quinta-feira, 24 de abril de 2014

A PRISÃO DE ALCOBACENSES ÀS ORDENS DO COPCON (22 de julho de 1975). OS MANDATOS DE PRISÃO ASSINADOS EM BRANCO. O “BOM” OTELO. TARCÍSIO TRINDADE, CARLOS “CARANGUEIJO ”, H. BASTOS, L. ”CAPADOR ”, MÁRIO AMARAL E OUTROS.



 

A PRISÃO DE ALCOBACENSES ÀS ORDENS DO COPCON (22 de julho de 1975).
OS MANDATOS DE PRISÃO ASSINADOS EM BRANCO.
O “BOM” OTELO.
TARCÍSIO TRINDADE, CARLOS “CARANGUEIJO ”, H. BASTOS, L. ”CAPADOR ”, MÁRIO AMARAL E OUTROS.

Fleming de Oliveira



Luís do Couto Serrenho, figura típica de Alcobaça, conhecido por Luís “Capador”, nunca soube das razões porque no dia 22 de julho de 1975 foi preso às ordens do COPCON, embora não tivesse dúvidas de maior donde proveio a denúncia (o que nunca me quis esclarecer).
Comerciante estabelecido no Rossio de Alcobaça, com negócio de taberna e venda de jogo, além de um pequeno talho, assinando com dificuldade o nome, nunca se envolveu em política, antes ou depois do 25 de Abril.
Apesar disso, foi interveniente num episódio  marcante do PREC, em Alcobaça.

Na manhã de 21 de julho de 1975, Luís “Capador”  tinha regressado do matadouro da Nazaré, aonde fora, como habitualmente, levar gado para abate. Ao ver o desusado movimento de pessoas concentradas em frente aos Paços do Concelho de Alcobaça, ali se deteve um pouco a conversar, a apreciá-lo à distância.
Nunca teve problemas em confessar-me que não fazia ideia do que eram comunistas ou socialistas, nem da razão porque queriam correr com o José Pinto (PC e Presidente da CA da CMA), que “até nem era mau homem”.
Depois do almoço, como a agitação popular se havia transferido da Gafa para o Rossio, quase em frente ao seu estabelecimento, foi ver, aliás sem grande curiosidade, o que se passava.
O seu azar foi estar nesse dia munido de um cajado, com cerca de 1,30m de comprimento, que costumava utilizar para conduzir o gado.

“Capador”, definia-se como pessoa simples, pacífica e algo ensimesmada, pelo que se irritou quando o ativista do MDP António Luís Ventura, o interpelou. Sendo de poucas falas, logo o avisou, que “se não fosse marreco, até lhe moía os ossos com um pau”. Possivelmente também por causa do cajado, ainda foi provocado com insultos e ameaças físicas, junto à sede do PC, por três indivíduos do Valado dos Frades (operários de Raul da Bernarda, Ldª.)
No dia seguinte, logo de manhã, após uma noite passada em casa, quando se preparava para ir ao talho buscar a ferramenta para capar três porcos, encontrou à sua espera uma força armada composta por seis militares que se transportavam num jeepão do Exército, acompanhada pelo guarda Almeida, da PSP de Alcobaça, com a função de o identificar. Tendo-lhe sido dada voz de prisão, subiu para o veículo, sem tempo de arrumar a motorizada, avisar a família ou acabar de se arranjar. No jeepão encontravam-se, também detidos, o Solicitador Hernâni Bastos e o Comandante dos Bombeiros de Alcobaça, Carlos Leão da Silva, “Caranguejo”, seguindo todos para Leiria e acompanhados de perto, até S. Jorge, por um muito curioso Deodoro Morgado Henriques, de bicicleta.
Ao fim da tarde, no quartel de Leiria, foi dito aos presos, aos quais se juntara ainda em Alcobaça Mário Amaral que talvez ainda nessa noite depois de ouvidos, regressassem a casa. Não lhes foi dito que iriam para Lisboa, muito menos para Caxias ou se havia algum mandado e nesse caso em que moldes.

Mário Amaral contou-me que “em consequência dos assaltos à Câmara e ao PCP e por força do cargo na secção de Alcobaça do PS, fui confrontado até cerca das cinco e meia da manhã seguinte com pedidos de informação de todo o País, através do telefone. Perto das sete, acordei com a campainha da porta e dirigindo-me à janela, fui informado pela minha vizinha que vieram à minha porta um agente da PSP e um militar e, ainda, que o Carlos Leão, o Hernâni Bastos e o Luís Serrenho tinham sido presos. Na presunção de que algum deles tivesse invocado o meu testemunho, dirigi-me ao Posto da PSP para saber do que se passava. Que nada, foi a informação. Foi então que ao sair encontrei o referido agente da PSP que ao ver-me, exclamou: Ah! Você está aqui? Fica já detido!”
Razões dessa detenção não lhe foram apresentadas. Mandato também não, porque em tempo de Revolução a legalidade assim o impunha/permitia, mas admite que a prisão tenha sido resultante de alguma atividade conspiratória em que se envolveu do não agrado do PC.
O certo é que, não soube como, nem porquê, vieram ordens não para os soltar ou ouvir, mas para os levar para Lisboa e transferir para Caxias, acusados de pertencerem a uma perigosa associação de malfeitores.

Tendo corrido o boato em Alcobaça (prontamente transmitido ao Quartel de Leiria), que na Estrada Nacional, junto à Benedita, se iriam organizar barricadas populares, para os libertar do COPCON, se por lá passassem, foi decidido fazer um desvio por Santa Margarida, Coruche e Santarém.
Chegados à Prisão de Caxias, como não havia mandados, conhecimento da ordem de detenção ou instruções, tiveram de passar primeiro pelo Comando do COPCON, para se registarem e formalizar a situação.
Os alcobacenses (insiste-se), haviam sido presos sem mandatos de captura ou quando muito assinados em branco, com base em denúncias não assumidas, como era prática seguida por Otelo Saraiva de Carvalho, no Comando do COPCON, que entendia que “de maneira nenhuma estas prisões podem ser consideradas no âmbito da estratégia anti monopolista. Estão sim dentro de uma luta anti corrupção. Quanto à estratégia anti monopolista isso é um assunto que terá que ser encarado no âmbito do Programa económico. Em relação à atuação do COPCON, ele atuou a pedido do Governo e de acordo com a legislação que o criou a ele COPCON. De qualquer modo esse assunto parece-nos que já estará respondido no que respeita à entrada em vigor de legislação revolucionária.”
Tratando-se de uma perigosa associação de malfeitores havia que os colocar em celas separadas, situação que se manteve até serem ouvidos pela primeira vez, ao fim de 9 dias. Nunca souberam se essas celas eram as mesmas que antes do 25 de Abril recebiam os presos políticos, mas seja como for não tinham em funcionamento os instrumentos que Gilberto Coutinho, referiu ter-lhe sido contado e sabia.

Os mandados em branco, foram variadas vezes utilizados. As circunstâncias em que foram utilizados foram descritas, após 25 de novembro de 1975, por Otelo Saraiva de Carvalho, ao juiz- nstrutor do seu processo:
“(…) No que se refere a prisões, passou o COPCON a atuar como um agente de polícia captor, com a diferença de que os mandados de captura eram emitidos pelo próprio COPCON.
(…) Assim, a Repartição de Informações, responsável pelo controlo dos mandados de captura, apresentava ao declarante vários exemplares destes em branco, já numerados, sendo cada exemplar em triplicado. O declarante rubricava-os, cabendo a responsabilidade àquela Repartição, durante as horas de serviço, da emissão de mandados ou da entrega, totalmente em branco e só com a assinatura do declarante, a uma força captora, para a realização de uma prisão.
(…) Todos os dias, o oficial encarregado da sala sete recebia do oficial de serviço os mandados não utilizados, que recolhiam à sala sete, à responsabilidade daqueles oficiais (…).”

Além destes, houve outros comportamentos revolucionários, como os saneamentos de oficiais, passagens compulsivas à reserva, feitas pelos Conselhos das Armas, sem que fossem ouvidos os visados.

A isto poderia acrescentar-se as tentativas de promover o fuzilamento dos presos que fossem considerados mais perigosos para o avanço da revolução. Foram feitos vários abaixo-assinados nesse sentido e terá sido a tentativa ensaiada na Assembleia Selvagem do MFA, de 11 para 12 de março, que levou Vasco Lourenço tomar uma posição frontal contra a medida, defendida por Varela Gomes.

Vários líderes do MFA, manifestaram concordância com graves situações, desde as barricadas, as aleatórias prisões do 28 de setembro de 1974, as detenções de gestores ligados à banca, em 13 de dezembro, até à aprovação, pelo auto designado Conselho dos Vinte, da unicidade sindical.

Num livro apologético e menor que Vasco Lourenço lançou, gaba-se que os saneamentos dos oficiais das Forças Armadas foram “muito democráticos”.
O Gen. Sousa Menezes, depois do 25 de Abril colocado em Moçambique, onde participou do processo de descolonização até à independência do território, escreveu que “(…) a revolução brandia uma arma terrível que quase paralisava a vontade dos quadros permanentes. Sabia-se que essa arma tinha sido decisiva nas revoluções vermelhas dos países do Leste, saneamento militar, às vezes seguido do fuzilamento, como aconteceu na Rússia, nos anos 20. Tratou-se do esquema mais feroz montado no consciente dos militares. Toda a gente tinha medo de ser saneada. A disciplina militar e o cumprimento das ordens estavam profundamente afetadas pela desconfiança e pela incerteza. (…).”

Sem se poder concluir que a cadeia hierárquica das Forças Armadas se esfumou totalmente durante o período revolucionário, convém salientar que, a par da cadeia militar tradicional, outras hierarquias, efémeras, se organizaram durante o PREC. O enfraquecimento da cadeia de comando e da disciplina militar não significou, que o valor e significado da hierarquia se tenham extinguido no seio das Forças Armadas, nem que isso teve como consequência, a redução dos generais. O PREC não dispensava generais, seja pela tradição castrense, seja para evitar lutas fratricidas ao nível dos oficiais intermédios que lideraram o golpe. Generais como António de Spínola e Costa Gomes iriam ocupar a chefia do Estado, até à realização das eleições presidenciais de 1976. Muitos dos oficiais intermédios do MFA, seriam graduados em patentes superiores, no mais puro respeito formal pelas tradições e ritos castrenses.

João Salgueiro, Presidente da Câmara de Porto de Mós, não renega as origens, nem o passado político e tem orgulho em ter participado no 25 de Abril “como Oficial do Exército. Com alguma imodéstia que isso possa representar, no 25 de Abril fiz parte do grupo que ocupou a sede da Legião Portuguesa e integrei o corpo de proteção ao 1º. de maio.”
Esteve envolvido no Verão Quente no RI7, no qual teve problemas porque era adjunto do comandante de uma companhia de intervenção, o qual nunca aparecia ao fim da tarde.
Foi Salgueiro quem efetuou as prisões dos alcobacenses, com ordens do COPCON, “mas recusei-me a prender as de Porto de Mós porque eram quase todos meus amigos. Pedi ao meu comandante para não me fazer essas maldades e ele teve o bom senso de não me mandar prender os de Porto de Mós. Quando recebi o mandato de Otelo com a lista das pessoas a serem presas, liguei a alguns amigos de Porto de Mós para fugirem! Felizmente na altura não havia escutas telefónicas!”

Sobre a prisão dos alcobacenses, o CDS emitiu cerca de um ano depois um comunicado de onde se transcreve que, a injusta prisão de cinco alcobacenses em Caxias, por motivos políticos e efetuada, em julho do ano findo, por iniciativa de BUFOS das delegações locais de partidos gonçalvistas, ainda poderá dar muito que falar. Nesses cinco alcobacenses presos, estão incluídos alguns simpatizantes do nosso partido. Prosseguem diligências, em Lisboa, junto da 2ª Divisão do EMGFA, tendo em vista o desmascaramento público dos bandalhos gonçalvistas de Alcobaça.

Os alcobacenses não terão sido mal tratados em Caxias.
O oficial que tomou declarações a Luís “Capador” não queria acreditar quando este afirmava e reafirmava que nada sabia de partidos e política, muito menos o que era esquerda ou direita (“o PPD também é comunista?” ), pelo que não tinha dúvidas em ter sido preso por um mal entendido.
A propósito da sua estada em Caxias, durante dez dias, Luís “Capador” sublinhava-me que deveu a soltura, tal como os demais alcobacenses, à influência de António Raposo de Magalhães, que ali prestava serviço, como alferes miliciano.

Mário Amaral, contou-me que “passados nove dias fui ouvido por um senhor Capitão que me garantiu ir falar com o Gen. Otelo Saraiva de Carvalho, no sentido de ordenar a nossa libertação face à inexistência de razões justificativas da prisão”.
Dentro da rotina prisional e de acordo com o seu hábito de vida, Luís “Capador”, levantava-se todos os dias às 6h30 e ocupava parte da manhã a fazer a limpeza das celas já que, como dizia, os seus conterrâneos não sabiam fazer nada.
Por isso, Hernâni Bastos, naquela sua muito peculiar forma de falar e estar, dizia que “nunca na vida vi mulher a dias mais bonita que o Capador”.
José Eduardo Reis Oliveira contou-me, a propósito da “passagem” dos alcobacenses por Caxias, um episódio curioso, de que teve conhecimento e correu por Alcobaça.
Na Cadeia de Caxias, havia algumas pequenas prorrogativas, uma das quais consistia em poder pedir ao carcereiro, pagando é verdade, que comprasse o jornal. Um dia essa tarefa coube a “Capador”, que comprou O Século. Os companheiros, quando deram pela aquisição, já não foram a tempo de reparar o grosseiro erro.
“-Oh Luís este jornal não é dos nossos! Onde é que tens a cabeça? Este jornal é dos comunas. O nosso é o Jornal Novo.”
“Capador” coçou a cabeça, (ele sabia lá, jornais são apenas jornais que trazem notícias), pelo que o melhor e único argumento que arranjou não acalmou os companheiros.
“-Eh pá, eu sabia lá. Para mim são todos iguais.”
De facto a política não era o seu forte. Se fosse, não seria conhecido por Luís “Capador”, acrescentou-me  Reis Oliveira.

A comida dos presos era razoável, mesmo de acordo com a opinião de um talhante como “Capador”.
No dia em que os alcobacenses foram libertados, ou seja em 30 de julho de 1975, tinham à sua espera uma autêntica mesa de casamento, tantas as iguarias que amigos lhes foram fazendo chegar. Mas a ânsia de liberdade era tão grande que deixaram ficar tudo para os guardas.

Francisco Vitorino André, comerciante na Vila e Vereador da CM, após o 25 de Abril, também esteve para ser preso no dia 22 de julho, pelo COPCON.
Era assumidamente, um homem de direita, “não desgosto de viver em democracia e, desde muito novo servi o regime, nunca com intenção de obter dividendos políticos ou patrimoniais. Exerci na minha freguesia dois mandatos como Presidente da Junta antes do 25 de Abril e como se sabe a remuneração nesse tempo era simplesmente zero”.
Francisco André não foi detido por mera casualidade pois “nesse dia saí muito cedo da minha residência na Vestearia e fui com um amigo a Lisboa. Quando passei por Alcobaça vi uma viatura do Exército com naturalidade, pois nunca pensei que estivesse destinada a transportar-me à prisão. Fui procurado, mas como não estava, não foi possível a minha detenção. Quando regressei de Lisboa estava a decorrer nos Paços do Concelho uma grande manifestação na qual me integrei, fui metralhado por olhares diversos, certamente alguns achavam estranho eu estar ainda em liberdade”.
Vitorino André acrescentou-me que #entretanto fui avisado pelo meu filho que tinha de comparecer de imediato no Posto da PSP, fi-lo com a maior prontidão. O chefe daquela segurança disse-me que não me prendia, que se eles quisessem que me viessem buscar.”
A razão porque o COPCON o quis prender, não chegou a conhecer. Vitorino André foi candidato a deputado pelo CDS, às eleições para a Assembleia Constituinte, mas não veio a ser eleito.

José Eduardo Reis Oliveira, sobre Hernâni Bastos, que conhece há muitos anos, asseverou-me que “foi uma figura incontornável do PREC em Alcobaça. Chegou jovem à nossa pacata vila nos anos 60 (1957 confirmei eu) e instalou-se como Solicitador. Rapidamente abanou as estruturas implantadas usando, na promoção da sua profissão, alguns métodos bastante revolucionários para o tempo. A placa identificativa do seu escritório, na Rua Alexandre Herculano, dizia:
Hernâni Bastos
Solicitador
Cobranças difíceis”

Nessa época, tinham escritório na comarca de Alcobaça, os Advogados Drs. Pina Cabral, Amílcar Magalhães, Amílcar Ferreira, José Bento da Silva e Manuel de Almeida.
Solicitador, era apenas Ernesto de Almeida. Hernâni Bastos, esteve ligado a algumas “estórias”, de gosto duvidoso, mas a sua irreverência era uma imagem de marca. Exímio dançarino, segundo me contou frequentou muitos salões de Lisboa, onde era reconhecido e apreciado pelo elemento feminino. A sua preferência, incidia pelas músicas românticas, “onde não era necessário movimentar os pés”.
José Eduardo contou-me que por “vezes o vi brincar (brejeiramente) com o nome do Presidente da Câmara, Joaquim Augusto Carvalho”.
Quando, fora de Alcobaça, almoçava ou jantava com alguns funcionários mais jovens do Tribunal, entre os quais José Eduardo que lá trabalhou durante algum tempo, “para ser servido com rapidez e com direito aos melhores pratos, intitulava-se Presidente da Câmara e, no final da refeição, oferecia sempre os préstimos. Alguma coisa que seja preciso procure-me. Pergunte por Joaquim Augusto Carvalho”…
Os convivas sorriam circunstancialmente, pois o ambiente era descontraído. “Era o tempo em que iam a Lisboa, ao Estádio da Luz, ver os jogos internacionais do Benfica”.
Na altura do PREC, Hernâni Bastos frequentava quase diariamente o Café Trindade. Com a Revolução a clientela mudou bastante.
Segundo JERO “Os donos da revolução, invadiram as mesas do Café Trindade, afrontando a clientela de outrora, que convivia mal com os novos tempos”.
Um dia, ainda de acordo com JERO Hernâni Bastos entrou pelo Café Trindade e foi ao balcão tomar uma bica. “Levava pela trela um cão que tratava por Camarada. Da entrada até ao balcão deu diversas ordens de comando ao cão, em voz suficientemente alta para ser ouvido pelo Camarada e pelos ocupantes afetos ao PC e ao MDP que ocupavam então a maioria dos lugares. Tempos depois do assalto à sede de Alcobaça do Partido Comunista, teve direito a um mandato de captura, que o levou até às celas de Caxias. Tinha relações de amizade com Hernâni Bastos e quando regressado de Caxias o visitei no seu escritório para lhe dar um abraço, encontrei um homem diferente. Quando lhe perguntei pelo Camarada, já não tive a resposta pronta a que estava habituado. O riso fácil fora-se…”

Na manhã de Domingo, dia 20 de julho, foi detido na sua residência, em Alcobaça, Tarcísio Trindade, último Presidente da CMA, no tempo do Estado Novo e levado para Caxias.
A sua prisão pelo COPCON nada teve a ver com a dos outros quatro alcobacenses. Esclareceu-me que  “cerca das oito da manhã recebi um telefonema do meu amigo José Costa Pombo, informando-me que a Rua D. António de Campos, onde eu residia, a Rua Miguel Bombarda no seu troço final e o início da Avenida Maria e Oliveira, estavam pejadas de militares cercando a minha casa e seus acessos. Bateram à porta e o comandante da valente expedição apresentou-me um mandato de captura assinado por Otelo Saraiva de Carvalho. Revistaram a minha casa, os meus filhos de tenra idade tiveram de sair das camas e berços pois, até esses, foram revistados”.
Trindade foi preso por uma força militar do COPCON composta por um major, dois capitães, furriéis e praças, transportados em três viaturas e veio a ser libertado 25 dias depois, sem qualquer explicação, antes, durante ou depois da prisão.
Nunca foi ouvido, interrogado ou acusado. Quando em 15 de agosto de 1975, pelas 23h chegou a Alcobaça, depois de 25 dias de detenção, tinha umas 200 a 300 pessoas à sua espera, que o aplaudiram quando estacionou o automóvel no Rossio.
Ao sair, comentou reconhecido e emocionado que “pelo que vejo, há ainda homens de coragem em Alcobaça”. Imediatamente, uma voz feminina ripostou “e mulheres também”.
Tal como no caso dos outros alcobacenses, nunca tendo sido possível apurar a razão da sua detenção, Tarcísio Trindade podia dizer, que “não merecia esta receção, nem merecia ter lá estado”.

Para António Carvalho Rainho, “tudo servia para amedrontar e ofender as pessoas que de algum modo não estavam na sua linha de atuação política. Um dos acontecimentos que numa manhã me assustou, foi a detenção de Tarcísio Trindade. Vivia eu na Rua D. António de Campos, em Alcobaça, onde também residia Tarcísio Trindade, quando de manhã, ao dar os primeiros passos na rua, me apercebi de que ao longo da mesma se encontravam alguns militares armados até aos dentes. Assustei-me de verdade e confesso que desci a rua com a convicção de que era mais pequeno do que um grão de arroz, pela circunstância de que, em primeiro lugar, desconhecia em absoluto a razão de tamanha segurança e em segundo eu, como outros residentes vizinhos, pensássemos que talvez fossemos alvo de tais movimentos, pois a euforia revolucionária era tanta, que tudo era possível acontecer”.





1 comentário:

José Ponte disse...

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