quinta-feira, 6 de outubro de 2011

A CENSURA ANTES DO 25 de ABRIL

Uma rolha na boca.
Mário Neves, faz crónicas dramáticas a partir de Badajoz.
As entrevistas a Salazar.
Os fatos de banho, vigiados pelos zelosos cabos-do mar.
O Catitinha.
O homem da língua da sogra e os barquilhos.
Como é bom namorar.
A Ala Liberal e a Lei da Imprensa.
Portugal combate os mendigos e miséria, por via administrativa e judicial.
O ortodoxo Lopes-Graça e o russo liberal Rostropovich.
Portugal derrota em futebol a Home Fleet por um rotundo 11-1.



FLEMING DE OLIVEIRA








(I)






Muitos mais que desafiaram a censura poderiam ser aqui citados, num rol sem conta.
A repressão da cultura e dos seus obreiros nas várias e distintas facetas, constituiu uma saga feroz, que só terminou quando o regime caiu. O Lápis Azul riscou notícias, livros, letras de fados ou peças de teatro, apagou anúncios publicitários, caricaturas e pinturas de parede. É vulgar associar-se a Censura a cortes parciais, por vezes totais, nas provas de tipografia, a que os jornais estavam obrigados antes da publicação. Mas a Censura também actuava, impondo a publicação das chamadas Notas Oficiosas. Há quem recorde isso como uma violência terrível, a obrigatoriedade de publicar as notas oficiosas, ou seja o jornal não tinha direito de omitir a publicação. Salazar confrontado uma vez com esta situação de intromissão, argumentou que não sei precisamente o que se passou (…). Fui consultado, quando se recusou a publicação (…). É claro que V. Exª poderia reclamar, e teria por si a lei, se a nota excedia as dimensões comuns. Se o tivesse feito certamente obteria justiça ou prescindindo-se da publicação (…), ou ordenando-se a sua publicação por partes em dias sucessivos, ou ainda pagando o custo excedente. Devo porém dizer que não tem sido preciso obrigar nenhum periódico a publicar as notas do governo, mesmo as mais extensas: todos têm prestado esse serviço voluntariamente.
A Constituição de 1975 aboliu, formal e totalmente a censura. O Lápis Azul começou, como escudo de protecção do golpe de Gomes da Costa, e, pouco a pouco, foi-se transformando numa espécie de guardião do tríptico Deus, Pátria e Família. Menos de um mês após o golpe militar, foi instituído o regime de Censura Prévia, tido como medida transitória, enquadrada na suspensão das garantias constitucionais da República. A 24 de Junho de 1926, os jornais passavam a anunciar que este número foi visado pela Comissão de Censura, tinham de remeter quatro provas para a Comissão e não podiam deixar espaços em branco, após os cortes. Gomes da Costa havia anunciado que não estava disposto a criar a censura à imprensa, pelo menos enquanto os jornais não me incomodarem.
Apesar de dois decretos de Julho seguinte enunciarem que a todos é lícito manifestar livremente o seu pensamento por meio da imprensa, o regime de censura prévia militar, manteve-se até ao fim da Ditadura, isto é, com a entrada em vigor da Constituição de 1933.
Em breve, começam a surgir os jornais clandestinos e a 16 de Abril de 1927 um diploma sujeita, a processo sumário, o julgamento de delitos de imprensa, como a publicação de notícias tendenciosas ou de propaganda subversiva.
Era com o Lápis Azul que os censores decidiam o que o país poderia (deveria, mereceria) saber. O próprio movimento iniciado em 25 de Abril, ainda foi objecto de tentativa de censura, mas tratou-se do seu último estertor.
O Lápis Azul foi quebrado e hoje em dia, passados 30 e tal anos sobre o 25 de Abril, vive-se o maior período seguido de liberdade de imprensa, de expressão, da história da República Portuguesa, mau grado alguns incidentes pontuais.
A liberdade de imprensa ou de expressão não foi, uma constante da nossa história. Antes pelo contrário. Mas, de tão natural, esta respiração de liberdade, faz-nos hoje esquecer um dos instrumentos mais pesados da nossa história recente. As gerações após o 25 de Abril, dificilmente compreenderão, o que foi viver sob um regime de Censura. Só os portugueses de meia idade, se lembram ou percebem como era dantes, tal como a necessidade licença de porte de isqueiro para alegadamente proteger a indústria nacional de fósforos, até à Coca Cola, que se bebia livremente em África, muito concretamente no seio das Forças Armadas, e mas que era proibida na Metrópole.

CONTINUA


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