que o tinha em elevada
consideração, exprimiu-se do modo seguinte, que transmitiu à família:
Manuel Vieira Natividade consagrou o seu talento literário,
artístico e crítico e também os seus estudos arqueológicos, históricos e
económicos à glorificação monumental de Alcobaça. Compete-lhe a divisa que para
si se impôs o quinhentista Ferreira:
Eu desta glória só fico contente,
Eu desta glória só fico contente,
Que a minha terra amei e a minha gente.
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