quarta-feira, 16 de abril de 2014

-LOPES-GRAÇA, A CENSURA E O NOTÍCIAS DA AMADORA (1968). O VIOLONCELISTA SOVIÉTICO MSTISLAV ROSTROPOVICH SUSPENSÃO POR UM MÊS DE A BOLA (1946)-


 

-LOPES-GRAÇA, A CENSURA E O NOTÍCIAS DA AMADORA (1968).
O VIOLONCELISTA SOVIÉTICO MSTISLAV ROSTROPOVICH
SUSPENSÃO POR UM MÊS DE A BOLA (1946)-

Fleming de Oliveira


Na prova de uma página do Notícias da Amadora, reconhecidamente não afeto ao salazarismo (2 de março de 1968), havia uma notícia sobre o compositor Fernando Lopes-Graça, autorizada pelos Serviços da Censura, onde se podem ver os cortes efetuados.
No primeiro parágrafo, aliás suprimido, liam-se elogios ao músico que o zeloso censor decidiu eliminar, dada a sua descrição como um homem cuja vida era uma luta exemplar contra a ignorância, o modo de dizer estou aqui e as canções que recolheu do sangue do povo.
Linhas à frente, seguia sem cortes, a razão de ser da notícia. A projeção internacional do compositor português, decorria de Mstislav Rostropovich, um reconhecido violoncelista soviético (embora  contestante), lhe ter encomendado o Concerto para Violoncelo, classificado pelo jornalista como a sua última obra de fôlego.
Mas logo o lápis azul da censura voltou a cortar uma parte da notícia, alegadamente incómoda, deixando o leitor sem saber que a primeira audição mundial daquele concerto fora interpretada por Rostropovich, condecorado outrora com Prémio Estaline, durante umas comemorações da Revolução Bolchevista.

Lopes-Graça esteve frequentemente sob a mira da PIDE e da censura, especialmente após a participação no MUD assim como no PC, do qual se tornou um militante ativo.
É de 1945, o seu plano para a organização estatal da música, inédito até 1989, e o início da composição das Canções Heróicas, peças de intervenção cuja apresentação em público esteve proibida até ao 25 de abril.
Como comunista ortodoxo-soviético, confiava em absoluto na queda com o apoio dos Aliados, do Estado Novo, após o termo da II Guerra.
Só com o fim do Estado Novo, e com o PREC houve reconhecimento oficial do seu papel no quadro da cultura musical e nacional.
É de 1979, apesar do seu peculiar sentido de humor, a dramática e muito datada composição Requiem para as Vítimas do Fascismo em Portugal, por isso hoje esquecida.

Outro caso de suspensão de publicação periódica, aconteceu com o A Bola, graças a uma reportagem publicada a 25 de março de 1946.
A matéria, não censurada, referia-se a um desafio de futebol amigável entre a Seleção Portuguesa e, de acordo com o jornalista responsável pela peça, onze marinheiros britânicos da Home Fleet tomados como a Selecção Britânica. Portugal vencera por 11-1.
O jornalista disse que a luta não foi equilibrada, mas indiscutivelmente correta ou não estivessem em campo 11 cidadãos britânicos. Só para se ver como se perde com uma cara alegre e sorriso nos lábios a grande maioria, mas muito grande, dos assistentes ao espetáculo não deve ter dado por mal empregado o dinheiro gasto com os bilhetes da entrada. No entanto outro motivo de indiscutível sucesso houve, por milagre, para justificar a deslocação de tantos milhares de pessoas ao Vale do Jamor, a exibição da Banda de Música Inglesa, durante o intervalo do desafio. A compostura, o garbo e a afinação daquele conjunto compensaram de sobejo o sacrifício da tarde. Com aquela pequena amostra de um breve quarto de hora, o público ficou deliciado, aplaudindo merecidamente.
Os comentários em questão custariam ao jornal um mês de suspensão por falta de respeito para com o Velho Aliado e Sua Majestade.
NOTA-cfr. o nosso, NO TEMPO DE SALAZAR, CAETANO E OUTROS




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