Por alturas do terceiro quartel do século
XIX, Augusto Pereira d’Araújo Rosa, oficial de diligências, natural do Porto,
conhecido por milhafre, foi colocado
no Tribunal de Alcobaça para servir como oficial de justiça.
Ao fim de algum tempo, estabeleceu-se,
também, como alfaiate.
Pessoa de ideais republicanos, levou a
família a partilhar deles, nomeadamente o seu filho mais velho Eurico (nascido
em Alcobaça, a 23 de outubro de 1880, registado a 10 de abril de 1881 e
batizado a 12 seguinte, teve como padrinho o solicitador encartado António
Caetano Villa Nova). Além deste, teve ainda mais 3 filhos, Ernesto (viria a
dirigir os armazéns da Fábrica de Fiação e Tecidos e seria o Comandante do seu
corpo de Bombeiros), António (comerciante de máquinas de costura e ourives) e
Maria da Conceição (doméstica).
Arrojado, de confiança do Juiz do Tribunal
de Alcobaça, pouco antes de se reformar ainda era encarregado de no comboio
conduzir a Lisboa perigosos presos (embora com a colaboração de uma força do
Quartel), para cumprirem penas em estabelecimento de segurança ou degredo.
Eurico Pereira de Araújo Rosa, em estudante,
começou a destacar-se através da intervenção em círculos político-republicanos de
Alcobaça, bem como pela escrita no Semana
Alcobacense, onde redigia editoriais, artigos e os versos Remoques, sob o
pseudónimo de X, ao lado de Pereira
Zagallo, Afonso Ferreira, Raúl Proença ou Bernardo Villa-Nova, o que lhe era
facilitado por também ser tipógrafo.
A causa pública
esteva à frente de outros interesses, ainda que republicanos. Não admira que,
em 1914, tenha sido eleito Presidente da Comissão Executiva Câmara de Alcobaça,
cargo que ocupou até 1917 (sem pretender a recondução), suportando discreta e
estoicamente, mesmo com prejuízo da vida familiar (por alturas do sidonismo
teve de se refugiar na Alisseira, localidade perto de Alcobaça onde tinha uma
propriedade), um período extremamente difícil da vida do País e da Autarquia,
já que eram manifestas a penúria, as carências, pobreza e instabilidade
política e social.
A Monarquia Constitucional, tinha
consagrado a separação de poderes, levando à distinção entre as funções
administrativa e judicial.
A nível local, a
função judicial era exercida por tribunais e juízos, totalmente
separados das Câmaras Municipais. Em termos administrativos, a reforma de Mouzinho da Silveira, introduziu a figura do Provedor de Concelho, substituindo o
Juiz de Fora, como magistrado administrativo. Só que, ao invés do Juiz de Fora,
o Provedor do Concelho não acumulava a Presidência da Câmara com as funções de
representante da Coroa. O Presidente da Câmara, órgão representativo municipal,
passou a ser eleito entre os vereadores. A separação entre a magistratura
administrativa e a câmara municipal continuou com a substituição da figura do
Provedor pela do Administrador de Concelho. O Presidente da Câmara era o chefe do
executivo municipal.
Com a implantação da
República, nos termos da Lei 88, de 7 de agosto de 1913, as Câmaras Municipais vieram a ter dois órgãos, sendo
um executivo (Comissão Executiva da Câmara Municipal) e outro deliberativo (Senado Municipal). O Administrador
do Concelho manteve-se como o magistrado administrativo concelhio. A chefia do
executivo municipal passou a ser desempenhada pelo Presidente da Comissão Executiva da Câmara Municipal, como foi o
caso de Eurico Araújo.
Os autores e os
textos nem sempre são rigorosos nesta distinção, o que por isso pode acarretar
alguns erros .
Há muito a população
da Vila de Alcobaça reclamava no sentido de se proceder ao alargamento da Ponte
da Olaria, sobre o Rio Alcoa (esta não é a Olaria de Alcobaça, empresa de louça
decorativa fundada em 1927, que encerrou na década de 1980), obra que a Câmara
Municipal não tinha capacidade para efetuar por si.
Assim, foi recebido
na sede do Município (8 de abril de 1914), com agrado, júbilo mesmo, um
telegrama do Deputado Afonso Ferreira, comunicando a concessão de uma verba de
2.100$00 destinada a essa finalidade. Por outro lado, o diretor das obras
públicas do Distrito de Leiria Charters de Azevedo, escreveu nesse mesmo dia a
Manuel Vieira Natividade e a Alfredo Jacobetty, membro da Câmara Regional
Agrícola, dando-lhes conhecimento da excelente notícia.
A Câmara não perdeu
tempo, graças ao empenhamento pessoal de Eurico Araújo e, em junho, deu início
às obras que iriam melhorar o aspeto estético do local e a fluidez do trânsito.
Hoje em dia não restam vestígios.
Com Eurico Araújo a
Câmara Municipal deliberou tratar da obtenção gratuita da Igreja Nova, aliás em
bastante mau estado e sem utilidade,
a fim de ali ser feita a instalação do Museu e Biblioteca municipais (o que não
aconteceu) e que depois veio a ser demolida.
Também foi
deliberado que, caso não seja possível a obtenção gratuita, a Câmara poderá
considerar o pagamento de uma renda de valor módico que seja arbitrado e que
não ponha em causa obra tão meritória.
Cessado o mandato de
Presidente da CE da Câmara, Eurico Araújo continuou ligado ao Município, como
Chefe da Secretaria ainda que no tempo do Estado Novo, sem que isso implicasse
simpatia com este.
E. Araújo, foi agraciado a 28 de junho de
1919, pelo Governo da República, como Oficial da Ordem Militar de Santiago da
Espada, tendo sido o Presidente da República António José de Almeida, quem, em
Alcobaça, lhe impôs a condecoração.
António José de Almeida, era muito estimado
e considerado no meio republicano de Alcobaça, que não esquecia a deferência ao
convidar Raposo de Magalhães para Governador Civil de Leiria.
No Governo Provisório, António José de
Almeida assumiu a pasta de Ministro do Interior. A conversão daquele que era
tido como um agitador revolucionário, num estabilizador da ordem burguesa, foi
bem aceite pelos republicanos de Alcobaça, embora mal recebida por outros, que
da incredulidade e desilusão iniciais passaram a manifestar-lhe animosidade.
O facto de não ter
sido possível consultar o processo de agraciamento de Eurico Araújo (que se
extraviou de acordo com informação da Secretaria-Geral da Presidência da
República), impede conhecer as razões específicas que estiveram na origem da
condecoração. Por se tratar de uma Ordem que permanece semelhante nos seus
objetivos e pressupostos desde que foi reformada por Alvará de 31 de outubro de
1862, é de admitir que os méritos considerados do (ainda jovem) Eurico Araújo,
tenham também sido literários ou artísticos, embora fundamentalmente
político-partidários, tendo em conta que Sidónio Pais, de quem foi opositor, já
não era Presidente da República. O agraciado foi músico, escritor/dramaturgo,
poeta, jornalista, e ator de teatro, pioneiro na utilização de pratos
decorativos em faiança de Alcobaça, com rimas fáceis de sua autoria, embora não
assinadas, as quais passam por ser de poesia popular. Nos tempos livres,
pertenceu ao Grupo Dramático Villa Nova, foi fundador e executante na Banda de
Alcobaça, com ela saindo em todas as atuações que nunca perdia, autor da letra
do Hino do Rancho do Alcoa, bem como de peças de teatro amador, representadas
no Teatro Alcobacense, nas quais também assumiu o papel de ator.
A
Banda de Alcobaça (que renasceu há anos), foi fundada por Eurico Araújo, João
Sanches da Silva, Alberto Rodrigo Aurélio, Artur Rodrigues de Oliveira, António
Martins Marques, José dos Santos Calçada, Estevão Soares Prudêncio e Joaquim
Silvério de Carvalho, segundo reza a história, no dia 19 de Março de 1920.
Inicialmente
era composta por cerca de vinte alunos, e hoje integra mais de quarenta
elementos. A Banda (surgiu depois de desaparecidas a Filarmónica Alcobacense e
a Real Fanfarra), trajava a farda à maruja, na tradição da Real Fanfarra e desfilava
garbosamente pelas ruas da vila.
Por
Alvará de 26 de abril de 1919, a Vila de Alcobaça foi condecorada por António
José de Almeida com o grau de Cavaleiro da Ordem Militar da Torre e Espada, do
Valor Lealdade e Mérito, em reconhecimento pela participação do seu quartel, em
janeiro de 1919, no Movimento de Santarém, na defesa da República.
Este
processo de condecoração também se extraviou.
Até falecer (27 de
agosto de 1948), E.A./Eurico Araújo não se preocupou especialmente com
protagonismos ou honras, ao que refere a família.
Nos dias que correm
está algo esquecido, salvo pelo neto, Dr. Jorge Arújo que preza a sua memória,
embora não se tenham chegado a conhecer.
O Juiz Dr. Silvino
Villa Nova, sobre Eurico Araújo escreveu a 31 de agosto de 1986, no semanário Voz de Alcobaça, na seção Figuras Ilustres do Concelho de Alcobaça,
tal como Artur Faria Borda, no mesmo jornal em 30 de setembro de 1986.
1 comentário:
I am looking for the living familiy of Eurico Perreira Araujo. He married Maria Oliveira, who was the sister of Antonio Miguel Oliveira. He left Alcoba in 1902 and went to South Africa.WE are his family. I have tried to find Dr Jorge Araujo who you refer to in your blog. Please can you help me? My e-mail is admin@ihtsa.com.
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