NÃO
JURO PELA HONRA… DESTE POBRE PAÍS…
TRIBUNAL
JUDICIAL DE AlCOBAÇA (1976)
Fleming de Oliveira
A forma categórica
como rejeitou a ajuda do oficial de justiça, denunciou uma personalidade
orgulhosa e indómita.
O Dr. Manuel Almeida
contou-me que a senhora caminhou ereta até ao lugar indicado, apenas apoiada na
bengala, que agarrava firme na mão direita. Permaneceu de pé. Os cabelos
alvísssimos e as rugas profundas, que não disfarçava, anunciavam uma idade
provecta, mas indefinível.
–Pode sentar-se, minha senhora,
dirigiu-se-lhe com delicadeza o juiz Madeira Bárbara, poeta de rima duvidosa,
de pensamentos ingénuos mas alegadamente progressistas que chegaram a estar
afixados em algumas salas do Tribunal,
(nomeadamente na Sala dos Advogados), por iniciativa do Secretário Judicial e
ativista do MDP, José Maria Cascão.
–Ficarei de pé, como me impõe o respeito
devido a este Tribunal, ripostou num
tom que quase não admitia réplicas, batendo ao mesmo tempo com a bengala no
chão de soalho carunchoso.
Note-se que, por
esta altura, o Tribunal de Alcobaça, em muito más condições, funcionava no
primeiro andar da ala norte do Mosteiro, aguardando a todo o tempo a mudança
para o novo e excelente edifício na Gafa feito por mão de obra prisional, quase
concluído.
Às perguntas da
praxe (nome, estado civil, morada, profissão) foi respondendo, sem hesitações.
–É
alguma coisa a algum dos interessados neste processo?
–Sou a mãe do
Francisco (cliente do Dr. Almeida.)
–Mas não está zangada com ninguém?
–Jesus Cristo ensinou-nos
a amar até os nossos inimigos.
–Sim,
mas o facto de ser a mãe do Francisco não a vai impedir de responder, com
verdade, àquilo que aqui lhe for perguntado?
–Na minha idade,
Senhor Doutor Juiz, o temor das penas do inferno impede-me a mentira.
–Muito bem! Então jura por sua honra que vai
dizer a verdade, toda a verdade e nada mais do que a verdade?
–Juro por Deus,
Senhor Doutor! Pela minha honra não, que ela se perdeu, tal como a deste pobre
País…
O juiz, perplexo
(tal como o Dr. M. Almeida), disse apenas:
-Adiante,
mas jura?
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