O homem comum, o soldado, o prisioneiro e o
deslocado raramente são protagonistas nos livros de História.
Como escreveu o poeta brasileiro, a história humana não se desenrola apenas nos
campos de batalha e nos gabinetes presidenciais. Ela se desenrola também nos
quintais, entre plantas e galinhas; nas ruas de subúrbio, nas casas de jogo,
nos prostíbulos, nos colégios, nas ruínas, nos namoros de esquina. Disso quis
eu fazer a minha poesia, dessa vida obscura e injustiçada, porque o canto não
pode ser uma traição à vida, e só é justo cantar se o nosso canto arrasta
consigo as pessoas e as coisas que não têm voz.
O
século XX português e alcobacense teve grandes protagonistas que o marcaram e
moldaram. Já perpassamos por D. Carlos (rei numa monarquia sem monárquicos) e
Afonso Costa (outro Mata Frades), mas
não podemos esquecer, Salazar (governava o País como uma dona de casa), Duarte
Pacheco (uma curta vida para quem queria andar tão depressa), Egas Moniz (a
lobotomia como técnica da operação ao cérebro),
Óscar Carmona (sempre presente da Ditadura Militar, à Ditadura Nacional ao
Estado Corporativo, mas em segundo plano), Vasco Santana (um Zé Povinho, do
palco e da tela), Amália Rodrigues (Rainha do Fado), Humberto Delgado (abalou
sem medo o regime), Mário Soares (republicano de percurso sinuoso, possuidor de
um enorme ego, na maior parte das vezes socialista), Álvaro Cunhal (inabalável
nas convicções, ainda que contra as evidências), Sá Carneiro (um meteoro
político, de visão e de palavra), José Saramago (um mal amado, incompreendido
por alguns, mas que sabia sobre o que escreveu), Paula Rego (artista de muitos
contos e de histórias de colorida intensidade, aparentemente ingénuas) ou
Eusébio (o senhor golo).
E
em Alcobaça? Afonso Lopes Vieira, Manuel Vieira Natividade e outros.
Houve muitos vencedores no século XX, países que se reputaram vencedores saíram,
porém, devastados, o sofrimento, a dor, a memória dos tempos conturbados e das
lições amargas, vinham amiúde à tona.
As disputas que surgiram depois de qualquer
uma das guerras, foram alegadamente destinadas a evitar uma outra, a criar um
mecanismo e um estado de espírito conducentes à revolução pacífica dos
diferendos. Essas disputas, fossem elas o confronto entre formas extremas de
nacionalismo, entre o mundo comunista e o não comunista, entre as potências
coloniais e os que estavam sobre o seu domínio, resvalaram frequentemente para
a violência. Os ódios étnicos, pulsavam apesar de artificialmente recalcados e
numa primeira oportunidade vinham à superfície, sem olvidar limpezas étnicas.
A energia nuclear, a mais poderosa ameaça de
destruição jamais pensada ou concebida, que se iria revelar também o mais
poderoso instrumento de dissuasão, gerou um debate que, nas democracias, fez
prevalecer os argumentos morais e médicos sobre as estratégias militares.
A partir da última metade do século XX, a
televisão chegou às casas de centenas de milhões de pessoas e levou os
elementos da luta global, como a fome e a guerra, a pessoas que estavam a
milhares de quilómetros de distância e se supunham a ela imunes. Recorde-se,
por exemplo, o seu impacto na Guerra do Vietname e os movimentos que
despoletou. Mas, com o tempo, também funcionou como analgésico.
O verdadeiro progresso não é, afinal, uma
lei da natureza, pois todos dias e nos mais variados lugares, registam-se
avanços e recuos nada subjetivos.
Aos poucos, o Homem viu melhorar as
condições de vida, mesmo em países que estavam à margem da política ou da
ideologia predominantemente corretas. Não obstante, a luta por uma vida melhor
não ter chegado ao fim, aliás nunca o alcançará, apesar das características
dessas lutas terem sofrido frequentes e muitas alterações, a procura da
realização humana ainda que com dor, vai continuar a desafiar e inspirar o
século XXI.
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