-LOGO A SEGUIR AO 25 DE ABRIL REGRESSAM SOARES E CUNHAL.
-REGOZIJO EM ALCOBAÇA, BENEDITA E S. MARTINHO DO PORTO.
-MOVIMENTO “DEMOCRÁTICO” DE ALCOBAÇA.
Fleming de Oliveira
Logo nos dias seguintes a 25 de Abril, haviam regressado
a Portugal os dois mais carismáticos líderes da oposição, Soares (de comboio a
Santa Apolónia), e Cunhal (de avião), recebidos bem pela população, entre a
qual se encontrava Lourenço Pereira da Costa muito eufórico.
À chegada, Soares deu uma conferência de imprensa numa
sala da estação, perante uma multidão de jornalistas nacionais e
internacionais, repórteres de cinema e TV. Exprimindo-se em francês e
português, começou por agradecer a presença de jornalistas e afirmou que vivia
um grande dia, caracterizado pelo desejo de unidade das forças democráticas,
objetivo que definiu como essencial.
Mário Soares declarou que não conhecia pessoalmente o
Gen. Spínola e a única ligação que houve entre eles, baseou-se na oferta que
lhe fez do livro Portugal Bailloné, cuja receção este não acusou, nem lhe
transmitiu qualquer comentário. Sobre o Gen. Spínola, Soares disse que o general Spínola é credor de todo o nosso
reconhecimento pelo ato histórico que acaba de realizar.
Um jornalista português dirigindo-se ao Dr. Mário Soares fez-lhe uma
determinada pergunta ao que este respondeu
que venho de um país democrático,
onde o hábito de tratar as pessoas por dr. não existe. Chame-me apenas Mário
Soares, conforme decorre de uma entrevista a O Século, em 29 de abril, a
Adelino Tavares da Silva.
Nessa altura, Mário Soares ainda disse que o futuro de
Portugal seria um futuro socialista.
Em entrevista, a 6 de maio, ao semanário alemão Der Spiegel, interrogado sobre se acreditava que o Gen. Spínola
iria colaborar na prossecução desse objetivo, respondeu que via dificuldades,
mas julgava que Spínola era um homem
honesto, que queria verdadeiramente dar poderes ao Povo.
E de resto, não se tratava, de momento, de fazer uma
revolução socialista. Tratava-se, primeiro, de garantir ao país um futuro
democrático e só depois viria o resto.
A 30 de abril, quando Álvaro Cunhal saiu do aeroporto da
Portela, regressado do exílio em Paris, subiu para cima de uma chaimite e
discursou à multidão que o esperava, qual Lenine em 1917. Jaime Neves foi
incumbido pelo Gen. Spínola de o ir buscar ao aeroporto, para o levar até à
Junta de Salvação Nacional.
Nas comemorações do 1º. de maio, os dois surgiram de mão
dada e pela primeira vez juntos em público, no Estádio 1º de maio, que mudara
apressadamente o nome de INATEL, para onde convergiram as manifestações da
população de Lisboa e outras que quiseram associar-se-lhe. A mobilização
popular, demonstrou a determinação do País em cortar com o Estado Novo, com
manifestações, em muitos casos conjuntamente com forças militares. A Revolução
estava em marcha e, muito em breve, começaram os saneamentos, as ocupações de
edifícios devolutos para fins políticos, sociais e até habitacionais, bem como
alterações na toponímia. O apoio do PS revelou-se neste momento fundamental
para o PC.
O 1º. de maio de 1974, foi assinalado em Alcobaça com
desfiles, colchas e bandeiras nacionais à janela. Na Benedita, houve um desfile
pelas ruas, organizado por um grupo de professores e alunos, a que se juntaram
populares, entoando canções populares e empunhando cartazes, indo concentrar-se
na Avenida da Igreja onde, da varanda da casa da José Rafael Serralheiro,
discursou entre outros, o prof. Gonçalves Sapinho, Diretor do ECB-Externato
Cooperativo da Benedita.
Na Vestiaria, também houve participação popular, tendo a
Filarmónica tocado o enferrujado hino do 1º. de maio.
Por sua vez, em S. Martinho do Porto, o 1º. de maio foi
assinalado com manifestações de civismo e sem incidentes. Tendo-se reunido
muitas pessoas no Largo José Bento da Silva, portadoras de cartazes e bandeiras
nacionais, dirigiram-se depois à Delegação Marítima, para expressar ao seu
comandante, na qualidade de representante das FA, a sua adesão à Junta de
Salvação Nacional, bem como prestar homenagem aos elementos do MFA. O
“marialva” Sub-Tenente Amélio Cunha, até aí nada conhecido como revolucionário
ou mesmo progressista, mas localmente em certos meios, com o equívoco “picha de
ouro”, em nome da Junta de Salvação
Nacional agradeceu aos manifestantes a sua presença.
Pelos manifestantes e como seu representante, José da
Silva Pereira havido proferido uma saudação. Os manifestantes dirigiram-se
depois aos Postos da GF e PSP, assim como se detiveram diante dos edifícios
onde ondulava uma Bandeira Nacional.
No dia 4 de maio, umas duzentas pessoas auto
intitulando-se representantes do querer da população do Concelho de Alcobaça,
decidiram eleger uma comissão para exigir no Governo Civil de Leiria, a
destituição da Câmara.
No dia seguinte, essa comissão contactou, em Leiria, o
Comandante da RAL4 e o Secretariado do Governo Civil, propondo para a Câmara
Municipal um conjunto de 8 nomes:
Mário Amaral, comerciante; Mário Pires de Sá, professor;
Manuel Vazão de Almeida, médico, António Francisco Laureano, caixeiro, Maria da
Conceição e Silva, funcionária da Cooperativa, António Gaspar, agricultor e
Pessanha Gonçalves, advogado.
Por essa altura, Tarcísio Trindade deslocou-se ao
Governo Civil, tendo apresentado o pedido de demissão. Os demais elementos da
Vereação da Câmara permaneceram em funções, embora precariamente.
No entanto, o proclamado Movimento Democrático de
Alcobaça, que surgia pela primeira
vez à luz do dia, distribuiu profusamente pela Vila o seguinte panfleto:
AO POVO DO CONCELHO DE ALCOBAÇA
O Movimento
Democrático de Alcobaça, em reunião efetuada no dia 4, sexta-feira, na sua sede
provisória, instalada na antiga sala de ensaios da Orquestra Típica de
Alcobaça, aprovou por maioria (um único voto contra) uma proposta na qual se
decidiu pedir a dissolução da Câmara Municipal e a demissão do respetivo
Presidente, face ao seu comportamento ao serviço do Regime Fascista derrubado
pelo Movimento das Forças Armadas, com relevante e pessoal feição policial. Uma
comissão eleita para esse fim, avistou-se com o Comandante do Regimento de
Artilharia nº 4 e com o Secretário do Governo Civil em exercício. Nessa
entrevista foi garantido a essa comissão que na segunda-feira, dia 6, seria
destituído do seu lugar o Presidente da Câmara.
Helder Lopes fez parte da vereação que tomou posse em
1972, quando Tarcísio Trindade foi reconduzido como Presidente da Câmara. Da
equipa faziam ainda parte Manuel da Bernarda, Tomás Correia, Joaquim Pedro de
Sousa e Rui Tomás Marques, este como Vice-presidente. Na Vereação, não havia pelouros
distribuídos, muito menos competências delegadas. Tudo girava à volta do
Presidente. Fundamentalmente o que se esperava de um vereador era a comparência
nas sessões semanais, que se realizavam à segunda-feira.
No dia 6 de maio, realizou-se um plenário popular,
frente ao edifício da Câmara, a pedir, ociosamente, a demissão do Presidente e
Vereadores. Da janela do Salão Nobre, falaram aos manifestantes, aliás não
muito numerosos, mas barulhentos, Firmo de Almeida, e outros, como tornaremos a
ver adiante. Do Salão Nobre, aonde se
encontravam, Helder Lopes e Manuel da Bernarda, os únicos autarcas presentes,
assistiram a tudo, sem que fossem maltratados, por palavras ou de outra forma
qualquer. Esta foi a ultima vez que Helder Lopes esteve na Câmara enquanto
vereador, e não sabe ainda hoje se ele e os demais foram alguma vez formalmente
exonerados.
Entre os manifestantes que protestavam contra a Câmara e
Tarcísio Trindade, encontravam-se pessoas consideradas como apoiantes do
anterior regime, e que, portanto, nada fazia prever que se encontrassem nesse
momento numa posição diametralmente oposta.
Helder Lopes confessa que nunca sentiu qualquer receio,
embora estivesse a assistir numa expectativa ansiosa e, sem dúvida, bastante
aborrecido.
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