quinta-feira, 8 de setembro de 2011

(VII) NO TEMPO DE D.PEDRO, D. INÊS E OUTROS Histórias e Lendas que o tempo não apagou (COMEMORAÇÕES INESIANAS)


Em 1944, Leitão de Barros realizou o filme Inês de Castro, um dos clássicos do tempo do Estado Novo, numa co-produção hispano-portuguesa com apoio governamental e dedicado à memória de Manuel Vieira Natividade. Os produtores aproveitaram as facilidades que se davam em ambos países para este tipo de realizações.
A postura do governo português, face ao cinema, está de certo modo bem expressa, num discurso de António Ferro (SNI), pronunciado em finais de Dezembro de 1947, durante o ato de entrega dos prémios cinematográficos do ano. Ferro, colocava os filmes históricos em segundo lugar da classificação das películas que interessavam ao salazarismo/Estado Novo, depois dos filmes regionais ou folclóricos. Os filmes históricos marcam (...) um dos caminhos seguros sólidos, do cinema português. Aqui o cinema nacional acompanha a tendência da nossa própria literatura contemporânea onde os estudos históricos ocupam, neste momento, um lugar de alto relevo. É um cinema caro, nem sempre com fácil colocação fora de Portugal e que muitos consideram falso, artificial. Não importa!

Leitão de Barros procurou não ferir suscetibilidades políticas, pelo que realizou duas versões, uma portuguesa, outra espanhola. A história de Inês era uma trama peninsular e, para a levar ao cinema, Leitão de Barros teve que pesar a História e a Lenda. A lenda, é bem portuguesa, mas a história ultrapassa as nossas fronteiras. A lenda apresenta-nos um rei consumido pelo desvario de uma paixão que o leva a esquecer deveres com o País e o Povo. Mas estes amores, tal como os conhecemos da história que nos chegou, enredam-se também na intriga política internacional, em que a Castro servria interesses estrangeiros e os seus matadores desejos portugueses.
Afinal, tratou-se de um acto criminoso, excesso de poder ou um acto de justiça imposto pela política?
Apesar de o filme ter uma grande base histórica, nem por isso deixa de dar profundo (e fácil) relevo aos amores incómodos.
Se Inês não tivesse morrido nestas trágicas circunstâncias, quem hoje recordaria essa mulher, ainda que muito bela ou insinuante, amante de um príncipe herdeiro ou mulher de um rei?
Naquela contradição, perpassam os matadores, umas vezes assassinos implacáveis, sem sentimentos e a soldo, outras homens honrados, cientes do risco, fiéis ao Rei e à Pátria.
Nos anos 40 do século XX, em pleno Estado Novo, estas intervenções de índole histórica, estavam conforme as necessidades da sua implantação João Ameal (in História de Portugal), autor comprometido com o salazarismo, apresenta D. Pedro, na perspetiva de justiceiro popular, um senhor de justiça íntegra, atenta a cada caso, diligente e eficaz. O povo sabe que tem o rei por si. D. Pedro está sempre ao alcance dos que precisam da intervenção régia. É assim a justiça, uma mão espalha benesses, outra segura o gládio. O povo aprova a ação do soberano, que lhe assegura o bem-estar, a prosperidade económica, a ordem moral baseada na clara e inflexível justiça.
Para Aquilino Ribeiro (in, Príncipes de Portugal, Sua Grandeza e Misérias), a imagem é diametralmente diferente: O infante que tanto que reparou nela, ficou enamorado, acabando por perder o juízo que já era pouco. (…) No nosso labrusco D. Pedro, a dança era uma bambochata, saricoté de escravos. (…) Este rei era tudo o que há de mais ramboeiro, e em chulas, comezainas e lausperenes, consumia os maravedis que lhe chegavam à mão (…).


FLEMING DE OLIVEIRA
NOS 650 ANOS DA TRANSLADAÇÃO DE INÊS DE CASTRO PARA ALCOBAÇA

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