terça-feira, 22 de abril de 2014

ALCOBAÇA NAS VÉSPERAS DO 25 DE ABRIL

ALCOBAÇA NAS VÉSPERAS DO 25 DE ABRIL

Fleming de Oliveira


Na Câmara Municipal tinha assento, desde 1969, como Presidente, Tarcísio Trindade, um alcobacense que congregava simpatias pessoais, mesmo entre alguns liberais, afetos à oposição.
Trindade gaba-se mais tarde, que nunca a PIDE interferiu na gestão ou atividade municipal e que é um título de orgulho para mim poder afirmar que nenhum alcobacense foi molestado, prejudicado ou preso pela polícia política durante os meus mandatos, por diligência ou iniciativa da Câmara Municipal.

Manuel José dos Santos Campos nunca escondeu o apreço que Tarcísio Trindade pessoalmente lhe merecia, embora alegadamente não navegasse nas mesmas águas políticas.
Mas talvez até nem fosse bem assim. Ele, o Padre João Casimiro e representantes do Bárrio, Cela e Vestiaria estavam a criar condições para ser construído em Pinhal Fanheiro, um Centro Social destinado a dar apoio a crianças e idosos, ideia a que o Presidente da Câmara dava todo o apoio. Por essas e outras, Manuel Campos acreditava que Tarcísio Trindade era o homem certo para o lugar certo à frente dos destinos do Município. No seu tempo, Alcobaça caminhava a passos seguros, rumo ao progresso. A própria Feira de S. Bernardo era uma demonstração da pujança do Concelho, tanto no setor agrícola como industrial e comercial.

Por sua vez, era Chefe dos Serviços Técnicos da Câmara, o Engº. José Carlos Costa e Sousa, que entrara para os respetivos quadros com 27 anos, em 1 de outubro de 1948.

O Dr. Manuel dos Santos Machado, que em estudante chegou a morar em Aljubarrota, particular amigo de Tarcísio Trindade, havia recentemente tomado posse do cargo de Governador Civil do Distrito de Leiria, substituindo Damasceno de Campos, político com boas relações na Benedita e Manuel Castelhano.

Os Bombeiros Voluntários de Alcobaça andavam muito atarefados, ainda mais do que o habitual, em consequência dos inúmeros acidentes de viação e extemporâneos incêndios, que levavam a sirene a tocar em horas impróprias, com inquietação para a população.

Contrariamente à descrença que pairava sobre certas pessoas, alguns faziam crer que nada de anormal se passava na Filarmónica da Vestiaria, com ensaios concorridos e à espera de novo fardamento. Mas, a verdade, não era bem assim. A situação na Filarmónica era complicada e só, no fim do ano de 1974, se conseguiu fazer a eleição dos corpos sociais. Nas Assembleias-Gerais ninguém comparecia, dando a ideia que não havia quem estivesse para se incomodar, para agarrar o leme, apesar de gostar de música e a Filarmónica ser um dos grandes referenciais da terra. Havia o risco de se desmoronar uma coletividade com mais de 70 anos de vida ininterrupta. A Filarmónica da Vestiaria Monsenhor José Cacela teve, finalmente, no dia 7 de junho de 1974, a estreia dos seus novos fardamentos, realizando concerto com o maestro Agostinho Caineta, na presença de algumas individualidades, ligadas à música. Do programa, constou a interpretação da Marcha Infantes do Vinte, a Abertura Britanicus, de Scassola e para finalizar a Marcha Cidade Invicta, de Sousa Morais, esta sobre a regência do antigo e estimado maestro Manuel Maria Baltazar.

Em Valado de Frades, após obras que demoraram mais que o previsto, foi solenemente inaugurado o ringue de patinagem, com um jogo entre a equipa da casa e o Turquel, que aquela venceu por um concludente 4-0.
Na ocasião, o Dr. Joaquim Guerra, grande entusiasta da modalidade, fez um discurso aplaudido pela casa cheia.

Os proprietários e concessionários das bombas de combustível da Vila de Alcobaça estudavam, a possibilidade de estabelecer um horário de atendimento ao público, compatível com o descanso do pessoal e as restrições às vendas, decorrente de conjuntura internacional.

O Alm. Américo Tomás, em 29 de março, esteve em visita oficial ao Concelho de Alcobaça e acompanhou, obras de dragagem e saneamento na baía de S. Martinho do Porto. A propósito desta visita, o Ministro do Interior, César Moreira Batista, enviou ao Presidente da Câmara de Alcobaça, o seguinte telegrama:
Com os meus cumprimentos e por honroso encargo de Sua Exª. o Senhor Presidente da República, transmito a V. Exª e à população desse Concelho, os seus agradecimentos pela receção que lhe foi dispensada por ocasião da sua recente visita a S. Martinho do Porto.
 Moreira Batista, Ministro do Interior.

Por estes dias, o Prof. Marcelo Caetano, acompanhando o seu convidado, amigo e antigo Ministro (franquista) das Relações Exteriores de Espanha, Laureano Lopez-Rodó (tecnocrata, ligado ao OPUS DEI), fez uma visita particular à Vila e ao Mosteiro, depois de lhe andar a mostrar o Centro do País.

Os amigos do alheio, não descansavam, pois que penetraram com audácia, por uma janela na Igreja Paroquial da Benedita e introduzindo-se na sacristia, arrancaram da parede o cofre onde estavam guardadas a Coroa de Nª. Senhora, o cálice e as joias, o qual veio a ser recuperado, pouco depois, com todo o seu valor, junto ao campo de jogos.

Por Alcobaça e pelo País reinava a calma, tanta calma que, quando os carros de combate da Escola Prática de Cavalaria, de Santarém, comandados pelo Cap. Salgueiro Maia, arrancaram na madrugada de 25 de Abril em direção ao Largo do Carmo, a capacidade de resposta do regime foi inexistente. O Estado Novo, personalizado após setembro de 1968 por Caetano, ruiu, sem resistir. Nenhuma ação de cariz popular, nenhuma iniciativa de organizações ou instituições afetas ao regime ou mesmo a direita salazarista, se pôs em movimento para o defender, ainda que só na honra. Subitamente, como um castelo de cartas, caiu um regime com mais de 40 anos. As forças militares que supostamente cumpriam todas ordens dos comandos da Brigada do Reumático, mal puderam, passaram-se para o MFA.

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