Em 25 de Abril de 1974 Amílcar
Coelho[1],
saiu da Escola Prática de Cavalaria, em direção a Lisboa, integrado na coluna
comandada pelo Cap. Salgueiro Maia[2]. Numa expressão que se tornou popular
com o livro de Alfredo Cunha e Adelino
Gomes[3], Amílcar Coelho reclama-se
um dos rapazes dos tanques, tanto mais que o sucesso da missão e da coluna
foram determinantes na queda do Regime. Entretanto Paulo de Carvalho cantara na
rádio E Depois do Adeus[4].
Nesse
dia, A. Coelho com 21 anos e 4 meses de tropa, montou guarda ao Banco de
Portugal, de tarde participou no cerco ao Quartel do Carmo, à noite ficou de
atalaia à RTP enquanto o Gen. Spínola lia a proclamação da Junta de Salvação
Nacional. O Terreiro do Paço foi ocupado com sucesso às primeiras horas
da manhã, seguindo-se o cerco ao Quartel do Carmo, onde se encontrava Marcelo
Caetano, que se rendeu ao final do dia, momento decisivo da queda da Ditadura,
que caiu estrondosamente, pondo termo ao Estado Novo. O povo saiu à rua e
ninguém pode mais impedir a Liberdade. O 25 de Abril, segundo Amílcar Coelho não
se reduz, à missão de/e com Salgueiro Maia, inclui o banho de multidão na
altura do regresso a Santarém do esquadrão vitorioso, as eleições um ano
depois, ou a campanha de dinamização Maio-Nordeste, em que foi um participante.
Alfredo
Cunha[5]
captou-o numa fotografia que se tornou icónica: deitado no chão, de arma
apontada, com a mão esquerda a exibir um V, tinha a seu lado sentados no
passeio 3 meninos, quais flores de abril,
na sua roupa esfarrapada, nos seus pés descalços, desta outra escola tão
singular, na qual se ensaia a gesta de trocar um cravo por uma bala.
Sobre o
25 de Abril entende, e em suma, como o seu “ativo”, a liberdade de expressão em sentido lato, e como o “passivo” que os
grandes fracaços são o desenvolvimento e
educação, a falha na criação de um mundo mais justo e solidário e que o
consumismo criado na década de 1990 não pode ser entendido como
desenvolvimento. Estou muito triste
porque ter sido educador dos passos coelho… desta geração que está agora no
poder e foi educada essencialmente no pós 25 de Abril. Mas também sabe e
condescende que, o mundo só será melhor
se nós quisermos que seja melhor. E para isso as pessoas têm de se envolver.
Para haver um 25 de Abril temos de sair do quartel.
[1] Operário a
estudar a noite antes do 25 Abril, Amílcar Coelho prosseguiu, com sucesso, a
carreira académica como trabalhador-estudante, licenciando-se em Coimbra,
fazendo Mestrado na Universidade Católica de Lisboa e Doutoramento na
Universidade Nova de Lisboa em Filosofia Contemporânea. Autor de vasta
bibliografia, presidiu à UGT-Leiria e foi professor e investigador até se
aposentar.
-Fez uma breve incursão político-partidária.
[2] Em 1973 iniciaram-se as reuniões clandestinas do MFA
e, Fernando Salgueiro Maia, como Delegado de Cavalaria, integrava a Comissão
Coordenadora do Movimento. Depois do 16 de Março de 1974 (Levantamento das Caldas da Rainha), foi
Salgueiro Maia, a 25de abril, quem comandou a coluna de blindados que
montou cerco aos ministérios do Terreiro do Paço forçando, no final da
tarde, seguindo as ordens de Saraiva de Carvalho, a rendição de Marcello
Caetano, no Quartel do Carmo. Salgueiro Maia escoltou Caetano
ao avião que o transportaria para o exílio. Na madrugada de 25 de Abril durante
a parada da Escola Prática de Cavalaria, proferiu o
célebre discurso: “Meus senhores, como todos sabem, há diversas modalidades
de Estado. Os estados socialistas, os estados capitalistas e o estado a que
chegámos. Ora, nesta noite solene, vamos acabar com o estado a que chegámos! De
maneira que, quem quiser vir comigo, vamos para Lisboa e acabamos com isto.
Quem for voluntário, sai e forma. Quem não quiser sair, fica aqui”. Todos os 240 homens, formaram
à sua frente e depois seguiram para Lisboa. A 25 de Novembro de 1975 saiu da
EPC, comandando um grupo de carros às ordens do Presidente da República.
Será transferido para os Açores,
só voltando a Santarém em 1979, onde ficou a comandar o Presídio Militar. Em
1984 regressou à EPC. A 24 set1983, recebeu a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, e, a título póstumo, o grau
de Grande-Oficial da Antiga e
Muito Nobre Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor, Lealdade e Mérito,
a 28 jun1992, e em 2007 a Medalha de Ouro de Santarém. Recusou ser membro
do Conselho da Revolução, adido militar numa
embaixada à sua escolha, governador
civil de Santarém e pertencer à Casa Militar da Presidência da República. Foi promovido
a major em
1981 e, posteriormente, a Tenente-coronel. Foi agraciado, a título póstumo,
pelo Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, com a Grã-Cruz
da Ordem do Infante D. Henrique, a 25abril2016 tendo
a condecoração sido entregue à viúva a 30jun 2016, véspera do dia em que
completaria 72 anos.
[3] José Afonso Oliveira e Adelino Gomes, naturais dos
Marrazes, encontraram-se na baixa de Lisboa na manhã de 25 de Abril, em plena
movimentação militar, o José dentro de uma “Humber” (autometralhadora) e o
Adelino de microfone na mão.
-No dia 9 dez2023 foi lançado o livro “Dos espinhos de maio aos cravos de Abril –
Outros alicerces”. Dedicado aos civis fardados que, durante
meses, em Santarém, contribuíram para que do pó das botas cardadas florescessem
os cravos de Abril, esta é a narrativa atual de um desfile de memórias com meio
século. Acompanhando de perto a odisseia de um jovem de Marrazes obrigado a
prestar serviço militar entre 1972 e 1975, o livro põe em evidência os ténues
sinais que, na infância e adolescência em Leiria, foi observando e a que vieram
juntar-se os vividos na sua juventude, então num horizonte geográfico muito
mais vasto, todos eles convergindo para a evidência de acelerada desagregação
do regime político. Primeiro em Mafra, durante uns meses, e depois na Escola
Prática de Cavalaria, em Santarém, durante mais de 2 anos, o jovem leiriense
tornou-se um dos cabouqueiros que ajudaram a construir, também de armas na mão,
os alicerces do 25 de Abril. Com início numa viagem inspiradora ao túmulo do
capitão Salgueiro Maia, o leitor é desafiado a espreitar alguns farrapos do terceiro
quartel do Séc. XX e, a envergar o traje verde militar e deambular pela Tapada
de Mafra, pela lezíria ribatejana e até por uma fugaz passagem pelo RI 7,
Leiria; desta viagem fazem ainda parte uma incursão bizarra às Caldas da Rainha
em 16mar1974 e outra, ao Terreiro do Paço e ao Largo do Carmo, em 25 de Abril.
Prefaciada por Cesário Borga, a obra termina com uma reflexão inédita e na
primeira pessoa de um contemporâneo do autor, também ele miliciano na Escola
Prática de Cavalaria, acerca dos desafios que, volvidos 50 anos, ameaçam os
valores simbolizados pelos Cravos de Abril. Pondo de parte a persona utilizada
na narrativa, é o próprio protagonista – agora calvo, enrugado e com um índice
de massa corporal nada recomendável – que entra em cena para, em apêndice
datado de finais de 2023, se apresentar e partilhar alguns pensamentos.
[4] Manuel Paulo de Carvalho Costa (Lisboa, 15mai 1947)
começou como baterista. Em 1962 foi um dos fundadores dos “Sheiks”. O sucesso
da banda, a que chamaram “os Beatles portugueses”, pôs-lhe fim às veleidades
futebolísticas nos juniores do Benfica. Em 1968 a tropa pôs fim à banda.
Regressado à vida civil fez parte de vários grupos, entre eles a “Banda 4” e o “Projeto
Fluido”, que fundou, e o Thilo´s Combo. Apesar de nos dois primeiros projetos
ser o vocalista principal, só em 1970 iniciou uma carreira verdadeiramente a
solo ao ser convidado para cantar “Corre Nina”, no Festival RTP da Canção. Venceu
o Prémio de Imprensa para melhor cantor de 1970. Voltou ao Festival da Canção
com “Flor Sem Tempo”. Em 1974, venceu o Festival RTP da Canção, com “E Depois
do Adeus” uma das senhas para o 25 de abril. Na Eurovisão ficou em último lugar
ex-aequo com as canções da Noruega, Alemanha e Suíça.
-Com a
transmissão de "E Depois do Adeus" pelos Emissores
Associados de Lisboa, às 22 horas e 55 minutos, do dia 24 de Abril ,
era dada a ordem para as tropas se prepararem e estarem a postos. O efetivo
sinal de saída dos quartéis, posterior a este, seria a emissão, pela Rádio Renascença, de "Grândola, Vila Morena". A razão da
escolha de "E Depois do Adeus" é clara, pois não tendo conteúdo
político e sendo uma música em voga, não levantaria suspeitas, podendo a
revolução ser cancelada se os líderes do MFA concluíssem que não havia
condições para a sua realização. A
posterior radiodifusão, na emissora católica, de uma música claramente política
de um autor proscrito daria a certeza aos revoltosos de que já não havia volta
atrás, que a revolução era para arrancar.
-É o
autor do Hino do PPD/PSD.
[5] Alfredo Cunha e Adelino Gomes in Os Rapazes dos Tanques.
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