ENgº.
COSTA E SOUSA E A GESTÃO MUNICIPAL DE ALCOBAÇA ANTES E LOGO DEPOIS DO 25 DE
ABRIL.
MUDAVAM
OS PRESIDENTES E COSTA E SOUSA FICAVA.
Fleming
de Oliveira
Não é
possível falar da gestão municipal em Alcobaça antes do 25 de Abril, esquecendo
o Engº José Carlos Costa e Sousa.
Entrou para os quadros da Câmara em 1 de outubro de 1948
e aposentou-se em 6 de agosto de 1991, na véspera de completar 70 anos de idade.
Esses anos de serviço, aguentei 42 anos,
10 meses e 6 dias, como gostava de me dizer, permitiram-lhe estabelecer e
manter estreito contacto com diversas figuras sociais e políticas, locais e
nacionais, sobre as quais discorre com graça, senão mesmo com cinismo
indisfarçado. Ao mesmo tempo, era ímpar o seu conhecimento da vida e dos fastos
do Concelho, funcionando como autêntico arquivo municipal, à míngua de um
devidamente organizado, atualizado e fiável.
Nesse ano de 1948, a vida política alcobacense, no rescaldo
da guerra andava suspensa perante uma esperada, mas não concretizada, abertura
do regime.
A Câmara era a única do País com uma vereação afeta à
oposição, no mandato de Nascimento e Sousa, numa terra, onde se dizia, que até
os Presidentes da Câmara se matam, numa referência a Manuel da Silva Carolino,
que se suicidara.
Costa e Sousa foi frequentemente acusado de ser o dono
de Câmara. Isso resultava da circunstância de, contrariamente ao que hoje
acontece, os Presidente e Vereadores não exercerem as suas funções em regime de
permanência e ser muito diminuto o quadro de funcionários adstritos aos
serviços internos, para além do pessoal externo, na sua maioria contratado ao
dia.
Costa e Sousa disse-me que a leitura que faço da função resulta que sempre me procurei posicionar
perante a política como a água potável, isto é, politicamente procurei ser
insípido, inodoro e incolor.
Sem dúvida que esta postura lhe valeu, por vezes, alguma
incompreensão por parte do público, que estranhava que ao longo dos anos,
apesar das alterações que iam surgindo na administração municipal de Alcobaça,
a maior das quais foi obviamente com o 25 de Abril, ele se mantivesse
intocável.
Até essa altura, Costa e Sousa trabalhou com quatro
Presidentes de Câmara, todos eles diferentes, que passavam, enquanto ele
ficava. Era, de facto, o elo de ligação, a continuidade.
Referiu-me que sempre teve respeito e consideração por
todos os Presidentes de Câmara que só
tinham, porém, um defeito, aliás, sempre o mesmo: eram políticos. Desde sempre, verifiquei que, então como
agora, tudo o que sai bem é por mérito dos eleitos do povo e tudo o que sai mal
é por culpa dos funcionários.
Conheceu Humberto Delgado em Alcobaça, ainda Brigadeiro,
que ao fim de semana vinha à Cela, onde tinha interesses.
Trocaram correspondência, conversas de circunstância e,
algumas amabilidades.
Ao comentar a sua experiência dos Dias da Revolução,
começa por precisar que nunca fui um
fascista, nem combatente antifascista, como tantos gostam de se intitular.
Logo no dia 4 de maio de 1974, apesar de se saber que
Tarcísio Trindade não voltaria a ocupar a Câmara, havia muita agitação nas ruas
e no largo fronteiro aos Paços do Concelho pedindo redundantemente a sua
demissão, e gritando slogans como Tarcísio
para a rua ou Tarcísio fascista. Eram manifestações típicas de segunda-feira,
dia da feira semanal, comentou-me Costa e Sousa, que assistia de uma janela
do primeiro andar, aonde um ano depois voltou para ver os acontecimentos,
quando foi para correr com a CA de José Pinto.
Estes manifestantes nem sempre mostravam cordialidade,
mesmo dando o devido desconto ao discurso de um e outro. Por isso, Costa e
Sousa, retraiu-se quando um deles se lhe dirigiu, com vivacidade, perguntando
se saíam a bem ou esperavam que os deitassem pela janela. Com a calma que lhe
era peculiar, ou pelo menos aparentava, respondeu que não era ao fim de 26 anos na Câmara que ia fugir, pois não era político,
nem havia nada que justificasse essa defenestração. À cautela, foi para o rés
do chão pois que, se fosse atirado à rua, caía de um nível mais baixo.
Na sequência dessas movimentações, algumas pessoas
chegaram a forçar a entrada do edifício. Costa e Sousa reconheceu, alguns
contestatários mais conhecidos no meio, bem como feirantes. Estes últimos,
andavam há algum tempo de candeias às avessas com Tarcísio Trindade que fizera
várias mudanças no local de funcionamento do mercado de segunda-feira, a última
das quais para o alto da Gafa, e que estavam esperançados em ver alterada a
situação.
Em vão, no que dizia respeito à intervenção de Tarcísio
Trindade, que já não voltou à Câmara, tanto assim que Costa e Sousa e o Chefe
da Secretaria, foram ao fim da tarde levar-lhe alguns objetos pessoais, que
deixara no gabinete.
A propósito deste incidente com os feirantes e que teve
antecedentes, aonde se encontravam alguns ciganos, Costa e Sousa contou-me uma
pequena rábula ocorrida na última segunda-feira antes do 25 de Abril. A
Comissão de Feirantes seguiu, com persistência, o Presidente da Câmara até ao gabinete, pugnando pela alteração da
deliberação de escolher novo lugar para o mercado, utilizando uma linguagem
vernácula e gestos pouco amistosos. Pelo menos na aparência. Enquanto Trindade
procurava a chave no bolso e com algum nervosismo, dizia-lhes que não percebia
a razão de tanta agitação, pois os estava a escutar. Estes responderam que sim,
que os estava a escutar, mas enquanto não encontrasse a chave, pois que depois
lhes batia com a porta na cara.
Sem comentários:
Enviar um comentário