Alcobaça não tinha Brazão ou Selo de Município.
Como faziam muitas outras cidades ou vilas do País, através da Câmara Municipal manifestou o desejo de criar o seu Brazão, pelo que se resolveu contactar para o efeito a Associação dos Arqueólogos de Lisboa, nos termos seguintes:
“Alcobaça, 17 de Julho de 1922
À Exmª Associação dos Arqueólogos
LISBOA
Em nome da Comissão Executiva desta Câmara Municipal, venho solicitar a V.Exªs se dignem ver se o desenho que junto envio está ou não em harmonia com as regras heráldicas, para o efeito de servir de brazão à vila de Alcobaça. Deseja esta Câmara Municipal fazer com que uma terra de certa importância, como é a sede deste Concelho e para mais com um nome histórico feito por motivo do seu velho convento dos Bernardos, possua também o seu brazão, e daí ter encarregado um artista amador de elaborar o desenho junto que, para a devida apreciação e aprovação, temos a honra de trazer ao conhecimento de V.Exªs. Contando com a melhor colaboração de V.Exªs na realização mais perfeita dos desejos que a este respeito nos animam, vos desejo Saúde e Fraternidade.
O Vice-Presidente
a)-Leonardo Taveira Pinto”
Recebido este ofício na Secção de Heráldica da Associação dos Arqueólogos, foi nomeado relator do parecer, que veio a ser aprovado em sessão de 22 de Dezembro de 1922 da mesma secção, Afonso Dornelas, vogal da Secção de Heráldica e Genealogia daquela Associação.
A proposta para a criação de Brazão de Alcobaça, da responsabilidade de Afonso Dornelas, é do seguinte teor:
“- e vermelho, com uma torre de ouro assente num contra-chefe ondado de prata, carregado de duas Ribeiras em Azul. A torre acompanhada de dois crescentes de ouro, um em cada flanco. Chefe cozido de azul carregado de três flores de liz de ouro.
- escudo cercado pelo colar da Ordem Militar de Torre e Espada, do Valor Lealdade e Mérito.
- Bandeira, medindo um metro por um lado, não se incluindo o espaço das presilhas em que entra a haste, deve ser amarela cor de ouro, por ser peça principal do brazão”.
Para fundamentar aqula proposta, Afonso Dornelas teve em conta várias questões relevantes para a história de Alcobaça.
“É pois o Mosteiro de Alcobaça um monumento da maior tradição histórica e a sua fundação o primeiro acto da grande valor para a fundação da Nação Portuguesa. No Brazão de Alcobaça deve, portanto, existir alguma coisa que defina bem tal circunstância e, assim coloquem-se-lhe três flores de lis de ouro num chefe azul, como elementos extraídos da Ordem de S. Bernardo que também os adoptou por constituírem as armas de França, donde era natural e onde fundou a sua Ordem. Ficam, portanto, representados no brazão de Alcobaça, o castelo e os crescentes, como representantes da sua existência quando foi incorporada no território português; as flores de lis, representando a sua importância na História Geral de Portugal; sendo mais necessário que alguma coisa indique o valor da sua vida de facto e, assim, na base do Castelo, colocaremos os dois rios que se chamam Alcoa e Baça e que se juntam na vila, e são partes do seu nome, que evidentemente foi dividido para dar os nomes aos rios e não o contrário, como muitos dizem. O Alcoa e o Baça são a alma viva daquelas regiões. A indústria e a agricultura, tão desenvolvidas em Alcobaça, tudo devem aqueles rios; portanto o Brazão de Alcobaça, assim constituído, demonstra a vida e a histórias dessa antiquíssima vila de tão curiosas e históricas tradições. As peças principais do brazão, são de ouro, portanto deve ser desta cor a sua bandeira, como de ouro e a sua história”.
E Afonso Dornelas termina:
“Foi Alcobaça agraciada com a Ordem Militar da Torre e Espada do Valor Lealdade e Mérito, pelo Decreto nº 5.664, de 10 de Maio de 1919; portanto, o brazão deve ser circundado pelo colar da mesma ordem”
Na verdade, e recordando, vemos que o Decreto nº 5.664 é do seguinte teor:
“ Tendo-se as cidades de Porto, Coimbra, Santarém, Évora e Bragança e as vilas de Alcobaça e Caldas da Rainha, tornado dignas de ser galardoadas pelo heroísmo, civismo e amor que manifestaram em sustentar a integridade das Instituições Republicanas quando estas correram perigo de ser subvertidas pela acção proeminente que monárquicos tinham dentro da República; hei por bem decretar, sob proposta do Ministro da Guerra e nos termos da alínea g), do artº 2º. do decreto 5.030, de 1 de Dezembro de 1918, modificado pelo decreto nº. 5.246, de 8 de Março de 1919, o seguinte:
Artigo único: É conferido às cidades de Porto, Coimbra, Santarém, Évora e Bragança, o grau de Oficial e às vilas de Alcobaça e Caldas da Rainha o grau de Cavaleiro da Ordem de Torre e Espada do Valor, Lealdade e Mérito.
O Ministro da Guerra, o faça publicar. Paços do Governo da República, 10 de Maio de 1919. - João de Canto e Castro Silva Antunes-António Maria Batista.”
Desejada e saudada em Alcobaça e por quase todo o País como remédio para os males da Pátria, a República iria viver até ao fim num clima de instabilidade e frustração colectivas, que nem estas suadas vitórias ajudaram a ultrapassar. Os partidos perdiam prestígio, tal como a classe política, a agitação e o descontentamento social, fruto da crise económica, não abrandavam. As instituições demoravam a consolidar-se e a paciência já não abundava. Nem tudo, porém, foram factos negativos. No domínio cultural, é bom não o esquecer, a liberdade potenciada pela República trouxe alguns bons frutos que o País tanto carenciava.
Com zonas claras ou escuras, o certo é que a República impregnou forte e definitivamente o imaginário democrático e laico dos portugueses, que 90 anos depois da sua implantação, sem nela se reverem de todo, mantêm alguns dos seus símbolos.
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