COMISSÕES DE MORADORES, LIMPEZAS E HIGIENE (Alcobaça 1974-1975).
Fleming de Oliveira
A partir de 1974, abriram-se de repente as comportas de uma
corrente social, durante décadas reprimida.
O povo, como nas caricaturas de Bordalo Pinheiro, sacudiu a canga
e pretendeu tornar-se protagonista da peça, surpreendendo o poder político e
económico. Movimentos populares ultrapassaram, com frequência, enquadramentos
partidários, sindicais, religiosos ou outros.
“Comissões de Moradores” e outras formas organizativas, surgiram à
luz do dia por todo o país, sendo mais numerosas em zonas com tradição
histórica de lutas sociais. Efetivamente, um dos movimentos populares mais
significativos no pós-revolução, foi o aparecimento das Comissões de Moradores.
Em determinadas zonas do País, como Setúbal e as cinturas industriais de Lisboa
e Porto, este movimento teve alguma expressão, ainda que transitória.
Em
Alcobaça, não a teve.
Em 4
de dezembro de 1974 uma auto intitulada Comissão de Moradores da Azinhaga da
Palmeira, veio solicitar à CA da CMA, uma nova designação para o caminho, que
há pouco tinha sido arranjado. Gilberto de Magalhães Coutinho propôs que se
chamasse Rua da Liberdade, o que foi aprovado pela por unanimidade.
Embora
possa ter havido casos de manipulação partidária, estas Comissões foram na
maioria, a expressão sincera (embora tantas vezes utópica), de aspirações
locais, fruto de um momento histórico exaltante, no qual as populações
supuseram ser possível construir, por suas mãos, alternativas ligadas à
resolução dos problemas concretos e imediatos.
No
domingo, 25 de maio de 1975, “terá havido” um arremedo de uma manifestação de vontade e
querer de habitantes, homens, mulheres e crianças de Coz que, munidos de
enxadas e vassouras, limparam “as imundas
ruas e recantos”.
O Voz de Alcobaça
deu enfático, demolidor e poético destaque a essa iniciativa de algumas
pessoas, pela pena do redator, o panfletário, acintoso e azedo José Barbosa
Rodrigues (se não o promotor da iniciativa, foi interveniente ativo), que
escreveu que, limpas as ruas, foi iniciado a escalada que leva à Escola
Primária onde, ficou “desesperado e revoltado” com o espetáculo com que
deparou na casa de banho, nunca detetado, nem denunciado por alunos ou famílias
e a que nem todos conseguiram assistir pois, “as fezes cobriam todo o chão
não deixando qualquer espaço livre para a entrada de quem quer que fosse, o
cheiro pestilento obrigou-nos a fechar a porta. Esta escandalosa situação
deixou-nos perplexos e revoltosos, pois já não bastava o próprio estado do
edifício, o miserável estado das carteiras em que é necessário os alunos
segurarem as carteiras uns dos outros para conseguirem fazer as cópias, o
quadro que deveria estar num museu de artigos escolares do século XV, o
material didático que julgávamos já nem servir para sucata e a biblioteca
fenomenal de obras salazaristas e caetanistas que de certo muito irão
contribuir para o desenvolvimento dos nossos filhos…”
José Barbosa Rodrigues, enfatizou que, entre alguns
populares, depois de terem dado como terminada a jornada, “alguém alvitrou
irmos limpar o adro da Igreja de Santa Eufémia, o qual se encontrava fechado a
cadeado por uma fanática, a viver nesta localidade, que num ato de valentia,
orgulho religioso e por raivas pessoais, resolveu um dia fechar com corrente e
cadeado, o portal que dá acesso ao adro daquela igreja, sem que para isso
tivesse consultado qualquer pessoa ou entidade, quer religiosa, quer pública”.
Assim, foi organizado um cortejo de protesto, ele à
frente seguido de mais alguns, com que nos “dirigimos a casa dessa senhora,
a fim de obtermos a chave”, o que foi conseguido com alguma dificuldade, “com
a qual abrimos o portal”. Depois de ter sido feita a limpeza e “descarregado
o 14º. trator de lixo, iniciámos uma marcha cantada por todo o grupo pela rua
principal da aldeia (…)”.
Não obstante José Barbosa Rodrigues ter prometido
proceder a “outras obras de interesse local e das quais em breve haveremos
de falar”, esta iniciativa não deu frutos.
Romancear é
diferente de realizar. Romanceou tanto… que um dia acabou mal,
Em
Valado de Santa Quitéria, houve uma iniciativa que pareceu assemelhar-se, pois
em 26 de janeiro de 1975, cerca de 80 pessoas de todas as categorias sociais e
profissionais, incluindo estudantes, reuniram-se para levar a cabo a limpeza
das valetas que liga a EN8 até à saída do lugar, numa extensão de cerca de 6 km .
Foi
presente, em junho de 1974, à Câmara Municipal de Alcobaça uma petição de uma
Comissão de Moradores de S. Martinho do Porto que sugeria o nome do prof.
Francisco Nunes Eliseu, para patrono da Escola Preparatória da Vila.
A CMA,
sem tomar posição, ”lavando as mãos”, encaminhou superiormente o assunto.
Porém, em resposta, foi recebido um ofício da Direção Geral da Administração
Escolar, informando que à Escola Preparatória de S. Martinho do Porto, fora
atribuído o nome do Professor Eng.º Joaquim Vieira Natividade.
Na
Maiorga, de acordo com uma auto proclamada Comissão de Moradores, apoiada pela
CA da Junta de Freguesia, haviam condições higiénicas que deixavam bastante a
desejar.
Além
do péssimo estado das ruas, não havia esgotos, nem retretes públicas, que neste
caso serviriam não só os habitantes, como até as muitas pessoas que a visitam.
Era,
portanto, urgente construírem-se essas retretes, devendo a CMA colaborar
materialmente nesse sentido.
Analisado
o assunto em sessão com todo o cuidado
que merecia, a CMA encarregou o Engº Costa e Sousa e os Serviços Técnicos, de o
estudar e apresentar propostas.
Cremos
que, ainda hoje, o assunto continua em estudo, apesar da “gravidade” da situação.
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