quinta-feira, 6 de outubro de 2011

-A OPOSIÇÃO ESTÁ EM MAIORIA NA CÂMARA MUNICIPAL DE ALCOBAÇA (1946) -CASO ÚNICO NO PAÍS

OS PRESIDENTES DA CMA,
-Dr. NASCIMENTO E SOUSA
-JÚLIO GUIMARÃES BIEL

FLEMING DE OLIVEIRA
Em 2 de Janeiro de 1946 segundo O ALCOA tomaram posse, no meio de grande expectativa quanto ao desempenho do seu múnus, os membros da nova Câmara Municipal de Alcobaça, a qual era constituída pelos Dr. José Nascimento e Sousa, Presidente ultra conservador, João d’Oliva Monteiro, Dr. João Lameiras de Figueiredo, reconhecidos, no meio de Alcobaça, como republicanos e reviralhistas, Joaquim Ferreira Gomes e Carlos de Oliveira. Esta equipe, algo contranatura pode-se dize-lo, durou pouco tempo, cerca de um ano. Como surgiu este acontecimento extraordinário, em que a oposição entra na vereação, e que ainda hoje é recordado? Para o perceber, é necessário remontar à organização político-administrativa anterior ao 25 de Abril. A Câmara Municipal era (como hoje) o órgão colegial de gestão permanente dos assuntos municipais, composta por um Presidente e Vice-Presidente livremente nomeados pelo governo e por vereadores, eleitos quadrienalmente pelo Conselho Municipal. Os Presidente e Vice-Presidentes nomeados pelo Governo, deviam ser escolhidos, salvo circunstâncias excepcionais, entre os munícipes do concelho e de preferência entre os vogais do Conselho Municipal, antigos vereadores, antigos membros de comissões administrativas ou diplomados com curso superior. O Presidente da Câmara tinha como funções chefiar a administração municipal como órgão, embora nomeado, do concelho. E ainda a de representar o Coverno, de que era uma extensão, como magistrado administrativo. Isto é, o Presidente da Câmara, era simultaneamente órgão do Município e órgão do Estado. A razão desta forma de organização político-administrativa, segundo Marcelo Caetano, inseria-se na boa tradição da nossa administração municipalista, os juízes de fora, bem como na prática também seguida com sucesso em países de regime democrático, como o Maire, em França, o Podestà, em Itália e o Burgomestre, na Alemanha. O Presidente da Câmara era também autoridade policial em Alcobaça, visto o comando local desta não estar cometido a oficial do Exército. A PSP teve durante muito tempo as suas instalações no edifício dos Paços do Concelho, onde foi instalada, após o corte de fita da praxe, sendo Presidente Júlio Guimarães Biel, a 16 de Janeiro de 1950. Na altura eram consideradas as instalações, se não modelares pelo menos boas, dispondo de gabinetes, quartos, camaratas, casa de banho, refeitório, cozinha e calabouço, e onde se manteve até ao 25 de Abril, quando passou para as trazeiras do Tribunal da Comarca. O novo edifício teve de ser adaptado à PSP e GNR, pois inicialmente o projecto previa que ali fosse instalada a Cadeia Comarcã. A transferência da PSP e GNR, esta também ainda em muito más dependências, para as actuais instalações, ocorreu sendo a Câmara presidida por Miguel Guerra, onde Fleming de Oliveira, o autor destas notas, era o Substituto legal, Vereado/Vice-Presidente e foi coordenada pelo Engº Costa e Sousa (Chefe dos Serviços Técnicos).
Na Espanha franquista, mantinha-se o Alcalde. O regime português, alegadamente, pretendia aliar a conveniência de uma acção rápida, desenvolvida por uma entidade responsável e de confiança, dentro de um conjunto coordenado e harmónico. Ora não foi o que aconteceu em Alcobaça. Para grande surpresa do País, e da terra, o Conselho Municipal de Alcobaça, escolheu vereadores da oposição. Para obviar este percalço e péssimo exemplo, que poderia alastrar pelo País, o Governo ao fim de um ano demitiu os Presidente e Vice Presidente, forçando uma nova escolha para a vereação, desta vez a coberto de surpresas.
O Dr. José Nascimento e Sousa, em Maio de 1946, imperturbável a tudo isto, na qualidade de Presidente da Câmara, e em nome da Comissão Concelhia da União Nacional (U.N.), de Alcobaça, fazia em discurso a afirmação pública (…) da nossa inquebrantável fé nas doutrinas da Pátria, conduzida pelo Governo que tem à frente esse grande português cujo prestígio há muito ultrapassou as fronteiras do País e o impõe ao respeito e consideração do mundo: o Dr. Oliveira Salazar (…), e pessoal de que o (…) meu indefectível nacionalismo se enraíza e fortalece no muito amor que tenho à minha terra. (…) O povo do meu Concelho que hoje e sempre, com o entusiasmo que lhe dá a sua inquebrantável Fé, levanta-se e diz: Viva Portugal! Viva Carmona! Viva Salazar!
Mas isso não o livrou de ser substituído, não reconduzido, o que lhe causou alguma mágoa. Foi o Dr. Júlio Frederico de Guimarães Biel quem o veio a substituir.
Júlio Frederico de Guimarães Biel assume os destinos do Município em 1947. Seu pai, Emílio Biel, engenheiro civil de origem alemã, viera para Alcobaça em finais do século XX instalar a energia eléctrica na vila, tendo aqui casado e fixado residência. À data da tomada de posse, centrava em Leiria a sua actividade, exercendo funções de professor no Liceu Rodrigues Lobo, que acumulava com a Presidência da Caixa Regional do Abono de Família do Distrito e a Comissão do Recenseamento Eleitoral de Leiria. Anteriormente, fora Director da Mocidade Portuguesa de Leiria, Presidente da Comissão Concelhia de Leiria da União Nacional e Vogal da sua Comissão Distrital, Vereador na Câmara de Leiria evidenciando, além duma ligação forte ao Regime, uma defesa das suas principais organizações politicas. O seu mandato na Câmara de Alcobaça decorre até 1953. Atento às aspirações locais do Concelho, foram vários os focos de intervenção e criação de infra-estruturas: inúmeras escolas beneficiando, neste caso, do Plano dos Centenários; electrificação nas sedes de freguesia da Maiorga e da Cela; lavadouros e fontanários no Casal Pardo, na freguesia de Alfeizerão e na Vestiaria; alargamento do cemitério de Turquel; instalação de cabine telefónica nos Montes; pavimentações nas principais ruas de São Martinho do Porto, na Azambujeira, na freguesia de São Vicente de Aljubarrota; equipamentos no Parque General Carmona; arranjo da Praça Dom Afonso Henriques e criação do Posto de Turismo, em Alcobaça. A religiosidade fora um panorama marcante no seu mandato: inaugura a nova Igreja Paroquial de Pataias; acompanha as obras na Igreja Paroquial do Vimeiro e assiste ao início das obras da Igreja Nova no Bárrio. Conta com a presença do Cardeal Patriarca de Lisboa, D. Manuel Cerejeira, em várias ocasiões nomeadamente no encerramento do Ano Santo, cerimónia a que presidiu o Legado do Santo Padre, Cardeal Tedeschini.
Durante este período, Alcobaça acolhe vários eventos regionais e nacionais, destacando-se a passagem da espada de D. Afonso Henriques. Recebe diversas comitivas e personalidades internacionais, sendo a mais marcante a do Chefe de Estado Espanhol, Generalíssimo Franco (cfr. apontamentos amavelmente facultados por Luís Peres Pereira).
Nascido em Alcobaça, o Dr. José Nascimento e Sousa dedicou grande parte da sua vida à medicina, em que se licenciara em Coimbra. A sua afinidade com o Estado Novo, levou-o, em 1942, a assumir a Presidência da Comissão Concelhia de Alcobaça da União Nacional (UN) e, quatro anos mais tarde, a Presidência da Câmara Municipal. Durante o seu mandato, em si pouco relevante, assistiu-se todavia a um importante acontecimento na história da industrialização do concelho, o lançamento da primeira pedra da fábrica de cimento branco, em Pataias. Deu-se início à electrificação, quase inexistente, começando a construir-se a cabine eléctrica de Aljubarrota, foi inaugurada a iluminação eléctrica em Alfeizerão, sem prejuízo da iluminação a petróleo, que continuava na vila de Pataias. Na vertente viária, iniciaram-se os trabalhos de alteração do traçado da estrada de Alcobaça-Aljubarrota, enquanto na escolar, projectou-s a construção de edifícios em Évora de Alcobaça, Carris, Acipreste, Gaio e Póvoa. Assistiu-se ainda no seu mandato, ao início das obras na Escola Primária de Casais de Santa Teresa. Nacionalista e monárquico convicto (a bandeira do Ginásio Clube de Alcobaça por si proposta, foi desde o início azul e branca, com o emblema desenhado por José Carolino, funcionário da casa Magalhães, e o equipamento calção branco, camisola azul com o emblema do lado esquerdo a partir da A. G., de14 de Janeiro de 1948, a substituir o inicial calção preto), recebeu ao longo do seu mandato, membros de várias Casas Reais Europeias como o Príncipe D. João, Conde de Barcelona, Herdeiro do Trono Espanhol, filho de Afonso XIII e pai do actual rei de Espanha, a Família Real Italiana exilada em Cascais, após referendo que aboliu a monarquia, o Príncipe Guilherme da Suécia e a Infanta D. Maria Teresa, irmã do então Duque de Bragança, D. Duarte Nuno, pai de D. Duarte Pio, o actual pretendente. A peregrinação da Imagem de Nossa Senhora de Fátima, acontecimento que reuniu cerca de quinze mil fieis, os Jogos Florais da E.N. (a que nos referiremos, com um apontamento de Albino Serrano), realizados no Mosteiro de Alcobaça, com a presença de António Ferro, e a visita do Cardeal Legado do Papa, foram mais alguns momentos marcantes do mandato. O seu mandato presidencial de um ano, foi curto, talvez o mais curto de que há registo, devido ao facto de a Vereação ser composta por figuras da Oposição, ser a demissão do Presidente da Câmara a forma eficaz e rápida que o governo encontrou para ultrapassar a situação inédita, uma vereação maioritariamente não afecta ao regime, e a não recondução do Presidente, o meio para lhe manifestar a veemente censura. O Ginásio Clube de Alcobaça foi fundado em 1 de Junho de 1946, graças ao empenho de Nascimento e Sousa e ao longo dos seus anos de história, não obstante os altos e baixos, tem vindo a levar o nome de Alcobaça a muitos sítios, graças às participações desportivas ao nível do futebol, com destaque para a época em que militou na Primeira Divisão, o que se revelou catastrófico, pois que nunca mais recuperou.



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