segunda-feira, 3 de outubro de 2011
(III) -A VIDA NA SOCIEDADE CIVIL DE ALCOBAÇA, POR ALTURAS DE 1974. -NO TEMPO DO TUDO POSSÍVEL
-Populares limpam as ruas e a escola de Cós.
-Luísa Bazenga, uma estouvada ativista, ataca os
Bombeiros.
-Notas falsas em S. Martinho do Porto.
-Os Vigilantes da Revolução.
-O Clube Alcobacense tem nova direcção, que inicia funções
com um número de palhaços.
-Há que sanear os caciques, sejam padres ou não.
-O saneamento correto, segundo Otelo.
-D. António Ribeiro visita Alcobaça.
-Os funcionários judiciais de Alcobaça, desenvolvem
atividades político-sindicais.
-António Rainho, fica comovido e sobressaltado num café
em Amarante, com as notícias que lê no jornal.
-A Feira de S. Bernardo realiza-se à moda antiga para
manter acesa a chama, apesar dos temos de revolução.
-O Gen. Carmona fica com a cabeça e um braço de fora, na
arrecadação do quartel de Caldas da Rainha.
-O 70, com dois sacos cheios de notas e um Pastor Alemão
de guarda.
-Lurdes Costa Ribeiro e o negócio da pedra.
-Há dois Arco da Memória, a definir os limites dos Coutos de
Alcobaça.
-Luís da Graça, empresário de sucesso e homem bom.
-Casais da Vestiaria, não quer Comissão de Moradores, com
pena de Damásio Campos.
Francisco Cardoso, de S.Paulo, que já não vinha a Portugal há cerca de 6 anos, chegou a Lisboa em princípios de Julho de 1974. Antes de se deslocar para o Porto, tomou um táxi para ir ao banco comprar escudos. Como o carro não tinha ficado bem estacionado, saiu a correr, sem deixar de, ostensivamente, tomar nota da matrícula, pois nele deixara toda a bagagem. Quando voltou, disse ao motorista que Portugal era o único país onde faria isso, o que fez com este ficasse satisfeito e tivesse respondido que o português trabalhador é homem honesto. No entanto em lugares problemáticos, a coisa poderia ser diferente.
Contou que quase era assaltado, à porta de um bar no Cais do Sodré.
Ainda estou muito chateado com uns vadios que andavam por lá. E como sou cem por cento revolucionário, fico irritado vendo gente que não quer trabalhar e vive à custa dos outros. Se mandasse, ia lá e fuzilava todos esses vadios.
Em Setembro de 1974, havia alguma animação em S. Martinho do Porto, graças à ação dos amigos do alheio.
No dia 7, o agente Rui Jesus, da PSP ao entrar de serviço na parte da tarde, soube que estava pendente um pedido de captura de dois reclusos, um dos quais se havia evadido, pela segunda vez, da prisão de Caldas da Rainha e que se faziam transportar num automóvel roubado, com o qual já tinha feito alguns assaltos, que se apuraram depois serem a casas de electro-domésticos. Saindo para a rua, o agente Jesus deparou a certa altura com um homem que conduzia uma motorizada, aliás sem capacete, que aparentava ser um dos evadidos procurados. Este não só não parou, quando para tal foi intimado, como ainda tentou atropelar o agente Jesus, pondo-se em fuga, em direcção a Salir do Porto. O guarda Jesus, auxiliado por populares que presenciaram o caso, encetou a imediata perseguição, que não se revelou fácil. Após alguns tiros para o ar, como intimidação, mas sem sucesso, o fugitivo acabou por ser atingido numa anca, caindo para o chão e detido, foi transportado para o Hospital, onde ficou internado, sob prisão.
Dias depois, a 12, em S. Martinho apareceram notas falsas de 1.000$00, entregues para pagamento em estabelecimentos comerciais, como no Café Rosa, onde se deu pelo crime. Um dos passadores, pagou o jornal com uma nota de 1.000$00 e o outro com nota igual, uma despesa de 32$50, tendo desaparecido. No dia seguinte, no posto de gasolina da SACOR, parou um automóvel para se abastecer, preparando-se o condutor para pagar, também, com uma nota de 1.000$00. O fornecedor da gasolina desconfiou, por já andar no ar a notícia, graças ao caso do dia anterior, e a um outro ocorrido em Fátima, pelo que examinando cuidadosamente a nota, notou à transparência que não tinha selo de água e teria exclamado Alto! Aqui está mais uma! Já te apanhei, ganda vígaro!
Recusado o pagamento, o ocupante do automóvel pareceu admirado. Encontrando-se, casualmente, presente o taxista António Pedreiro, sugeriu que se dirigissem ao Posto da PSP, para denunciar a ocorrência. O condutor do automóvel acedeu à ideia, mas logo tentou fugir, pelo que com a ajuda de José Lopes da Silva, o burlão acabou por ser detido. No automóvel e nos bolsos foram encontradas mais notas falsas, prontas a entrar em circulação. O passador, um tal Nelson, foi preso e referiu que já havia passado duas notas em cafés de Tornada. Apreendidas, contaram-se 17 notas de 1000$00 e apurou-se elas vinham da Lourinhã, através de um tal Anacleto, que espalhara os seus agentes pelo país. Mais seis notas tinham sido passadas na Nazaré, aproveitando se os burlões das festas do Sítio, embora não fossem de grande qualidade. Apurou-se, porém, que estes não foram os passadores do dia anterior, no Café Rosa, de S. Martinho do Porto.
Em S. Martinho do Porto criou-se um grupo que se intitulou Vigilantes da Revolução (supostamente numa linha cubano-castrista), que, entre o mais, ia à noite para o Facho ver se detectava embarcação que transportasse homens e os desembarcasse com armamento, em apoio da contra-revolução fascista. Este grupo terá estado em contacto directo com o Cap. Gonçalves Novo, do Quartel das Caldas da Rainha. Pelo menos assim fazia constar para intimidar, dado este estar conotado com a ala mais radical do MFA. O Cap. Gonçalves Novo era conterrâneo (Sabugal) e parente de Gonçalves Sapinho.
Um dia, convidou-me para ir almoçar à Messe de Oficiais. Avisei-o de que não necessitava de correr riscos, por eu ser do PPD. Insistiu e fui almoçar. Cumprimentei alguns oficiais, mas vi noutros um ambiente gélido, pois o PPD não era bem visto por alguns.
Sapinho admite que foi algo com significado, com mais coragem pelo lado daquele que pelo seu, embora isso lhe pareça agora irrelevante, mas a mim antes não me pareceu.
O mesmo Grupo dito de Vigilantes, comunicou em fins de 1974, ao Quartel, a suspeita que na cave de determinada casa da rua Conde de Avelar, e que se encontrava alugada ao ano, havia armamento guardado e pronto a ser usado. Os militares vieram pressurosamente a S. Martinho do Porto, arrebentaram as portas, invadiram a casa e nada encontraram, salvo uns beliches de crianças, mobílias de quarto, sala e utensílios domésticos. As perigosas armas eram, afinal, tão só garfos e facas de cozinha.
O Quartel de Caldas da Rainha, participava com frequência e gostosamente neste tipo de operações ou controlos de estrada, umas vezes por iniciativa própria, outras por denúncias exteriores, ainda que anónimas e que alegadamente era para detectar armas e munições em más mãos. Nessas operações, a que por vezes se aliavam populares, montavam-se barreiras cada qual com 4 militares armados de G3 ou metralhadoras ligeiras e espaçadas, entre si, por cerca de 200m.
Uma operação montada na Matoeira, onde participou o sempre disponível e dinâmico soldado Moiteiro, o 70, terminou de uma forma trágica. Em determinado momento, surgiu um Mini, que não tendo respeitado o sinal de Stop, acelerou, quase atropelando um militar, para fugir. Por isso, e sem hesitação foi prontamente disparada uma rajada de tiros sobre o automóvel, um dos quais feriu mortalmente o condutor e gravemente a sua namorada na zona dos rins. Depois, apurou-se que se tratava apenas de um casalinho de namorados, cujo condutor não tinha carta de condução e usava o automóvel do pai, com o seu desconhecimento.
Se houvesse conhecimento de agitação na sua zona de intervenção específica entrava em regime de prevenção. A tropa de Caldas da Rainha em 11 de Março de 1974 rumou até Lisboa com dois piquetes em apoio ao Ralis, indo o soldado Moiteiro, o 70, a conduzir um dos veículos.
(CONTUNUA)
FLEMING DE OLIVEIRA
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