(II)
AS SEQUELAS
SUMÁRIO:
(1).A
Acalmação. As Chapeladas. Um Duelo à Pistola-(2).Felicitações a D. Manuel II e
Reintegração da Vereação-(3).Festas, Romarias e um Par de Bandarilhas-(4).A
Luta Armada vs. Combate Político-(5).A Companhia de Fiação e Tecidos de
Alcobaça-(6).Paiva Couceiro e o Prior de Turquel. A Mãe Soberana-(7).A
República em Portugal e Espanha.
-5-A
COMPANHIA DE FIAÇÃO E TECIDOS DE ALCOBAÇA-
A
Companhia de Fiação e Tecidos de Alcobaça era a única unidade empresarial de
peso na região, e a sua Direção, com destaque para o tempo de Fernando Alípio
de
Carneiro e Sá (1905/1947), possuía
notável sentido social e manifestava simpatia para com a República.
Este era muito respeitado e estimado pelos trabalhadores com
quem mantinha uma relação forte que determinou o sucesso da empresa e moldou o
ambiente laboral.
Fernando Sá chegou a Alcobaça em agosto de 1899, para tomar
posse do cargo de diretor da Fiação e Tecidos, em substituição de Francisco
Casimiro de Magalhães Cruz, que se encontrava a exercer interinamente o cargo,
o qual regressou ao Porto, onde era diretor da respetiva Companhia.
A Companhia Fiação e Tecidos de Alcobaça estabeleceu a sua unidade
de produção na Fervença (Alcobaça) em 1874 e aí funcionou ininterruptamente até
1998. Durante mais de 120 anos esta unidade industrial esteve indiscutivelmente
ligada à vila de Alcobaça quer como empregador, quer como gerador de riqueza,
quer como símbolo de desenvolvimento socioeconómico, constituindo-se como motor
de progresso para toda a vila. Durante muitos anos a Fábrica era visita
obrigatória para pessoas ilustres que pretendiam conhecer o concelho e o seu
desenvolvimento (…). É sob a direção de
Fernando Alípio de Carneiro e Sá que a Fábrica vive todo o contexto de duas
guerras mundiais, do advento da 1ª República, do início do Estado Novo, é
escutando ou lendo as suas palavras que muitos se informam sobre a República e
os seus ideais, é ele a personagem escolhida para explicar a Alcobaça a
chegada de uma nova moeda, o escudo (…). É
sob a sua gestão que a vila e a Fábrica enveredam finalmente por caminhos
iluminados a luz elétrica (…).
Se 1912 foi classificado como um bom ano, já 1913 foi marcado
com o rótulo de crise e 1914 considerado como o ano mais difícil, desde a sua
tomada de posse da Direção.
Estes problemas estiveram relacionados com a importação de
algodão e carvão: Na incerteza da obtenção a tempo da nossa principal
matéria-prima, algodão em rama, cujos preços foram imediatamente agravados pela
baixa das taxas cambiais, tomamos a resolução, bem a nosso pesar, de reduzir a
laboração da Fábrica a três dias por semana de 7 de agosto a 22 do mesmo e a 4
dias desde 24 do referido mês a 7 de novembro, prosseguindo daí por diante a
sua completa laboração. O pessoal compreendeu a situação e aceitou-a, tanto
mais que acreditava e respeitava a Direção na procura de dias melhores.
Não se encontrou referência a movimentos reivindicativos,
nomeadamente de tipo grevista, entre os cerca de 700 operários.
Os empregados e operários da Fiação e Tecidos celebravam com
diversos festejos o 1º. de maio, para o que se constituía uma comissão, que não
descansava na organização (que se realizavam em local sobranceiro à Fábrica), e
normalmente com o concurso das Filarmónicas da Maiorga (de que alguns faziam
parte) ou da Vestiaria. Para além das diversões para o pessoal, deslocavam-se
ao evento muitos curiosos alcobacenses para partilharem o momento com essa grande
família de
trabalhadores, em plena e alegre
convivência, num dia votado ao descanso e ao folguedo.
Fernando Sá conseguiu conferir à fábrica e seu pessoal, um
pouco de ar de bairro que os marcou enquanto esteve à sua frente. Eram inúmeras
as mulheres, tantas quanto os homens, o que era pouco vulgar ainda no País
pouco industrial.
Não haveria nenhuma família de Alcobaça que não tivesse
alguém a trabalhar na Fiação e Tecidos. Famílias inteiras ali trabalhavam, pais
e filhos, para lá transportavam a solidariedade, as alegrias e tristezas, as
festas e entretimentos. Nas festas do pessoal, especialmente no Natal e 1º. de
maio, e no quotidiano estabeleciam-se namoros e noivados, filhos eram
planeados, criava-se uma rede que conferia cumplicidade e segurança, os colegas
eram os vizinhos e familiares a quem não havia receio de entregar as chaves da
casa, as colegas tomavam conta de filhos de outra se necessário, as crianças
por vezes saíam da creche para serem perigosamente mimadas por uma correnteza
de mulheres, presas aos teares de onde não deveriam desviar a atenção.
A fábrica, afinal, era a identidade no dizer de Idalina
Maria, que nunca lá trabalhou, mas frequentou a creche como neta e filha de
casais de operários da Fiação e Tecidos.
-6-PAIVA COUCEIRO E O PRIOR DE TURQUEL.
A MÃE SOBERANA-
Alguns conservadores convenceram-se de que o anticatolicismo
e o exclusivismo político da República tinham criado espaço para derrubar o
novo regime, como foi o caso do ex-Governador de Angola, o Cap. Paiva Couceiro,
um dos poucos que, em outubro de 1910, combateram os republicanos em Lisboa.
A partir da Galiza, entrou no País por duas vezes, da
primeira em 3 de outubro de 1911 e da segunda em 6 de julho de 1912. Na
primeira, atravessou a fronteira, ocupou a povoação de Vinhais, proclamou a
Monarquia mas, atacado por forças republicanas, com pessoal mal armado e
municiado, não pode resistir e retrocedeu para a Galiza.
José Pereira dos Santos nasceu a 1 de dezembro de 1876, em
Malhou (freguesia ao tempo pertencente a Santarém, depois a Alcanena, até ser
extinta em 2013, no âmbito da reforma administrativa, tendo sido agregada às
freguesias de Louriceira e Espinheiro da qual é sede, para formar a freguesia
denominada União das Freguesias de Malhou, Louriceira e Espinheiro), filho de
Francisco Pereira dos Santos e de Maria da Conceição, tendo ingressado em 1891
no Seminário de Santarém. A 26 de março de 1898 recebeu, na igreja de S.
Vicente de Fora, a prima tonsura e os quatro graus das ordens menores. Em 1901,
assumiu funções na igreja de Nossa Senhora da Conceição, Turquel, ficando aí
colado a 3 de junho de 1907.
O Pe José Pereira dos Santos faleceu
a 5 de novembro de 1959 em Lisboa sem nunca ter abdicado das suas convicções
políticas.
O Prior de Turquel, deslocou-se ao Porto para apoiar Paiva
Couceiro. Regressado à paróquia, do respetivo púlpito, fez veementes apelos à
revolta contra a República, o que lhe valeu que, a pedido do Centro
Republicano, fosse preso por uma força militarizada do Quartel composta por 6
homens e encarcerado na cadeia comarcã, ao lado de presos de direito comum.
Paga a fiança por um amigo (alegadamente não tinha meios para isso), voltou à
paróquia onde prosseguiu com os incitamentos. José Ferreira Chumbo, um
turquelense com estabelecimento de porta aberta em Lisboa, fez um enérgico
protesto, contra a permanência do Pe. Pereira dos Santos, repudiando a estranha
impunidade e benevolência que vinha gozando, solicitando a sua expulsão por
inadaptação à nova ordem.
Na segunda vez, os monárquicos passaram a fronteira em três
pontos distintos do Minho e de Trás-os-Montes. A coluna da Paiva Couceiro rumou
a Chaves, onde ocorreram os combates mais violentos e se fizeram numerosos
prisioneiros monárquicos.
Depois destes mal sucedidos ataques, os monárquicos ainda se
envolveram noutras conspirações, contribuindo para aumentar a instabilidade
política. Esperava suscitar uma insurreição geral, mas constatou apenas a
indiferença apática dos monárquicos.
O Exército manteve-se fiel à República enquanto proliferaram
grupos armados de defesa da república, bandos chefiados por revolucionários
profissionais, sediados nos cafés da baixa lisboeta, e disponíveis para fazer o
trabalho sujo de intimidar, calar ou liquidar os reais ou supostos inimigos do
novo regime.
O Pe. José Pereira dos Santos, conhecia a existência da
festividade que se realizava em Loulé, no Domingo de Páscoa, em honra da Nossa
Senhora da Piedade/Mãe Soberana, e que era considerada uma das maiores
manifestações do culto mariano no País. Pelo menos a maior do sul. Mas não
conhecia a sua origem muitíssimo antiga e que remonta ao século XVI.
Nesses anos conturbados da I República, as ruas de Loulé
ainda ficavam pejadas de gente, sobretudo algarvios, mas também alentejanos e
mesmo alguns espanhóis de Ayamonte.
A procissão começava a formar-se. Ouvia-se a banda, o povo
agitava-se, os homens do andor avançavam pausadamente como compete.
Lançavam o grito: Viva
a Mãe Soberana!
E o povo respondia fervorosamente: Viva!
Afastavam-se os cavaletes que sustentavam
a imagem de duzentos e muitos quilos, assente nos ombros de oito fortes
rapazes, sem o menor estremecimento.
Nada havia aqui, em termos de conotação política, mas o Pe.
Pereira dos Santos que nunca foi ao Algarve, entrou em contacto com o Prior de
Loulé (que conheceu em Lisboa), com o objetivo de tentar implantar em Turquel
aquele festividade, como forma de contrariar a política anticlerical da
República.
O Governo Provisório, gozou de amplos poderes até à abertura
da Assembleia Constituinte, em 19 de junho de 1911.
Nesse momento, o Presidente do Governo Provisório, Teófilo
Braga, transmitiu à Assembleia Constituinte os poderes que lhe haviam sido
conferidos a 5 de Outubro de 1910. A Assembleia Constituinte aprovou por
aclamação a proposta apresentada ao Congresso pelo seu Presidente, Anselmo
Braamcamp Freire: A Assembleia Nacional
Constituinte confirma, até ulterior deliberação, as funções do Poder Executivo
ao Governo Provisório da República.
Dois meses mais tarde, com a aprovação da Constituição e a
eleição do primeiro Presidente da República, Manuel de Arriaga (24 de agosto),
o Governo Provisório apresentou a demissão.
Começava em Portugal a acidentada I República, que ao invés
de optar por pequenas mudanças que melhorassem a concreta qualidade de vida dos
portugueses, foi no sentido das transformações radicais numa montanha, que não
mexia quase nada, nem empurrada.
-7-A REPÚBLICA EM PORTUGAL E EM ESPANHA-
A I República Portuguesa pouco teve de comum com a I
República em Espanha, produto de uma série de revoluções de cariz liberal que,
todavia, custaram muito sangue, esforços e vidas.
Era uma República que, em 1873, se simbolizava numa mulher
forte, de longos cabelos, pintada com o vermelho da aurora e do sangue, usava
barrete frígio, por quem se morria romanticamente. A notícia da proclamação da
República em Espanha, alvoroçou as pessoas ávidas de derrube do trono
português, que aspiravam um Futuro com letra maiúscula, aliado a temas tão caros
como Justiça, Liberdade e Direito e outros que tinham sido meramente teorizados
e de repente resplandeciam em certezas que haveria de cumprir. A República
Espanhola foi torturada, pois levantaram-se contra ela todas as reações, mas os
maiores inimigos foram os seus militantes que se digladiaram ferozmente, ainda
que animados de boas intenções, de idealismo, sem vislumbrarem o perigo. Ao
lado deste quadro, os generais, os palacianos, os banqueiros, os
latifundiários, o clero, os poderes amortecidos, esperavam o final da luta dos
republicanos entre si. Nos pronunciamentos, apareciam sempre militares
imponentes nas fardas, tilintando
esporas e espadas, muito aclamados.
Numa Espanha galante e varonil, nada agradava mais às mulheres que um garboso
soldado.
Soldado que não ame é bom para a
sotaina.
Enquanto em Espanha, houve eleições três meses depois da
queda da Monarquia, a República Portuguesa demorou oito meses (maio de 1911),
para eleger a Assembleia Constituinte.
Entretanto, o Governo Provisório eliminou os poderes
independentes, substituiu as vereações municipais por comissões
administrativas, intimidou a magistratura (puniu com a transferência para as
colónias os quatro magistrados da Relação de Lisboa que, convidados a
pronunciar João Franco, decidiram em sentido contrário) e permitiu que
militantes republicanos impedissem a publicação de jornais não afetos.
As colónias, Joias da República, continuaram a ser governadas
por delegados da metrópole, na maioria militares, afetos ao PRP, e não por
locais, como acontecia nas colónias inglesas. A autonomia consistiu apenas numa
autonomia do alto-comissário, mantendo-se a população politicamente
marginalizada. Para os nativos, o Código de Trabalho, de outubro de 1914,
prolongou o regime de trabalho forçado de 1899, não muito longe da abolida
escravatura, com grande escândalo internacional.
Santiago Ponce, teve um primo madrileno, ativo militante
republicano, assumidamente anticlerical (apesar de antigo seminarista em
Santiago de Compostela e com ordens menores), com quem se encontrou uma vez.
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