NO TEMPO DE SALAZAR, CAETANO E OUTROS
O CONTO DO VIGÁRIO
A VERMELHINHA NO QUARTEL DE TANCOS
João Matias, tem uma história do conto do vigário que diz ter-lhe servido para vida.
Foi nos anos sessenta e estava na tropa. Nunca se aventurou em jogar à batota, não só por não ter muito jeito, mas por medo de perder o pouco dinheiro que tinha.
Alguns camaradas em Tancos (sempre que o cabo ou sargento de dia, não estivessem por perto), aproveitavam as horas mortas para jogar à lerpa, a dinheiro ou a tabaco. Os menos instruídos na arte, jogavam ao montinho, e os mais reguilas, arriscavam a vermelhinha. Matias arriscou uma vez e isso serviu-lhe de emenda.
Para quem não souber, recorde-se que a vermelhinha é um jogo de cartas, da mais pura batota, e que se via, algo à socapa, nas feiras e romarias, depenando os gananciosos incautos.
Consistia em escolher uma dama de um naipe vermelho, daí o nome vermelhinha, entre duas outras cartas de naipe preto.
O jogador/batoteiro, mostrava previamente onde estava a dama e, depois de manipular as cartas com grande velocidade, convidava a vítima a tentar descobri-la.
Para servir de isco, havia sempre um cúmplice, por perto. Este jogava e acertava quase sempre e até ajudava, quando o batoteiro fingia uma pequena distracção. Indicava onde se devia apostar, chamando a atenção para o facto da dama estar marcada com uma pequena dobra num dos cantos.
O incauto ganhava a primeira, segunda ou até terceira vez, o que o levava depois a apostar mais forte.
O papalvo do Matias, um dia lá começou a jogar e a ganhar, até que escolheu a carta marcada. Só que a carta marcada era afinal um Às de Espadas!
Como é que isso podia ter-lhe acontecido?
O António da Costa, colega mais antigo e por sinal da Nazaré, depois de o deixar perder outra vez, chamou-o de lado e disse:
-João, deixa-te dessas merdas, isso é só para perder dinheiro. Ninguém ganha. Repara naquele gajo. É o capanga, está ali para te sacar a massa. Deixa-te de ser parvo e gasta mas é o dinheiro numas cervejolas, que tem mais interesse. Anda daí. Esses gajos são uns filhos da p…, quando baterem com os cornos, em Angola, vão aprender o valor da amizade.
E foi então que lhe explicou que, naquele jogo, era impossível ganhar. Havia muitos truques que o batoteiro podia fazer, incluindo o de, disfarçadamente, desmarcar o canto da dama, para marcar o de uma das outras cartas de naipe preto.
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