EM LISBOA JÁ NÃO SE EXPLORAM TRABALHADORES COMO ANTES…
ALTINO, PATRÃO ALCOBACENSE DE “GANCHO”.
Fleming de Oliveira
Altino do Couto Ribeiro fazia a distribuição das
encomendas da sua fábrica de louça em Alpedriz, em qualquer parte do País, de
Norte a Sul e, muito especialmente em Lisboa, onde ia muitas vezes e tinha bons
clientes, como Brás & Brás, dadas as cordiais relações com o dono, António
Brás.
Por alturas de setembro de 1974, Altino deslocou-se numa
tarde a Lisboa para entregar mercadoria a um novo cliente, com uma loja de
decoração e artigos para casa, na Rua Forno do Tijolo. Ao chegar, foi recebido
por alguém se apresentou como o dono, que muito democraticamente lhe referiu
que, em Lisboa, “já não se exploram os
trabalhadores como antes”, pelo que não compreendia como o patrão obrigava
que o motorista fizesse a distribuição, sem ajudante.
Sem se desmanchar, Altino respondeu que o patrão da sua
empresa, era um “gajo de gancho”,
expressão que fez acompanhar, com o expressivo e popular gesto do dedo. Assim,
o cliente afirmou que quando o viajante por lá passasse, haveria de lhe chamar
a atenção para tal prepotência e dizer-lhe das boas e que transmitisse ao
patrão.
Com a entrega da mercadoria, recebeu a gratificação de “10$00 para uma cerveja”, o que não
rejeitou e intimamente divertido meteu no porta-moedas.
Dias depois, o viajante passou pelo estabelecimento, tendo-lhe
sido feita a queixa anunciada.
O viajante esclareceu que, na fábrica de Altino, “a distribuição foi sempre feita pelo patrão,
sem qualquer ajudante e nunca se deu mal com o processo”.
Mais tarde, Altino voltou à Rua Forno do Tijolo para
entregar mercadoria, e no meio de risota, o cliente disse-lhe que “você saiu-me cá uma boa prenda”.
Com o tempo tornaram-se amigos e fizeram muitos
negócios.
Em outubro ou novembro de 1974, Altino do Couto Ribeiro
recebeu mais um aviso para se deslocar à Delegação do Ministério do Trabalho,
em Leiria, “a fim de tratar de um assunto
do seu interesse”.
Não foi a primeira, nem a última vez que recebeu “avisos” semelhantes, pois não obstante ser pequeno
empresário de louça, estava sob a mira atenta dos sindicatos, sem que estes se
identificassem, propriamente, com os trabalhadores ao serviço da empresa.
O assunto que, afinal, tinha a tratar em Leiria era
relativamente insignificante, pelo que a deslocação aborreceu-o muito mais que
a importância. Todavia, sem que nada o justificasse, à falta de melhor
argumento, um sindicalista do Valado de Frades, trabalhador da SPAL, com que
não tinha de há muito boas relações, rotulou-o aí publicamente e em voz alta de
“explorador dos trabalhadores”. Altino
sentindo a injúria, irritou-se de imediato e tentou agarrar pelo colarinho o
provocador, só não conseguindo o seu intento, porque este era bastante
corpulento e foram separados pelo Delegado do Ministério do Trabalho.
Mas ao chegar à fábrica, resolveu telefonar ao Delegado
do MT, para dar-lhe uma satisfação e pedir desculpa pela atitude. Ficou
bastante reconfortado ao ouvir do outro lado assegurar-lhe que “compreendi muito bem a reação. Comigo não
sei como reagiria”.
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