quinta-feira, 17 de abril de 2014

-TARCÍSIO TRINDADE (Presidente da Câmara de Alcobaça), AMÍLCAR PEREIRA DE MAGALHÃES (Distinto Advogado, Deputado e Agricultor). ELEIÇÕES PARA A AN. FADIGAS CONTRAPROPÔS-

 
-TARCÍSIO TRINDADE (Presidente da Câmara de Alcobaça), AMÍLCAR PEREIRA DE MAGALHÃES (Distinto Advogado, Deputado e Agricultor).
ELEIÇÕES PARA A AN.
FADIGAS CONTRAPROPÔS-

-Fleming de Oliveira-


Nesse ano de 1969, foi nomeado Presidente da Câmara de Alcobaça, Tarcísio Trindade, de 37 anos, antigo vereador, que se vinha preparando, meticulosamente, para o lugar que exerceu até ao 25 de abril, Diretor do influente e católico O Alcoa até 27 de março de 1971, altura em que foi substituído por Adélio Viana Maranhão, com quem não mantinha ou passou a não manter relações de cordialidade. 
Tanto assim que, a propósito de um comentário de O Alcoa, sobre o estado de sujidade da areia da praia de Paredes, Tarcísio Trindade contra-atacou a coberto do seu Jornal de Alcobaça (16 de junho de 1971), sem meias medidas e com uma inusitada violência verbal, dizendo que será mais uma crítica à Câmara Municipal que o referido semanário tem publicado, numa linha de conduta surpreendente, já que nós, como toda a gente com um mínimo de formação, julgaríamos que um jornal católico, etc., etc., não publicaria mentiras aleivosas, nem críticas de má fé (…).
Tarcísio Trindade que, conforme assegurava O Alcoa, era aparentado com algumas das mais antigas famílias da Vila, sucedeu a um apagado e bondoso Presidente de Câmara, Jaime Horácio Pacheco Junqueiro.
Segundo corria em certos meios da ligados ao Município, Junqueiro nunca compreendeu, nem aceitou as razões da sua exoneração ao fim de dois mandatos, em que pouco mais fez que inaugurar alguns obras projetadas anteriormente (lavadouros, fontanários, escolas, Posto Clínico, Mercado Municipal e Parque de Campismo), receber Juscelino Kubitschek de Oliveira, os Príncipes de Mónaco e por duas vezes Américo Tomás.
Junqueiro, talvez nunca tivesse calculado que um dia pudesse ter chegado política e socialmente tão longe…
Ouvi contar ao Dr. Magalhães que J. Junqueiro, depois de deixar a Presidência da Câmara Municipal em 1969, mandou fazer cartões de visita onde no lugar habitualmente reservado a profissão, estava escrito Ex-Presidente da Câmara de Alcobaça. Começou a sua vida profissional em Alcobaça, como Fiscal da Comissão Reguladora das Moagens de Ramas. Depois foi secretário do Grémio da Lavoura, em cujo organismo chegou a gerente.
Fez parte da Comissão Concelhia de Alcobaça da UN e da vereação nas Câmaras Municipais presididas por Júlio Biel e Joaquim Augusto de Carvalho.

Após Mário Vazão assumir a direção de O Alcoa, as relações entre este e o Jornal de Alcobaça (de Tarcísio Trindade), passaram a ser bastante cordeais.
Tarcísio Trindade revia-se na figura de Manuel Carolino, que homenageava sempre que podia e que,  tal como ele, fora dono de um jornal (editor, proprietário, articulista).

Quando Tarcísio Trindade se perfilava para ser reconduzido num segundo mandato como Presidente da Câmara, (decisão que não era totalmente pacífica, tanto ao nível local como distrital), e era preciso constituir uma vereação sem sobressaltos e com alguns ares de abertura política (mas sem condescender demasiado com a oposição), o Dr. Amílcar Magalhães, por sugestão do Governador Civil, contatou Mário Fadigas, agricultor da Maiorga.
Afinal, o que é que pretendia o Dr. A. Magalhães, Deputado da Nação?
Tão só, sondar Mário Fadigas, para fazer parte da nova vereação municipal, presidida por Tarcísio Trindade. Fadigas era um homem dito de esquerda, republicano por tradição, pelo que ficou admirado com o convite, mas dado o respeito e a consideração que o Dr. Magalhães lhe merecia, não excluiu liminarmente a proposta, dizendo que a podia aceitar, mas…, precisaria que lhe fosse assegurado que os seus correligionários de Alcobaça, teriam o mesmo respeitoso tratamento, que a Situação lhes reconhecesse a mesma idoneidade moral para servir a causa pública. Perante esta objeção, o Dr. Amílcar Magalhães respondeu que, por ele, aceitava a contraproposta, mas não podia assumir o compromisso em nome de outrem.
Mário Fadigas, não obstante as divergências políticas, sempre teve boas relações com o Dr. Amílcar Pereira de Magalhães, que reconhecia como conservador, mas não propriamente salazarista.

O Dr. Amílcar Magalhães nasceu em 1909, no lugar de Porto do Carro-Leiria, no seio de uma família abastada, antes de a vida de seus pais ter dado algumas voltas. Teve dois irmãos mais novos, sendo um Advogado e outro industrial de cerâmica. Muito jovem foi viver para os Montes, aonde veio a casar e seu pai tinha a vida organizada. Seu pai, Joaquim Pereira de Magalhães, a quem já me referi doutras vezes, era republicano e anticlerical, ideias que de alguma forma transmitiu aos filhos, embora tivesse frequentado o Seminário de Leiria, onde fez os estudos básicos.
Republicano Joaquim Magalhães, chegou a ser procurado em sua casa, nos Montes, por tropas ao serviço da monarquia que, de baioneta em punho, a vasculharam de alto a baixo, só a tendo abandonado quando o oficial que as comandava viu um crucifixo pendente numa parede. De facto, D. Joaquina sua esposa, era pessoa crente e praticante. Joaquim Pereira de Magalhães encontrava-se prudentemente refugiado, num esconderijo existente numa sua propriedade.
Desde pequeno, o jovem Amílcar gostou de assumir responsabilidades, que o pai aos poucos lhe foi confiando. Gostava de contar que, com cerca de 12 anos, o pai o encarregou de ir de comboio a Lisboa, tratar de um negócio de resina, de que se terá saído bem.
A devido tempo, com os pais a viver em Coimbra (o pai foi archeiro na Universidade), depois de ter estudado no Liceu de Leiria, licenciou-se na Faculdade de Direito (1936), tendo como colegas de curso e amigos, os Drs. Fernando Maia de Carvalho, Manuel Casanova, Antão Santos da Cunha e José Guilherme Melo e Castro, este por mim referido a propósito do convite para as eleições de 1969 para a Assembleia Nacional.
Terminado o curso de Direito, estagiou em Coimbra, com um Advogado muito conhecido, Dr. Abranches Ferrão e por alturas de 1939, abriu em Alcobaça um escritório, com o tempo conceituado e com boa clientela, onde trabalhou até 1982, altura em que faleceu.
Sem favor, era o que se pode qualificar como um distinto e exemplar advogado, à moda antiga, embora com pouco ar de tribuno. Pessoa de temperamento aparentemente frio, pouco loquaz, cristão mas não praticante, prezava o estilo da oratória do Dr. Salazar, que achava adequado para o País, o que realçava, com um gesto largo da sua mão direita.
O Dr. Amílcar Magalhães era do tempo em que, uma frase bem elaborada, escrita ou falada, correspondia a uma pessoa de educação e cultura humanista, onde os clássicos não tinham desaparecido dos vícios de leitura ou dos manuais escolares.
Assistiu com mágoa, aliás pouco expressa publicamente, ao final do Império, embora reconhecesse que nada podia ser feito em contrário. Recordo-me de lhe ouvir dizer que a ocupação dos territórios da Índia, não constituiu uma surpresa, muito menos o fim do mundo onde se formou e desenvolveu pessoal e socialmente.
Quando se deu o 25 de abril, não perdoou a Caetano o falhanço, nem acreditou no mérito político de Spínola, que tinha alguma dificuldade em aceitar pelo snobismo.
Pessoa afável, algo idealista, mas também pragmático, não muito expansivo, escreveu em 1942 (com poucos anos de profissão), um texto que publicou sob o título O POLÓNIA ASSALTA A SOGRA E PALMA-LHE OS BENS que bem o definia na sua postura ético-profissional. Daí destaco que (…) no caminho percorrido (ainda não tinha sido longo, pois era o advogado mais novo da Comarca) até aqui, pudemos ter visto já o bastante para chegarmos à confrangedora certeza de que a profissão escolhida, longe de nos trazer sempre aquela benéfica recompensa espiritual que em outros tempos visionámos, se transforma, antes, num longo rosário de desgostos e desilusões. É que a vida é cheia de surpresas. (…)
Acreditava bastante na importância da justiça célere e ponderada.
Como reagiria hoje?

Joaquim Meneses, recordava do Advogado Dr. Magalhães a postura sóbria, correta e leal, e que, por alturas do Natal, mandava uma garrafa de porto, mas do bom, a cada um dos elementos do Posto da GNR.
Investiu grande parte do seu património, em propriedades rústicas nos Montes, nas quais produzia vinha e fruta e dedicava muito do seu tempo disponível.
Nunca apurei se foi porque não quis, nunca fez parte ou se identificou com a Ala Liberal ou foi Caetano e a ANP que o não quiseram, na nova e última Assembleia Nacional (eleições em 1973).

A partir de 1971, havia que começar a considerar a escolha/eleição dos novos elementos para a Administração Municipal de Alcobaça e, de acordo com algumas promessas de Caetano, desejava-se que fosse uma representação ativa, jovem e impulsionadora, recaindo não só em determinadas elites, mas entre os seis a escolher, estejam englobadas pessoas, que pela sua profissão ou formação, possam ser úteis em todos os sectores primordiais da vida da nossa terra.
Em dezembro de 1971, tomaram posse os novos membros do Conselho Municipal de Alcobaça para 1972/1975 que passou a ter a seguinte constituição: Presidente da Câmara-Tarcísio Trindade; Representante das Ordens Profissionais-Dr. Amílcar Pereira de Magalhães;
Representante das Misericórdias (Alcobaça e Aljubarrota)-Fernando Alua Soares;
Representante do Comércio-Raul dos Reis Gameiro; Representante da Lavoura-Bento Jácome de Sousa; Representantes da Juntas de Freguesia do Concelho-Firmo Lisboa, Martinho Duarte, António da Silva Marques (Santeiro) e Bernardo Matias Coelho; Representante da Indústria Têxtil-Francisco Ferreira Rodrigues;
Representantes das Casas do Povo (Alcobaça e Alfeizerão)-respetivamente João Henriques Domingues e Joaquim Machado Ferreira; Representante dos Empregados de Escritório-Alberto dos Santos Duarte Vieira.
O Conselho Municipal elegeu sem sobressaltos, os seguintes vereadores: Adelino Rodrigues da Costa e Joaquim Pedro de Sousa, professores, José Mateus, comerciante, que transitaram da vereação cessante, Manuel João Coelho da Bernarda, arquiteto, Helder dos Santos Lopes, industrial, e Manuel Alberto Tomás Correia, gerente comercial.

A 28 de julho de 1973, tomou posse no Salão Nobre do Governo Civil de Leiria, como Vice-Presidente da Câmara, o Dr. João Pereira Leão Costa, que veio substituir o Engº. Rui Tomás Pereira Marques. Estiveram presentes nessa concorrida cerimónia, entre outros, o Presidente da Comissão Distrital da ANP, Engº. Lemos Proença, o Deputado Dr. Amílcar Pereira de Magalhães, o antigo Presidente da CMA, Provedor da Misericórdia e Presidente da Comissão Concelhia da ANP, Joaquim Augusto de Carvalho (que fez um discurso de conteúdo marcadamente  nacionalista), Comandantes Distritais da PSP e GNR, o Presidente da CMA, Tarcísio Trindade (cujo discurso além de destacar os méritos de inteligência e aprumo do empossado, salientou a estima e confiança dos administradores, empregados e operários da grande empresa onde desempenha importante cargo, a vontade de todos participarem, ainda que ignorados, no tempo presente deste país remoçado, deste Portugal Novo de Rui Sanches e Veiga Simão, neste Portugal Novo de Marcello Caetano ), Vereadores, Presidentes das Juntas de Freguesia e Regedores, Pároco e Vigário de Alcobaça, José Emílio Raposo de Magalhães, responsáveis por estabelecimentos de ensino, dirigentes de coletividades e senhoras.
Pela portaria do Ministério do Interior que nomeou o Dr. Leão Costa, o Engº. Rui Tomás Marques foi louvado pelo aprumo, zelo e competência com que exerceu o cargo.

Tarcísio Trindade, veio a fundar um jornal periódico, de que era dono, que chegou até ao 25 de Abril, e lhe assegurava mais, que O Alcoa, a retaguarda da sua ação na Presidência da Câmara de Alcobaça. Trindade era muito ambicioso, e no quadro do marcelismo, ainda que moribundo, veio a ser designado em Outubro de 1973 como Procurador à Câmara Corporativa, em representação das Câmaras Municipais, concelhos rurais de sete distritos.

Caetano, atingiu situações paradoxais, pois que o mesmo modelo político, marcado pelo estilo de autoritarismo típico da guerra-fria, que serviu para o País se integrar em 1948 na OCDE, em 1949 na NATO ou em 1960 na EFTA, permitiu em 1972 uma associação com a CEE. Como se comprovou, Portugal estava longe de ser uma sociedade aberta, do pluralismo ou das regras de concorrência de uma economia de mercado, onde preponderasse uma economia privada, sem a presença sufocante de grupos familiares em sectores básicos.
Os novos tempos alteraram os esquemas de comunicação, com o aparecimento de O Expresso, de Pinto Balsemão, os artigos de Sá Carneiro, e um pequeno, mas efémero e aparente, abrandamento da censura.
Foi o processo de intensificação capitalista de economia, que Caetano veio a considerar como um tempo de vacas gordas, isto é, o início da sociedade de consumo, certos esquemas de capitalismo popular, por via do jogo bolsista, que atingiu níveis elevados e mesmo dramáticos.
Em Março de 1972, o Deputado  Amílcar Pereira de Magalhães, não obstante já não ser um jovem, mas portador de ilusões acerca das virtualidades do marcelismo, interveio na Assembleia Nacional e num discurso de fundo, pedindo a criação dos Estudos Superiores de Agronomia, em Alcobaça. Quem conheceu o Dr. Magalhães poderá perceber quanto este tema lhe era caro e o preocupava. Mais do que político, e pelo menos tanto como advogado, o Dr. Amílcar Magalhães era um homem da terra e da agricultura, as quais dedicou muito do seu tempo, saber e património. Esta intervenção foi apreciada em Alcobaça mas, não obstante os telegramas de apoio da Câmara, Juntas de Freguesia, Grémio do Comércio, etc., não obteve  acolhimento no governo.

Com a presença do Presidente da Comissão Executiva da ANP, Dr. Elmano Alves, foram inauguradas em 18 de novembro de 1972, na Praça Rodrigues Lobo, em Leiria, as novas instalações.
Após a inauguração, tomaram posse os membros de algumas Comissões Concelhias do Distrito, tendo usado da palavra, o Deputado Amílcar P. Magalhães, Presidente da Comissão Concelhia de Alcobaça, em nome das congéneres, que reafirmou que, a ANP (…) não é um partido político, no significado corrente do termo: republicanos ou monárquicos, liberais ou democratas das várias tendências, todas nela terão o seu lugar, sem o sacrifício das ideias particulares ou quebra de dignidade, porque estarmos em face de princípios e valores que a todos sendo comuns, constituem o substrato da Nação, que devemos acima de tudo, incondicionalmente servir (…). Este será o nosso objetivo e também a nossa esperança.
O Dr. Amílcar Magalhães estava longe de ser um republicano no sentido de antimonárquico (embora não simpatizasse com a monarquia), e não perfilhava teorias extremistas.
Por isso, manteve-se discretamente afastado do salazarismo, passando apenas a colaborar com o regime, após a substituição de Salazar.
Foi como se referiu o Dr. José Guilherme Melo e Castro (colega de curso na Faculdade de Direito), que em nome de Marcelo Caetano, se deslocou ao seu escritório em Alcobaça, para o convidar a integrar a lista da UN, o que veio a acontecer como independente.
Perante a ANP, defendeu em 1972 que (…) se a democracia liberal fosse governo, decerto que os seus partidários nunca razoavelmente admitiriam que os monárquicos ou os defensores do estado social se dispensassem nesta grave emergência, dos seus deveres de cidadãos, só porque não viram ainda restaurada a monarquia ou a república corporativa. E quanto à garantia das liberdades constitucionais, cremos que nenhum governo por estas responderia melhor que o actual (…).
Quase no fim da legislatura (abril de 1973), o Dr. Amílcar Magalhães fez uma intervenção na Assembleia Nacional (aliás a sua última), a que foi dada boa cobertura nos jornais afetos ao regime e mesmo à oposição, refletindo sobre os atos de violência subversiva continuam na rua, já com alguns reflexos na paz dos espíritos. (…) Em nome do pluralismo ideológico e pretendidas vantagens de todo o diálogo, já se tem igualmente aludido nesta sala à questão da liberdade, ou liberdades políticas usufruídas ou não, pelos cidadãos portugueses, nas últimas décadas (…).

As eleições para a Assembleia Nacional em 1973, não tiveram história.
A Ala Liberal morrera politicamente. Aliás nunca tentara, ao contrário do que ocorreu com os socialistas de Soares, estabelecer qualquer compromisso com o ideário demo-republicano. Não era esse o seu fundamento. Naquelas eleições não houve oposição. A CDE ainda chegou a apresentar lista em Leiria, composta por Carlos Mota, Odete Santos, Custódio Maldonado Freitas, Guarda Ribeiro, José H. Vareda e Manuel Barrido, que acabou por não ir a votos.
Por sua vez, a lista da ANP era composta por Magro dos Reis, Henrique Lacerda, Joaquim da Silva Pinto, Joaquim Sequeira de Faria e Manuel Valente Sanches, que ocupou todos os lugares disponíveis. Em 24 de outubro de 1973, realizou-se no Cine-teatro de Alcobaça uma sessão de propaganda da oposição, que registou uma boa afluência, mas todavia não chegou a esgotar o recinto, apesar de estarem presentes bastantes centenas de pessoas vindas de outros concelhos. A encerrar, os participantes entoaram o Hino Nacional.
Isto, de acordo com um apontamento noticioso de O Alcoa, que não esteve presente, apesar do convite.
NOTA-cfr. o nosso, NO TEMPO DE SALAZAR, CAETANO E OUTROS


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