GILBERTO
MAGALHÃES COUTINHO, ANTIFASCISTA
ALCOBACENSE
Fleming
de Oliveira
Não
seria muito justo, deixar de referir o papel político de Gilberto Magalhães Coutinho
em Alcobaça.
Com 81
anos, faleceu em fevereiro de 1999, essa figura com algum relevo nos meios
políticos da oposição ao Salazarismo em Alcobaça, que veio a ser detido
primeira vez pela PIDE, em 22 de novembro de 1948, em Alcobaça, tendo dado a
entrada na respetiva Diretoria, em 24 de novembro de 1948, para averiguações e
recolhido de seguida, preventivamente,
ao Aljube.
Julgado
no Tribunal Plenário Criminal de Lisboa,
em 6 de dezembro de 1949, foi condenado na pena de 2 anos de prisão maior
celular ou, em alternativa, na de 3 anos de degredo, na suspensão de direitos
políticos por 15 anos, 1000$00 de imposto de justiça, acrescido das
percentagens legais e sujeito a medidas de segurança. A pena de prisão decorria
de lhe ser imputado atentar contra a segurança do Estado, enquanto que as
Medidas de Segurança se justificavam, por período de tempo por vezes mais ou
menos indeterminado, normalmente de três meses a três anos renováveis tantas
vezes quanto a polícia política decidisse, com a benévola assinatura dos juízes
do Plenário, na perigosidade do acusado, numa avaliação e proposta feitas pela
PIDE.
Sobre
os Tribunais Plenários, escreveu por exemplo António Valdemar que, juntamente com a PIDE, as Forças Armadas, a
censura, a banca, a esmagadora maioria do episcopado português e outros
elementos da hierarquia da Igreja Católica, foram os principais sustentáculos
da ditadura que se prolongou de 28 de Maio de 1926 até 24 de Abril de 1974.
Data de 1945 a
criação dos Tribunais Plenários de Lisboa e do Porto. Destinavam-se a julgar
acusações e delações contra a segurança do Estado, legitimando-as e, ainda processos de liberdade de
imprensa, não apenas circunscritos a matéria editada em jornais e revistas, mas
também em livros e outras publicações (…). Logo que foi implantada a Ditadura Militar, restringiram-se as
liberdades constitucionais, estabeleceu-se a censura, preparou-se uma polícia
política. Sob a alçada do foro militar, ficaram os processos políticos. Quando
Salazar ascendeu a 5 de Julho de 1932
a chefe do governo, são também criados em Lisboa e
Porto, em Dezembro de 1932, os tribunais militares especiais para os crimes
políticos. Porém, com a cosmética que o termo da II Guerra impôs durante
algum tempo, em 20 de dezembro de 1945 acabaram em Portugal os Tribunais Especiais Militares, que deram
lugar aos Tribunais Plenários Criminais,
atribuindo à recém criada PIDE, antes PVDE, a exclusiva competência para
instruir os processos. Em 1945, foram criados os Tribunais Plenários, de Lisboa e Porto.
Nestes
tribunais, frequentemente, os juízes eram pouco mais que presenças de estilo,
complacentes com as torturas na cela e até na própria sala de audiências,
chegando a ordenar a detenção de testemunhas ou advogados de defesa, por desrespeito ao tribunal. A certeza que havia, é que os processos estavam
como que decididos a priori. Os juízes (Desembargadores) e os representantes do
M.P., eram escolhidos pelo Ministro de Justiça, de acordo com critérios de
confiança política.
Segundo
Irene Pimentel, o Tribunal Plenário de Lisboa, atingiu um grau de corrupção e de falta de vergonha com acusações
claramente pidescas, ao contrário do do Porto que, deste, nunca se aproximou, nem de longe nem de
perto.
Estava
o autor destas notas em 1972, em serviço militar na Guiné quando, com alguma
surpresa, tomou conhecimento, que o Tribunal Plenário do Porto (juiz presidente
Morais Campilho), absolveu alguns estudantes de Coimbra, acusados de participar
em reuniões do PC, distribuírem propaganda apelando ao termo da guerra de
África e tomarem partido por dois colegas estudantes angolanos, afetos ao MPLA.
Julgado
no 1º. Juízo Criminal de Lisboa, em 30 de maio de 1951, Gilberto Coutinho foi de
novo condenado no cumprimento de pena de
prisão e sujeito a Medidas de Segurança. Antes fora sujeito à tortura do sono. Foi restituído à
liberdade condicional, com termo de identidade e residência, em 3 de Junho de
1953, embora com Guia da Cadeia do Forte
de Peniche, emitida com data de 6 de junho de 1953. Apenas, em 8 de outubro
de 1956 lhe foi concedida a liberdade definitiva.
O seu
primeiro emprego, em Alcobaça, ocorreu na antiga Casa Furtado, de José Sanches Furtado (ferragens e drogaria).
Quando saiu da prisão de Peniche, em liberdade condicional, foi trabalhar para
a casa Thomaz dos Santos, em Caldas
da Rainha. Daí passou para Barreto &
Trindade, em Alcobaça, onde se tornou sócio e deu origem à empresa que atualmente
ainda gira sobe o nome de Gilberto de
Magalhães Coutinho, Ldª.
Dotado
de forte espírito associativo, fez parte do grupo dos fundadores do Rancho de Alcobaça, da ADEPA e ainda da sociedade proprietária
do Voz de Alcobaça. Também se dedicou
ao Ginásio Clube de Alcobaça, de que
foi diretor e apoiante em momentos difíceis.
Quem o
conheceu de perto, recorda um comerciante honesto, conceituado na praça, pleno
de seriedade e disciplina na sua condução financeira. Nunca repudiou, as
convicções políticas e tinha a fama, seguramente o proveito moral, de não ser
acusado de criar situações que pudessem comprometer ou criar prejuízos a outrem.
Pessoalmente,
embora não tivesse sido pessoa propriamente das relações sociais, muito menos
políticas do autor deste texto, registo que sempre lhe notei o gosto de ler e
trocar impressões acerca dos mais variados assuntos. Aliás colaborou, por
alturas dos vinte anos do 25 de Abril, na nossa Notas
Sobre os Tempos do Prec em Alcobaça, publicadas em O Alcoa.
O
estatuto social de alcobacenses como Coutinho não era elevado e, não obstante,
não consta que como outros tivesse sido especialmente mal tratado, muito menos
fisicamente torturado pela PIDE.
Os
presos, reconheciam que havia diferença no tratamento, entre um operário ou assalariado rural (socialmente mais
indefesos) e um intelectual. De acordo com Irene Flunser Pimentel, que escreveu a
História da PIDE, havia diferença de tratamento entre funcionários do PC e
presos como Soares ou Cunhal. Na primeira prisão, Cunhal ainda foi bastante castigado, depois não tanto, embora
sujeito a grande isolamento, incomunicabilidade. Esta podia atingir meio ano,
com denegação de acesso a revistas, livros ou correspondência. A tortura não
era caso raro e nela intervinha, além dos agentes, um médico com vista a
assegurar que o detido possuía condições físicas ou psicológicas para o
prosseguimento.
Nos
anos sessenta, o meu Pai, que também era advogado, frequentava no Porto, meios
sociais, não propriamente políticos, de Artur Santos Silva (Pai) pelo que se
recorda de ouvir este contar, alguns factos ou impressões, relacionados com a
sua atividade político-profissional, nos Tribunais Plenários.
Artur
Santos Silva (o arturão como era conhecido no meio), contava casos em que as testemunhas que enalteciam a
conduta dos acusados ou o mérito das ideias que professavam, entravam na sala
de audiências do Tribunal Plenário nessa qualidade e, quando saíam, iam diretamente
para os calabouços.
Além
da privação do sono, havia a estátua e a audição de estridentes gravações de choros,
gritos, confissões ou denunciasse claro os espancamentos com cavalos-marinhos, o rabo de boi ou matracas.
Sobre
Albino Serrano, Artur Faria Borda e Gilberto de Magalhães Coutinho, pode-se
consultar com interesse o Voz de
Alcobaça, respetivamente os números do ano de 1999, janeiro a abril de
2000, 31 de agosto de 1999 e 28 de fevereiro de 1999.
NOTA-cfr. o nosso, NO TEMPO DE
SALAZAR, CAETANO E OUTROS
Sem comentários:
Enviar um comentário