quinta-feira, 16 de março de 2017

A I GUERRA E ALCOBAÇA -AS APARIÇÕES DE FÁTIMA- -A I GUERRA NA FIAÇÃO E TECIDOS DE ALCOBAÇA-



-AS APARIÇÕES DE FÁTIMA-
No dia 13 de maio de 1917, três crianças, Lúcia de Jesus dos Santos, Francisco Marto e Jacinta Marto, com 10, 9 e 7 anos respetivamente, afirmaram ter visto uma senhora mais branca que o Sol, sobre uma azinheira, quando apascentavam na Cova da Iria.
Lúcia via, ouvia e falava com a aparição, Jacinta via e ouvia e por sua vez Francisco via, mas não ouvia.
As aparições repetiram-se nos cinco meses seguintes e seriam portadoras de uma mensagem. A 13 de outubro, perante cerca de 50.000 pessoas a aparição disse-lhes ser a Nª. Sª. do Rosário. As crianças, haviam relatado que Nossa Senhora lhes tinha prometido um milagre para o meio-dia desse dia, na Cova de Iria, de maneira a todos puderem acreditar.
De acordo com indicações de testemunhas, após uma chuva torrencial as nuvens desmancharam-se e o Sol apareceu como um disco girando no céu. Algumas, afirmaram que não se tratou do Sol, mas de um disco em proporções solares, semelhante à Lua, menos brilhante do que o normal, acompanhado de luzes multicores, que se refletiram na paisagem, nas pessoas e nas nuvens. Foi ainda relatado, que o Sol se teria movido aos ziguezagues, o que assustou muitos que pensaram ser o fim do mundo.
Conforme testemunhos, o Milagre do Sol terá durado cerca de dez minutos. As três crianças, afirmaram terem observado Jesus, a Virgem e S. José abençoando as pessoas dentro (ou junto) do Sol, enquanto populares asseguraram ter visto vultos com forma humana, dentro do Sol quando este desceu.
As crianças, foram interrogadas pelo Pároco da Freguesia de Fátima no final do mês, e não mais deixarão de ser enquadradas e apoiadas, pelo clero. De tal modo que se na segunda aparição estiveram presentes cerca de 50 pessoas, na terceira já serão mais de 1.000. Até então, a mensagem recolhida nos interrogatórios resumia-se a promessas de levar para o Céu os três pastores, pedido para rezar o terço e alusões, ainda que vagas, ao final da guerra. Em julho, tendo a imprensa começado a interessar-se pelo acontecimento, a polémica atingiu os jornais nacionais, o que fez o administrador do concelho de Ourém reagir, levando por dois dias as crianças para sua casa (embora haja quem refira a cadeia junto a presos de delito comum), pretendendo evitar uma manifestação popular (que seria uma violação da interdição de concentrações religiosas públicas sem prévia autorização, no quadro das leis da República). Sem se atrapalhar com o contratempo, Lúcia viu, no dia 19 de agosto e noutro local, aquela que doravante designará por Nossa Senhora. A 13 de setembro compareceu, com mais de 20.000 pessoas,

penúltima aparição, que foi considerada uma desilusão pelos presentes, na qual esteve o enviado do Cardeal Patriarca, o Pe. Manuel Nunes Formigão (um dos primeiros sacerdotes a interrogar os videntes, figura determinante na aquisição dos terrenos da Cova da Iria, relator único da comissão canónica sobre os acontecimentos de 1917 e autor de vários livros, artigos promotores do santuário em jornais católicos e no boletim mensal Voz de Fátima).
Engrácia Maria, de Maceira/Leiria tinha um afilhado na Guerra que amava como filho.
Embora não soubesse aonde se encontrava e de quem recebia raras notícias escritas (embora não soubesse ler), foi muito animada a pé à Cova de Iria, com uma vizinha pois o marido, que não era de padres, não quis ir. Segundo contou, e isso foi repetido na família durante anos, não se apercebeu de alguma coisa em especial, o que a deixou triste, pois ia esperar encontrar algum conforto.
O sobrinho regressou são e salvo.
A 13 de outubro a Senhora declarou-se muito ofendida, anunciou que a Guerra terminou e que os soldados iriam voltar para casa.
Individualidades tão diversas como António Sérgio e o católico Domingos Pinto Coelho, defenderão que nada de especial se passou em Fátima, para além de uma variação natural da luz do Sol com a densidade das nuvens em movimento.
O alcobacense, Artur Faria Borda, embora fosse menino ao tempo, ouviu falar no assunto, mas tal como os demais em casa, nunca acreditou no Milagre do Sol.
Estes acontecimentos ocorreram num momento em que o esforço de guerra muito desestabilizava a República, com o aumento do custo de vida, crescimento do desemprego e os motins derivados da escassez de alimentos. Após a entrada oficial na Guerra, alguns partidos republicanos uniram-se no apoio ao governo, e os monárquicos receberam ordem, do exilado D. Manuel II, para se absterem de política, enquanto a Guerra durasse.
A Igreja Católica era a única oposição organizada que podia instrumentalizar a aversão à guerra e as pastorais dos bispos assumiram em 1917 um tom crítico que levou a que seis fossem expulsos das respetivas dioceses. Entre 1920 e finais de 1924, a ação dos políticos republicanos tornou-se mais direta, intensa e violenta. O Governador Civil de Santarém proibiu uma peregrinação a Fátima em 13 de maio de 1920, cumprindo determinações do Ministro do Interior, pelo que chamou a Guarda Nacional Republicana, para ocupar as estradas de acesso.
Os incidentes iriam prosseguir.

A Capelinha das Aparições foi dinamitada em 6 de março de 1922, na linha de outros atentados ocorridos pelo País, o que criava grande insatisfação entre a população crente, mas não só.
As aparições poderiam ter caído no esquecimento, como mais uma manifestação de protesto, se a Igreja com o beneplácito do Estado Novo, não tivesse feito delas, o coração da reconquista cristã de Portugal.
As aparições da Virgem e o incremento da devoção mariana, potenciaram a feminização do catolicismo português.
Sendo o anticlericalismo uma manifestação fundamentalmente masculina, as mulheres, constituíam outrossim, a reserva da Igreja. As mulheres deviam sacrificar-se para conseguir, neste mundo, a felicidade e bem estar do marido e filhos, e no outro, a salvação das suas almas.
Das mulheres dependia a vida da paróquia. Em casa, sozinhas ou em grupo (filhas e vizinhas), trabalhavam para a Igreja em bordados e rendas, confecionavam roupas para os pobres e participavam em obras de caridade. Preparavam as procissões, vestiam os anjinhos e decoravam os andores. A partir dos primeiros anos do século XX, a catequese passou a depender quase por completo das mulheres que doutrinavam as crianças para a Primeira Comunhão, Comunhão Solene ou Profissão de Fé.
Considerando que o casamento muitas vezes resultava de ajuste entre famílias, isso acarretava um fosso entre os membros do casal quanto a crenças e comportamentos religiosos.
À mulher cumpria rezar pelo marido e tentar evitar que os filhos seguissem as más pisadas paternais, no bordel ou taberna.
-A GUERRA NA FIAÇÃO E TECIDOS DE ALCOBAÇA-
A Companhia Fiação e Tecidos de Alcobaça teve ao serviço alguns operários que estiveram na Flandres durante a Guerra, pelo que regressados a direção, atribuiu-lhes uma pensão anual de 100$00 que se manteve durante alguns anos.
A consciência social do diretor Fernando Sá e acionistas nortenhos foi determinante.
No dia 9 de abril, aniversário de La Lys, por volta das 15horas, procedia-se na Fiação e Tecidos, a um minuto de silêncio em homenagem aos portugueses que participaram e tombaram no conflito. Para o assinalar, o Apito Grosso da sirene da fábrica tocava para o pessoal se perfilar em sentido e recolher em silêncio. Mas havia também o Apito Fino (o Apito Grosso era o toque utilizado para o início de cada turno de trabalho). Ao mesmo tempo, era desligada a energia elétrica, as máquinas paravam, só reiniciando a laboração, contra novo toque do Apito Grosso.

O 1º. de maio, na Companhia de Fiação e Tecidos, com o apoio de diretor, era festejado nas instalações com projeção de cinema ao ar livre no jardim, e lanche, oferta de bibes e leite aos filhos do pessoal. Nesse dia, desfilava o Corpo de Bombeiros, comandado pelo Diretor da Fábrica, bem como a Banda sob a batuta de António Aniceto e da qual faziam parte vários antigos combatentes.
Em vários aspetos, o funcionamento e organização da Companhia Fiação e Tecidos de Alcobaça eram modelares, tendo em atenção os padrões nacionais e coevos, pois de acordo com os Estatutos da Caixa de Socorros e Pensões dos Empregados e Operários, os sócios auferiam vantagens na aposentação (a pensão na aposentação ordinária, correspondia, para os empregados, a três quartos do vencimento do ano anterior, para os operários a mesma percentagem sobre o salário da última semana ou sobre a média, se o trabalho for por empreitada subsídio pecuniário, metade do salário, sempre que a doença se prolongasse por mais de três dias), assistência médica com consultas, socorros farmacêuticos e medicamentos aos sócios, com mais de seis meses de inscrição.
Cerca de 100 anos decorridos, pode-se afirmar que muitos políticos portugueses, como os Democráticos e Evolucionistas, sem esquecer o alcobacense Artur Faria Borda, entendiam que o interesse nacional colonial e republicano, passava por estar ao lado dos Aliados contra a Alemanha, apesar de não se confiar muito na idoneidade política dos britânicos em relação a Portugal. Os Democráticos e Evolucionistas defendiam que a intervenção portuguesa deveria ocorrer independentemente do pedido ou necessidade ingleses. Os Unionistas e Monárquicos, estavam liminarmente contra Afonso Costa (o grande adversário e denominador comum), bem como os clericais (os Franceses eram ateus e maçónicos, os Ingleses protestantes e os Russos autocráticos e cismáticos), que tinham opinião oposta, que passava, nalguns casos, por esperar para ver, embora todos inicialmente pensassem que a guerra não seria muito prolongada, talvez nem chegasse ao Natal.
Não estavam esquecidas as conversações secretas ocorridas em 1913 entre a aliada Inglaterra e Alemanha, para partilha das colónias portuguesas, numa reedição do que se tentara em 1898.
A Alemanha tinha grandes e nada equívocas ambições territoriais e desencadeara na imprensa uma agressiva e depreciativa campanha do intoxicação contra Portugal e seu Império Ultramarino, bem como escaramuças territoriais em Angola e Moçambique. Caso Portugal entrasse na Guerra, ao lado dos Aliados tidos previsivelmente como vencedores, opinião corrente, pelo menos, até meados do conflito, o perigo da perda das colónias seria quase eliminado.
A Espanha era germanófila e neutral.

Não menos despiciendo, era a pretensão de a República obter o reconhecimento e respeito internacionais, o que não acontecera até 1914.
No esforço de guerra, chegaram a estar mobilizados perto de 200.000 militares portugueses, na esmagadora maioria em plena pujança de vida.
Em Montes, como em muitos outros locais do País, os rapazes que foram para a guerra, deixaram as prometidas à espera. Os que regressaram, por vezes com a manga do casaco a pender vazia, pulmões afetados gravemente ou afetados emocionalmente, foram mesmo assim obrigados a casar.
As perdas somaram quase 10 mil mortos e milhares de feridos e estropiados física e psicologicamente, além de custos económicos, para além da capacidade nacional.
Júlio Henriques dos Reis Godinho, depois de regressar de França casou com uma moça de Coz, indo viver para a Maiorga.
Durante a sua estada em França, Júlio Godinho teve um trato amoroso, da qual nasceu um rapaz, pelo que foi mantendo algum contacto esporádico por correio, com a mãe deste.
Cerca de 30 anos passados após o termo da Guerra, o rapaz com uma forte barba escura, veio à Maiorga conhecer o pai. Acontece, que a PIDE, sabendo que ele pertencia ao Partido Comunista francês, e que por causa de problemas com as autoridades teve de se refugiar em Marrocos, veio detê-lo, colocando-o na fronteira de Vilar Formoso com bons conselhos, não sem antes o ter passado pelo crivo de um interrogatório apertado.
Nunca mais se encontraram.
Não se pode concluir que os objetivos que levaram Portugal a entrar na Guerra com tantos sacrifícios e dor, tenham sido alcançados, salvo a defesa das colónias.
O clima político, económico, apesar de uma pequeníssima e aparente euforia momentânea e mesmo social que o País atravessou após a I Guerra não permitiu oferecer aos combatentes regressados, o acolhimento solidário e reconhecida reintegração que o seu sacrifício merecia e impunha. Este facto levou a que muitos dos combatentes, nomeadamente os feridos, mutilados, exaustos e deprimidos, que além de esquecidos pelo Estado, fossem também hostilizados pelas famílias.
Foi perante este quadro de penúria, miséria mesmo, e sofrimento em que viviam muitos inválidos de guerra, viúvas e órfãos, que um grupo de combatentes decidiu no final de 1919, dar os primeiros passos com vista à criação de uma organização que pudesse dar alguma, ainda que ténue, resposta a essa situação de profunda injustiça. 


Sem comentários: