REINA A ORDEM EM TODO O PAÍS.
O contexto internacional. O golpe falhado de Caldas da
Rainha e Gonçalves Sapinho. Em África, alcobacenses combatiam e morriam.
Fleming de Oliveira
Em Portugal, e na frente militar de África, por alturas
dos primeiros meses de 1974, havia a forte sensação de que alguma coisa iria
mudar em breve.
As pessoas sentiam necessidade de mudança. Qual a
mudança de que o País precisava, era algo que merecia pouca coincidência de
opiniões. Se se perguntasse ao homem da rua e aos próprios militares do quadro
permanente que meios se haveriam de utilizar, as respostas seriam díspares e
inconclusivas.
A agitação estudantil, especialmente universitária, era
uma manifestação do mal-estar em que o País vivia. Caetano não conseguiu dar
resposta às ânsias de mudança. A Evolução na Continuidade mantivera os mesmos
instrumentos de repressão, apenas com novas designações. A liberalização da
economia, não correspondeu às necessidades de modernização do País, mas o
problema principal era, mesmo, a Guerra em África.
A incorporação nas Forças Armadas, era uma ameaça para
os jovens, muitas vezes utilizada repressivo-politicamente, e os apoios
internacionais aos Movimentos de Libertação, tornavam crescentemente mais
difícil a manutenção da soberania portuguesa.
Não obstante a grande oposição que se fazia sentir na
ONU, as relações com o Ocidente eram normais. A atestá-lo, cite-se a cimeira
das Lajes Caetano-Nixon-Pompidou, o fim da interdição da utilização de material
da NATO nas campanhas de África, a abertura de Angola e Moçambique ao capital
internacional, a intermediação pedida a Portugal nas questões relativas à
Rodésia (Ian Smith) e as boas relações com Israel.
Dos custos da guerra, em 1974, os 50% do orçamento
aplicados na guerra, corresponderiam grosso modo a 20% da riqueza do país.
Grande parte desse investimento era em infraestruturas ou canalizado para a
promoção da população africana. A prová-lo, cite-se ainda o facto de os
indicadores de desenvolvimento social e económico da África Portuguesa
superarem os de toda a restante África, apenas ultrapassados pela África do
Sul. Em 1974, 60% dos efetivos militares portugueses nos três teatros de
operações eram de recrutamento local. A guerra estava em avançada fase de
africanização, o que também implicava que o futuro do Ultramar Português se
aproximasse irremediavelmente do momento em que as elites locais, ainda que não
muito preparadas, reclamassem maiores se não totais poderes.
Em 1973, a Time Magazine abordava a iminência de um milagre económico português. Quais eram
os indicadores de tal milagre? Taxas de crescimento anual nunca inferiores a
5%, surgimento de indústrias metalomecânica, petroquímica e pesada portuguesa,
na construção naval, movimento bolsista, investimento estrangeiro, com fixação
de multinacionais e consolidação de uma classe média empresarial e mudança do perfil da população.
Tudo isso se sentia na vida social, nos hábitos e modas,
no gosto de viajar, nas atividades lúdicas e na descompressão que se ia
instalando com altos e baixos.
Portugal era, em 1973, um país estimado por turistas,
barato e o povo simpático. Em 1973, acolheu o maior número de seminários e
congressos profissionais realizados em solo europeu. O regime era encarado com
envergonhada tolerância por alguns dos seus parceiros europeus, ao contrário da
Espanha que, algo esquecida, mais de trinta anos se tinham passado depois da
guerra civil, continuava no limbo dos intocáveis. Franco morreu em 1975 e
isso irá facilitar a mudança.
Marcelo Caetano, condicionado pela fragilidade da sua base de apoio e
pela incapacidade de renovação ideológica dos setores que se lhe opunham,
estava ultrapassado. Nem um novel PS, muito menos o PC,
podiam negociar com Caetano. O Estado Social, encontrava-se amarrado à herança
de Salazar, cativo dos que não tinham uma solução para a mudança do regime e
incapacitado de dialogar com uma oposição, que se assumia marxista e não
rejeitava o derrube violento da Situação. A Caetano pouco mais restava que um
círculo de políticos que em breve ascenderiam à ribalta nos partidos de
direita, surgidos com 25 de Abril e algum respeito que o general António de
Spínola por ele demonstrava.
A situação no início de 1974, estava próxima do
insustentável.
O chamado Golpe das Caldas traduziu-se numa tentativa
precipitada de um grupo de oficiais do quadro permanente, próximos ou afetos ao
Gen. António de Spínola.
A 16 de março de 1974, arrancou de Caldas da Rainha uma
coluna militar em direção a Lisboa que, sem poder contar com o apoio das
principais unidades do exército, acabou por ser facilmente neutralizada. Nas
semanas que se seguiram, foi intenso o movimento conspiratório de um corpo de
oficiais do quadro permanente das Forças Armadas, em Portugal e África, que
procuravam uma solução para o impasse da política ultramarina e a sua
incapacidade para ultrapassar vitoriosamente a crise em que o País estava
mergulhado.
Gonçalves
Sapinho chegou à Benedita vindo do Sabugal, nos finais dos anos de 1960, digamos que por mero
acaso. A minha esposa tinha concorrido para uma vaga que havia no concelho de Caldas da Rainha. Nessa altura era tropa em Montejunto. Quando regressámos de férias, vimos
que a vaga era na escola primária do Casal da Marinha. Ainda tentei emprego nas Caldas da Rainha, na Benedita e em Alcobaça. Como fui
contratado para professor de Matemática no Externato Cooperativo da Benedita,
acabámos por nos instalar na Benedita. Nesse mesmo ano, 1967/1968, insistiu-se
para que fosse Diretor do Externato e, até hoje, não me arrependo de ter aceitado
o convite. Fui Diretor Pedagógico até 2000.
Havia de sua parte uma ligação especial a dois capitães
e sobretudo ao Maj. Serrano, 2º Comandante da Unidade, de cuja casa era visita
conjuntamente com a mulher, o que lhe permitiu perceber que este participava em
reuniões do futuro MFA, em Óbidos, embora isso nunca lhe tenha sido dito
expressamente.
Falava-se de muita coisa, com à vontade, como
reivindicações, greves, democracia e o 2º
Comandante num jantar em sua casa, com três convidados que não identifico,
questionou sobre a possibilidade de ser desencadeada uma Greve de Zelo, o grau
de adesão e a utilidade. Convergimos sobre a “certeza” que tal greve não tinha
hipóteses de sucesso. Estas e outras situações, mostravam o “lirismo” de alguns
oficiais.
No dia 16 de março de 1974, quando Gonçalves Sapinho se
levantou, tomou conhecimento do movimento de militares do RI5, rumo a Lisboa, liguei para casa do Major, 2º Comandante,
para saber o ponto da situação. Atendeu a esposa, que me disse que o Major
meteu baixa nesse dia, e que não tinha participado, alegando que era pai de
três filhos.
Isto é, borregou na
hora da verdade.
Embora não tivessem conversado sobre a situação entre 16
de março e o 25 de Abril, Gonçalves Sapinho ainda lhe disse que era de opinião que isto já tinha ido longe demais, e que
era inevitável que acontecesse alguma coisa ainda.
No dia 26 de abril, apareceram os primeiros militares
saneados, e entre eles lá estava o 2º Comandante do RI5, o que não impediu de
continuarem a manter relações de amizade, pois
era um homem inteligente, culto e amigo do seu amigo.
De acordo com os comunicados e notas oficiosas, no dia
17 de março, Reina a ordem em todo o
País.
Sobre o 16 de março, Otelo Saraiva de Carvalho declarou,
ao Gazeta de Caldas, de 23 de março 2007, que o 16 de março foi para mim um acontecimento de grande importância,
independentemente de ter nascido de uma ação militar desorganizada e
aventureira. A verdade é que essa ação acabou por constituir um ensaio de
grande utilidade para elaborar o plano de ações para o 25 de Abril. Como
“assisti” na rotunda da Encarnação, em Lisboa, à montagem do aparato bélico que
esperava a coluna que vinha das Caldas, pude ficar a saber com que unidades não
podíamos contar, quais as que havia necessidade de controlar e de que forma se
organizavam as unidades militares e os órgãos militarizados. A missão para o 25
de Abril era muito concreta ao contrário do 16 de março, que apenas serviu como
balão de ensaio. O acontecimento em si foi uma derrota que não merece grande
comemoração, mas para os que participaram ativamente naquele dia é um marco
histórico nas suas vidas.
Em Alcobaça, a vida política e social decorria sem
sobressaltos.
É certo que havia rapazes na Guerra e alguns morriam em
combate em nome de Portugal, por doença ou por outras razões, como aconteceu
com o Sold. Adriano Maria Alexandre
(morreu em combate a 25-02-74 na Guiné)-Sold.
Amândio Riquezo Antunes (morreu de acidente a 30-10-71 em Angola.
Encontra-se sepultado no cemitério de S. Martinho do Porto)-Sold. Antero Correia de Sousa Luz (morreu em combate a 18-01-74 em
Moçambique)-Sold. António Esperança
Francisco (morreu de acidente a 14-02-68-Moçambique. Encontra-se sepultado
no cemitério de Pataias)-1º Grum. António
Fialho dos Santos Canário (morreu de acidente a 24-07-74 na Guiné. Encontra-se sepultado no cemitério da
Benedita)-1º Cabo Ataliba Pereira Faustino (morreu por
suicídio a 25-12-64 na Guiné)-Fur. Mil.
Graciano de Sousa Rato (morreu de acidente a 15-03-68-na Guiné)-Fur. Mil. Jaime de Matos Feijão (morreu
em combate a 22-09-65-Guiné. Encontra-se sepultado em Bissau)-Sold. João Coelho dos Santos (morreu em
acidente a 16-12-71em Moçambique. Encontra-se sepultado no cemitério do Barrio)-Sold Joaquim Arlindo de Sousa Alves
(morreu de acidente a 23-02-62 em Angola. Encontra-se sepultado em Luanda)-2º Sarg Cav. Joaquim Fernando (morreu a
3 1-05-65 em Moçambique. Encontra-se sepultado em Vila Cabral)-1º. Cabo Joaquim Marcelino (morreu em
combate a 24-06-69 em Moçambique). Encontra-se sepultado no cemitério do
Vimeiro)-1º. Cabo Joaquim Peres Jorge
(morreu por doença a 3 1-05-65-Angola. Encontra-se sepultado no cemitério da
Benedita)-Sold José da Silva Alves
(morreu em combate a 07-12-68 em Angola)-1º
Cabo José Eugénio de Oliveira Barros (morreu de acidente a 30-08-63 em
Angola)-Sold. José Inácio Neves (morreu em combate a 04-06-73 na Guiné.
Encontra-se sepultado no cemitério da Benedita)-Sold. José Luís Machado (morreu em combate a 21-06-73em Angola)-Sold.José Madeira Heitor (morreu em
combate a 22-01-68 em Moçambique. Encontra-se sepultado no cemitério da Cela), -Sold. José Mendonça Pereira da Silva
(morreu por doença a 16-04-70 em Angola)-Sold.
José Parrilha Madeira (morreu de
acidente a 05-02-69. Encontra-se sepultado no cemitério da Cela Nova),-Sold. José Paulo da Fonseca (morreu em
combate a 12-02-64 na Guiné. Encontra-se Sepultado em Bissau)-Fur. Mil. José Pedro Teodoro Vieira
(morreu de acidente a 15-08-68 em Angola)-Sold.
José Romão Alexandre (morreu em
combate a 15-01-74 na Guiné. Encontra-se sepultado no cemitério da Maiorga)-Sold. Justo Leão do Couto (morreu de
acidente a 01-05-67 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério de Turquel)-Sold. Luís Belo Gerardo (morreu em
combate a 26-07-65 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério da Benedita)-Sold. Luís da Silva Mateus (morreu em
combate a 14-08-69 na Guiné)-1º. Cabo
Manuel António Cotrim Antunes (morreu de acidente a 28-02-71 em Angola)-2º Sarg. Cav. Manuel de Sousa (morreu
em combate a 03-08-61 em Angola)-Sold.
Manuel de Sousa Pereira (morreu em combate a 21-11-65-em Moçambique.
Encontra-se sepultado em Mueda Moçambique)-Sold.
Manuel Henriques Lopes (morreu de
acidente a 22-10-74 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério da Benedita)-Sold. Manuel Tereso Lopes (morreu em
combate a 23-07-73- Moçambique. Encontra-se sepultado no cemitério de Turquel)-Sold. Pedro Vitorino Libânio Dias
(morreu de acidente a 21-05-75 em Angola. Encontra-se sepultado no cemitério de
Maiorga)-Fur. Mil. Raul Canadas Ferreira
(morreu em combate a 09-09-68 na Guiné)-1º.
Cabo Silvestre Costa Silva (morreu em combate a 13-03-70 em Moçambique.
Encontra-se sepultado no cemitério de Turquel)-Cor. Tristão de Araújo Leite Bacelar, (morreu de doença a 26-09-68
na Guiné)-Sold. Vitorino Susano Simão,
(morreu em combate a 2 1-06-73 na Guiné. Encontra-se sepultado no cemitério de
Turquel)-1º. Cabo Fernando de Sousa
Barreiro, (morreu de acidente a 09-09-62 na Guiné. Não foi encontrado.
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