quarta-feira, 23 de abril de 2014

ENgº. COSTA E SOUSA E A GESTÃO MUNICIPAL DE ALCOBAÇA ANTES E LOGO DEPOIS DO 25 DE ABRIL. MUDAVAM OS PRESIDENTES E COSTA E SOUSA FICAVA.

 



ENgº. COSTA E SOUSA E A GESTÃO MUNICIPAL DE ALCOBAÇA ANTES E LOGO DEPOIS DO 25 DE ABRIL.
MUDAVAM OS PRESIDENTES E COSTA E SOUSA FICAVA.

Fleming de Oliveira



Não é possível falar da gestão municipal em Alcobaça antes do 25 de Abril, esquecendo o Engº José Carlos Costa e Sousa.
Entrou para os quadros da Câmara em 1 de outubro de 1948 e aposentou-se em 6 de agosto de 1991, na véspera de completar 70 anos de idade. Esses anos de serviço, aguentei 42 anos, 10 meses e 6 dias, como gostava de me dizer, permitiram-lhe estabelecer e manter estreito contacto com diversas figuras sociais e políticas, locais e nacionais, sobre as quais discorre com graça, senão mesmo com cinismo indisfarçado. Ao mesmo tempo, era ímpar o seu conhecimento da vida e dos fastos do Concelho, funcionando como autêntico arquivo municipal, à míngua de um devidamente organizado, atualizado e fiável.

Nesse ano de 1948, a vida política alcobacense, no rescaldo da guerra andava suspensa perante uma esperada, mas não concretizada, abertura do regime.
A Câmara era a única do País com uma vereação afeta à oposição, no mandato de Nascimento e Sousa, numa terra, onde se dizia, que até os Presidentes da Câmara se matam, numa referência a Manuel da Silva Carolino, que se suicidara.
Costa e Sousa foi frequentemente acusado de ser o dono de Câmara. Isso resultava da circunstância de, contrariamente ao que hoje acontece, os Presidente e Vereadores não exercerem as suas funções em regime de permanência e ser muito diminuto o quadro de funcionários adstritos aos serviços internos, para além do pessoal externo, na sua maioria contratado ao dia.

Costa e Sousa disse-me que a leitura que faço da função resulta que sempre me procurei posicionar perante a política como a água potável, isto é, politicamente procurei ser insípido, inodoro e incolor.
Sem dúvida que esta postura lhe valeu, por vezes, alguma incompreensão por parte do público, que estranhava que ao longo dos anos, apesar das alterações que iam surgindo na administração municipal de Alcobaça, a maior das quais foi obviamente com o 25 de Abril, ele se mantivesse intocável.
Até essa altura, Costa e Sousa trabalhou com quatro Presidentes de Câmara, todos eles diferentes, que passavam, enquanto ele ficava. Era, de facto, o elo de ligação, a continuidade.

Referiu-me que sempre teve respeito e consideração por todos os Presidentes de Câmara que só tinham, porém, um defeito, aliás, sempre o mesmo: eram políticos. Desde sempre, verifiquei que, então como agora, tudo o que sai bem é por mérito dos eleitos do povo e tudo o que sai mal é por culpa dos funcionários.

Conheceu Humberto Delgado em Alcobaça, ainda Brigadeiro, que ao fim de semana vinha à Cela, onde tinha interesses.
Trocaram correspondência, conversas de circunstância e, algumas amabilidades.
Ao comentar a sua experiência dos Dias da Revolução, começa por precisar que nunca fui um fascista, nem combatente antifascista, como tantos gostam de se intitular.

Logo no dia 4 de maio de 1974, apesar de se saber que Tarcísio Trindade não voltaria a ocupar a Câmara, havia muita agitação nas ruas e no largo fronteiro aos Paços do Concelho pedindo redundantemente a sua demissão, e gritando slogans como Tarcísio para a rua ou Tarcísio fascista. Eram manifestações típicas de segunda-feira, dia da feira semanal, comentou-me Costa e Sousa, que assistia de uma janela do primeiro andar, aonde um ano depois voltou para ver os acontecimentos, quando foi para correr com a CA de José Pinto.
Estes manifestantes nem sempre mostravam cordialidade, mesmo dando o devido desconto ao discurso de um e outro. Por isso, Costa e Sousa, retraiu-se quando um deles se lhe dirigiu, com vivacidade, perguntando se saíam a bem ou esperavam que os deitassem pela janela. Com a calma que lhe era peculiar, ou pelo menos aparentava, respondeu que não era ao fim de 26 anos na Câmara que ia fugir, pois não era político, nem havia nada que justificasse essa defenestração. À cautela, foi para o rés do chão pois que, se fosse atirado à rua, caía de um nível mais baixo.
Na sequência dessas movimentações, algumas pessoas chegaram a forçar a entrada do edifício. Costa e Sousa reconheceu, alguns contestatários mais conhecidos no meio, bem como feirantes. Estes últimos, andavam há algum tempo de candeias às avessas com Tarcísio Trindade que fizera várias mudanças no local de funcionamento do mercado de segunda-feira, a última das quais para o alto da Gafa, e que estavam esperançados em ver alterada a situação.
Em vão, no que dizia respeito à intervenção de Tarcísio Trindade, que já não voltou à Câmara, tanto assim que Costa e Sousa e o Chefe da Secretaria, foram ao fim da tarde levar-lhe alguns objetos pessoais, que deixara no gabinete.
A propósito deste incidente com os feirantes e que teve antecedentes, aonde se encontravam alguns ciganos, Costa e Sousa contou-me uma pequena rábula ocorrida na última segunda-feira antes do 25 de Abril. A Comissão de Feirantes seguiu, com persistência, o Presidente da Câmara até ao  gabinete, pugnando pela alteração da deliberação de escolher novo lugar para o mercado, utilizando uma linguagem vernácula e gestos pouco amistosos. Pelo menos na aparência. Enquanto Trindade procurava a chave no bolso e com algum nervosismo, dizia-lhes que não percebia a razão de tanta agitação, pois os estava a escutar. Estes responderam que sim, que os estava a escutar, mas enquanto não encontrasse a chave, pois que depois lhes batia com a porta na cara.


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