quinta-feira, 8 de setembro de 2011
(VI) NO TEMPO DE D.PEDRO, D. INÊS E OUTROS Histórias e Lendas que o tempo não apagou (COMEMORAÇÕES INESIANAS)
Sobre Inês de Castro foram também produzidas peças musicais, com destaque para a Inês de Castro (música de Giuseppe Persiani e libreto de Salvore Cammmarano), que estreou no teatro San Carlo-Nápoles, a 28 de Janeiro de 1835. Esta ópera, em três atos, entretanto um pouco esquecida, foi apresentada no Pátio da Universidade de Coimbra, a 6 e 7 de Junho e nas escadarias do Mosteiro de Alcobaça, a 10 de Junho de 2003, com alguma expectativa.
Inês de Castro continuou a interessar compositores contemporâneos, sendo também de referir a peça de James McMillan, a primeira ópera deste compositor escocês católico, nascido em 1959, apresentada no Coliseu do Porto em 2001, no âmbito do Porto-Capital Europeia da Cultura.
Narrado por Fernão Lopes, trovado por Garcia de Resende, poetizado como ninguém por Camões, dramatizado por António Ferreira, mitificado por Manuel Faria de Sousa, o episódio de Inês de Castro entrou no imaginário nacional português, e até no europeu.
Ainda talvez esteja na memória de alguns alcobacenses, a representação, de A Castro, de António Ferreira, no adro do Mosteiro de Alcobaça, pela companhia de Amélia Rey Collaço e marido Robles Monteiro, na noite de 25 de Agosto de 1935, numa encenação de Júlio Dantas.
Foi considerada como uma manifestação artística sem par, aliás repetida anos depois, 30 de Agosto de 1941. Segundo o Diário de Notícias, Amélia Rey Colaço acabara de encontrar a expressão definitiva de um espetáculo nacional e No templo gótico transformado pela magia da luz, aconteceu um milagre.
Nesta representação grandiosa e imponente, participaram cerca de 400 figurantes, que utilizaram adereços do Torneio Medieval e do Cortejo, organizado por Leitão de Barros, em Lisboa. Em Alcobaça e no Mosteiro, pode-se concretizar um projeto antigo de Amélia Rey Colaço, que nessa década dos anos trinta foi considerado um ponto alto da sua carreira.
O espetáculo começou com Palmira Bastos a dizer (obviamente) Afonso Lopes Vieira:
Na Estremadura, coração de Portugal
Entre mosteiros e castelos e memórias
Alcobaça rebrilha entre as mais altas glórias,
Primeiro Afonso invocou Claraval.
Povo da nobre Vila! Ante vós neste adro
Vamos representar a tragédia de chama
E compor para vós o mais formoso quadro
Que o amor neste mundo inspirou quem ama.
Perto daqui, lá dentro, os túmulos de encanto
Monumentos que o mundo aqui vem admirar
Vibram de beijos, de saudades e de pranto.
E assistem entre nós (noss’alma e adivinha)
Eternos na paixão, sombras dispersas no ar,
D. Pedro Rei do Amor, e Dona Inês Rainha!
O momento culminante foi a encenação do enterro de Inês. O Diário de Lisboa descreveu com destaque o espetáculo, relevando a vasta figuração, os sinos a dobrar a finados, e os violinos que gemiam os últimos acordes musicais da oratória acompanhados dum rumor surdo, de uma luz de luar, derramada sob o préstito fúnebre, desde a base da escadaria, até à entrada do templo.
Esta segunda representação de A Castro, no adro do Mosteiro, na noite de 30 de Agosto de 1941, estava inserida no que se pretendeu ser os Festivais de Alcobaça, que não tiveram seguimento. Afonso Lopes Vieira escreveu, que esta segunda tentativa de Grande Arte no sentido mais português e mais europeu faz-nos esperar que venha a criar-se nesta nobre vila o Ciclo Nacional de Teatro e Música, capaz de ser tão belo como os mais belos da Europa. Então haveria Portugal, documentado da maneira mais bela as capacidades do seu espírito. Ajudemos, pois, com amor e saibamos ser gratos ao Heroísmo artístico da empresa Rey-Colaço-Robles Monteiro. Neste Agosto de 1941, o Festival de Alcobaça consistiu, na noite de 29, num Concerto de Música Espiritual na nave do Mosteiro (I Parte), com áreas de Bach, o poema sinfónico de César Franck e a música dos executantes de Cruz Fidelis, bem como uma representação no claustro do Mosteiro (à esquerda da Igreja) do Mistério de Gil Vicente- Auto de Mofina Mendes (II Parte), (…) uma obra humana e divina a que a Virgem preside e em que a realidade destrói os arroubos de fantasia numa réplica interpretativa de um conto milenar oriental (…), numa encenação de Amélia Rey Colaço e Robles Monteiro.
A representação de A Castro, na noite do dia 30, constituiu um notável e cuidadoso espetáculo em termos de efeitos de luz, guarda-roupa, adereços, brocados e cabeleireiro, onde além dos atores da tragédia, Amélia Rey Colaço, Lucília Simões, Raúl de Carvalho, João Villaret, Robles Monteiro, Igrejas Caeiro, Vital dos Santos, José Cardoso e Augusto Figueiredo, atuaram o Choro das Moças de Coimbra e Orquestra, sob a regência do maestro René Bohet.
Como em 1935, por uma noite de milagre, A CASTRO, volta a ser representada sobre o fundo evocador, dominador, impressionante de Stª Maria de Alcobaça, monumento tão ligado à tragédia quinhentista de Ferreira, que já nos parece que sem ele faltaria à obra uma personagem. O mosteiro que guarda os túmulos de Pedro e de Inês, aguarda também um pouco de drama que a morte acabou e começou de novo, dando-a à imaginação dos intrepretadores. (…) A luz, que é a cortina que se abre para exibir o espetáculo, cria logo um ambiente roçando a pedraria e os vestuários e chamando o público para o campo da tragédia, valoriza a forma e o relevo do cenário e trá-lo também para a ação. O choro, outra personagem essencial da obra, ora vivendo como comentador, ora como interlocutor, enleado na linha evolutiva, fecha-a num parêntesis camoneano, tão ajustados e próprios se acharam os versos do Príncipe ao comentário coral criado por Ferreira. Complemento do ambiente imaginado, poetização melódica dos versos do autor, como óleo de penetração sensível, a música intervém também acompanhando o lirismo dos ritmos propositadamente irreal, nebulosa, indefinida quasi sonho, quasi imaginação um cortejo fúnebre sobre o ponto final da morte de Inês, dará ao público a nota evocadora da interpretação passional das gerações que ainda souberam acrescentar em beleza uma História de Amor.
(CONTINUA)
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