Jero é um dos
melhores contadores de histórias da Alcobaça moderna e contemporânea. Escreve
com facilidade, sensibilidade e muitas vezes com… graça, o que também é motivo
de apreço.
Nunca me passaria,
pois, pela ideia ensinar-lhe alguma coisa sobre a “nossa” Alcobaça, muito menos emendar comentários ou factos por ele
descritos.
Posto isto, tomo a liberdade
de muito benevolamente (pelo menos no meu entendimento), fazer breves
aditamentos ao artigo que publicou no passado número deste jornal, sobre o
antigo Presidente da Câmara, Dr. José Nascimento e Sousa.
Quando o Eng. José
Costa e Sousa (que alguns ainda recordarão e que também era um excelente
contador de histórias) foi colocado depois da II Guerra (1 de Outubro de 1948),
nos Serviços Técnicos da Câmara de Alcobaça, houve quem o avisasse que vinha
para uma “terra muito difícil”, onde
o Presidente da Câmara se matava (Manuel da Silva Carolino) e a oposição
ganhava eleições municipais. Na verdade este acontecimento teve ressonância
nacional e o governo de Salazar, não obstante as promessas de abertura após a
II Guerra, não o podia tolerar.
O Dr. Nascimento e
Sousa era uma personalidade altamente conservadora e de pendor monárquico e o
facto de a vereação ser composta por figuras ligadas à oposição e com
respeitabilidade social, não foi fruto de sua condescendência, mas a prova de
que não foi capaz de controlar a situação.
Em 2 de Janeiro de
1946 segundo O ALCOA tomaram posse, no meio de “grande expectativa quanto ao desempenho do seu múnus”, os membros
da Câmara Municipal de Alcobaça, a
qual era constituída pelos Dr. José Nascimento e Sousa, João d’Oliva Monteiro, Dr.
João Lameiras de Figueiredo (reconhecidos republicanos e reviralhistas), Joaquim
Ferreira Gomes e Carlos de Oliveira.
Esta equipe, algo
contranatura pode-se dize-lo, durou pouco tempo, cerca de um ano.
Como surgiu este “acontecimento extraordinário”, em que a
oposição entrou na vereação, e que ainda hoje é recordado? Para o perceber, é
necessário remontar à organização político-administrativa anterior ao 25 de
Abril. A Câmara Municipal era (como hoje) o órgão colegial de gestão permanente
dos assuntos municipais, composta por um Presidente e Vice-Presidente (livremente
nomeados pelo governo) e por vereadores, eleitos quadrienalmente pelo Conselho
Municipal. O Presidente e Vice-Presidente nomeados pelo Governo, deveriam ser
escolhidos, salvo circunstâncias excepcionais, entre os munícipes do Concelho e
de preferência entre os vogais do Conselho Municipal, antigos vereadores,
antigos membros de comissões administrativas ou diplomados com curso superior.
O Presidente da Câmara tinha como funções chefiar a administração municipal, como
órgão do concelho. E ainda a de representar o Governo, de que era uma extensão,
como magistrado administrativo. Isto é, o Presidente da Câmara, era
simultaneamente órgão do Município e órgão do Estado.
A razão desta organização político-administrativa, segundo
Marcelo Caetano, inseria-se na “boa”
tradição da nossa administração municipalista, os juízes de fora, bem como na
prática seguida com sucesso em países de regime democrático, como o “Maire”, em França, o “Podestà”, em Itália e o “Burgomestre”, na Alemanha. O Presidente
da Câmara era também autoridade policial em Alcobaça, visto aqui o comando
local não estar cometido a oficial do Exército.
Na Espanha
franquista, mantinha-se o “Alcalde”.
O regime português,
alegadamente, pretendia aliar a conveniência de uma acção rápida, desenvolvida
por uma entidade responsável e de confiança, dentro de um conjunto coordenado e
harmónico. Ora não foi o que aconteceu em Alcobaça. Para grande surpresa do
País, e da terra, o Conselho Municipal, escolheu vereadores da oposição. Para
obviar este percalço e “péssimo”
exemplo, que poderia alastrar pelo País, o Governo ao fim de um ano demitiu os
Presidente e Vice-presidente,
forçando uma nova escolha, desta vez a coberto de surpresas.
O Dr. José
Nascimento e Sousa, em Maio de 1946, imperturbável a tudo isto, na qualidade de
Presidente da Câmara, e em nome da “Comissão
Concelhia da União Nacional (U.N.), fazia em discurso a afirmação pública
(…) da nossa inquebrantável fé nas
doutrinas da Pátria, conduzida pelo Governo que tem à frente esse grande
português cujo prestígio há muito ultrapassou as fronteiras do País e o impõe
ao respeito e consideração do mundo: o Dr. Oliveira Salazar (…), e pessoal
de que o (…) meu indefectível
nacionalismo se enraíza e fortalece no muito amor que tenho à minha terra. (…)
O povo do meu Concelho que hoje e sempre,
com o entusiasmo que lhe dá a sua inquebrantável Fé, levanta-se e diz: Viva
Portugal! Viva Carmona! Viva Salazar!”
Mas isso não o
livrou de ser substituído, não reconduzido, o que lhe causou alguma mágoa. Foi o Dr. Júlio Frederico de Guimarães
Biel quem o veio a substituir.
Sem comentários:
Enviar um comentário