sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

A GNR, OS INFORMADORES DA PIDE, O SOLD. MENESES E HUMBERTO DELGADO

 


 

FLeming de OLiveira

 

 

 

 

A GNR de Alcobaça, além do policiamento das zonas rurais e manutenção da ordem, tinha instruções para fiscalizar a atividade da oposição.

Os agentes usavam, por vezes, roupas civis para entrar em tabernas e outros locais de convívio, controlar os elementos tidos por afetos à oposição, especialmente ao PC, saber quem ouvia a Rádio Moscovo ou a Rádio Argel, lia material proibido ou tão só dizia mal do regime. E contactava com informadores, que depois reportava à PIDE. Entre os que a GNR controlava, Oliveira lembra-se de Eurico Granada, que vivia junto ao Posto, aonde tinha de se apresentar mensalmente, nunca soube porquê. Mas este, por vezes esquecia-se de o fazer. Todavia, o sold. Hermínio Oliveira, que simpatizava com ele, assumia a responsabilidade de registar a apresentação, como se tivesse sido feita.

 

Era sacristão, carpinteiro, vivia para os lados de Turquel ou Benedita e vinha numa motorizada com alguma regularidade ao Posto de Alcobaça da GNR. Só falava com o Comandante do Posto. Entrava para o seu gabinete, fechavam a porta e eram dadas instruções para não serem incomodados. O que lá se passava, não transpirava para o exterior e ninguém fazia perguntas. Eram seguramente coisas importantes que não diziam respeito ao pessoal. 

Um dia o homem saiu a resmungar e desabafou: Estou farto. Esta é a última vez que trabalho para a GNR.

O sold. Hermínio Oliveira, ouviu, nada comentou, mas começou a pensar. E como era da confiança do comandante veio a saber, muito confidencialmente assim lhe foi recomendado, que se tratava de um informador da PIDE, que vinha com um relatório, sem prejuízo do que fazia por escrito com a delegação de Leiria, junto ao Governo Civil.

O homem estava muito contrariado, pois da última vez as suas informações foram pouco valorizadas em Leiria, a ponto de ser ameaçado que com tão fracos resultados seria posto fim à relação existente entre ambos ou diminuída a remuneração, que era de cerca de 25$00 por mês. Seja como for, Hermínio não tornou a ver o homem no posto.

Tempos depois cruzaram-se mas foi como nunca se tivessem visto.

 

Joaquim Meneses encontrou-se várias vezes com Humberto Delgado, nomeadamente na sua quinta. Quando era a festa de S. Pedro, deslocava-se para lá uma patrulha da GNR, de que Meneses fez parte várias vezes. Aliás, a Igreja de S. Bento situa-se na propriedade de Delgado. Quando o pessoal da Guarda chegava, Delgado dava instruções à cozinheira para servir um bom almoço e ser bem tratado. Falava cordialmente, embora com banalidades, com os elementos da patrulha, dizendo-lhes que ali havia boa gente e para estarem à vontade.

 

Meneses salienta que os elementos da GNR, antes de saírem em serviço no dia das eleições, tinham de ir votar, o que no seu caso fazia por mero dever de ofício, pois que nunca teve interesse pela política. Ia votar nas listas da UN, pois no dia anterior, o comandante do Posto, no cumprimento de instruções que vinham de Leiria ou Lisboa, dizia-lhes com veemência aonde o voto tinha de ser colocado.

O carisma do General acarretou um epílogo inédito, isto é, o candidato não desistiu de ir às urnas, apesar de lhe ter sido impedida a fiscalização do escrutínio e as eleições terem sido falsificadas.

Veja-se o telegrama que Delgado enviou a Tomás e que nunca teve obviamente resposta.

Ex. Sr. Almirante Américo Tomás

Num país civilizado e democrático de eleições livres, eu teria enviado a V. Ex.ª um telegrama de parabéns pela vitória nas eleições. Sucede, porém, que eu fui violentamente roubado nas eleições, além de perseguido e vexado. Por isso, muito lamento que V.ª Ex.ª se decida a aceitar um cargo obtido por aquela forma. Porque talvez V.ª Ex.ª desconheça, transcrevo por tradução um passo do New York Times, de 10 do corrente:

O general Humberto Delgado, é claro, perdeu por uma larga maioria a favor do candidato escolhido por António de Oliveira Salazar, o ditador e Primeiro-Ministro. O nome do vencedor é, por acaso, Almirante AméricoTomás, mas isso não tem qualquer importância. Ele não terá qualquer poder, e o doutor Salazar podia da mesma forma ter escolhido o polícia de trânsito mais à mão.

Este passo dá ideia do que no estrangeiro se pensa da farsa das eleições e da função que a V.ª Ex.ª atribuem como Presidente da República eleito por aquela forma, afrontosa da dignidade humana.

A Bem da Nação.

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