terça-feira, 22 de abril de 2014

REINA A ORDEM EM TODO O PAÍS. O contexto internacional. O golpe falhado de Caldas da Rainha e Gonçalves Sapinho. Em África, alcobacenses combatiam e morriam.

 
REINA A ORDEM EM TODO O PAÍS.
O contexto internacional. O golpe falhado de Caldas da Rainha e Gonçalves Sapinho. Em África, alcobacenses combatiam e morriam.

Fleming de Oliveira


Em Portugal, e na frente militar de África, por alturas dos primeiros meses de 1974, havia a forte sensação de que alguma coisa iria mudar em breve.
As pessoas sentiam necessidade de mudança. Qual a mudança de que o País precisava, era algo que merecia pouca coincidência de opiniões. Se se perguntasse ao homem da rua e aos próprios militares do quadro permanente que meios se haveriam de utilizar, as respostas seriam díspares e inconclusivas.

A agitação estudantil, especialmente universitária, era uma manifestação do mal-estar em que o País vivia. Caetano não conseguiu dar resposta às ânsias de mudança. A Evolução na Continuidade mantivera os mesmos instrumentos de repressão, apenas com novas designações. A liberalização da economia, não correspondeu às necessidades de modernização do País, mas o problema principal era, mesmo, a Guerra em África.
A incorporação nas Forças Armadas, era uma ameaça para os jovens, muitas vezes utilizada repressivo-politicamente, e os apoios internacionais aos Movimentos de Libertação, tornavam crescentemente mais difícil a manutenção da soberania portuguesa.

Não obstante a grande oposição que se fazia sentir na ONU, as relações com o Ocidente eram normais. A atestá-lo, cite-se a cimeira das Lajes Caetano-Nixon-Pompidou, o fim da interdição da utilização de material da NATO nas campanhas de África, a abertura de Angola e Moçambique ao capital internacional, a intermediação pedida a Portugal nas questões relativas à Rodésia (Ian Smith) e as boas relações com Israel.
Dos custos da guerra, em 1974, os 50% do orçamento aplicados na guerra, corresponderiam grosso modo a 20% da riqueza do país. Grande parte desse investimento era em infraestruturas ou canalizado para a promoção da população africana. A prová-lo, cite-se ainda o facto de os indicadores de desenvolvimento social e económico da África Portuguesa superarem os de toda a restante África, apenas ultrapassados pela África do Sul. Em 1974, 60% dos efetivos militares portugueses nos três teatros de operações eram de recrutamento local. A guerra estava em avançada fase de africanização, o que também implicava que o futuro do Ultramar Português se aproximasse irremediavelmente do momento em que as elites locais, ainda que não muito preparadas, reclamassem maiores se não totais poderes.
Em 1973, a Time Magazine abordava a iminência de um milagre económico português. Quais eram os indicadores de tal milagre? Taxas de crescimento anual nunca inferiores a 5%, surgimento de indústrias metalomecânica, petroquímica e pesada portuguesa, na construção naval, movimento bolsista, investimento estrangeiro, com fixação de multinacionais e consolidação de uma classe média empresarial e mudança do perfil da população.
Tudo isso se sentia na vida social, nos hábitos e modas, no gosto de viajar, nas atividades lúdicas e na descompressão que se ia instalando com altos e baixos.
Portugal era, em 1973, um país estimado por turistas, barato e o povo simpático. Em 1973, acolheu o maior número de seminários e congressos profissionais realizados em solo europeu. O regime era encarado com envergonhada tolerância por alguns dos seus parceiros europeus, ao contrário da Espanha que, algo esquecida, mais de trinta anos se tinham passado depois da guerra civil, continuava no limbo dos intocáveis. Franco morreu em 1975 e isso irá facilitar a mudança.
Marcelo Caetano, condicionado pela fragilidade da sua base de apoio e pela incapacidade de renovação ideológica dos setores que se lhe opunham, estava ultrapassado. Nem um novel PS, muito menos o PC, podiam negociar com Caetano. O Estado Social, encontrava-se amarrado à herança de Salazar, cativo dos que não tinham uma solução para a mudança do regime e incapacitado de dialogar com uma oposição, que se assumia marxista e não rejeitava o derrube violento da Situação. A Caetano pouco mais restava que um círculo de políticos que em breve ascenderiam à ribalta nos partidos de direita, surgidos com 25 de Abril e algum respeito que o general António de Spínola por ele demonstrava.

A situação no início de 1974, estava próxima do insustentável.
O chamado Golpe das Caldas traduziu-se numa tentativa precipitada de um grupo de oficiais do quadro permanente, próximos ou afetos ao Gen. António de Spínola.
A 16 de março de 1974, arrancou de Caldas da Rainha uma coluna militar em direção a Lisboa que, sem poder contar com o apoio das principais unidades do exército, acabou por ser facilmente neutralizada. Nas semanas que se seguiram, foi intenso o movimento conspiratório de um corpo de oficiais do quadro permanente das Forças Armadas, em Portugal e África, que procuravam uma solução para o impasse da política ultramarina e a sua incapacidade para ultrapassar vitoriosamente a crise em que o País estava mergulhado.

Gonçalves Sapinho chegou à Benedita vindo do Sabugal, nos finais dos anos de 1960, digamos que por mero acaso. A minha esposa tinha concorrido para uma vaga que havia no concelho de Caldas da Rainha. Nessa altura era tropa em Montejunto. Quando regressámos de férias, vimos que a vaga era na escola primária do Casal da Marinha. Ainda tentei emprego nas Caldas da Rainha, na Benedita e em Alcobaça. Como fui contratado para professor de Matemática no Externato Cooperativo da Benedita, acabámos por nos instalar na Benedita. Nesse mesmo ano, 1967/1968, insistiu-se para que fosse Diretor do Externato e, até hoje, não me arrependo de ter aceitado o convite. Fui Diretor Pedagógico até 2000.
Havia de sua parte uma ligação especial a dois capitães e sobretudo ao Maj. Serrano, 2º Comandante da Unidade, de cuja casa era visita conjuntamente com a mulher, o que lhe permitiu perceber que este participava em reuniões do futuro MFA, em Óbidos, embora isso nunca lhe tenha sido dito expressamente.
Falava-se de muita coisa, com à vontade, como reivindicações, greves, democracia e o 2º Comandante num jantar em sua casa, com três convidados que não identifico, questionou sobre a possibilidade de ser desencadeada uma Greve de Zelo, o grau de adesão e a utilidade. Convergimos sobre a “certeza” que tal greve não tinha hipóteses de sucesso. Estas e outras situações, mostravam o “lirismo” de alguns oficiais.
No dia 16 de março de 1974, quando Gonçalves Sapinho se levantou, tomou conhecimento do movimento de militares do RI5, rumo a Lisboa, liguei para casa do Major, 2º Comandante, para saber o ponto da situação. Atendeu a esposa, que me disse que o Major meteu baixa nesse dia, e que não tinha participado, alegando que era pai de três filhos.
Isto é, borregou na hora da verdade.
Embora não tivessem conversado sobre a situação entre 16 de março e o 25 de Abril, Gonçalves Sapinho ainda lhe disse que era de opinião que isto já tinha ido longe demais, e que era inevitável que acontecesse alguma coisa ainda.
No dia 26 de abril, apareceram os primeiros militares saneados, e entre eles lá estava o 2º Comandante do RI5, o que não impediu de continuarem a manter relações de amizade, pois era um homem inteligente, culto e amigo do seu amigo.

De acordo com os comunicados e notas oficiosas, no dia 17 de março, Reina a ordem em todo o País.
Sobre o 16 de março, Otelo Saraiva de Carvalho declarou, ao Gazeta de Caldas, de 23 de março 2007, que o 16 de março foi para mim um acontecimento de grande importância, independentemente de ter nascido de uma ação militar desorganizada e aventureira. A verdade é que essa ação acabou por constituir um ensaio de grande utilidade para elaborar o plano de ações para o 25 de Abril. Como “assisti” na rotunda da Encarnação, em Lisboa, à montagem do aparato bélico que esperava a coluna que vinha das Caldas, pude ficar a saber com que unidades não podíamos contar, quais as que havia necessidade de controlar e de que forma se organizavam as unidades militares e os órgãos militarizados. A missão para o 25 de Abril era muito concreta ao contrário do 16 de março, que apenas serviu como balão de ensaio. O acontecimento em si foi uma derrota que não merece grande comemoração, mas para os que participaram ativamente naquele dia é um marco histórico nas suas vidas.

Em Alcobaça, a vida política e social decorria sem sobressaltos.
É certo que havia rapazes na Guerra e alguns morriam em combate em nome de Portugal, por doença ou por outras razões, como aconteceu com o Sold. Adriano Maria Alexandre (morreu em combate a 25-02-74 na Guiné)-Sold. Amândio Riquezo Antunes (morreu de acidente a 30-10-71 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério de S. Martinho do Porto)-Sold. Antero Correia de Sousa Luz (morreu em combate a 18-01-74 em Moçambique)-Sold. António Esperança Francisco (morreu de acidente a 14-02-68-Moçambique. Encontra-se sepultado no cemitério de Pataias)-1º Grum. António Fialho dos Santos Canário (morreu de acidente a 24-07-74 na  Guiné. Encontra-se sepultado no cemitério da Benedita)-1º Cabo Ataliba Pereira Faustino (morreu por suicídio a 25-12-64 na Guiné)-Fur. Mil. Graciano de Sousa Rato (morreu de acidente a 15-03-68-na Guiné)-Fur. Mil. Jaime de Matos Feijão (morreu em combate a 22-09-65-Guiné. Encontra-se sepultado em Bissau)-Sold. João Coelho dos Santos (morreu em acidente a 16-12-71em Moçambique. Encontra-se sepultado no cemitério do Barrio)-Sold Joaquim Arlindo de Sousa Alves (morreu de acidente a 23-02-62 em Angola. Encontra-se sepultado em Luanda)-2º Sarg Cav. Joaquim Fernando (morreu a 3 1-05-65 em Moçambique. Encontra-se sepultado em Vila Cabral)-1º. Cabo Joaquim Marcelino (morreu em combate a 24-06-69 em Moçambique). Encontra-se sepultado no cemitério do Vimeiro)-1º. Cabo Joaquim Peres Jorge (morreu por doença a 3 1-05-65-Angola. Encontra-se sepultado no cemitério da Benedita)-Sold José da Silva Alves (morreu em combate a 07-12-68 em Angola)-1º Cabo José Eugénio de Oliveira Barros (morreu de acidente a 30-08-63 em Angola)-Sold. José Inácio Neves  (morreu em combate a 04-06-73 na Guiné. Encontra-se sepultado no cemitério da Benedita)-Sold. José Luís Machado (morreu em combate a 21-06-73em Angola)-Sold.José Madeira Heitor (morreu em combate a 22-01-68 em Moçambique. Encontra-se sepultado no cemitério da Cela), -Sold. José Mendonça Pereira da Silva (morreu por doença a 16-04-70 em Angola)-Sold. José Parrilha Madeira  (morreu de acidente a 05-02-69. Encontra-se sepultado no cemitério da Cela Nova),-Sold. José Paulo da Fonseca (morreu em combate a 12-02-64 na Guiné. Encontra-se Sepultado em Bissau)-Fur. Mil. José Pedro Teodoro Vieira (morreu de acidente a 15-08-68 em Angola)-Sold. José Romão Alexandre  (morreu em combate a 15-01-74 na Guiné. Encontra-se sepultado no cemitério da Maiorga)-Sold. Justo Leão do Couto (morreu de acidente a 01-05-67 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério de Turquel)-Sold. Luís Belo Gerardo (morreu em combate a 26-07-65 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério da Benedita)-Sold. Luís da Silva Mateus (morreu em combate a 14-08-69 na Guiné)-1º. Cabo Manuel António Cotrim Antunes (morreu de acidente a 28-02-71 em Angola)-2º Sarg. Cav. Manuel de Sousa (morreu em combate a 03-08-61 em Angola)-Sold. Manuel de Sousa Pereira (morreu em combate a 21-11-65-em Moçambique. Encontra-se sepultado em Mueda Moçambique)-Sold. Manuel Henriques Lopes  (morreu de acidente a 22-10-74 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério da Benedita)-Sold. Manuel Tereso Lopes (morreu em combate a 23-07-73- Moçambique. Encontra-se sepultado no cemitério de Turquel)-Sold. Pedro Vitorino Libânio Dias (morreu de acidente a 21-05-75 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério de Maiorga)-Fur. Mil. Raul Canadas Ferreira (morreu em combate a 09-09-68 na Guiné)-1º. Cabo Silvestre Costa Silva (morreu em combate a 13-03-70 em Moçambique. Encontra-se sepultado no cemitério de Turquel)-Cor. Tristão de Araújo Leite Bacelar, (morreu de doença a 26-09-68 na Guiné)-Sold. Vitorino Susano Simão, (morreu em combate a 2 1-06-73 na Guiné. Encontra-se sepultado no cemitério de Turquel)-1º. Cabo Fernando de Sousa Barreiro, (morreu de acidente a 09-09-62 na Guiné. Não foi encontrado.



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