terça-feira, 22 de abril de 2014

-LOGO A SEGUIR AO 25 DE ABRIL REGRESSAM SOARES E CUNHAL. -REGOZIJO EM ALCOBAÇA, BENEDITA E S. MARTINHO DO PORTO. -MOVIMENTO “DEMOCRÁTICO” DE ALCOBAÇA.

 
-LOGO A SEGUIR AO 25 DE ABRIL REGRESSAM SOARES E CUNHAL.
-REGOZIJO EM ALCOBAÇA, BENEDITA E S. MARTINHO DO PORTO.
-MOVIMENTO “DEMOCRÁTICO” DE ALCOBAÇA.


Fleming de Oliveira




Logo nos dias seguintes a 25 de Abril, haviam regressado a Portugal os dois mais carismáticos líderes da oposição, Soares (de comboio a Santa Apolónia), e Cunhal (de avião), recebidos bem pela população, entre a qual se encontrava Lourenço Pereira da Costa muito eufórico.
À chegada, Soares deu uma conferência de imprensa numa sala da estação, perante uma multidão de jornalistas nacionais e internacionais, repórteres de cinema e TV. Exprimindo-se em francês e português, começou por agradecer a presença de jornalistas e afirmou que vivia um grande dia, caracterizado pelo desejo de unidade das forças democráticas, objetivo que definiu como essencial.
Mário Soares declarou que não conhecia pessoalmente o Gen. Spínola e a única ligação que houve entre eles, baseou-se na oferta que lhe fez do livro Portugal Bailloné, cuja receção este não acusou, nem lhe transmitiu qualquer comentário. Sobre o Gen. Spínola, Soares disse que o general Spínola é credor de todo o nosso reconhecimento pelo ato histórico que acaba de realizar.
Um jornalista português dirigindo-se ao Dr. Mário Soares fez-lhe uma determinada pergunta ao que este respondeu que venho de um país democrático, onde o hábito de tratar as pessoas por dr. não existe. Chame-me apenas Mário Soares, conforme decorre de uma entrevista a O Século, em 29 de abril, a Adelino Tavares da Silva.
Nessa altura, Mário Soares ainda disse que o futuro de Portugal seria um futuro socialista. Em entrevista, a 6 de maio, ao semanário alemão Der Spiegel, interrogado sobre se acreditava que o Gen. Spínola iria colaborar na prossecução desse objetivo, respondeu que via dificuldades, mas julgava que Spínola era um homem honesto, que queria verdadeiramente dar poderes ao Povo.
E de resto, não se tratava, de momento, de fazer uma revolução socialista. Tratava-se, primeiro, de garantir ao país um futuro democrático e só depois viria o resto.
A 30 de abril, quando Álvaro Cunhal saiu do aeroporto da Portela, regressado do exílio em Paris, subiu para cima de uma chaimite e discursou à multidão que o esperava, qual Lenine em 1917. Jaime Neves foi incumbido pelo Gen. Spínola de o ir buscar ao aeroporto, para o levar até à Junta de Salvação Nacional.
Nas comemorações do 1º. de maio, os dois surgiram de mão dada e pela primeira vez juntos em público, no Estádio 1º de maio, que mudara apressadamente o nome de INATEL, para onde convergiram as manifestações da população de Lisboa e outras que quiseram associar-se-lhe. A mobilização popular, demonstrou a determinação do País em cortar com o Estado Novo, com manifestações, em muitos casos conjuntamente com forças militares. A Revolução estava em marcha e, muito em breve, começaram os saneamentos, as ocupações de edifícios devolutos para fins políticos, sociais e até habitacionais, bem como alterações na toponímia. O apoio do PS revelou-se neste momento fundamental para o PC.

O 1º. de maio de 1974, foi assinalado em Alcobaça com desfiles, colchas e bandeiras nacionais à janela. Na Benedita, houve um desfile pelas ruas, organizado por um grupo de professores e alunos, a que se juntaram populares, entoando canções populares e empunhando cartazes, indo concentrar-se na Avenida da Igreja onde, da varanda da casa da José Rafael Serralheiro, discursou entre outros, o prof. Gonçalves Sapinho, Diretor do ECB-Externato Cooperativo da Benedita.

Na Vestiaria, também houve participação popular, tendo a Filarmónica tocado o enferrujado hino do 1º. de maio.
Por sua vez, em S. Martinho do Porto, o 1º. de maio foi assinalado com manifestações de civismo e sem incidentes. Tendo-se reunido muitas pessoas no Largo José Bento da Silva, portadoras de cartazes e bandeiras nacionais, dirigiram-se depois à Delegação Marítima, para expressar ao seu comandante, na qualidade de representante das FA, a sua adesão à Junta de Salvação Nacional, bem como prestar homenagem aos elementos do MFA. O “marialva” Sub-Tenente Amélio Cunha, até aí nada conhecido como revolucionário ou mesmo progressista, mas localmente em certos meios, com o equívoco “picha de ouro”, em nome da Junta de Salvação Nacional agradeceu aos manifestantes a sua presença.
Pelos manifestantes e como seu representante, José da Silva Pereira havido proferido uma saudação. Os manifestantes dirigiram-se depois aos Postos da GF e PSP, assim como se detiveram diante dos edifícios onde ondulava uma Bandeira Nacional.

No dia 4 de maio, umas duzentas pessoas auto intitulando-se representantes do querer da população do Concelho de Alcobaça, decidiram eleger uma comissão para exigir no Governo Civil de Leiria, a destituição da Câmara.
No dia seguinte, essa comissão contactou, em Leiria, o Comandante da RAL4 e o Secretariado do Governo Civil, propondo para a Câmara Municipal um conjunto de 8 nomes:
Mário Amaral, comerciante; Mário Pires de Sá, professor; Manuel Vazão de Almeida, médico, António Francisco Laureano, caixeiro, Maria da Conceição e Silva, funcionária da Cooperativa, António Gaspar, agricultor e Pessanha Gonçalves, advogado.
Por essa altura, Tarcísio Trindade deslocou-se ao Governo Civil, tendo apresentado o pedido de demissão. Os demais elementos da Vereação da Câmara permaneceram em funções, embora precariamente.

No entanto, o proclamado Movimento Democrático de Alcobaça, que surgia pela primeira vez à luz do dia, distribuiu profusamente pela Vila o seguinte panfleto:

AO POVO DO CONCELHO DE ALCOBAÇA

O Movimento Democrático de Alcobaça, em reunião efetuada no dia 4, sexta-feira, na sua sede provisória, instalada na antiga sala de ensaios da Orquestra Típica de Alcobaça, aprovou por maioria (um único voto contra) uma proposta na qual se decidiu pedir a dissolução da Câmara Municipal e a demissão do respetivo Presidente, face ao seu comportamento ao serviço do Regime Fascista derrubado pelo Movimento das Forças Armadas, com relevante e pessoal feição policial. Uma comissão eleita para esse fim, avistou-se com o Comandante do Regimento de Artilharia nº 4 e com o Secretário do Governo Civil em exercício. Nessa entrevista foi garantido a essa comissão que na segunda-feira, dia 6, seria destituído do seu lugar o Presidente da Câmara.

Helder Lopes fez parte da vereação que tomou posse em 1972, quando Tarcísio Trindade foi reconduzido como Presidente da Câmara. Da equipa faziam ainda parte Manuel da Bernarda, Tomás Correia, Joaquim Pedro de Sousa e Rui Tomás Marques, este como Vice-presidente. Na Vereação, não havia pelouros distribuídos, muito menos competências delegadas. Tudo girava à volta do Presidente. Fundamentalmente o que se esperava de um vereador era a comparência nas sessões semanais, que se realizavam à segunda-feira.
No dia 6 de maio, realizou-se um plenário popular, frente ao edifício da Câmara, a pedir, ociosamente, a demissão do Presidente e Vereadores. Da janela do Salão Nobre, falaram aos manifestantes, aliás não muito numerosos, mas barulhentos, Firmo de Almeida, e outros, como tornaremos a ver adiante. Do Salão Nobre, aonde se encontravam, Helder Lopes e Manuel da Bernarda, os únicos autarcas presentes, assistiram a tudo, sem que fossem maltratados, por palavras ou de outra forma qualquer. Esta foi a ultima vez que Helder Lopes esteve na Câmara enquanto vereador, e não sabe ainda hoje se ele e os demais foram alguma vez formalmente exonerados.
Entre os manifestantes que protestavam contra a Câmara e Tarcísio Trindade, encontravam-se pessoas consideradas como apoiantes do anterior regime, e que, portanto, nada fazia prever que se encontrassem nesse momento numa posição diametralmente oposta.
Helder Lopes confessa que nunca sentiu qualquer receio, embora estivesse a assistir numa expectativa ansiosa e, sem dúvida, bastante aborrecido.

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