terça-feira, 4 de abril de 2017

A I REPÚBLICA EM ALCOBAÇA

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(I)


AS SEQUELAS
SUMÁRIO:
(1).A Acalmação. As Chapeladas. Um Duelo à Pistola-(2).Felicitações a D. Manuel II e Reintegração da Vereação-(3).Festas, Romarias e um Par de Bandarilhas-(4).A Luta Armada vs. Combate Político-(5).A Companhia de Fiação e Tecidos de Alcobaça-(6).Paiva Couceiro e o Prior de Turquel. A Mãe Soberana-(7).A República em Portugal e Espanha.
-1-A ACALMAÇÃO.
AS CHAPELADAS.UM DUELO À PISTOLA-

Com 19 anos, e a forma trágica e sangrenta como chegou ao trono, D. Manuel II colheu, de início, alguma simpatia popular.
Mas isso não era suficiente.
O rei, que não fora preparado para tal, começou por demitir João Franco que falhou a tentativa de governar à inglesa, isto é sem Parlamento, e nomear um governo, presidido pelo Alm. Francisco Joaquim Ferreira do Amaral (no que ficou conhecido como Governo de Acalmação) que, embora tenha conseguido acalmar, momentaneamente, os ânimos, teve efémera duração.
Demitido o governo de João Franco, foi efetuado um não muito diligente inquérito que, ao longo dos dois anos seguintes, veio a apurar que o regicídio fora cometido por membros da Carbonária, o qual estava concluído nas vésperas do 5 de Outubro.
Entretanto, tinham sido descobertos mais suspeitos de envolvimento direto, sendo que alguns estavam refugiados no Brasil e em França e dois, pelo menos, tinham sido mortos pela própria Carbonária, ao que constava.
O ex-Ministro das Finanças Manuel Afonso Espregueira, esteve envolvido em duras polémicas parlamentares, sofrendo violentos ataques de vários deputados da oposição, inclusive monárquica, que o acusavam de conflitos de interesses na gestão das finanças públicas, como um empréstimo que contraiu em Paris, dando como garantia os rendimentos do monopólio dos fósforos e o protecionismo que aparentou em relação ao Banco Lisboa & Açores, ao qual estivera ligado. No Tempo de Reis, Republicanos & Outros. A I República em Portugal & Alcobaça.
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O ataque mais feroz foi desferido pelo Deputado José Caeiro da Mata, do Partido Regenerador, que o acusou de burla e apelidou de criminoso, numa sessão plenária de 10 de Marco de 1909, por causa de um empréstimo à Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses da qual fora diretor geral e onde permanecia como consultor.
A questão acabou num duelo à pistola que, embora proibido por lei, foi presidido pelo Conde de Penha Garcia, travado de madrugada em Monsanto, respeitando os preceitos antigos em que cada um dos contendores, ilustres e honrados deputados, estava respetivamente acompanhado por dois padrinhos, ambos Pares do Reino e cumprida a distância de 15 passos do outro e de que saíram ilesos. A 25 de Abril de 1909, a maioria parlamentar abandonou os trabalhos, invocando a circunstância de Caeiro da Matta, ao regressar à Câmara dos Deputados após o duelo, não ter apresentado desculpas pelo sucedido. Seguiu-se novo duelo, também sem ferimentos, entre Caeiro da Mata e o líder da maioria parlamentar, Manuel António Moreira Júnior, mas esta continuou a retirar-se da Câmara sempre que Caeiro da Mata pedia para usar da palavra.
Em resultado, o governo de Sebastião Teles foi obrigado a demitir-se, o que nada ajudou a monarquia.
Este incidente foi acompanhado em Alcobaça com indiferença e escárnio pelos republicanos, que num telegrama enviado à Câmara de Deputados, assinado por Santiago Ponce y Sanchez, com a anuência de Sebastião Vazão, J. Ferreira da Silva, entre outros, repudiava e ridicularizava o incidente (não foi possível apurar o conteúdo concreto deste telegrama).
Os partidos monárquicos continuavam a desgastar-se em querelas e divisões, enquanto o Partido Republicano ia ganhando terreno, apesar de as eleições serem frequentemente viciadas, os votos comprados, sendo a chapelada uma fraude muito vulgar.
As eleições, não motivavam, normalmente, o interesse popular. No Concelho de Alcobaça, os eleitores não sabiam se existia acordo entre os diversos grupos políticos concorrentes, nem isso era explicado pelos caciques. Sabia-se que existia paz, mais do que isso, uma completa e absoluta indiferença. Diziam os republicanos que dos candidatos que se propunham ao sufrágio, nenhum era da terra, afinal ilustres desconhecidos, mas que, mesmo assim, eram eleitos com o apoio dos caciques (civis e clericais).
Quem eram os candidatos ministeriais?
Isso era um segredo ciosamente reservado (até ao fim) a uns poucos amigos. Esta indiferença, sinal de decadência, explicavam os republicanos, era resultado dos enganos sofridos e que eles um dia, no poder, iriam remediar. Era uma dura

experiência, feita de repetidas e amargas deceções que levavam ao marasmo e à descrença política do povo.
Combater por quem?
Porque partido ou porque princípio, se na confusão caótica dos partidos monárquicos, era difícil distinguir a cor dos estandartes? Visto que este era o estado do espírito público em relação à política, aos políticos do rotativismo, a oposição republicana clamava pela salvaguarda do decoro dos princípios, prometia sempre que um dia seria diferente…(mas foi?), recusando que à sombra da indiferença popular, o ato eleitoral fosse transformado numa farsa ridícula pela chapelada.
Quando em abril de 1908, o representante do governo tentou adiar em Lisboa, por um dia, o escrutínio eleitoral, o povo reagiu, revoltou-se, reivindicando a tutela e guarda das urnas, seguindo-se luta com a Guarda Municipal em cuja posse se encontravam, de que resultaram 14 mortos e inúmeros feridos.
Muitos anos mais tarde (obviamente noutro contexto), Humberto Delgado aceitou envolver-se numa eleição presidencial, sabendo que as cartas estavam marcadas. A explicação que ele próprio deu, filia-se numa expressão atribuída a Napoleão:on s'engage et puis on voit.
E, efetivamente, envolveu-se profundamente na campanha presidencial. Naturalmente que as eleições de 1958 foram viciadas. Delgado, confiava numa reação de indignação geral, que não surgiu.
Pessoas próximas do candidato encolhiam os ombros, quando ele denunciava a fraude: Em Portugal as eleições foram sempre viciadas, até no tempo da Monarquia.
-2-FELICITAÇÕES A D. MANUEL II E REINTEGRAÇÃO DA VEREAÇÃO-
O Presidente da Câmara, José Maria Furtado dos Santos, convocou uma sessão extraordinária para 6 de maio de 1908, dia em que se realizava em Lisboa, o juramento e aclamação de D. Manuel II, tendo proposto que se lhe dirigisse um telegrama de saudação, fazendo votos para que o seu reinado seja o início duma época de paz e prosperidade para a Nação.
Foi aprovado por unanimidade.
A ata foi assinada não apenas pela vereação, mas por outras pessoas mais ou menos anónimas que assistiram à sessão.
Em resposta, foi recebido um telegrama assinado por D. Manuel II/Manuel Rei a agradecer à Câmara Municipal as felicitações.
Tendo a vereação municipal sido reintegrada, a sessão de 24 de fevereiro de 1908 contou já com a presença dos vereadores que haviam sido destituídos pela ditadura

franquista, pelo que se enviou um telegrama assinado por José Furtado dos Santos /Presidente, Brito, Pereira dos Santos, José Rino, Sousa e Epifânio da Franca /vereadores/vogais, ao Presidente do Conselho Alm. Ferreira do Amaral, manifestando-lhe quanto a Câmara Municipal se congratulava por o País haver regressado a normalidade constitucional dos negócios públicos da Nação.
-3-FESTAS, ROMARIAS E UM PAR DE BANDARILHAS-
Os interesses da generalidade dos alcobacenses não se reduziam, naturalmente, aos assuntos da grande ou pequena política ou à contestação ao regime monárquico.
As feiras, romarias, touradas, circos, concertos da Banda e outros divertimentos ocupavam um espaço importante, nos parâmetros das disponibilidades populares, que eram bem diversas de uma família para outra.
Em agosto de 1909, havia grande entusiasmo pela realização de uma corrida de touros, na praça da Vila, e na qual um aficionado da Golegã irá montar um dos cornúpetos. Contrariamente ao que seria de esperar, pois não fora anunciado, e para satisfazer vários pedidos de amigos e admiradores, o vereador a cavaleiro Vitorino Froes, também participou nesta corrida de touros, sendo muito aplaudido.
Outro atrativo irresistível (pelo menos assim se anunciava nos cartazes distribuídos pela Vila), era a presença do famoso Monas, que irá lidar com bandarilhas alguns dos bichos propostos ao castigo dos arrojados turistas. Não deixava de ser um chamariz, o acessível preço das entradas, 240 reis para o sol e 160 reis para a sombra, bem como de 1$000 reis para os camarotes.
As touradas constituíram um divertimento muito usual e apreciado na Vila de Alcobaça enquanto houve Praça de Touros, ao qual compareciam famílias.
Em agosto de 1922, realizou-se na Praça de Touros de Alcobaça com muito público, entre o qual se distinguiam senhoras e cavalheiros que vieram da Nazaré, uma vacada com dez animais de um ganadeiro de Almeirim, na qual tomaram parte amadores da vila de Alcobaça e de Torres Novas.
Antes do início do espetáculo, houve alguma confusão entre o público, pois a organização não assegurou o respeito pela marcação dos lugares, especialmente os da sombra.
As vacas, embora mal tratadas (uma deles parecia sofrer de uma pata), permitiram um aceitável trabalho por parte dos amadores da lide apeada, o que já não aconteceu com o trabalho do cavaleiro Roberto Cunha, porque as vacas que lhe saíram, não se prestavam para a lide a cavalo e fugiam prontamente. Isto motivou protestos do público e do cavaleiro, que anunciou depois de espetáculo, numa taberna da Vila onde se reuniu com uns amigos que o quiseram obsequiar com

lanche, que não voltava a tourear em Alcobaça, se as vacas não fossem previamente sorteadas.
Por sua vez, o amador Arnaldo Valério, de Torres Novas, teve azar, pois a sua montada nervosa, tal como ele mesmo, chocou com uma vaca, caiu sobre ela e matou-a, a qual veio a ser adquirida por José Pereira da Silva Rino (presente na Praça), para distribuir a carne pelo Hospital, Asilo de Infância Desvalida e vários pobres indicados pelo regedor.
Os bandarilheiros que vieram da Benedita, bastante novos e com pouca prática, mostraram apenas que eram valentes, o que lhes valeu simpatia do público, enquanto que os de fora, também amadores, agradaram e receberam ovação. Dos forcados de Torres Novas, salientaram-se quatro, pois os restantes apesar da vontade de fazer boa figura, não o conseguiram, tendo um deles ficado ferido no rosto e numa clavícula, embora sem grande gravidade. Assistido no Hospital, teve alta antes do jantar, a tempo de ir confraternizar com amigos e admiradores.
No mês seguinte, realizou-se outra corrida de touros, tendo como cabeça de cartaz o amador caldense, António Emílio Geraldes Quelhas, que envergava uma vistosa casaca à portuguesa. A Comissão que explorava a Praça de Touros de Alcobaça, tornou público a devido tempo através da imprensa e cartazes afixados na Praça, no escritório de Manuel Carolino e estabelecimento de Abílio da Silva Ramalho, onde se vendiam os bilhetes de ingresso que, desta vez, garantia os lugares, de modo a evitar abusos e que os compradores de bilhetes de sol, não fossem para a sombra.
Esteve animada e concorrida a feira anual de S. Simão, para que contribuiu o esplêndido soalheiro tempo de novembro, embora frio. Fizeram-se importantes transações, tanto em gado, como em artigos de comércio como louças. Vendeu-se grande quantidade de castanha e frutos secos. No Rossio, achava-se montada uma barraca de fantoches proveniente de Leiria, que deve ter feito bom negócio, especialmente pela afluência da pequenada. A vacada, deixou satisfeitos os aficionados do costume. Enfim, foi uma feira cheia, muito do agrado dos alcobacenses, onde não faltou a endiabrada batota à custa de incautos, apesar de atenta vigilância policial.
-4-A LUTA ARMADA VS. COMBATE POLÍTICO-
Apesar dos sucessos eleitorais alcançados pelo movimento republicano, o setor mais radical do PRP advogava a luta armada como o meio de derrubar o regime e assumir o poder.
Foi esta fação que saiu vitoriosa do Congresso do PRP realizado em 23/25 de Abril/1909. O PRP inscreveu-se nas fraturas culturais que dividiam a sociedade portuguesa. As estatísticas do século XX, demonstram que o Sul estava muito

desligado da Igreja, e foi precisamente aqui que o PRP mais expandiu a sua influência. Por outro lado, quem estava irritado com a governação, independentemente das suas crenças e ideias, começou a votar nos republicanos. O período que decorreu até à revolução de 5 de Outubro, foi marcado por uma forte instabilidade e agitação político-social, com várias ameaças de sublevação pondo a revolução em risco.
O diretório, composto por Teófilo Braga, Eusébio Leão, José Cupertino Ribeiro (comerciante natural de Pataias, radicado em Lisboa que, como referimos atrás, fez uma oferta ao Hospital, de lençóis e guardanapos, que de vez em quando repetia, pois nunca esqueceu a sua origem que apreciava citar, mas onde não deixou descendentes segundo se sabe), Basílio Teles e José Relvas, recebeu o mandato de fazer a revolução. As funções logísticas relacionadas com a preparação do golpe foram cometidas a elementos mais radicais. O comité civil era formado por Afonso Costa, João Chagas e António José de Almeida, enquanto que Cândido dos Reis liderava o comité militar. António José de Almeida ficou encarregado de coordenar as sociedades secretas, como a Carbonária, a Maçonaria e a Junta Liberal, dirigida por Miguel Bombarda, a quem se ficou a dever uma importante e bem sucedida ação de propaganda republicana junto da burguesia.
A monarquia portuguesa, não o era uma mais no sentido tradicional do termo. Desde 1834, o regime português era encarado como uma comunidade soberana de cidadãos, apenas limitados pela lei, e que aceitavam a existência de um chefe de Estado, embora de natureza dinástica, e com poderes bem delimitados na Carta/Constituição.
Vitorino Magalhães Godinho destacou que, os reis e as cortes portuguesas a partir do século XV sempre conceberam o Reino de Portugal como uma república no sentido clássico, um governo em que, independentemente da origem do poder dos governantes, estes regiam o Estado tendo em conta o bem público, de uma maneira regular e legal, sem arbítrio pessoal. Mais tarde, sobretudo a partir do século XVIII, acrescentou-se a esta ideia de república o princípio da participação dos cidadãos no governo, através de instituições representativas e em nome da soberania da nação. A monarquia constitucional portuguesa, no século XIX, foi esse tipo de república. Portugal era, neste sentido, republicano muito antes de 1910.
A Nobreza e a Igreja, foram bastante enfraquecidas através de ataques diretos ou de expropriação do património. Os liberais encaravam a monarquia como a melhor das repúblicas, onde se conjugavam os princípios da igualdade num quadro de soberania popular, com o respeito pela tradição dinástica e católica.
D. Carlos, segundo constava, confidenciara entre amigos que Portugal era uma monarquia sem monárquicos. Afinal, a monarquia portuguesa era uma República com um Rei, pelo que não faltava quem entendesse que para a derrubar bastaria

dispensar/mandar embora o Rei. A expressão República era algo místico/mítico, e parecia suficiente aceder a um novo regime para libertar o País da injustiça e dos males que o assolavam.
A revolução veio preencher um vazio político e não teve oposição. O Porto manteve-se a aguardar até 6 de outubro. O Governo Provisório teve apenas de telegrafar a notícia aos comandos militares e autoridades civis do País. Os quadros do exército aderiram em massa e, em três dias, mais de 1.500 oficiais entregaram declarações escritas de lealdade ao novo regime.
Uma excursão do povo republicano de Alcobaça, no dia 1 de dezembro de 1910, deslocou-se a Lisboa, animada de grande fervor democrático, para saudar as novas autoridades, tendo recebido manifestações de apreço e estima por parte da Câmara Municipal, do Governo Provisório e do Diretório do Partido Republicano que a recebeu.
A nova Constituição rompeu com a Carta, indo muito além da substituição do Rei pelo Presidente.
Apagou o papel político do Chefe de Estado, e concentrou o poder político nas duas Câmaras do Congresso (a dos Deputados e a dos Senadores), ambas eleitas por sufrágio direto. Estas Câmaras, elegiam e podiam destituir o Presidente da República, e o Governo, formalmente nomeado pelo Presidente, dependia unicamente da sua confiança. O Presidente não podia vetar leis, nem dissolver o Congresso. Os Ministros eram obrigados a assistir às sessões das câmaras. Tudo, portanto, dependia dos Deputados e Senadores.
Em 1910, a República Portuguesa passou a ser, com a III República Francesa, uma das duas únicas repúblicas modernas na Europa.
Mas enquanto a III República Francesa, no princípio, durante a década de 1870, teve governos e parlamentos onde os partidários das antigas dinastias reinantes formavam a maioria, isso não aconteceu em Portugal. Na República Portuguesa, começou por vigorar o princípio de que o país é para todos, mas o Estado é para os republicanos. Mais do que o caráter eletivo dos cargos de direção política do Estado, o que definiu a ideia de república, em Portugal depois de 1910, foi a reserva desses cargos e dos empregados públicos para os republicanos – e estes foram quase sempre, entre 1910 e 1926, os de um partido, o Partido Republicano Português.
Muitos militantes do PRP, perfilhavam a ideia que a República só poderia ser atingida, através de uma rutura revolucionária, sem compromissos com o passado dinástico e católico. O objetivo do PRP era, portanto, derrubar os braganças, para transformar Portugal numa comunidade política moderna, definida pela igualdade entre os cidadãos adultos do sexo masculino, pela afirmação pública de uma

perspetiva racionalista, o que implicaria a eliminação nos atos e instituições do Estado, das referências a outras entidades que não humanas, entenda-se a Igreja ou mesmo Deus, e pelo culto da pátria, corporização do bem comum. Os líderes do PRP acreditavam que era possível criar um novo mundo através de uma ação coletiva, e confiavam no poder político que exerciam para desencadear e concretizar essa ação. Porém os republicanos, mesmo os do PRP estavam divididos, não só pela disputa do poder, mas também por conceções do que deveria ser o novo regime. Os republicanos no poder, não se diferenciavam da antiga elite política pelas origens sociais ou percursos académicos e profissionais, pois 90% dos deputados tinham curso superior e 36% provinham da Faculdade de Direito, de Coimbra. A mudança que os republicanos encarnavam era ideológica, mas não sociológica.
A lei eleitoral (14 março de 1911) para a Assembleia Constituinte herdou o sufrágio restrito, muito longe de cumprir uma das grandes promessas, o sufrágio universal (de acordo com a lei a condição de eleitor era atribuída a cidadãos com mais de 21 anos que soubessem ler e escrever ou que fossem chefes de família há mais de um ano), o sistema maioritário e os grandes círculos plurinominais que vinham do rotativismo. O objetivo, como a imprensa republicana explicou, era alegadamente proteger e consolidar as instituições. Nas eleições para a Assembleia Constituinte nem todos os deputados foram eleitos, porque a lei previa a dispensa de eleições nos círculos onde não se apresentassem candidaturas da oposição, isto é, monárquicos. Deste modo por não ter havido eleições em grande parte do País, 91 deputados foram nomeados e não eleitos.
A exceção foi Lisboa, onde devido a protestos se realizaram eleições, mesmo sem ter havido oposição monárquica.
Mais tarde, Oliveira Salazar, na Sessão de 5 de maio de 1932 do Conselho Político Nacional, sobre a decisão de submeter a plebiscito a Constituição de 1933 defendeu que, embora o povo não esteja, na sua grande maioria, apto para votar em perfeita consciência o texto completo da Constituição, o seu voto tem um significado político que não é lícito desprezar: é um voto de confiança nos dirigentes.
A História repete-se?
O Decreto n.º 22 229/ 21 de fevereiro de 1933, tornou obrigatória a participação dos eleitores chefes de família, inscritos no recenseamento político de 1932, tendo como consequência que, sendo o sufrágio obrigatório, as abstenções contavam como votos a favor.
O (oficioso) Semana Alcobacense, registou que a despeito de quantos expedientes se lançou mão para infligir uma derrota à lista oficial do Partido Republicano, pelo nosso círculo; a despeito de quantas manobras ocultas se forjaram para malquistar

e levar de vencida essa lista; a despeito de todos os manejos do caciquismo monárquico, posto ao serviço da lista oposicionista; a despeito de tudo isto, os deputados que, pela maioria, irão à Constituinte representar o círculo de Alcobaça, são:
- Afonso Ferreira,
- Gaudêncio Pires de Campos.
- José de Cupertino Ribeiro.
São três republicanos de velha data, com largos anos de serviço e de sacrifício ao Partido que acaba de lhes conferir tão honroso mandato. De toda a justiça era que as sias candidaturas triunfassem.
Podem-se orgulhar de ir ao Parlamento não á sombra de lindinhas manobras eleiçoeiras, mas à custa do seu próprio valor e do muito que têm feito pela causa da República, de que são dos mais intemeratos paladinos.
A 3 de julho de 1913, nova lei eleitoral retirou o direito de voto aos analfabetos, a pretexto de conter o caciquismo.
O PRP conseguiu uma esmagadora maioria, inimaginável mesmo nos tempos das chapeladas monárquicas ou do Estado Novo, ao obter 97,6% dos votos. Numa Assembleia de 234 deputados, sentaram-se três independentes, dois socialistas e 229 em representação do PRP. A 24 de agosto de 1911 procedeu-se à eleição de Manuel de Arriaga, como primeiro Presidente da República e no mesmo dia a eleição do Senado. Para esta legislatura foram eleitos 71 senadores republicanos, entre os deputados. O primeiro governo do Partido Democrático, chefiado por Afonso Costa, ocupou o poder durante mais de um ano, marcando o início do predomínio dos democráticos na governação, pois até ao fim da República foi este partido o que ocupou o poder por mais tempo. Se Portugal tinha graves problemas económicos, como era tradicional, eles agravaram-se com a agitação social, em boa parte fruto do movimento reivindicativo do operariado. A legalização da greve e as crescentes reclamações sociais aumentaram o clima de instabilidade e alarmaram as classes mais abastadas e conservadoras, que logo que puderam exportaram capitais. 1912 foi um ano marcado por grande turbulência, e um movimento grevista que desembocou na primeira Greve Geral a que se seguiu forte repressão, restabelecimento da censura à imprensa a Lei-Garrote, encerramento da Casa Sindical e inúmeras prisões de sindicalistas.
Estas ações determinaram que o PRP/Partido Democrático fosse perdendo o apoio do operariado e Afonso Costa alcunhado de racha-sindicalistas.

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