sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

OS DOIS ARCOS DA MEMÓRIA- CANDEEEIROS E VIDAIS

 

 

 

 

 

OS DOIS ARCOS DA MEMÓRIA

CANDEEEIROS E VIDAIS

 

Fleming de OLiveira

 

 

 

Maria de Lurdes Costa Ribeiro é senhora que se destacou, pela vitalidade, vontade de servir e elevada noção do valor do serviço comunitário.

Foi a primeira Presidente de Junta de Freguesia do Concelho de Alcobaça, para cujo lugar, em Turquel foi eleita, em 1979.

Depois de ter estado emigrada com o marido na Alemanha, regressou a Portugal em 1973, pouco depois deste ter falecido e com um filho de 18, tendo sido sócia da “Solancis”, até 1992. A família do marido fazia pressão para que voltassem a Portugal, trabalhar na empresa, em franco crescimento que já era, como ainda é, uma referência, não só no Concelho de Alcobaça, mas no País, na área da exploração da pedra da Ataíja e Moleanos, bem como do vidraço, cuja produção em grande parte se destina à exportação.

Em 1992 a “Solancis”, que integrava duas empresas, dividiu-se ficando Lurdes Costa e o filho com a que se dedica à Construção Civil.

 

Em Julho de 1975, um conhecido e antigo fornecedor de componentes de máquinas para corte de pedra, estabelecido no Alentejo, na zona de Borba, foi à “Solancis” saber das necessidades, mas apresentando-se com um braço ao peito, engessado, e alguns hematomas faciais. Contactando com Lurdes Costa, que tinha a seu cargo as relações com o exterior, esta perguntou-lhe que acidente é que tinha sofrido, ao que respondeu que ao passar em Rio Maior, e o pessoal sabendo que era alentejano, mas desconhecendo os seus princípios e propósitos, provocou-o e agrediu-o, com tal violência, de que resultou a fratura de um braço e os hematomas. Todavia, este alentejano nada tinha de comunista ou simpatizante e até dizia que se dava muito bem com os fascistas, pois eram quem lhe pagavam a tempo e horas e o ajudavam a viver com decência.

Na empresa de Lurdes Costa Ribeiro, salvo um pequeno incidente, rapidamente sanado com o despedimento célere de alguns contestatários que reivindicavam de forma abusiva e exagerada aumento de salários e diminuição das horas de trabalho, não houve mais nenhuma contestação laboral e os sindicatos não tiveram oportunidade de intervirem.

 

Relativamente à “Solancis”, cumpre trazer ao conhecimento que os seus verdadeiros pais, foram os antepassados dos atuais sócios que iniciaram a exploração da pedra na Serra dos Candeeiros, numa pedreira denominada Vale da Louceira, sendo o seu primeiro exportador José Oliveira Delgado, na década de 1900. A exploração consistia no arranque da pedra e sua transformação, em pias, no próprio local. Essas pias, além de outras utilizações, tinham como função principal guardar o azeite, da azeitona que o lavrador apanhava e mandava transformar. Serviam as pias ainda para guardar e salgar porco, que se matava pela altura dos Santos e era governo para o ano inteiro. Do equipamento inicial constavam apenas alavancas e serrotes e especialmente a força do braço de dois trabalhadores, que ganhavam 7$50 por dia.

Pias e cantarias abasteciam as terras limítrofes de Alvorninha, Santa Catarina, Vimeiro, Cela, Alfeizerão, Bárrio, Famalicão e Nazaré, sendo o transporte feito por carro de bois. O serviço era moroso, necessitando de um dia para percorrer 30km. A partir de 1920, Silvino Oliveira Delgado, após herdar desenvolveu a actividade do pai, e já munido com macaca e mais tarde com compressor, dedicou-se ao trabalho de fazer cantarias e campas para cemitérios. A herança passaria doravante de pais para filhos, já que desde cedo o pai, os ia iniciando na arte e desenvolvendo o gosto pelo trabalho da pedra.

O filho mais velho, Manuel Costa Oliveira Delgado, em 1951, e com 17 anos de idade, assumiu a responsabilidade de fornecer à firma Marques da Cruz, de Leiria, o trabalho de pedra, para o Estádio da Luz. O entusiasmo e ritmo adquiridos levaram a Solancis a comprar um terreno no Casal do Carvalho-Benedita, para montar uma oficina e assim se constituiu em 1969, a Solancis-Sociedade Exportadora de Pedreiras, Ldª, dada a necessidade de satisfazer a procura de lancis e cantarias de calcário, vidraços e semi-rijos da Ataíja e Moleanos.

Inicialmente as suas pedreiras tinham estrutura produtiva insatisfatória, que se suspendia nos períodos de maior actividade agrícola. Por outro lado, eram manifestas as carências de equipamentos. Os blocos eram arrastados com alavancas, macacas e crapoud.

 

No curriculum da empresa consta o trabalho de reconstrução de um Arco da Memória, em 1981. O projeto foi do arquiteto Joaquim Pereira. A iniciativa do restauro, pois encontrava-se em ruínas, ficou a dever-se ao padre Manuel Vitorino da Silva Fernandes, Pároco de Vidais. Nos trabalhos, foram aplicadas cerca de 90 toneladas de blocos cortados e emparelhados na Solancis.

No cimo da Serra dos Candeeiros, existe um arco de volta perfeita que foi construído pelos Frades de Alcobaça para assinalar a divisão administrativa dos coutos. Segundo alguns autores, o arco data do século XVI e serviu para o Mosteiro definir os limites das suas terras. Há quem defenda que terá sido mandado erguer por Frei Bernardo de Brito.

Esse arco veio a ficar conhecido por Arco da Memória e está localizado no limite dos Concelhos de Alcobaça e Porto de Mós, mais precisamente, numa subárea da freguesia do Arrimal, chamada Memória. 

Conforme a conhecida lenda, D. Afonso Henriques, quando ia a caminho de Santarém, em 1147, jurou, do alto da Serra de Albardos-Serra dos Candeeiros, que caso a conseguisse conquistar, doaria a Bernardo de Claraval, os terrenos avistados na direção do mar. O lugar onde o rei teria feito esse juramento é onde se encontra o Arco da Memória.

De acordo com alguns autores (menos esclarecidos), no topo do Arco da Memória havia uma estátua, representando D. Afonso Henriques, ladeada por duas pirâmides. Mas, estão a fazer confusão com outro arco, um pouco maior nas suas dimensões, também chamado Arco da Memória e que fica situado numa povoação chamada Arco da Memória, pertencente à freguesia de Vidais, no Concelho de Caldas da Rainha.

Os habitantes da freguesia de Vidais chamavam ao seu arco, O Rei da Memória, porque a meio do cano constavam os seguintes dizeres: O Santo Rei D. Afonso Henriques, fundador de Alcobaça.

Não devemos esquecer, mais uma vez, que a lenda diz que D. Afonso Henriques terá prometido mandar erguer um mosteiro em homenagem a Santa Maria, nas terras concedidas a Bernardo de Claraval, caso conseguisse conquistar Santarém aos mouros.

No local da promessa feita pelo rei, ao cimo da Rua de Cister, da actual povoação designada por Arco da Memória, foi levantada uma estátua de D. Afonso Henriques e mais tarde um arco, o Arco da Memória. No cimo aplanado, foi colocada a estátua do nosso primeiro rei. Assim, o Arco da Memória permaneceu até aos dias em que a fúria republicana, destruiu o monumento, a 12 de janeiro de 1911. A destruição do Arco da Memória, encimado com estátua de D. Afonso Henriques, coincidiu com a construção da estrada municipal que liga a Benedita a Caldas da Rainha, via Alvorninha, pelo que quase todas as pedras do monumento que se encontravam espalhadas encosta abaixo foram partidas pelos cantoneiros e utilizadas para a construção da estrada. A estátua de D. Afonso Henriques fora vandalizada e ficou ao abandono. Mais tarde, foi salva por um habitante local, Joaquim Martins, que a guardou, enterrou e participou o feito às autoridades das Caldas da Rainha. Esse morador, mais tarde, foi encarregado de transportar a estátua para Caldas da Rainha. Ao chegar à cidade, o homem foi multado pois, ia no seu carro de bois, sentado em cima da estátua, o que foi considerado falta de respeito por um símbolo nacional. Diz-se que o homem pagou pela multa, três vezes  superior ao que veio a receber do frete. Posteriormente, a estátua foi levada para Leiria pelo Eng. Afonso Zúquete, que dirigia as obras de solidificação do Castelo. Atualmente, a estátua está situada no mirante da Avenida Ernesto Korrodi, no sopé do monte onde assenta o Castelo de Leiria. Inicialmente esteve no claustro do edifício dos antigos Paços Episcopais, na ocasião quartel do RAL 4, onde se aloja a PSP, até ser transferida para o local em que se encontra.

No dia 28 de junho de 1981, foi inaugurada a reconstrução do Arco com o contributo da população e de várias entidades públicas e privadas, como a Solancis. Desde essa altura, tem havido esforço para que a estátua de D. Afonso Henriques volte a ocupar o seu lugar, no cimo do Arco da Memória, na Freguesia de Vidais.

O Arco da Memória, sito na Serra dos Candeeiros, serviu como marco assinalando o limite dos coutos, a entrada de quem vinha fazer os seus negócios ou mesmo de quem vinha à procura de refúgio nas terras dos frades. Sobre este assunto, na nossa obra NO TEMPO DE SALAZAR, CAETANO E OUTROS. Alcobaça e Portugal, escrevemos a propósito de uma visita de D. Miguel a Alcobaça, que a maior parte dessa viagem à Região do Oeste, em agosto de 1830, decorreu nos coutos de Alcobaça, que continuavam a ser palco de conflitos acesos entre os frades e os aldeões, por razão do pagamento dos direitos senhoriais. O Marquês de Fronteira, recordou nas suas memórias que, em 1824 os rendeiros dos frades tinham-se rebelado, largando fogo às medas de trigo que pertenciam à comunidade e que o Abade Geral do Mosteiro se vira obrigado a chamar a tropa que estava em Leiria. No caso de Aljubarrota, o conflito traduzia-se na questão dos limites da doação de D. Afonso Henriques e arrastou-se desde os finais da Idade Média. Terá sido depois do jantar, durante uma conversa havida na varanda do seu quarto, que a questão foi apresentada ao Rei. O Esmoler-Mor, Frei António da Silva que fora Abade Geral dos Coutos de Alcobaça, durante o vintismo, aproveitou a ocasião para dizer ao Rei que nessa época os povos dos coutos, principalmente os de Aljubarrota, aproveitando-se da rebelião que as Cortes causaram, tinham arruinado o Arco Memória, onde fez voto o Sr. D. Afonso I, e que pedia a S.M. o mandasse reedificar.

Ora (independentemente da data de construção), o Arco da Memória assinalava o limite norte dos Coutos e era o símbolo material dos poderes do Mosteiro, cuja contestação o Abade circunscrevia ao período liberal. D. Miguel terá concordado com a sugestão, propondo que no Arco a reconstruir, se fizesse uma inscrição que o ligaria física e simbolicamente a Afonso Henriques: El Rei D. Afonso I o mandou fazer e D. Miguel I reedificar.

A réplica do Arco da Memória, na freguesia de Vidais, tem o mesmo efeito no imaginário do povo local, leva-o a ouvir falar de lendas e de sérios registos históricos do seu passado. Mas, além de ser o lugar que assinalava os territórios do Mosteiro de Alcobaça, de ser o sítio onde os republicanos mostraram o seu repúdio para com os símbolos da monarquia, de ser o ponto que transporta os habitantes locais para o mundo das lendas e para o mundo dos factos históricos, marca ainda a legítima vontade de um povo querer ter junto a si o património que lhe pertence e com o qual ele fortemente se identifica.

Este Arco da Memória é um dos marcos limites dos coutos do Mosteiro de Alcobaça, alinhando a Norte com o Arco da Memória existente na Serra dos Candeeiros e a Poente com a foz do rio Vau, em Salir do Porto.

 

 

 

 

 

 

 

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